10 de março de 2022

O ato de transferência de concessão de um determinado serviço mediante a autorização do poder público, previsto no artigo 27 da Lei 8.987/1995, não é incompatível com a Constituição Federal, e, portanto, não deve ser impugnado.

Ministro Dias Toffoli mudou de posição e proferiu entendimento vencedor em julgamento

Com base nesse entendimento, o Supremo Tribunal Federal, por 7 votos a 4, validou, em julgamento virtual, a cessão ou transferência das concessões sem obrigatoriedade de abertura de novo processo licitatório. Prevaleceu a proposta do relator, ministro Dias Toffoli, que mudou seu voto no decorrer do processo.

Para Toffoli, as cessões ou transferências de concessão e do controle societário da concessionária, desde que autorizadas pelo poder público, têm a finalidade de permitir a continuidade da prestação de serviços nos casos em que as concessionárias não têm condições de dar continuidade aos empreendimentos.

Segundo ele, o próprio parágrafo 1º do dispositivo da lei que se tentava impugnar já prevê requisitos para que a administração pública autorize a cessão da concessão ou a transferência do controle societário, como atendimento das exigências técnicas, idoneidade financeira e regularidade jurídica, além do comprometimento com todas as obrigações contratuais.

Também cabe à administração pública fazer o controle de juridicidade do ato de transferência, conferindo se são atendidos os critérios de admissibilidade da cessão, se há norma legal vedando a prática no contrato específico ou cláusula proibindo, se o certame não apresenta empecilho à cessão, se a transferência não resulta de conluio para transmitir a posição contratual ou se não há indícios de cartelização.

O entendimento de Toffoli foi acompanhado por Gilmar Mendes, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, André Mendonça, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso.

Ficaram vencidos os ministros Luiz Edson Fachin, acompanhado por Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, e Cármen Lúcia.

Histórico da ADI
A ação foi proposta pela Procuradoria-Geral da República em 2003, pelo então procurador Cláudio Fonteles. O artigo 27 da Lei 8.987/95 dispõe sobre a caducidade da concessão quando ocorrer a transferência da concessão ou do controle acionário da concessionária sem a prévia anuência do poder concedente — admitindo, assim, a transferência quando houver anuência da administração. A ação argumentava que essa transferência violaria o artigo 175 da Constituição, que proíbe que haja concessão sem prévio procedimento licitatório.

O dispositivo determina que “a transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão”. Para combater a eficácia do artigo 27 da lei impugnada, o procurador-geral invocou o artigo 175 da Constituição Federal, segundo o qual, “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”.

Após citar a doutrina que amparava suas alegações, Cláudio Fonteles advertiu para um contrassenso da lei impugnada: o dispositivo questionado, diz ele, “discrepa da própria lei, pois o artigo 26 do mesmo diploma, ao dispor sobre a subconcessão de serviço público, estabelece expressamente a exigência de licitação”.

No julgamento iniciado no Plenário Virtual em agosto de 2021, e que depois foi transferido para o Plenário físico devido a um pedido de destaque de Gilmar Mendes, Toffoli tinha dado provimento parcial ao pedido para declarar a inconstitucionalidade do artigo.

Na continuação do julgamento, em dezembro, o relator disse que, depois de o caso ser transferido para o julgamento presencial, resolveu mudar seu voto, também influenciado por um parecer apresentado pelo ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence. Esse parecer foi publicado pela ConJur.

Nele, o ministro aposentado afirma que o artigo 27 da Lei 8.987/1995 é constitucional. Isso porque a operação ocorre depois da contratação da proposta mais vantajosa, que exaure a finalidade da licitação.

Respondendo a pergunta feita pela Associação Brasileira de Infraestrutura e de Indústrias de Base (Abdib), Pertence disse também que a transferência da execução de serviços públicos não despreza a licitação promovida anteriormente, com a extinção da concessão e novo procedimento para contratar outro concessionário para prestar o serviço.

Segundo Pertence, a mudança é inevitável e previsível na gestão e execução dos contratos de concessão, que têm prazos longos. E a transferência de concessões ou do seu controle societário, destacou, só pode ser feita com concordância do poder público, com a comprovação de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal, além da garantia de que serão cumpridas todas as cláusulas do contrato. 


ADI 2.946

Fonte: STF