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O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão por maioria da Terceira Turma, definiu que o depósito espontâneo e parcial feito pelo devedor não afasta a incidência da multa de 10% sobre o valor remanescente nem dos honorários de sucumbência previstos no Código de Processo Civil (CPC), ainda que a diferença seja posteriormente complementada.
06/10/2025

O caso envolveu uma execução invertida, quando o próprio devedor inicia o cumprimento de sentença. O valor depositado espontaneamente pela parte devedora foi considerado insuficiente pela credora, que instaurou o cumprimento de sentença para cobrar a diferença, já acrescida de 10% a título de multa e dos honorários sucumbenciais no mesmo percentual.

A executada, porém, impugnou a cobrança, alegando, entre outros pontos, que o depósito antecipado demonstrava boa-fé e deveria afastar penalidades. O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu a favor da devedora, mas a exequente recorreu ao STJ.

Devedor pode agir com má-fé para retardar o cumprimento da obrigação

A ministra Nancy Andrighi, autora do voto que prevaleceu na Terceira Turma, afirmou que a execução invertida, embora moralmente aceitável, não garante automaticamente a boa-fé do devedor. Ela pode ser utilizada – exemplificou a ministra – como uma forma de beneficiar o inadimplente, impedindo o ajuizamento da execução por falta de interesse processual, já que o artigo 526, parágrafo primeiro, do CPC dispõe que o depósito voluntário por parte do devedor deve ser sucedido pela intimação do credor para se manifestar acerca da suficiência do valor depositado.

Ela explicou que, quando o valor do depósito é insuficiente, o devedor ganha tempo no cumprimento da obrigação, uma vez que nesse intermédio, enquanto é processada a liquidação incidental, o credor não pode promover a execução e o devedor evita todas as consequências do inadimplemento, como os juros de mora e a correção monetária incidentes sobre o valor principal da condenação.

Além disso – continuou Nancy Andrighi –, a possibilidade de complementar o depósito sem penalidades representaria vantagem indevida frente ao credor, o qual, na execução direta, fica sujeito a sofrer sanção por excesso de execução. Para ela, a insuficiência do depósito na execução invertida também viola o princípio da adstrição e, se não for aplicada a sanção prevista no artigo 526, parágrafo segundo, do CPC, permite ao devedor quitar o débito de forma parcelada e sem ônus, mesmo após reconhecido o erro apontado pelo credor.

A ministra também destacou em seu voto a impossibilidade de ser aplicada a norma do artigo 545 do CPC, que permite a complementação do depósito sem ônus, pois “a denominada execução inversa apresenta distinção relevante com a ação de consignação em pagamento. A execução inversa não pressupõe a recusa do credor em receber a prestação, ao contrário do que ocorre na consignação em pagamento”, observou.

REsp 1.873.739

Fonte: STJ

Circunstâncias concretas que evidenciaram erro de proibição e inexistência de efetiva ofensa ao bem jurídico tutelado levaram a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, a reformar uma decisão de segunda instância que condenou um homem acusado de estupro de vulnerável. Para o colegiado, o enquadramento formal do réu no artigo 217-A do Código Penal (CP) não se traduz automaticamente em infração penal material, diante da inexistência de lesão social relevante.
06/10/2025 ​

No caso, o acusado, então com 19 anos, manteve relacionamento amoroso com uma menina de 13 anos, com quem teve relações sexuais. De acordo com os autos, o relacionamento ocorreu com ciência e anuência da família, e resultou no nascimento de um filho, ao qual o réu prestava assistência afetiva e material.

Para o tribunal estadual – que reformou a absolvição proferida em primeiro grau –, não seria possível reconhecer a atipicidade da conduta nesse caso. Segundo a corte, apesar de o acusado alegar desconhecimento da idade da vítima, as provas indicaram que ele tinha ciência da menoridade, uma vez que o relacionamento durou cerca de 18 meses, período, inclusive, em que a vítima fez aniversário, além de ambos residirem na mesma rua, onde geralmente as pessoas se conhecem.

Ainda segundo o tribunal, nem o consentimento da vítima nem a existência de vínculo afetivo teriam o efeito de descaracterizar o crime, que, por se tratar de delito de violência presumida, não admite relativização.

Súmula 593 não dispensa análise das circunstâncias específicas do caso

Ao analisar o recurso da Defensoria Pública estadual, o relator na Quinta Turma, desembargador convocado Carlos Marchionatti – que já deixou o STJ –, acolheu integralmente a posição apresentada pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca em seu voto-vista.

O colegiado considerou que a jurisprudência consolidada do STJ, por meio da Súmula 593, reconhece a vulnerabilidade absoluta de menores de 14 anos, tornando irrelevantes o consentimento, as experiências sexuais anteriores ou a existência de relacionamento afetivo. No entanto, conforme registrado no acórdão, a aplicação dessa tese não dispensa a análise das circunstâncias específicas do caso concreto, sendo possível, excepcionalmente, que a referida súmula e o artigo 217-A do CP cedam diante de situações que evidenciem erro de proibição e ausência de efetiva lesão ao bem jurídico protegido.

A Quinta Turma entendeu que esse afastamento é possível por meio da técnica do distinguishing, que permite a não aplicação do entendimento sumulado em casos excepcionais, desde que existam fundamentos constitucionais e infraconstitucionais que justifiquem a prevalência da justiça material sobre a interpretação literal do tipo penal.

Condenação do pai poderia representar traumas mais graves

Nesse contexto, conforme registrado no acórdão, o erro de proibição pode ocorrer, por exemplo, em situações envolvendo relacionamento amoroso consensual entre adolescentes ou jovens com pequena diferença etária, especialmente quando desse vínculo se forma um núcleo familiar estável – circunstâncias plenamente verificadas no caso concreto.

Por fim, os ministros ressaltaram ainda que a proteção integral da criança nascida da relação, garantida pelo artigo 227 da Constituição Federal e pela Lei 13.257/2016 (Marco Legal da Primeira Infância), justifica uma solução que preserve o núcleo familiar constituído e evite traumas mais graves decorrentes da condenação do pai.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial

Fonte: STJ
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu, em julgamento de recurso repetitivo (Tema 1.309), que os sucessores de servidor público falecido antes do ajuizamento de uma ação coletiva não são beneficiados pela decisão que reconhece o direito de receber diferenças remuneratórias, salvo se expressamente contemplados. Por maioria de votos, prevaleceu o entendimento da relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura.
03/10/2025

Com a definição da tese, os tribunais de todo o país deverão observá-la na análise de casos semelhantes. Também poderão voltar a tramitar os processos que estavam suspensos à espera da fixação do precedente qualificado.

De um lado, a Fazenda Pública sustentava não haver formação de coisa julgada em favor dos sucessores, caso a morte do servidor ocorra antes da propositura da ação. De outro, os herdeiros do servidor afirmavam que a ação coletiva beneficia os sucessores quanto aos direitos individuais homogêneos do falecido e de seus pensionistas.

As duas posições, segundo a relatora, já foram adotadas em julgamentos das turmas da Primeira Seção, fato que motivou a afetação da controvérsia ao rito dos repetitivos, para pacificar a questão na corte.

Favorecimento de herdeiros e os diferentes tipos de ação coletiva

Inicialmente, a ministra destacou que os casos analisados abordam o reconhecimento de direito individual homogêneo, a partir de processo coletivo de um grupo de servidores. “Não estão em discussão ações individuais, multitudinárias, ou ações coletivas tendo por objeto direitos difusos, coletivos”, esclareceu.

Quanto aos tipos de ação coletiva, Maria Thereza de Assis Moura lembrou que existem aquelas em que a coisa julgada beneficia apenas os membros de associações e há outras em que toda a categoria é favorecida.

Conforme explicado, o primeiro caso se refere às ações coletivas ordinárias, propostas por associações de servidores com base no artigo 5º, XXI, da Constituição Federal. Amparada em precedentes do Supremo Tribunal Federal (Temas 82 e 499), a ministra assinalou que essas ações beneficiam apenas os associados.

A segunda hipótese – prosseguiu – é a das chamadas ações coletivas substitutivas, verificadas no mandado de segurança coletivo e na ação proposta por sindicatos para defender “interesses coletivos ou individuais da categoria”, como previsto no artigo 8º, III, da Constituição. “Os sucessores, pelo contrário, não integram a categoria profissional”, salientou a ministra.

De acordo com a relatora, em ambos os casos, um legitimado (associação ou sindicato) busca direitos individuais homogêneos de uma coletividade em nome próprio, mas não há favorecimento dos herdeiros do servidor que morreu antes do ajuizamento da ação.

Direitos e deveres da pessoa natural se extinguem com a morte

Maria Thereza de Assis Moura apontou ainda que os direitos em debate são de titularidade de pessoa natural e se extinguem com a sua morte. Citando a doutrina, ela afirmou que o morto não tem direitos e deveres nem mantém relação com a administração pública, com associação ou sindicato.

“Os sucessores do servidor falecido antes da propositura da ação coletiva não são beneficiados pela coisa julgada, visto que o perecimento extingue a pessoa natural (artigo 6º do Código Civil) e rompe o vínculo com a associação (artigo 56 do Código Civil), com a administração pública (artigo 33, IX, da Lei 8.112/1990) e com a categoria profissional”, concluiu a ministra.

REsp 2.144.140.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2144140 e REsp 2147137
Fonte: STJ
A norma do Código de Processo Civil que determina que os honorários de sucumbência, quando fixados por equidade, obedeçam pelo menos à tabela da OAB local não vincula a análise do juiz. Em vez disso, oferece a ele mera referência.

 

 

 

3 de outubro de 2025

escritório advogado advocacia

STJ vem afastando regra do CPC sobre uso da tabela da OAB para honorários por equidade (Freepik)

A posição tem sido defendida por ministros do Superior Tribunal de Justiça, em julgamentos que culminam com a relativização do artigo 85, parágrafo 8º-A, do CPC.

A norma foi incluída no código pela Lei 14.365/2022, que ampliou direitos da advocacia, especialmente em um tema tão sensível como a questão dos honorários por equidade.

Eles estão previstos no artigo 85, parágrafo 8º do CPC, para causas cujo proveito econômico for inestimável ou irrisório, ou quando o valor da causa for muito baixo.

Nessas hipóteses, o juiz foge da regra geral, que prevê honorários em percentuais fixos, e pode fixar a verba livremente, de acordo com a complexidade da causa, o zelo do advogado, o lugar da prestação de serviço e outros fatores.

Apenas referência

Em um momento em que o Judiciário discutia se o método da equidade caberia também para causas de valor muito alto — hipótese recusada pelo STJ e ainda em análise pelo Supremo Tribunal Federal — a Lei 14.365/2022 deu um padrão mínimo para advocacia.

Ela diz que, quando o método da apreciação equitativa for utilizado, ainda assim o juiz deve observar um mínimo: os valores recomendados pelo Conselho Seccional da OAB para a ação ou 10% do valor da causa, prevalecendo o que for maior.

Na prática, a tabela da OAB local será sempre o valor mínimo para os honorários, pois fatalmente será maior do que 10% do que o juiz considerar como valor muito baixo ou irrisório.

O problema é que esse tabelamento, feito unilateralmente pela OAB, sempre foi tratado pela jurisprudência do STJ como um referencial que não precisa ser seguido pelo juiz.

Há precedentes da 1ª Seção e das 1ª, 2ª e 3ª Turmas do tribunal usando essa mesma lógica já sob a vigência do artigo 85, parágrafo 8º-A do CPC. Apenas a 4ª Turma vem consistentemente aplicando a norma, com base em precedente da 2ª Seção.

Flagrante desproporcionalidade

Um dos precedentes mais recentes é o do REsp 2.194.144, julgado pela 1ª Turma em agosto. Relator, o ministro Sérgio Kukina apontou que a previsão do artigo 85, parágrafo 8º-A do CPC serve apenas como referencial.

Ao adotar essa posição, ele se reportou ao acórdão da 1ª Seção na Rcl 45.947, de junho de 2024, em que fica claro que a tabela da OAB não vincula a análise do magistrado sobre honorários, sob pena de enriquecimento sem causa dele.

O processo tinha valor da causa R$ 424,6 mil, valor do tratamento home care pleiteado na ação originária. Acontece que, nessas causas relacionadas ao direito á saúde, a corte entende que é impossível mensurar o proveito econômico.

No caso concreto isso é ainda mais evidente porque o objetivo da reclamação foi compelir o Tribunal de Justiça de Santa Catarina a aplicar a posição que a 1ª Seção fixou no IAC 14, sobre competência do juízo estadual.

O ministro Gurgel de Faria então fixou honorários em R$ 2 mil. A parte recorreu para pedir a aplicação do artigo 85, parágrafo 8º-A. Com base na tabela da OAB-DF, a verba honorária subiria para R$ 17,9 mil. E se aplicado o mínimo de 10% sobre valor da causa, R$ 42,4 mil.

Para o relator, isso resultaria em flagrante desproporcionalidade, levando em conta a ínfima complexidade da causa, a curta tramitação do feito e o trabalho desenvolvido pelos advogados. Com isso, manteve a decisão e negou provimento ao recurso.

Já a 2ª Turma do STJ seguiu o mesmo caminho no REsp 2.182.939, julgado em março. “O disposto no parágrafo 8º-A do artigo 85 do CPC/2015 serve apenas como referencial, não vinculando o magistrado”, disse o relator, ministro Francisco Falcão.

Cizânia extensa

As turmas de Direito Privado estão mais dividas. A 3ª Turma tem precedentes, como o AREsp 2.506.581, confirmando uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que entendeu que, ao fixar honorários por equidade, o juiz deve observar a tabela da OAB, não adotá-la obrigatoriamente.

Para o ministro Humberto Martins, essa posição segue a mesma linha da jurisprudência do STJ. A votação foi unânime, em junho de 2024.

A 4ª Turma, por outro lado, tem julgados em sentido oposto. No REsp 2.122.434, sob relatoria do ministro João Otávio de Noronha, o colegiado deu provimento ao recurso da parte para refazer o cálculo da verba honorária e fixou tese não-vinculante:

A fixação equitativa dos honorários advocatícios deve observar os valores recomendados pela OAB ou o limite mínimo de 10% estabelecido no parágrafo 2º do artigo 85, conforme o artigo 85, parágrafo 8º-A, do CPC.

A 2ª Seção, que reúne os membros de ambos os colegiados, também se debruçou sobre a questão dos honorários por equidade no julgamento de uma reclamação. Na Rcl 47.536, a votação foi por adotar a tabela da OAB, conforme voto do ministro Antonio Carlos Ferreira.

Rcl 47.536
REsp 2.122.434
AREsp 2.506.581
REsp 2.182.939
REsp 2.194.144
Rcl 45.947

  • – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
    Fonte: Conjur

2 de outubro de 2025

 

Posse do imóvel era dividida entre os três filhos e o pai

Ordem de indisponibilidade não afronta a impenhorabilidade do bem e família, diz STJ (Unsplash)

Nas execuções civis, é cabível a ordem de indisponibilidade do bem de família, já que a medida não afronta a regra da impenhorabilidade prevista na Lei 8.009/1990.

A conclusão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento ao recurso especial de dois devedores de uma cooperativa de crédito.

A indisponibilidade é uma medida atípica que restringe o direito de o devedor dispor sobre seu patrimônio. Ele mantém o domínio e propriedade do bem, mas não pode vendê-lo. O instituto é uma forma de incentivar a quitação da dívida e não se confunde com a penhora.

O precedente é inédito nas turmas de Direito Privado do STJ. O tema já foi enfrentado nas turmas de Direito Público, onde já se admitiu indisponibilidade de bens de família em ações de improbidade administrativa, por exemplo.

Por outro lado, a posição mais recente é de que a medida é inócua para garantir futura ou atual execução, já que a penhora seria inviável justamente pela proteção dada pela lei ao bem de família.

Indisponibilidade do bem

Segundo o processo, o credor pediu e conseguiu a indisponibilidade de um imóvel dos devedores na fase de execução da dívida. O casal executado, por sua vez, alega que a medida seria inviável por se tratar de bem de família, que é impenhorável.

As instâncias ordinárias entenderam cabível a medida, efetuada por meio da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB) — um sistema eletrônico criado pelo Conselho Nacional de Justiça para centralizar esse tipo de medida. A 3ª Turma do STJ manteve essa conclusão.

Relatora do recurso, a ministra Nancy Andrighi entendeu que a indisponibilidade via CNIB poderá servir como medida coercitiva ao pagamento da dívida, inclusive por dar ciência a possíveis interessados na compra do imóvel em questão.

“Ou seja, na medida em que a ordem informa a terceiros sobre a dívida, coage os devedores a quitarem os valores, para liberar seus bens”, disse a magistrada, que foi acompanhada por unanimidade.REsp 2.175.073

  • correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
    Fonte: Consultor Jurídico
Caso o falecido não tenha compartilhado senhas com os herdeiros, a busca por informações patrimoniais e bens digitais em seus aparelhos eletrônicos poderá ser feita por meio de um incidente processual a ser instaurado paralelamente ao processo de inventário, com o apoio de profissional especializado – o inventariante digital.
01/10/2025

A decisão foi tomada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento de recurso relacionado ao inventário das vítimas de um acidente de helicóptero ocorrido em São Paulo, em 2016.

Como não há previsão legal sobre o acesso aos bens digitais deixados por uma pessoa falecida, o colegiado entendeu que o caminho mais adequado para tais situações, pelo menos até a aprovação de legislação específica, é a instauração de um incidente próprio, associado à aba do inventário – chamado pela relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, de “incidente de identificação, classificação e avaliação de bens digitais”.

Acesso ao conteúdo dos aparelhos será feito por profissional especializado

De acordo com a solução proposta, o incidente, apensado ao processo (associado à aba) de inventário, deverá ser conduzido pelo próprio juiz do inventário, e o acesso aos aparelhos eletrônicos será feito por intermédio de um profissional especializado, que identificará e classificará os ativos transmissíveis, preservando tudo o que possa violar os direitos de personalidade do autor da herança.

O caso chegou ao STJ depois que uma das inventariantes tentou conseguir acesso ao conteúdo dos aparelhos mediante ofício à Apple. No entanto, de acordo com a ministra Nancy Andrighi, autorizar a empresa a abrir um equipamento eletrônico de pessoa falecida poderia violar sua intimidade.

Solução está amparada em analogia com outros institutos jurídicos

A relatora afirmou que o direito sucessório deve assegurar que a impossibilidade de acesso aos bens digitais, devido à existência de senhas não compartilhadas com os herdeiros, não cause prejuízo à transmissão do patrimônio. Contudo, ela apontou que nem todos os bens digitais são transmissíveis: aqueles que possam violar direitos de personalidade, como a intimidade e a vida privada do falecido ou de terceiros, devem ser preservados.

Assim – prosseguiu a ministra –, o juiz deve equilibrar o direito dos herdeiros a receber todos os bens do falecido, em consonância com o artigo 5º, inciso XXX, da Constituição Federal, com a proteção dos direitos de personalidade, especialmente a intimidade do falecido e de terceiros.

“Diante de vácuo legislativo a respeito do acesso aos bens digitais de propriedade da pessoa falecida que não deixa senha nem administrador dos seus bens digitais, a proposta de que o acesso se dê mediante incidente processual não caracteriza ativismo judicial e está alicerçada em interpretação analógica com outros institutos processuais”, declarou Nancy Andrighi, ao determinar o retorno do processo ao primeiro grau para a instauração do mencionado incidente.

REsp 2.124.424

Fonte: STJ

Ao cassar acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que, quando um imóvel é qualificado como bem de família, mesmo estando incluído em ação de inventário, deve ser assegurada a sua impenhorabilidade.
29/09/2025

O TJRS havia considerado que o apartamento em discussão, por pertencer ao espólio, deveria primeiro ser colocado à disposição da quitação das obrigações deixadas pelo falecido, para só depois, se fosse o caso, ser transmitido aos herdeiros, os quais então poderiam alegar a impenhorabilidade do bem.

No imóvel em questão, residia uma das herdeiras, que cuidava dos pais. Após a morte dos dois, no curso de uma execução fiscal movida pela Fazenda do Rio Grande do Sul, o inventariante pediu que fosse reconhecido o direito real de habitação daquela filha e invocou a impenhorabilidade do imóvel, por se tratar de bem de família – o que foi negado pelas instâncias ordinárias.

Qualificação como bem de família deve ser feita primeiro

Em decisão monocrática, o relator no STJ, ministro Benedito Gonçalves, deu provimento ao recurso do espólio para cassar o acórdão do TJRS e determinar que a corte estadual rejulgue a questão relacionada à caracterização do imóvel como bem de família, para definir se ele é ou não impenhorável no processo de execução fiscal. A decisão do ministro foi confirmada pelo colegiado da Primeira Turma.

De acordo com Benedito Gonçalves, a jurisprudência do STJ considera que o imóvel qualificado como bem de família não está sujeito à penhora, situação que não se altera caso o bem esteja incluído em inventário. Na sua avaliação, o acórdão do tribunal estadual contrariou os precedentes do STJ, pois o órgão julgador compreendeu que eventual caracterização do imóvel como bem de família só poderia ocorrer após a finalização do processo de inventário, quando ele estivesse registrado no nome dos herdeiros.

Segundo o relator, o TJRS não apreciou as provas apresentadas pela parte sobre a alegada qualificação do imóvel como bem de família, o que deve ocorrer agora, no novo julgamento da questão.

 REsp 2.168.820.

Fonte: STJ

STJ decide que remuneração de jovem aprendiz integra base de cálculo da contribuição previdenciária, GIIL-RAT e contribuições a terceiros

 

Reprodução Freepik

 

Em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a tese de que “a remuneração decorrente do contrato de aprendizagem (artigo 428 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT) integra a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal, da Contribuição do Grau de Incidência de Incapacidade Laborativa decorrente dos Riscos Ambientais do Trabalho (GIIL-RAT) e das contribuições a terceiros”.

A relatora do Tema 1.342, ministra Maria Thereza de Assis Moura, explicou que a solução da controvérsia passava por definir se a contraprestação do trabalho do aprendiz pode ser qualificada como salário e remuneração, na forma da legislação de custeio da seguridade social.

A ministra observou que o artigo 195, I, da Constituição Federal apontava a folha de salários como fonte de custeio da seguridade social; contudo, a Emenda Constitucional 20/1998 excluiu os valores pagos no contexto de relações não empregatícias, seguindo orientação do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário 166.772.

O artigo 22, I e II, da Lei 8.212/1991 – acrescentou a relatora – passou a prever que a contribuição do empregador e o adicional para financiamento da aposentadoria especial incidem sobre as remunerações de empregados e de trabalhadores avulsos, “destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma”.

Jovem aprendiz é empregado e recebe remuneração

De acordo com Maria Thereza de Assis Moura, tanto a Secretaria Especial da Receita Federal quanto o artigo 428 da CLT consideram que o contrato de aprendizagem é um contrato de trabalho. Além disso, lembrou que o reconhecimento de direitos previdenciários ao adolescente é assegurado pelo artigo 65 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Na avaliação da relatora, não se sustenta o argumento de que o contrato de aprendizagem não gera uma relação de emprego, nem o de que o aprendiz é segurado facultativo, na forma do artigo 14 da Lei 8.212/1991 e de seu correspondente artigo 13 da Lei 8.213/1991. Esses dispositivos, alertou, apenas trazem uma idade mínima para a filiação como facultativo.

“Não é possível ver neles a indicação de que a pessoa com menos de 18 anos necessariamente é segurada facultativa. A forma de filiação de tal pessoa que tenha um contrato de trabalho será a de empregado. Portanto, esses dispositivos não impedem que a forma de filiação do aprendiz seja a de empregado – segurado obrigatório e, portanto, não facultativo”, disse.

Do mesmo modo, a relatora ressaltou que o parágrafo 4º do artigo 4º do Decreto-Lei 2.318/1986 exclui apenas os “menores assistidos” da base de cálculo de encargos previdenciários, os quais não se confundem com o aprendiz, que é empregado e recebe remunerações (salário e outras verbas).

Leia o acórdão no REsp 2.191.479.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a alteração dos critérios de cálculo dos adicionais de insalubridade e periculosidade dos servidores públicos, causando redução da remuneração quando persistem as mesmas condições de trabalho, viola o princípio da irredutibilidade de vencimentos.
26/09/2025

O colegiado deu provimento a um recurso do Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário de Rondônia para reformar a decisão que determinou o pagamento dos dois adicionais, a partir de 1º de agosto de 2021, com novo cálculo previsto em lei estadual de 2016, o qual provocou a redução dos valores.

O tribunal estadual manteve a alteração na forma do pagamento, entendendo que os adicionais – de natureza propter laborem – remuneram o servidor público em caráter precário e transitório, razão pela qual não se incorporam a seus vencimentos e podem ser reduzidos ou até suprimidos sem ofensa ao princípio da irredutibilidade.

Mudança nas condições de trabalho poderia justificar supressão da verba

O relator do recurso no STJ, ministro Gurgel de Faria, afirmou que, quando cessam as condições que justificam os adicionais – por exemplo, nos casos de aposentadoria ou de eliminação da insalubridade no trabalho –, a extinção do pagamento não é apenas uma prerrogativa da administração, mas uma imposição do princípio da legalidade, pois seria contraditório exigir o adicional quando não há mais a razão para pagá-lo.

“A extinção da causa determina, necessariamente, a extinção do efeito, sem que tal circunstância configure violação ao princípio da irredutibilidade de vencimentos, precisamente porque não há redução propriamente dita, mas, sim, adequação da remuneração à nova realidade fática do exercício funcional”, explicou.

Outra situação muito diferente é quando permanecem as condições e os riscos que justificam a verba propter laborem, mas o valor é reduzido devido a alteração legislativa na forma de cálculo.

“A jurisprudência do STJ não apresenta contradição alguma, e sim coerente diferenciação entre situações juridicamente distintas: quando há extinção da causa que justifica a percepção da verba propter laborem, sua supressão é legítima, porque desaparece o próprio fundamento para sua existência; todavia, quando persiste a causa, mas se reduz artificialmente o valor por meio de alteração dos critérios de cálculo, reduzindo a remuneração, configura-se violação indireta ao princípio da irredutibilidade de vencimentos” – concluiu, acrescentando que, em tal hipótese, é preciso haver compensação da diferença para preservar a integralidade remuneratória.

RMS 72.765.

Fonte: STJ

O protesto que gera transtornos para a população por bloquear vias da cidade causa ofensa intolerável aos interesses da sociedade, o que resulta no dever de indenizar por danos morais coletivos.

26 de setembro de 2025

Manifestação, manifestantes, protesto, educação

Protesto gera danos morais coletivos quando causa ofensa intolerável aos interesses da sociedade, segundo o STJ (Fernando Frazão/Agência Brasil)

 

Essa conclusão é da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento a um recurso especial da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e, com isso, manteve a condenação ao pagamento de R$ 1,2 milhão.

A indenização se refere aos transtornos causados pela CUT em Vitória no dia 30 de agosto de 2013, em protestos relacionados ao Dia Nacional de Mobilização, organizado pela central sindical em diversas cidades do país.

Na capital capixaba, os sindicalistas obstruíram importantes vias, uma delas totalmente paralisada pela queima de pneus. No STJ, a CUT sustentou que não há danos morais coletivos pelo exercício de um direito garantido pela Constituição.

Direito com regras

Relator do recurso, o ministro Marco Aurélio Bellizze observou que a Carta Magna brasileira exige a prévia comunicação de manifestações às autoridades, o que não foi feito pelos sindicalistas, “talvez até de maneira deliberada, a fim de conseguir maiores holofotes”.

O magistrado destacou que em momento algum a CUT ponderou as consequências de sua conduta e os problemas que seriam causados aos cidadãos. E afirmou que as reivindicações dos trabalhadores são tão relevantes quanto o direito de ir e vir da população.

“O que se tem verificado de modo corriqueiro na realidade brasileira é a ocorrência de manifestações em vias de grande movimento e que, não obstante sejam a expressão coletiva da liberdade de manifestação do pensamento por meio do direito de reunião, têm causado grandes transtornos para os cidadãos nas principais cidades do país, caracterizando diversos problemas de colisão com o direito da liberdade de circulação.”

Bellizze citou a jurisprudência do STJ segundo a qual a constatação dos danos morais coletivos se dá presumidamente (in re ipsa), sem depender da comprovação de dor, sofrimento ou abalo psicológico. Ele acrescentou que sua configuração só ocorre quando a conduta antijurídica afeta, intoleravelmente, os valores e interesses coletivos fundamentais, como foi o caso do protesto de 2013 em Vitória.


REsp 2.026.929

  • – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
    Fonte: Conjur