A norma do Código de Processo Civil que determina que os honorários de sucumbência, quando fixados por equidade, obedeçam pelo menos à tabela da OAB local não vincula a análise do juiz. Em vez disso, oferece a ele mera referência.
3 de outubro de 2025
STJ vem afastando regra do CPC sobre uso da tabela da OAB para honorários por equidade (Freepik)
A posição tem sido defendida por ministros do Superior Tribunal de Justiça, em julgamentos que culminam com a relativização do artigo 85, parágrafo 8º-A, do CPC.
A norma foi incluída no código pela Lei 14.365/2022, que ampliou direitos da advocacia, especialmente em um tema tão sensível como a questão dos honorários por equidade.
Eles estão previstos no artigo 85, parágrafo 8º do CPC, para causas cujo proveito econômico for inestimável ou irrisório, ou quando o valor da causa for muito baixo.
Nessas hipóteses, o juiz foge da regra geral, que prevê honorários em percentuais fixos, e pode fixar a verba livremente, de acordo com a complexidade da causa, o zelo do advogado, o lugar da prestação de serviço e outros fatores.
Apenas referência
Em um momento em que o Judiciário discutia se o método da equidade caberia também para causas de valor muito alto — hipótese recusada pelo STJ e ainda em análise pelo Supremo Tribunal Federal — a Lei 14.365/2022 deu um padrão mínimo para advocacia.
Ela diz que, quando o método da apreciação equitativa for utilizado, ainda assim o juiz deve observar um mínimo: os valores recomendados pelo Conselho Seccional da OAB para a ação ou 10% do valor da causa, prevalecendo o que for maior.
Na prática, a tabela da OAB local será sempre o valor mínimo para os honorários, pois fatalmente será maior do que 10% do que o juiz considerar como valor muito baixo ou irrisório.
O problema é que esse tabelamento, feito unilateralmente pela OAB, sempre foi tratado pela jurisprudência do STJ como um referencial que não precisa ser seguido pelo juiz.
Há precedentes da 1ª Seção e das 1ª, 2ª e 3ª Turmas do tribunal usando essa mesma lógica já sob a vigência do artigo 85, parágrafo 8º-A do CPC. Apenas a 4ª Turma vem consistentemente aplicando a norma, com base em precedente da 2ª Seção.
Flagrante desproporcionalidade
Um dos precedentes mais recentes é o do REsp 2.194.144, julgado pela 1ª Turma em agosto. Relator, o ministro Sérgio Kukina apontou que a previsão do artigo 85, parágrafo 8º-A do CPC serve apenas como referencial.
Ao adotar essa posição, ele se reportou ao acórdão da 1ª Seção na Rcl 45.947, de junho de 2024, em que fica claro que a tabela da OAB não vincula a análise do magistrado sobre honorários, sob pena de enriquecimento sem causa dele.
O processo tinha valor da causa R$ 424,6 mil, valor do tratamento home care pleiteado na ação originária. Acontece que, nessas causas relacionadas ao direito á saúde, a corte entende que é impossível mensurar o proveito econômico.
No caso concreto isso é ainda mais evidente porque o objetivo da reclamação foi compelir o Tribunal de Justiça de Santa Catarina a aplicar a posição que a 1ª Seção fixou no IAC 14, sobre competência do juízo estadual.
O ministro Gurgel de Faria então fixou honorários em R$ 2 mil. A parte recorreu para pedir a aplicação do artigo 85, parágrafo 8º-A. Com base na tabela da OAB-DF, a verba honorária subiria para R$ 17,9 mil. E se aplicado o mínimo de 10% sobre valor da causa, R$ 42,4 mil.
Para o relator, isso resultaria em flagrante desproporcionalidade, levando em conta a ínfima complexidade da causa, a curta tramitação do feito e o trabalho desenvolvido pelos advogados. Com isso, manteve a decisão e negou provimento ao recurso.
Já a 2ª Turma do STJ seguiu o mesmo caminho no REsp 2.182.939, julgado em março. “O disposto no parágrafo 8º-A do artigo 85 do CPC/2015 serve apenas como referencial, não vinculando o magistrado”, disse o relator, ministro Francisco Falcão.
Cizânia extensa
As turmas de Direito Privado estão mais dividas. A 3ª Turma tem precedentes, como o AREsp 2.506.581, confirmando uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que entendeu que, ao fixar honorários por equidade, o juiz deve observar a tabela da OAB, não adotá-la obrigatoriamente.
Para o ministro Humberto Martins, essa posição segue a mesma linha da jurisprudência do STJ. A votação foi unânime, em junho de 2024.
A 4ª Turma, por outro lado, tem julgados em sentido oposto. No REsp 2.122.434, sob relatoria do ministro João Otávio de Noronha, o colegiado deu provimento ao recurso da parte para refazer o cálculo da verba honorária e fixou tese não-vinculante:
A fixação equitativa dos honorários advocatícios deve observar os valores recomendados pela OAB ou o limite mínimo de 10% estabelecido no parágrafo 2º do artigo 85, conforme o artigo 85, parágrafo 8º-A, do CPC.
A 2ª Seção, que reúne os membros de ambos os colegiados, também se debruçou sobre a questão dos honorários por equidade no julgamento de uma reclamação. Na Rcl 47.536, a votação foi por adotar a tabela da OAB, conforme voto do ministro Antonio Carlos Ferreira.
Rcl 47.536
REsp 2.122.434
AREsp 2.506.581
REsp 2.182.939
REsp 2.194.144
Rcl 45.947