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O Supremo Tribunal Federal pode retomar neste ano a análise de um processo que se arrasta na corte há um quarto de século e que pode afetar indiretamente as relações entre empregados e empregadores. 

17 de janeiro de 2023
STF pode analisar em 2023 ADI sobre decreto de Fernando Henrique Cardoso
Fellipe Sampaio/STF

Trata-se da ADI 1.625, que questiona um decreto assinado em dezembro de 1996 pelo então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, suspendendo a adesão do Brasil à Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que limita as demissões sem justa causa. 

Ou seja, diferentemente do que começou a ser dito no último mês, o Supremo não vai decidir se é ou não possível demitir sem justa causa. O que a corte decidirá é se o presidente da República pode cancelar, sem a anuência do Congresso Nacional, a adesão do país a uma convenção internacional. 

Além disso, segundo ministros do Supremo e especialistas em Direito Trabalhista consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico, mesmo que o tribunal derrube o decreto de FHC, não haverá nenhum efeito prático imediato sobre as demissões sem justa causa. 

Isso porque a convenção precisaria ainda ser regulamentada por meio de uma lei complementar, o que exigiria maioria absoluta nas duas casas do Congresso (41 dos 81 senadores e 257 dos 513 deputados federais). 

‘Alarde’
Ricardo Calcini, professor de Direito do Trabalho na FMU, diz que não passa de “alarde” dizer que o Supremo vai barrar as dispensas sem justa causa. “O principal ponto discutido hoje, muito embora já há 25 anos, é a questão da denúncia do decreto presidencial. Ou seja, se é ilegal ou não esse tipo de ato praticado exclusivamente pelo presidente.” 

Ele diz que, mesmo com eventual decisão do Supremo contra o decreto de FHC, e aprovação pelo Congresso da lei complementar, dificilmente haveria entraves às demissões sem justa causa, já que as empresas poderiam continuar alegando motivações de ordem técnica, financeira e contábil, por exemplo, para demitir empregados, bastando para isso o pagamento da multa de 40% do FGTS.

O advogado Carlos Eduardo Ambiel, doutor em Direito pela USP e professor de Direito do Trabalho da Faap, afirma que a convenção sequer proíbe dispensas sem justa causa, prevendo demissões por questões econômicas, tecnológicas e estruturais. Ou seja, que não envolvem necessariamente a atuação do empregado. 

Além disso, explica o especialista, a convenção só recomenda mecanismos para “minimizar” os efeitos das demissões, o que também é previsto na CLT quanto às dispensas coletivas. 

“Ademais, o texto da Convenção 158 da OIT sempre se reporta à necessidade de suas disposições estarem em conformidade e de serem implementadas através da legislação local. No caso do Brasil, já há previsão para quase tudo o que está na Convenção 158, como seguro-desemprego, indenização pela dispensa, aviso prévio e direito a questionar a dispensa motivada em tribunal”, comenta Ambiel. 

De acordo com o professor, a única previsão que está na convenção e o Brasil ainda não utiliza é a que preceitua o direito à defesa prévia do empregado dispensado por sua “conduta ou desempenho”. 

“Não parece que teremos qualquer mudança significativa daquilo que já existe atualmente, vez que nossa legislação já é extremamente protecionista e, em algumas disposições, até supera as sugestões da Convenção 158 da OIT”, conclui Ambiel. 

Decisão em 2023?
Outro ponto que, na visão dos especialistas, não corresponde à verdade é a certeza de que o Supremo decidirá o caso já em 2023. A discussão sobre a retomada do julgamento começou depois que a corte aprovou alterações em seu regimento interno para limitar a 90 dias corridos o prazo para a devolução de novos pedidos de vista, e a 90 dias úteis a devolução de pedidos de vista feitos antes da alteração regimental.

Com isso, o ministro Gilmar Mendes, responsável pelo último pedido de vista no caso, terá de devolver a ADI para análise colegiada em até 90 dias úteis (cerca de cinco meses) a partir da publicação da resolução, que sequer entrou em vigência ainda.

O processo, no entanto, só volta a ser analisado quando colocado em pauta. Para isso não há um prazo fixo definido. Há ainda a possibilidade de novos pedidos de vista ou de destaque, o que, no último caso, faria a discussão recomeçar do zero, com data incerta para nova inclusão em pauta e julgamento. 

ADI 1.625
A ação foi ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), em 1997. O último andamento do processo no Plenário Virtual ocorreu em 3 de novembro do ano passado, quando o ministro Gilmar Mendes pediu vista. 

Há oito votos no caso e três entendimentos diferentes. Joaquim Barbosa, que já se aposentou, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski entenderam que o presidente da República não pode, sozinho, revogar o decreto sem a aprovação do Congresso. Assim, tirar o país da convenção da OIT seria inconstitucional. 

Maurício Corrêa e Ayres Britto, também aposentados, disseram que o decreto de FHC precisa ainda passar pelo Congresso antes que o Brasil deixe a convenção da OIT.

Para Dias Toffoli, Nelson Jobim (aposentado) e Teori Zavascki (morto em acidente aéreo em 2017), o decreto continua válido. Toffoli e Zavascki, no entanto, sustentaram que será preciso que o Congresso aprove decretos semelhantes em todos os outros casos futuros, a contar da definição do tema pelo Supremo. 

Faltam os votos de Gilmar Mendes, Nunes Marques e André Mendonça. 

Além da ADI, o Supremo discutirá o tema na ADC 39, ajuizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e pela Confederação Nacional do Transporte (CNT). 

As entidades pedem que o tribunal declare constitucional o decreto de FHC. Nesse caso, há quatro votos, sendo três deles pela inconstitucionalidade do decreto.

ADI 1.625
ADC 39

*PorTiago Angelo – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 16 de janeiro de 2023, 18h23

27/12/2022


Por unanimidade de votos, o Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a validade de normas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que exigem o pagamento das anuidades para que os advogados possam participar das eleições internas da entidade. No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7020, o Plenário também reiterou que a norma que caracteriza o não pagamento de anuidades, multas e serviços como infração disciplinar e motivo de suspensão profissional do advogado é inconstitucional.

A ação foi ajuizada pelo Partido Republicano da Ordem Social (Pros) contra dispositivos do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994), do Regulamento do Estatuto e de atos normativos dos Conselhos Seccionais da OAB que preveem a suspensão e a exigência do adimplemento da anuidade para participar das eleições.

Eleições internas

Para o relator, ministro Edson Fachin, a exigência de quitação da anuidade apenas visa reger as eleições para direção da entidade de classe, de modo a que participem do processo eleitoral as pessoas que efetivamente estejam ativas no quadro de integrantes, associados ou filiados e cumprem as normas internas. “Candidata-se e vota aquele que possui interesse e atende aos critérios exigidos”, afirmou. “Por isso, o estatuto determina expressamente que os candidatos comprovem situação regular perante a OAB”, afirmou.

Embaraço à atividade profissional
Com relação à suspensão do exercício profissional, Fachin lembrou que, em 2020, o STF firmou entendimento de que a aplicação da medida em decorrência da falta de pagamento das anuidades configura sanção política em matéria tributária (Tema 732 de repercussão geral). Para a Corte, essa interdição profissional é um meio indireto de coerção para o pagamento do tributo, violando os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e do devido processo legal.

Ainda de acordo com o relator, o STF vem reafirmando a inconstitucionalidade de normas que estabeleçam embaraços ao exercício de atividades profissionais ou econômicas, a fim de induzir o contribuinte ao pagamento de dívidas tributárias. A resolução de conflitos sobre esse tema originou a edição das Súmulas 70, 323 e 547 da Corte.

A ADI 7020 foi julgada na sessão virtual finalizada em 16/12.

FONTE: STF

Pensões por morte de cargos civil e militar podem ser acumuladas, diz Supremo

20 de dezembro de 2022,

O Supremo Tribunal Federal decidiu, de forma unânime, que é possível acumular dois benefícios de pensão por morte decorrentes de um cargo de médico militar e outro de médico civil.

A viúva de um médico, que ocupou dois cargos, recebia duas pensões

O caso foi julgado em sessão virtual encerrada na última sexta-feira (16/12) e tem repercussão geral — ou seja, deve ser aplicado em todas as futuras decisões no país.

No processo, a viúva de um médico, que ocupou um cargo no Ministério do Exército e outro no Ministério da Saúde, recebia duas pensões. Após oito anos, o Tribunal de Contas da União proibiu a acumulação e exigiu que ela optasse por um dos dois benefícios. 

No entanto, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região entendeu que a acumulação dos cargos de médico militar e civil e, por conseguinte, das duas aposentadorias, se deu “em total conformidade com o texto constitucional”, não havendo, portanto, impedimento à acumulação de pensões. 

No recurso extraordinário, a União contestou este fundamento, alegando que o artigo 11 da Emenda Constitucional 20/1998 veda a acumulação.

Em dose dupla
No voto, o ministro Dias Toffoli, relator, considerou que é possível acumular aposentadorias e pensões em cargos constitucionalmente acumuláveis, afastando a aplicação do artigo 11 da Emenda Constitucional 20/1998.

Toffoli pontuou que não há vedação para a acumulação de pensões por morte de um mesmo instituidor, no âmbito do mesmo regime de previdência social, quando decorrentes do exercício de cargos acumuláveis na forma do artigo 37 da Constituição. 

Portanto, “não há respaldo legal para impedir o recebimento acumulado das duas pensões por morte por parte do cônjuge sobrevivente, porquanto incabível falar em incidência do artigo 11 da EC 20/98, por se tratar de cargos acumuláveis”, destacou.

Na análise do ministro, as disposições constantes no artigo 11 da EC 20/1998 se destinam a regular as situações que estariam em desacordo com o novo regramento sobre acumulação de proventos e remuneração inaugurado pela referida norma, visto que é aplicável aos casos não respaldados pelo artigo 37 da Constituição. 

“Ainda que se aponte tratar de pensões de dois cargos de médico, um civil e outro militar, tal acumulação encontra respaldo no artigo 29, inciso II, da Lei 3.765/1960, que autoriza a acumulação de uma pensão militar com a de outro regime, sem exigir, no ponto, que sejam acumuláveis os cargos públicos envolvidos”, completou.

O relator pontuou ainda que a jurisprudência da Corte é firme no sentido da possibilidade de acumulação de duas aposentadorias decorrentes de cargos acumuláveis com pensão militar por morte.

O entendimento foi seguido pelos ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Roberto Barroso, Rosa Weber, Nunes Marques, Gilmar Mendes e André Mendonça.

RE 658.999

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 20 de dezembro de 2022, 18h43

O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal homologou na quarta-feira (15/12), por unanimidade, o acordo firmado entre estados, Distrito Federal e União sobre o ICMS de combustíveis. 

15 de dezembro de 2022
Ministro Gilmar Mendes criou comissão especial para buscar saída conciliatória
Fellipe Sampaio/SCO/STF

Com a decisão, o Supremo coloca fim ao impasse criado pela edição das Leis Complementares 192/2022 e 194/2022, de março e junho deste ano, respectivamente. As normas reduziram o ICMS dos combustíveis em meio às altas de preços registradas ao longo deste ano, provocando significativa queda de arrecadação tributária nos estados. 

O ministro Gilmar Mendes, relator de duas ações sobre o tema, criou em julho uma comissão especial para buscar uma saída conciliatória. Na última reunião, feita no dia 2 deste mês, os estados elaboraram a proposta que foi aceita pela União.

Entre os diversos pontos costurados na reunião final, no STF, alguns são considerados uma conquista em termos de acordo federativo em prol do cidadão/contribuinte: estados não cobrarão os contribuintes da diferença entre a trava da base de cálculo (na substituição tributária); reconhecimento da União de que os estados e o Distrito Federal é quem irão escolher se adotam alíquota ad rem (por unidade de produto) ou ad valorem (por valor, como é hoje); os estados aceitam manter a alíquota modal (menor alíquota vigente no seu território) para gás natural, gás de cozinha e diesel.

Confira a íntegra dos pontos acordados:

1) Quanto ao art. 3º, V, “a”, “b” e “c”, da Lei Complementar nº 192/2022: devolução da competência dos estados e o Distrito Federal escolherem a alíquota ad rem ou ad valorem, por meio do Confaz, “como o órgão legitimado para implementar a monofasia e a uniformidade da alíquota do ICMS dos combustíveis indicados pelo Congresso Nacional no art. 2º da Lei Complementar 192/22”; 

2) Acordaram pela necessidade de se revogar as disposições da Lei Complementar nº 192/2022 que preveem um intervalo mínimo de 12 meses entre a primeira fixação e o primeiro reajuste dessas alíquotas, e de seis meses nos reajustes subsequentes, além da trava de que deveriam observar “as estimativas de evolução do preço dos combustíveis de modo que não haja ampliação do peso proporcional do tributo na formação do preço final ao consumidor”; 

3) Os encaminhamentos descritos nos itens 1 e 2 acima ocorrerá por meio de projeto de lei Complementar (PLP), para fins de revogação do art. 18-A da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), bem como da alínea “b”, do inciso V do art. 3° e os §§ 4° e 5° do art. 6°, todos da Lei Complementar n° 192/2022 e do inciso III do §1º do art. 32-A da Lei Kandir, com redação dada pelo art. 2º da Lei Complementar 194/2022;

 4) Até 31 de dezembro de 2022, os Estados e o Distrito Federal celebrarão convênio para adoção do ICMS uniforme e monofásico para os combustíveis previstos no item 1 acima, com exceção da gasolina (que deverá ser objeto de acordo posterior quanto às medidas substitutivas do debate acerca da essencialidade); 

5) Os Estados e o Distrito Federal, por meio do Confaz, reconhecerão, de imediato, a essencialidade dos seguintes combustíveis: diesel, GLP e gás natural;

6) Os Estados e o Distrito Federal renunciaram expressamente a qualquer possibilidade de cobrança das diferenças não pagas pelos contribuintes, em decorrência do arbitramento da base de cálculo dos combustíveis (art. 7º da Lei Complementar 192/2022), pela média dos últimos 60 meses, e, na mesma medida, resta-lhes assegurada que não poderão ser instados a restituir eventuais valores cobrados a maior também pelo desdobramento do art. 7º, desde o período de início de efeitos da medida legal até 31 de dezembro de 2022., registrando-se, neste ponto do acordo, que tal consensualidade não representa o reconhecimento acerca da constitucionalidade do art. 7° da Lei Complementar n° 192/2022 pelos representantes dos Estados na Comissão Especial; 

7) No que se refere ao debate da incidência tributária sobre as tarifas Tust/Tusd, nos termos do inciso X do art. 3º da LC 87/1996, houve a necessidade de desdobramento da conciliação/mediação para identificar os eventuais itens correlacionados às tarifas de energia elétrica, que compõem os serviços de transmissão, distribuição e encargos, que serão debatidos em grupo de trabalho (negociação como técnica autocompositiva) entre os próprios entes federativos, para fins de discussão do tema previsto no caput, com prazo de até 120 dias, a contar da presente data; 

8) Para tanto, como medida de boa-fé dos representantes da União, convencionou-se a inexistência de qualquer óbice à concessão de medida cautelar nos autos da ADI 7195, enquanto o tema estiver em discussão no âmbito do grupo de trabalho previsto no tópico anterior (7); 

9) Quanto à compensação estabelecida no art. 3º da Lei Complementar, criou-se grupo de trabalho específico (negociação), com representantes da União e dos Estados para, no prazo de até 120 dias, a contar da presente data, revisar os critérios de apuração da perda de arrecadação do ICMS; 

10) Serão revistos os critérios estabelecidos na Portaria ME nº 7.889/22 para alterar a base de comparação anual da perda para base mensal, de modo que o gatilho de 5%, previsto no art. 3º da Lei Complementar 194/2022, seja aplicado somente na comparação isolada entre os meses de 2021 e 2022; 

11) Pontou-se que “Em nenhuma hipótese, eventual acordo restringirá as repartições constitucionais destinadas aos municípios”; 

12) Reconhecimento da possibilidade que a União compense eventual perda de arrecadação, mediante entrega de valores aos Estados, caso o Plenário do STF, em apreciação de eventual acordo do grupo de trabalho tratado no caput, reconheça a presença dos requisitos necessários para a abertura de crédito extraordinário, de modo que as quantias necessárias ao pagamento sejam incluídas em lei orçamentária e submetidas ao regime fiscal aplicável, sem prejuízo de eventual compensação de dívida já deferida liminarmente; 

13) Como medida antecipatória, no caso de eventual derrubada do veto presidencial ao art. 14 do PLP 18/2022 (veto 36/22 em relação à LC 194/2022), acordou-se que a expressão “disponibilidades financeiras” prevista naquele texto, deve ser entendida como aquelas verificadas no exercício anterior ao da publicação da referida Lei Complementar, tendo em vista a necessidade de tornar exequível a compensação dos demais entes para os mínimos constitucionais da saúde e da educação. Em decorrência dos grandes temas federativos que foram pactuados, sempre na presença de representantes da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, da Procuradoria-Geral da República e do Tribunal de Contas da União, registre-se que o acordo regeu-se nos limites das disponibilidades autorizativas dos membros indicados pelos Entes Federativos, demandando inúmeras reuniões na Comissão Especial designada pelo Ministro Gilmar Mendes, contando também com a observação de representantes dos Municípios e de várias entidades admitidas como amici curiae (amigos da Corte), além da participação especial de vários especialistas que foram ouvidos na condição de experts. Cumpre destacar que, a pedido dos próprios Entes Federativos, foram contempladas no acordo todas as ações em curso no Supremo Tribunal Federal, devendo aqueles peticionarem diretamente aos próprios relatores, solicitando o cumprimento do acordado nesta oportunidade.


ADPF 984 e ADI 7.191

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 15 de dezembro de 2022, 17h13

Só não compõem base do ISS materiais de construção que se sujeitem ao ICMS

5 de dezembro de 2022

Só podem ser excluídos da base de cálculo do Imposto Sobre Serviço (ISS) os valores de materiais de construção civil que, por serem produzidos pelo prestador fora do local da prestação do serviço, estejam sujeitos à cobrança do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Base de cálculo do ISS só não contém os materiais que não foram produzidos no local da obra, e sobre os quais incidiu ICMS

Essa é a conclusão a ser extraída de um julgamento do Supremo Tribunal Federal que pode ter alcançado um ponto final após mais de uma década. No sábado (3/12), a corte rejeitou embargos de declaração pela segunda vez, em recurso extraordinário sobre o tema.

No Supremo, a discussão tratou da constitucionalidade do artigo 9º, parágrafo 2º, alínea “a”, do Decreto-Lei nº 406/1968. Trata-se da norma que estabelece a base de cálculo sobre a prestação de determinados serviços, entre os quais se encontram os da construção civil (itens 19 e 20 da lista anexa à lei).

A jurisprudência do STF já tratava esse trecho da lei como recepcionado pela Constituição Federal de 1988 — portanto, constitucional. O julgamento encerrado no sábado com a rejeição dos embargos de declaração manteve essa conclusão.

Assim, a regra para a definição da base de cálculo do ISS é: o preço do serviço deduzido das parcelas correspondentes ao valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços.

Os itens 19 e 20 da lista anexa, que elencam serviços da construção civil, trazem uma ressalva fundamental: eles excluem da base do ISS o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços fora do local da execução do trabalho, que ficam sujeitas ao ICM (denominação anterior do ICMS).

Faltou decidir o alcance do termo “mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços”. Essa missão, que não tem ligação com a Constituição, ficou a cargo do Superior Tribunal de Justiça.

O que pode ser deduzido?
Há duas interpretações possíveis. Uma delas é mais favorável ao contribuinte: o ISS não alcança o valor relativo a mercadoria alguma, quer fosse produzida no local da prestação do serviço (pela determinação do artigo 9º, parágrafo 2º, alínea “a”, do Decreto-Lei nº 406/1968), quer fora dele (pela ressalva do item da lista).

A outra é mais restritiva: a dedução do ISS só se aplica às mercadorias produzidas pelo prestador fora do local da prestação de serviços que se sujeitavam ao antigo ICM (atual ICMS). Essa foi a posição adotada pelo STJ em diversos precedentes, inclusive no caso julgado pelo STF.

De acordo com o Supremo, essa interpretação não fere a Constituição. Foi o que decidiu o Plenário em junho de 2020, conforme publicou a revista eletrônica Consultor Jurídico, entendimento confirmado agora com a rejeição dos embargos de declaração.

O caso concreto que gerou o recurso trata de ação ajuizada por uma empresa com o objetivo de extinguir uma execução fiscal provocada pelo município de Betim (MG). O objetivo era excluir da base do ISS valores dos materiais fornecidos em serviços de concretagem prestados em obras de construção civil — o que não é possível.

Fim de papo
O processo chegou ao STF em 2010, com o reconhecimento da repercussão geral. Em agosto daquele ano, a relatora, a então ministra Ellen Gracie, deu provimento ao recurso para restabelecer a sentença de primeiro grau que permitiu à empresa deduzir da base de cálculo os valores dos materiais usados para concretagem.

Essa decisão monocrática valeu por uma década, até ser derrubada no julgamento do STF em 2020. Segundo o advogado Ricardo Almeida Ribeiro da Silva, que atuou em favor do município de Betim, esse cenário levou à expectativa errônea de que todo e qualquer gasto com materiais de construção poderia ser excluído da base de cálculo do ISS.

Em sua avaliação, o momento é de o STJ reforçar a jurisprudência firmada antes de 2010. Já em 2020, ele afirmou que o impacto econômico, tanto para as empresas como para os municípios, seria pequeno, já que as leis municipais em geral definem alíquotas mínimas de ISS para incentivar o setor.

RE 603.497

*Por Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 5 de dezembro de 2022, 13h51

05/12/2022

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a ratificação, pela União, dos registros imobiliários de terras públicas situadas em faixas de fronteira, decorrentes de alienações e concessões feitas pelos estados a particulares, deve respeitar a política agrícola e o plano nacional de reforma agrária. Ainda de acordo com a decisão, a ratificação não se sobrepõe aos direitos originários dos indígenas sobre as áreas que tradicionalmente ocupam, e os atos jurídicos de disposição de imóveis que tenham por objeto o domínio e a posse dessas terras são nulos.

A decisão, unânime, foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5623, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), na sessão virtual encerrada em 25/11. O objeto da ação era a Lei 13.178/2015, que trata da ratificação dos registros imobiliários decorrentes de alienações e concessões de terras públicas situadas nas faixas de fronteira.

Função social
Na ação, a Contag argumentava que a norma teria impacto irreversível na estrutura fundiária de uma parcela significativa do território nacional, por permitir a transferência, para a propriedade privada, de patrimônio público com área superior à de vários países europeus. Segundo a confederação, a propriedade deve cumprir sua função social, que compreende as obrigações de proteção ao meio ambiente e de obediência às normas trabalhistas.

Faixa de fronteira
Em seu voto, a ministra Cármen Lúcia explicou que as terras devolutas situadas em faixa de fronteira são bens da União, por serem consideradas indispensáveis à defesa nacional. Por isso, não podem ser transferidas a particulares por ato estadual. De acordo com a relatora, o registro público imobiliário é um instrumento fundamental para a segurança jurídica, e a indefinição da propriedade rural é um obstáculo ao desenvolvimento e prejudica o cumprimento das funções sociais da terra.

Origem pública
Diante do complexo sistema fundiário brasileiro, Cármen Lúcia ressaltou que a validação do registro imobiliário prevista na lei não se confunde com a doação de terras públicas ou com a desapropriação para fins de reforma agrária. Entretanto, pela sua origem pública, a destinação dos imóveis deve se compatibilizar com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária, conforme disposto no artigo 188 da Constituição da República. A finalidade é impedir que a ratificação de título se converta em “automática transferência de bens imóveis da União”.

A relatora acrescentou que, conforme o princípio da função social da propriedade, é dever do proprietário rural observar o conjunto de normas sobre aproveitamento racional e adequado da terra, utilização adequada dos recursos naturais e o direito ao trabalho.

Decisão
Ao acolherem por unanimidade o voto da relatora, a Corte julgou parcialmente procedente a ADI para atribuir interpretação conforme a Constituição aos artigos 1º, 2º e 3º da Lei 13.178/2015.

Processo relacionado: ADI 5623

Fonte: STF

O Supremo Tribunal Federal formou maioria nesta segunda-feira (21/11) em um dos julgamentos que estão ocorrendo em Plenário Virtual para definir se a mudança de jurisprudência da Corte em temas tributários gera a quebra automática do trânsito em julgado de casos anteriores decididos em sentido contrário.

21 de novembro de 2022

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Decisão do Supremo terá influência sobre todos os processos tributários do país

O caso que já tem maioria (RE 949.297), de relatoria do ministro Luiz Edson Fachin, aborda o que acontece com a decisão tributária transitada em julgado quando o STF declarar que um tributo originalmente considerado ilegal é, na verdade, constitucional — em decisão com efeito erga omnes, que vale para todos, e, portanto, no controle concentrado de constitucionalidade.

Até agora, sete ministros foram a favor de admitir a quebra do trânsito em julgado da decisão nessas hipóteses: o próprio relator, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Dias Toffoli.

Na prática, isso significa que não é mais preciso entrar com uma ação rescisória para que o novo entendimento do STF sobre a aplicabilidade do tributo seja implantada.

Em conjunto está sendo julgado um outro recurso (RE 955.227), de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, que discute o que acontece com a decisão tributária definitiva quando o STF, em um novo acórdão, se pronuncia em sentido contrário — em decisões individuais, que não dizem respeito a mais ninguém além das partes; ou seja, no âmbito do controle difuso de constitucionalidade. Neste julgamento, ainda há apenas cinco votos depositados.

Como mostrou a ConJur, os julgamentos são muito aguardados devido aos amplos impactos na segurança jurídica e na forma de atuação do Fisco perante os contribuintes. Advogados ouvidos pelo Valor Econômico apontam que a decisão vai afetar pelo menos quatro teses fundamentais, com enorme impacto para o contribuinte: as relativas à cobrança de CSLL, de IPI, contribuição patronal sobre terço de férias e Cofins de sociedades uniprofissionais.

Segundo o tributarista Hugo de Brito Machado Segundo, em coluna publicada na ConJur, o RE que já tem maioria era, dos dois, aquele sobre o qual havia menos discordância. Entende-se, “de modo razoavelmente pacífico”, que, quando a decisão tem efeito erga omnes, alcançando pessoas além das partes do processo (em ADI, ADC ou RE com repercussão geral), uma mudança de entendimento equivale a mudança na legislação. Assim, os efeitos da decisão transitada em julgada devem ser interrompidos de imediato, tão logo a nova decisão passe a valer.

“Tem-se hipótese análoga à da sentença que afirma indevido um tributo, por falta de amparo legal, e em seguida o Poder Público edita uma lei conferindo esse amparo. A partir da lei, o tributo se faz devido, e, a sentença deixa de afastar sua cobrança, porque desaparece seu fundamento (a falta de lei)”, explica.

Caso a caso
O problema, para Machado Segundo, é em relação às decisões sem efeitos vinculantes. Nesses casos, estudiosos e tributaristas concordam que o Supremo deveria prestigiar a coisa julgada e não admitir sua quebra sem interposição de ação revisional. Apesar disso, os cinco ministros que já votaram foram a favor da quebra automática nesses casos também.

Segundo o voto do ministro Barroso, relator, a manutenção da coisa julgada em matéria tributária após o posicionamento do STF em sentido contrário cria uma situação desigual: algumas empresas não precisarão recolher a CSLL, ganhando vantagem competitiva e financeira em relação às demais, o que as permitirá baratear os custos de sua estrutura e produção.

“A coisa julgada não pode servir como salvo conduto inalterável a fim de ser oponível eternamente pelo jurisdicionado somente porque lhe é favorável”, afirmou.

“Alterado o contexto fático e jurídico, com o pronunciamento desta Corte em repercussão geral ou em controle concentrado, os efeitos das sentenças transitadas em julgado em relações de trato sucessivo devem a ele se adaptar”, disse.

Fellipe Sampaio/SCO/STF
Gilmar Mendes mudou entendimento após pedido de vista e passou a acompanhar os relatores com ressalvas

As novidades
O julgamento dos dois recursos foi retomado na sexta-feira (18/11) com voto-vista do ministro Gilmar Mendes, que a princípio tinha se posicionado contra a quebra da coisa julgada tributária, mas mudou de entendimento.

Agora, o ministro Gilmar Mendes apresentou uma divergência parcial, baseada na proposta de modulação dos efeitos da tese a ser aprovada pelo STF.

Tanto o ministro Barroso quanto o ministro Fachin ressaltaram que, quando o Supremo declara a constitucionalidade de uma lei que cria um tributo, produz para o contribuinte uma norma jurídica nova.

E para isso, o ordenamento prevê algumas regras: a cobrança não pode retroagir para período em que o tributo não existia, e é preciso dar um tempo de transição, para que o contribuinte não seja pego de surpresa.

Assim, a proposta é que a tese só valha a partir da publicação da ata de julgamento e leve em conta o período de anterioridade nonagesimal, para os casos de contribuições sociais, e de anterioridade anual e noventena, para as demais espécies tributárias.

O ministro Gilmar Mendes divergiu especificamente nesse último ponto. Ele entendeu ser desnecessária a aplicação dos princípios da anterioridade anual e da noventena.

Teses
No RE 949.297, a tese proposta pelo ministro Luiz Edson Fachin foi:

  • A eficácia temporal de coisa julgada material derivada de relação tributária de trato continuado possui condição resolutiva que se implementa com a publicação de ata de ulterior julgamento realizado em sede de controle abstrato e concentrado de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, quando os comandos decisionais sejam opostos, observadas as regras constitucionais da irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, de acordo com a espécie tributária em questão

No RE 955.227, o ministro Luís Roberto Barroso propôs duas teses:

  1. As decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo.
  • Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das sentenças transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo.

Entenda o caso
Os dois REs tratam da cobrança da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), tributo instituído pela Lei 7.689/1988 e cuja incidência foi inicialmente afastada por decisões judiciais sob o fundamento de que só poderia ser criado e por meio de lei complementar.

A partir de 1992, o STF passou a proferir decisões individuais declarando a constitucionalidade da CSLL. Mas foi apenas a partir de 2007, após a instauração da sistemática da repercussão geral, que o Supremo julgou o tema com eficácia erga omnes (para todos), na ADI 15, confirmando essa posição.

A União passou a entender que todos deveriam pagar a contribuição, inclusive aqueles que já tinham decisão transitada em julgado afastando a incidência do tributo. Já os contribuintes defenderam a prevalência da coisa julgada.

Clique aqui para ler o voto de Fachin
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RE 949.297 (controle concentrado)

Clique aqui para ler o voto de Barroso
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RE 955.227 (controle difuso)

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 21 de novembro de 2022

Ministro Dias Toffoli pediu vista e paralisou andamento do processo

21/11/2022
Fachada do edifício sede do Supremo Tribunal Federal – STF

Um dia após o início do julgamento, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a análise da ação que questiona a prisão especial por quem tem curso superior. O ministro Dias Toffoli pediu vista ontem (19) e paralisou o andamento do processo.

O julgamento tinha começado na última sexta-feira (18) no plenário virtual do STF. O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, e a ministra Cármen Lúcia tinham votado para derrubar o direito de prisão especial, com cela solitária, para portadores de diploma de curso superior.

Em 2015, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) contra a prisão especial para quem tem curso superior. Segundo ele, o grau de escolaridade não tem relação lógica com a distinção na forma de prisão nem com as finalidades buscadas pela Constituição.

No relatório, Moraes escreveu que o benefício é inconstitucional e fere o princípio da isonomia. Segundo o ministro, a prisão especial transmite a “inaceitável mensagem” de que pessoas sem nível superior “não se tornaram pessoas dignas de tratamento especial por parte do Estado, no caso, de uma prisão especial” e contrapõe-se aos objetivos da Constituição de construir uma sociedade justa e de reduzir as desigualdades sociais.

O STF não tem prazo para retomar o julgamento. Uma nova data dependerá de quando Toffoli devolverá o pedido de vista e apresentará seu voto.

* Por Wellton Máximo – Repórter da Agência Brasil – Brasília

Fonte: Agência Brasil

Em sessão virtual, o Plenário do Supremo Tribunal Federal manteve a decisão do ministro Alexandre de Moraes de bloquear as contas do Partido da Causa Operária (PCO) nas plataformas Twitter, Instagram, Facebook, Youtube, Tik Tok e Telegram.

16 de novembro de 2022

O colegiado do STF negou provimento
ao recurso das plataformas de redes sociais
Reprodução

O bloqueio das contas do PCO foi determinado em junho deste ano, em razão de postagens em que o partido pediu a dissolução do Supremo e atribuiu a seus ministros a prática de atos ilícitos.

Nos agravos julgados pelo Plenário, as plataformas alegaram, entre outros pontos, que a medida representava censura e era desproporcional. Elas pediram que fossem indicadas postagens específicas incompatíveis com a Constituição, para que fossem removidas.

Em voto pelo desprovimento dos recursos, Alexandre sustentou que não foram apresentados elementos minimamente suficientes para mudar a determinação. Ele lembrou que o bloqueio levou em consideração a gravidade das publicações divulgadas, que atingem a honorabilidade e a segurança do STF e de seus ministros, e também do Tribunal Superior Eleitoral.

A decisão mantida pelo colegiado aponta indícios relevantes da utilização de dinheiro público pelo presidente do PCO para fins ilícitos, com a disseminação em massa de ataques reiterados às instituições democráticas e ao próprio Estado democrático de Direito, em desrespeito aos parâmetros constitucionais que protegem a liberdade de expressão.

O voto do relator foi acompanhado pelos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin e pelas ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber, presidente da corte.

Votos vencidos
Ficaram vencidos os ministros Nunes Marques e André Mendonça, que votaram pelo provimento dos recursos. Para Nunes Marques, a decisão contraria a garantia da liberdade de expressão e configura censura prévia. No mesmo sentido, Mendonça considerou a medida desproporcional. A seu ver, devem ser apontados conteúdos específicos, caso a caso, por ordem judicial fundamentada, para remoção das plataformas. 

PET 10.391

Com informações da assessoria de imprensa do STF.

O Supremo Tribunal Federal manteve decisão do Tribunal de Contas da União que havia decretado a indisponibilidade, por um ano, de R$ 653 milhões em bens e ativos da PPI (Projeto de Plantas Industriais Ltda.), sociedade brasileira pertencente ao grupo japonês Toyo Engineering. Também foi confirmada a desconsideração da personalidade jurídica da empresa.

19 de outubro de 2022

STF reafirma que TCU pode determinar bloqueio de bens de particulares

A decisão foi tomada no julgamento de mandado de segurança (MS 35.506) impetrado pela PPI, em sessão virtual. A maioria da corte negou o mandado de segurança, e o ministro Ricardo Lewandowski, primeiro a proferir o voto nesse sentido, redigirá o acórdão.

A decisão questionada foi proferida pelo TCU no âmbito de tomada de contas especial que apura responsabilidades por indícios de irregularidade no contrato firmado entre a Petrobras e o Consórcio TUC Construções, para a construção da Central de Desenvolvimento de Plantas de Utilidade (CDPU) do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).

Segundo o ministro Lewandowski, a jurisprudência pacificada do STF admite que as cortes de contas, no desempenho regular de suas competências, adotem medidas cautelares diversas, desde que não extrapolem suas atribuições constitucionais. Ele ressaltou, ainda, que a origem pública dos recursos envolvidos justifica que a medida cautelar atinja particulares, e não apenas sobre órgãos ou agentes públicos.

O ministro citou entendimento doutrinário e precedentes segundo os quais o TCU tem, no exercício de sua função constitucional e com base na sua Lei Orgânica (Lei 8.443/1992), o poder geral de cautela para decretar a indisponibilidade de bens em tomada de contas especial, desde que fundamente sua decisão.

Já o ministro Edson Fachin, que também votou pela negativa do pedido, afirmou que o dano eventualmente causado à Petrobras, e, portanto, ao Erário, justificam a adoção da medida cautelar. No seu entendimento, a determinação está amparada pelo texto constitucional e pelo artigo 44, parágrafo 2º, da Lei 8.443/1992.

Em relação à desconsideração da personalidade jurídica da PPI, Lewandowski afirmou que, embora haja poucos precedentes sobre o tema, o STF tem admitido o deferimento de cautelares nesse sentido quando há alegações de malversação de dinheiro público.

O ministro explicou que a finalidade da medida é reprimir abusos e fraudes pela manipulação e pelo uso inadequado do instituto da pessoa jurídica. Todavia, a decisão definitiva sobre os bens bloqueados, tanto da pessoa jurídica quanto de seus sócios ou administradores, caberá sempre a um magistrado, a fim de resguardar os direitos e as garantias fundamentais dos cidadãos.

Fachin, por sua vez, registrou que, ao analisar o caso concreto, o TCU considerou que havia indícios robustos de que os administradores teriam se escondido por trás das empresas para maximizar lucros, às custas do patrimônio da Petrobras, concedendo propinas a funcionários do alto escalão da companhia.

Assim, a desconsideração da personalidade jurídica da empresa contratada visa responsabilizar os sócios de direito ou de fato. Além dos ministros Ricardo Lewandowski e Edson Fachin, votaram nesse sentido os ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Luiz Fux, e as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.

Divergência
O relator do processo, ministro Marco Aurélio (aposentado), havia votado pela concessão do MS para suspender a determinação do TCU, confirmando liminar deferida por ele em favor da empresa, em 2018. Para o relator, a corte de contas, órgão administrativo que auxilia o Poder Legislativo, não tem competência para restringir direitos de particulares com efeitos práticos tão gravosos como a indisponibilidades de bens e a desconsideração da personalidade jurídica.

O ministro Nunes Marques, por sua vez, votou pela anulação somente da indisponibilidade dos bens. Para ele, houve violação do direito líquido e certo da empresa de ver seus bens livres e desembaraçados. O ministro Roberto Barroso se declarou suspeito para julgar a matéria. 

Com informações da assessoria de imprensa do STF.

MS 35.506

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 19 de outubro de 2022, 9h16