O governo de Javier Milei virou mais uma página infame da história recente da Argentina, dando fim ao cepo – o controle de capitais que limitava a compra de dólares – e criando um sistema de banda que deverá fazer convergir as cotações no  câmbio oficial e no paralelo.

14 de abril de 2025

A queda nas restrições só será possível graças a um novo aporte de socorro externo liderado pelo Fundo Monetário Internacional e, também, a uma mãozinha de Donald Trump.

O FMI vai emprestar US$ 20 bilhões em dinheiro novo, sendo que US$ 12  bilhões deverão ser depositados nos cofres da Argentina nesta terça-feira e outros US$ 2 bilhões em junho.

Em paralelo, o Banco Mundial anunciou linhas de financiamento de US$ 12 bilhões e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) vai liberar outros US$ 10 bilhões.

“Hoje é um dia especial. Estamos mais livres,” disse Milei hoje em entrevista a uma rádio local. “Desarmar o cepo implicava eliminar várias camadas, coisas que começamos a fazer desde o primeiro dia.”

Numa evidência do prestígio de Milei na Casa Branca, desembarcou hoje cedo em Buenos Aires o Secretário do Tesouro, Scott Bessent – que, mesmo enfrentando turbulências nos mercados americanos, manteve a reunião com o líder argentino.

Milei e Bessent deverão fazer um comunicado conjunto hoje à tarde.

Esse é o 23° acordo do FMI com a serial defaulter Argentina, lembra o Financial Times.

Pelos termos negociados, a Argentina se compromete a obter um superávit fiscal primário de pelo menos 1,3% do PIB neste ano. O governo prometeu entregar 1,6%.

No último mês, antes da confirmação do pacote aprovado na sexta-feira, o peso argentino estava sob pressão. A cotação do blue – o dólar paralelo – descolou do oficial e abriu um ágio superior a 20%. O Banco Central do país precisou intervir, vendendo US$ 2,5 bilhões para impedir uma desvalorização ainda mais acentuada da moeda local e evitar um contágio na inflação.

Dentro do regime de banda que passa a valer a partir de hoje, a cotação do dólar poderá flutuar entre 1.000 e 1.400 pesos. A banda será ampliada em 1% ao mês para cima e para baixo, na tentativa de estabelecer um teto para a depreciação cambial.

“Foi um movimento importante e na direção correta,” disseram os analistas do BTG em um relatório. “É melhor do que esperávamos.”

Segundo o BTG, a cotação deverá se estabilizar abaixo do teto da banda, mas parece “muito ambiciosa” a visão do governo de que ela ficará perto do piso.

Com relação ao impacto inflacionário, os analistas estimam que ele será “moderado” – e a inflação deverá seguir em tendência de queda, após o ajuste inicial.

Para a Goldman Sachs, o pacote também surpreendeu positivamente.

“Em particular, o novo regime de flutuação foi além de nossas expectativas e poderá contribuir para a sustentabilidade de médio prazo do programa de ajustes macroeconômicos implementados,” disse o analista Sergio Armella. “O país necessita de uma taxa cambial que possibilite ao Banco Central acumular reservas de maneira substancial.”

Os títulos soberanos da Argentina sobem 5% hoje pela manhã, em uma reação positiva dos investidores internacionais. As ações de empresas argentinas listadas nos EUA, sobretudo os bancos e a petroleira, registram ganhos acima de 10%.

No mercado argentino, o dólar oficial sobe hoje mais de 8%, cotado a 1.190 pesos. O blue recuou ligeiramente para 1.305 pesos.

A Argentina precisava desesperadamente do apoio do FMI para ter bala e intervir no câmbio se necessário e assim realizar uma ‘flutuação suja’ sem as amarras do cepo.

Uma mostra dos desafios adiante é que a inflação parou de cair e, na verdade, voltou a subir na margem. Em março, a variação mensal ficou em 3,7%, ante 2,4% em fevereiro.

Milei recebeu também um voto de confiança de Xi Jinping. A China vai renovar U$ 5 bilhões de uma parcela dos US$ 18 bilhões em swaps cambiais que mantém com a Argentina.

Os controles cambiais haviam sido impostos pela peronista Cristina Kirchner a partir de 2011, depois de seu governo ter exaurido as reservas internacionais. Diversas medidas de controle de compra e venda de dólares foram criadas para impedir uma fuga ainda maior de capitais, com impacto sobre a inflação.

Mauricio Macri acabou com as restrições em 2015. Menos de quatro anos depois, entretanto, os controles foram retomados e seriam apertados no governo de Alberto Fernández.

Milei, que assumiu em dezembro de 2023 com uma agenda ampla de reformas econômicas, conseguiu eliminar o déficit fiscal, mas não foi capaz de recuperar as reservas em moeda forte – que, em termos líquidos, continuavam negativas antes do aporte dos organismos multilaterais.

Fonte: https://braziljournal.com/milei-libera-o-cambio-em-mais-um-passo-historico-para-a-argentina/