17 de janeiro de 2022
Com base nos princípios da anterioridade anual e nonagesimal, a juíza Patrícia Persicano Pires, da 16ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, concedeu liminar para suspender a cobrança do diferencial de alíquota (Difal) do ICMS em 2022 a uma indústria química.
A empresa impetrou mandado de segurança contra a aplicação imediata da Lei Complementar 190/2022, sancionada em 4 de janeiro deste ano, que se refere à cobrança do Difal do ICMS, pela não observância dos princípios constitucionais da anterioridade anual e nonagesimal.
A juíza afirmou “não haver dúvidas” quanto à necessidade de respeitar a anterioridade nonagesimal, na medida em que o artigo 3º da LC 190/2022 determinou a observância, quanto à produção de efeitos, ao disposto na alínea c, do inciso III, do caput, do artigo 150 da Constituição Federal.
“Conquanto o Estado de São Paulo tenha publicado a Lei Estadual 17.470/2021 em 14/12/2021, a validade da lei estadual está sujeita aos efeitos da Lei Federal que disciplina normas gerais para a cobrança do Difal. Logo, o Difal, pela anterioridade nonagesimal, por escolha do legislador federal, somente poderá ser exigido depois de 90 dias da publicação da LC 190/2022”, afirmou.
Outro ponto a ser observado, explicou a magistrada, é sobre a anterioridade anual. Segundo ela, como a LC 190/2022 só foi promulgada em 4 de janeiro de 2022, tem “pertinência” a controvérsia se o Difal poderia ser exigido já neste ano ou somente a partir de 1º de janeiro de 2023.
“Analisando-se a redação da LC 190/2022, tenho que a forma de cálculo do ICMS nas operações interestaduais quando da remessa ao não contribuinte do imposto equivale a aumento do tributo”, completou a juíza, afirmando que, para o contribuinte que, antes da lei complementar, recolhia apenas o tributo em seu estado de origem, a obrigação de recolher a diferença para o estado de destino quando a alíquota deste é superior à daquele, implica em majoração do imposto.
Não bastasse isso, Pires observou que, ao definir uma nova categoria de contribuintes do imposto (artigo 4º, § 2º, da LC 190/2022), a lei criou uma nova relação jurídico-tributária, “de modo que para essa nova categoria de contribuintes, o imposto, que antes da edição da LC 190/2022 não era constitucionalmente exigível, além de aumento da caga tributária, a LC 190/2022 também implica na criação de um novo”.
E, para a magistrada, as inovações da lei que possuem a natureza de criação e aumento de tributo também estão presentes no artigo 12, incisos XIV, XV e XVI (quanto definem novos fatos geradores) e no artigo 13, inciso IX e X e §§ 3º, 6º e 7º (definição da base de cálculo). “Logo, imperioso o respeito à anterioridade anual”, concluiu Pires ao conceder liminar que impede a Fazenda Estadual de cobrar o Difal da empresa autora antes de 1º de janeiro de 2023.
Para o advogado Matheus Bueno, o entendimento da juíza está correto. “O raciocínio por trás da decisão é de que a Constituição apenas delega competências, não cria tributos, e as leis complementares criam as balizas a serem seguidas pela União, estados e municípios. O fato de ter havido modulação não significa mera continuidade do tributo, como os estados vem defendendo. É um excelente precedente para todas as operações com destinatário final no território paulista”, explicou.
Decisões conflitantes
Duas Varas da Fazenda Pública de São Paulo tomaram nos últimos dias decisões conflitantes sobre o pagamento imediato do diferencial de alíquotas (Difal) do ICMS no comércio eletrônico, o que deixa claro o quanto tem feito falta um entendimento unificado sobre o assunto.
A 8ª Vara concedeu uma liminar a um contribuinte para que ele não tenha de pagar o Difal. Em sua decisão, o juiz Josué Vilela Pimentel lembrou que o Supremo Tribunal Federal julgou a inconstitucionalidade da cobrança do Difal sobre o ICMS, introduzida pela Emenda Constitucional 87/2015, entendendo pela necessidade de edição de lei complementar para a fixação de normas gerais.
Tendo em vista que a Lei Complementar 190/2022 só foi publicada neste mês, o magistrado alegou que deve incidir o princípio nonagesimal. Assim, determinou a suspensão da exigibilidade do Difal/ICMS, com os efeitos decorrentes, entrementes a emissão da certidão de regularidade fiscal, assim como afastou qualquer punição pelo não recolhimento do Difal.
Por outro lado, a 10ª Vara negou o pedido de uma empresa de não aplicação imediata da LC 190/22. Segundo o juiz Otavio Tioiti Tokuda, a cobrança de Difal não é criação de imposto ou majoração de imposto existente, já que a Lei Complementar 190, ao alterar a Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir), apenas disciplinou a distribuição dos recursos apurados no ICMS quando há movimentação de mercadorias entre dois estados que cobram alíquotas distintas.
1001443-38.2022.8.26.0053
Fonte: TJSP