MURRAY ADVOGADOS
A PEC 66/2023 (moratória disfarçada?): Panorama e Principais Mudanças.
Por Alexandre Tuzzolo Paulino.
Quando todas as atenções estavam voltadas para o Supremo Tribunal Federal no dia do voto do ministro Luiz Fux (11/09/25) no julgamento da ação pena 2668, foi aprovada pelo Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição nº 66/2023, que deu origem à Emenda Constitucional 136/2025. Fica alterado o regime de pagamento de precatórios pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, redefinindo prazos, limites orçamentários e critérios de atualização para os credores.
A partir de 2026, os precatórios — inclusive RPVs (Requisições de Pequeno Valor) — deixarão de contar para o limite de despesas primárias da União. Estados, DF e Municípios terão seus pagamentos limitados a percentuais da Receita Corrente Líquida (RCL), variando de 1% a 5%, dependendo do tamanho do estoque de precatórios em atraso em relação à RCL e o indexador passa a ser o IPCA, com juros simples de 2% ao ano, salvo quando a Selic for menor, o que certamente gera perdas significativas para credores, especialmente considerando moras longas.
Com os limites orçamentários para pagamento baseados em percentuais da RCL e sem garantia de liquidação do estoque em prazo certo, credores terão maior dificuldade de estimar quando receberão os valores devidos. E, ao impor um teto de gasto anual para precatórios conforme o estoque relativo, cria-se uma situação em que dívidas já reconhecidas judicialmente poderiam ficar pendentes indefinidamente.
A postergação indefinida do pagamento de precatórios alimentares (ou seja, aqueles que correspondem a salários, pensões, benefícios previdenciários) tem impacto direto na dignidade, no direito à subsistência e na confiança no sistema jurídico.
Organizações da sociedade civil, OAB e entidades de credores manifestaram preocupação com a constitucionalidade da PEC ou da EC 136, chamando‐a de “calote”, “moratória disfarçada”, sob argumento de que fere garantia da coisa julgada, direito de propriedade e a autoridade do Judiciário.
A OAB propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a EC 136/2025, com pedido de medida cautelar para suspender os efeitos da norma até seu julgamento definitivo pelo STF. A OAB alega violação aos princípios da coisa julgada, direito de propriedade e autoridade jurisdicional.
Do ponto de vista jurídico-constitucional, a EC 136/2025 (derivada da PEC 66/2023) caminha numa linha tênue entre o poder de organização do Estado para gerenciar perdas fiscais e o direito fundamental dos credores de receber decisões judiciais transitadas em julgado. Princípios como dignidade da pessoa humana, segurança jurídica, coisa julgada, direito à propriedade, e até o acesso à justiça, podem ser afetados se os pagamentos ficarem indefinidamente protelados.
Além disso, há desafios práticos: como será efetivamente apurado o estoque de precatórios, como garantir transparência nos acordos diretos, como será calculado o deságio, como será fiscalizada a nova sistemática pelos tribunais de contas e pelo próprio Judiciário, e como os credores mais vulneráveis conseguirão proteger seus direitos diante da norma?
Há, ainda, a provável judicialização em massa, com o aumento de litígios para obter liminares ou decisões de mérito que reconheçam violação constitucional, bem como a possibilidade de intervenção do STF para modular ou até declarar inconstitucionalidades parciais ou totais da norma, com impacto financeiro.
Setembro de 2.025