STJ define que gratuidade judicial não afasta obrigação de caução em tutela provisória, salvo se comprovada absoluta impossibilidade financeira

 

29/06/2025

 

Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil

 

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que a concessão da justiça gratuita não isenta automaticamente a parte do dever de prestar caução para obtenção de tutela provisória, salvo se demonstrada a absoluta impossibilidade de oferecê-la. Segundo o colegiado, embora a gratuidade afaste o pagamento de despesas processuais, ela não exclui, por si só, a exigência de caução, que tem por finalidade assegurar o equilíbrio entre as partes e garantir eventual reparação à parte adversa, caso a medida seja revertida.

No caso julgado, uma mulher ajuizou ação para revisar cláusulas do contrato de compra de um imóvel, alegando cobranças abusivas que a levaram a interromper os pagamentos. Além da revisão do contrato, ela requereu a suspensão do leilão do imóvel e a devolução em dobro dos valores pagos indevidamente, além de indenizações por danos materiais e morais.

O juízo de primeira instância concedeu a tutela para suspender os leilões, mas condicionou a medida à prestação de caução. A autora recorreu, pedindo a dispensa da caução por ser beneficiária da justiça gratuita, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou o pedido. No recurso ao STJ, a compradora sustentou que a caução seria incompatível com o benefício da justiça gratuita.

 

Afastamento indiscriminado da caução poderia fomentar condutas temerárias

O ministro Marco Buzzi, relator do recurso, ressaltou que o deferimento da justiça gratuita não implica, de forma automática, a dispensa da caução exigida para concessão de tutela provisória, pois essa medida tem natureza de contracautela e visa resguardar a parte contrária em caso de eventual revogação.

O relator advertiu que o afastamento indiscriminado da caução poderia gerar desequilíbrio no processo e fomentar condutas temerárias. De acordo com o ministro, a exigência da caução deve ser analisada pelo juiz conforme o caso concreto, com base nos princípios do contraditório, da proporcionalidade e da segurança jurídica.

“Nesse contexto, a menor demonstração da plausibilidade do direito alegado pela parte impõe um grau mais elevado de cautela por parte do julgador, a fim de resguardar a parte contrária contra eventuais prejuízos decorrentes da concessão precipitada da medida, justificando-se a imposição de caução mais gravosa, especialmente quando houver dúvida relevante acerca do direito invocado”, disse.

 

Incoerência na conduta da autora

Ao examinar as particularidades do caso em análise, o ministro ressaltou que a exigência de caução foi plenamente justificada diante da postura contraditória da parte autora, a qual, poucos dias antes do ajuizamento da ação, apresentou propostas que demonstram sua capacidade financeira, como a sugestão de pagamento em 18 parcelas de R$ 4.000,00 e uma oferta à vista no valor de R$ 400 mil.

Para Marco Buzzi, é evidente a incoerência da conduta da recorrente, que, ao mesmo tempo em que alega impossibilidade de prestar caução, revela possuir recursos suficientes para tanto. A seu ver, o comportamento contraditório se intensifica diante da viabilidade de refinanciamento da dívida, circunstância que afasta a alegação de hipossuficiência econômica.

“A permanência no imóvel desde 2015, sem qualquer pagamento, e ausente demonstração de interesse em cumprir, ainda que parcialmente, as obrigações contratuais, caracteriza inadimplemento injustificado e afronta os princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e da vedação ao enriquecimento ilícito”, concluiu ao negar provimento ao recurso.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

 

 

Alberto Murray Neto

No exercício da advocacia empresarial, não basta ao profissional conhecer apenas as normas de direito societário substancial, como o Código Civil e a Lei das Sociedades por Ações. O domínio do direito registrário mercantil e do funcionamento das Juntas Comerciais é igualmente essencial para garantir segurança jurídica, celeridade e efetividade na constituição, alteração e extinção de sociedades empresárias.

As Juntas Comerciais, órgãos executores do registro público de empresas mercantis, são responsáveis por autenticar e arquivar os atos constitutivos, modificativos e extintivos das sociedades. Portanto, o advogado que atua nessa área precisa entender o seu funcionamento prático, especialmente as Instruções Normativas do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), que uniformizam os procedimentos de registro em âmbito nacional.

A correta redação de atos societários complexos, como acordos de sócios, alterações contratuais com reorganizações societárias ou instrumentos de transformação, fusão e incorporação, exige não apenas técnica jurídica, mas também o conhecimento das exigências formais de registro. Pequenos descuidos – como cláusulas ambíguas, omissões ou desrespeito às formalidades exigidas pelo DREI – geram exigências por parte das Juntas, atrasam operações empresariais e aumentam o custo para o cliente.

Assim, o advogado que domina o direito registrário mercantil agrega valor à sua atuação: previne entraves burocráticos, garante previsibilidade nos prazos de arquivamento e consolida a segurança dos atos societários perante terceiros e órgãos públicos.

Alberto Murray Neto é advogado de Murray – Advogados, PLG International Lawyers, Haddock Offices, Alameda Santos, 2.326, 12º andar, São Paulo/SP, (11) 3132.9400, www.murray.adv.br

 O golpe da falsa central telefônica, conhecido por importunar as pessoas com ligações indesejadas e causar prejuízos, ganhou um passo adicional para confundir as vítimas: a instalação de aplicativos que garantem que os criminosos controlem o smartphone.

25/06/2025

A fraude começa com uma chamada, na qual o estelionatário se apresenta como técnico do banco e pede que a pessoa instale apps como Teamviewer, Anydesk e outros que permitem o acesso remoto ao aparelho. Depois, o criminoso pergunta qual o código exibido por esse programa que libera o controle à distância.

Se o cliente acreditar nessas instruções, o criminoso toma o controle do celular e pode fazer uma série de operações financeiras para esvaziar a conta da vítima –nem antivírus nem a segurança dos apps bancários podem prevenir as perdas. O programa usado no golpe é legítimo, está nas lojas oficiais de Google e Apple, já que tem uso estabelecido por profissionais de assistência técnica.

A empresa de cibersegurança Kaspersky detectou aumento na instalação desses aplicativos por parte de seus clientes desde maio de 2024, de uma frequência que saiu de menos de dez detecções por mês para um pico de mais de mil em outubro –os patamares registrados continuam acima dos 800 mensais neste ano.

Os programas de acesso remoto, afirma a companhia, são cruciais para uma reedição do golpe da mão fantasma, que afeta celulares Android e iPhones e escapa dos sistemas de segurança.

Embora os criminosos recorram a uma manobra tecnológica para enganar a vítima, é ela quem pode reconhecer os indícios da fraude por meio da fala do falso atendente, de acordo com a Febraban (Federação Brasileira de Bancos). “O banco nunca liga para o cliente pedindo para que ele instale nenhum tipo de aplicativo em seu celular.”

De acordo com a entidade, a pessoa, nesses casos, deve desligar, entrar em contato com a instituição -recorrendo aos canais oficiais- para saber se algo aconteceu mesmo com a conta (veja no vídeo no topo da reportagem um exemplo de tentativa de golpe).

Como esse tipo de fraude requer a cooperação do cliente para ser realizada, os estelionatários ainda tentam convencer a vítima a apresentar o dedo e o rosto para verificação biométrica durante transações via Pix ou empréstimos. Às vezes, eles desligam a chamada e passam a se comunicar por mensagem porque alguns apps bancários não realizam transações enquanto há uma chamada em curso.

O desafio, diz o diretor da equipe de pesquisa da Kaspersky para Américas, Fabio Assolini, é que o criminoso, além de criar pressão mencionando problemas, também cita dados da vítima, como CPF, número e conta e outros -essas informações podem ser vazadas ou compartilhadas anteriormente pelo próprio cliente, que pode ter preenchido um formulário falso na internet.

Outro artifício usado pelos estelionatários é a máscara de telefone (técnica conhecida como “spoofing”), que troca o número que aparece no identificador de chamadas -as ligações falsas podem apresentar o telefone do banco ou até do gerente.

Por se tratar de um aplicativo legítimo, os antivírus, que monitoram a instalação de qualquer programa no aparelho, não bloqueiam o programa de acesso remoto usado pelos criminosos. “Alguns produtos de segurança, nós inclusive, vamos emitir um alerta de que o software tem um potencial malicioso, mas no final a gente deixa a escolha para a pessoa [de manter ou não o app]”, diz Assolini.

O especialista afirma que alguns bancos começaram a travar o funcionamento do próprio app quando detectam um aplicativo de acesso remoto instalado no aparelho e exibem uma mensagem orientando que o cliente delete o programa para conseguir acessar o mobile banking.

Porém, essa medida pode incomodar o cliente que usa o aplicativo de acesso remoto no trabalho, por exemplo.

Segundo Assolini, a alta no número de detecções de programas de acesso remoto é um sinal de que o golpe tem funcionado. “E não foi só no Brasil, começou aqui, mas passou a ser uma técnica bastante usada por criminosos em outros países também.”

A nova versão do golpe da mão fantasma começou a ganhar popularidade, depois que caiu o número de detecções do vírus que desvia Pix de forma automática -foram menos de 40 nos quatro primeiros meses deste ano, ante mais de mil em 2024.

O cibercriminoso responsável pelo desenvolvimento desse programa fraudulento foi preso pela Polícia Civil de São Paulo no fim do ano passado. Desde então, as atualizações do vírus cessaram, disse Assolini.

O aumento de golpes com uso de acesso remoto aponta que o alvo das quadrilhas mudou dos computadores para os smartphones. De acordo com levantamento realizado pela Deloitte, 75% das operações bancárias realizadas por brasileiros em 2024 ocorreram em smartphones.

VEJA ALERTAS DO NOVO GOLPE DA MÃO FANTASMA

– Desconfie se alguém se apresentar como técnico do banco pedindo para instalar aplicativos

– O banco nunca liga pedindo instalação de apps no seu celular

– Suspeite se pedirem códigos de qualquer aplicativo que você baixar

– Não atenda a pedidos para realizar verificação biométrica (dedo, rosto)

– Se suspeitar de fraude, desligue, procure o canal oficial do banco e confirme se há algo errado

– Mantenha seus dados pessoais em segurança e não preencha formulários suspeitos

– Use apenas canais oficiais para contato com instituições financeiras Mantenha o celular atualizado com as últimas versões de segurança

– Não acredite em “pedidos urgentes”, porque estelionatários tentam criar uma situação de pressão

COMO PROCEDER EM CASO DE FRAUDE

– Entre em contato com o banco assim que possível

– Registre boletim de ocorrência

– Conteste as transações pelo app ou pelos canais de atendimento do banco

– Documentar bem o golpe aumenta as chances de estorno

– Remova imediatamente qualquer app de acesso remoto instalado

– Troque todas as senhas de contas bancárias

Fonte: SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.261), fixou duas teses sobre o bem de família. Na primeira, ficou definido que a exceção à impenhorabilidade do bem de família, nos casos de execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar, prevista no artigo 3º, inciso V, da Lei 8.009/1990, restringe-se às hipóteses em que a dívida foi constituída em benefício da entidade familiar.
23/06/2025

A segunda tese estabelece que, em relação ao ônus da prova: a) se o bem foi dado em garantia real por um dos sócios de pessoa jurídica, é, em regra, impenhorável, cabendo ao credor o ônus de comprovar que o débito da sociedade se reverteu em benefício da família; e b) caso os únicos sócios da pessoa jurídica sejam os titulares do imóvel hipotecado, a regra é a penhorabilidade do bem de família, competindo aos proprietários demonstrar que o débito da sociedade não se reverteu em benefício da entidade familiar.

Com a definição das teses, podem voltar a tramitar todos os processos sobre o mesmo assunto que estavam suspensos à espera do precedente, incluindo os recursos especiais e agravos em recurso especial.

Proteção ao bem de família não é absoluta

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator dos recursos representativos da controvérsia, lembrou que o Estado instituiu a proteção ao bem de família para concretizar o direito fundamental à moradia, impedindo que o imóvel urbano ou rural destinado à residência familiar seja penhorado juntamente com os demais bens do devedor.

“O bem funcionalmente destinado à moradia da família está protegido da retirada do patrimônio do devedor, de forma a eliminar ou vulnerar aquele direito fundamental”, afirmou o relator.

Por outro lado, o ministro ressaltou que essa proteção não é absoluta, devendo ser relativizada conforme os outros interesses envolvidos. Segundo explicou, o STJ entende que a exceção à impenhorabilidade prevista no artigo 3º, inciso V, ocorrerá quando o devedor tiver oferecido o imóvel como garantia hipotecária de uma dívida contraída em benefício da própria entidade familiar.

Não é admissível comportamento contraditório do devedor

De acordo com o relator, o devedor que tenta excluir o bem da responsabilidade patrimonial, após dá-lo como garantia, apresenta um comportamento contraditório com a conduta anteriormente praticada (venire contra factum proprium), sendo essa uma postura de exercício inadmissível de um direito e contrária à boa-fé.

O ministro destacou que, embora a garantia do bem de família tenha impactos sobre todo o grupo familiar, a confiança legítima justifica a garantia da obrigação, já que o imóvel foi oferecido pelo próprio membro da família.

“Admitir que a defesa seja oposta em toda e qualquer situação, implicaria o esvaziamento da própria garantia que constituiu o fundamento que conferia segurança jurídica e suporte econômico à contratação posterior”, concluiu.

 REsp 2.093.929.

Fonte: STJ

As plataformas destinadas às transações de criptomoedas respondem de forma objetiva por fraudes na transferência desses ativos, caso a operação tenha seguido as medidas de segurança, como uso de login, senha e autenticação de dois fatores. 
24/06/2025

Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de um usuário de plataforma de criptomoedas para reconhecer a responsabilidade da empresa pela falha no sistema de segurança.

Segundo o processo, o usuário estava transferindo 0,00140 bitcoins de sua conta na plataforma para outra corretora, quando uma falha no sistema teria resultado no desaparecimento de 3,8 bitcoins da conta, equivalentes, na época, a aproximadamente R$ 200 mil.

De acordo com o usuário, essa falha estaria relacionada ao mecanismo de dupla autenticação da plataforma, que exige login, senha e validação por email para a realização de transações. Ele relatou que, no seu caso, não foi gerado o email de autenticação relativo à transação fraudulenta. A empresa alegou que a fraude ocorreu por uma invasão hacker no computador do usuário, e não por falha da plataforma.

O juízo de primeiro grau condenou a empresa a devolver a quantia perdida e a pagar R$ 10 mil por danos morais, pois ela não comprovou a alegada invasão hacker, nem o envio do email ao usuário antes da transferência. Contudo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) entendeu que o desaparecimento dos bitcoins decorreu de culpa exclusiva do usuário e de terceiros, e afastou o dever de indenizar.

Instituições financeiras respondem objetivamente por fraudes nas operações

A relatora no STJ, ministra Isabel Gallotti, lembrou que a jurisprudência do tribunal se consolidou no sentido de que “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias” (Súmula 479).

Entre as instituições financeiras definidas no artigo 17 da Lei 4.595/1964 – acrescentou a ministra –, estão as pessoas jurídicas públicas e privadas que tenham como atividade principal ou acessória a custódia de valores de propriedade de terceiros. Dessa forma, a relatora observou que a empresa de criptomoedas em questão é instituição financeira, constando, inclusive, da lista de instituições autorizadas, reguladas e supervisionadas pelo Banco Central.

“Em se tratando, portanto, de instituição financeira, em caso de fraude no âmbito de suas operações, a sua responsabilidade é objetiva, só podendo ser afastada se demonstrada causa excludente da referida responsabilidade, como culpa exclusiva da vítima ou de terceiros, nos termos do artigo 14, parágrafo 3º, I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC)“, apontou.

Isabel Gallotti verificou que, no caso, não foram produzidas provas de que o usuário tivesse liberado informações pessoais para terceiros de maneira indevida ou de que houvesse confirmado a operação contestada por email – provas essas que poderiam afastar a responsabilidade da empresa pela transação fraudulenta.

Ataque hacker não exclui responsabilidade da instituição

Além disso, a ministra destacou que a empresa deveria demonstrar que o usuário atuou de maneira indevida em toda a cadeia de atos necessários para a conclusão da operação, ou seja, que ele fez login e inseriu senha e código PIN para transferir 3,8 bitcoins e, também, que confirmou essa específica operação por meio de link enviado por email.

Na hipótese, a relatora ressaltou que a empresa não apresentou o email de confirmação da transação de 3,8 bitcoins, sendo que tal prova era indispensável para afastar a sua responsabilidade pelo desaparecimento das criptomoedas.

Por fim, a ministra comentou que um ataque hacker no caso não excluiria a responsabilidade da empresa, que responderia pela falta de segurança adequada para combater esses crimes.

 REsp 2.104.122.

Fonte: STJ

Ao estabelecer que o oferecimento de fiança bancária ou seguro-garantia judicial tem o efeito de suspender a exigibilidade do crédito não tributário, o Superior Tribunal de Justiça fortalece esses instrumentos e privilegia o direito de defesa.

 

 

 

24 de junho de 2025

Freepik

Assinatura, contrato

Oferecimento do seguro-garantia e da fiança bancária suspendem a exigibilidade do crédito não tributário, segundo o STJ

 

Essa conclusão é de advogados ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico sobre a tese vinculante fixada pela 1ª Seção do STJ, em julgamento do último dia 11.

A posição não é nova e já estava pacificada nas turmas de Direito Público da corte. Ela resulta na aplicação por analogia das regras para suspensão da exigibilidade do crédito tributário, por falta de previsão sobre o tema quanto ao crédito não tributário.

Ficou decidido que tanto a fiança bancária quanto o seguro-garantia se prestam a essa suspensão, desde que o valor garantido corresponda ao total da dívida, acrescido de 30%, conforme diz o artigo 835, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil

Relator dos recursos especiais julgados, o ministro Afrânio Vilela considerou todas as garantias que o sistema bancário e de seguros oferece atualmente. “A substituição traz não gravosidade à empresa, menor onerabilidade, liberação de capital de giro, equivalência em dinheiro e mesmo efeito jurídico do depósito.”

Direito de defesa

Para Rachel Quintana Rua Duarte, do escritório Bhering Cabral Advogados, a posição do STJ representa um avanço concreto para a segurança jurídica e a previsibilidade no exercício do direito de defesa dos contribuintes, especialmente nos setores altamente regulados.

“Diante do cenário de instabilidade econômica, o reconhecimento da eficácia das garantias fidejussórias como alternativa legítima ao depósito em dinheiro protege o fluxo de caixa das empresas e preserva sua capacidade de operação enquanto submetem as sanções administrativas à revisão do Judiciário.”

Em sua avaliação, as teses prestigiam a coerência normativa, conferem efetividade à legislação processual e fortalecem o equilíbrio entre o poder sancionador estatal e o direito à ampla defesa.

Esther Slud, sócia da área de Resolução de Disputas do Cescon Barrieu, acrescenta que o STJ já havia decidido que o seguro-garantia produz os mesmos efeitos jurídicos do dinheiro, o que harmoniza o princípio da máxima eficácia da execução para o credor com o princípio da menor onerosidade para o executado.

“De um lado, dá-se liquidez ao crédito do exequente, e, de outro, é uma opção menos onerosa ao executado, em comparação com o depósito em dinheiro”, aponta ela.

Isso porque as empresas reguladas passam a ter maior disponibilidade de caixa, não sendo obrigadas a bloquear valores expressivos para impugnar judicialmente decisões administrativas, como explica Thais Arza, sócia de Seguros, Resseguros e Previdência Privada do Mattos Filho.

Segurança econômica e jurídica

A advogada destaca que o seguro-garantia judicial é um produto bem estruturado, comercializado por várias seguradoras e que hoje é amplamente aceito pelo Judiciário, seja em dívidas cíveis, trabalhistas ou fiscais.

“Essa decisão apenas dá mais força e credibilidade a esse tipo de produto. As seguradoras sabem precificá-lo e estão prontas para assumir esses riscos. O mesmo racional se aplica à fiança bancária, que também é comercializada há muitos anos e bem estruturada.”

Paulo Figueiredo, sócio da área Bancária e Financeira do Cescon Barrieu, lembra que instituições financeiras e seguradoras estão sujeitas a regramentos rígidos para o controle dos riscos assumidos frente à condição patrimonial da respectiva instituição.

“A emissão de cartas de fiança por instituições financeiras ou de seguros-garantia por seguradoras deve ser reconhecida como exposição para fins do cômputo do capital mínimo exigido, de acordo com as condições previstas na regulamentação aplicável.”

“Em outras palavras, o risco de crédito decorrente da emissão desses instrumentos é devidamente considerado pelo regulador na apuração das exigências de capital mínimo”, complementa ele.

Seguro-garantia em alta

Segundo Ketlyn Stefanovic, presidente da comissão de Crédito e Garantia da Federação Nacional de Seguros Gerais (Fenseg), cerca de 40 seguradoras oferecem o seguro-garantia judicial no Brasil.

“Sua crescente aceitação no âmbito jurídico o posiciona como uma ferramenta versátil para diversas ações — desde causas cíveis e trabalhistas até execuções fiscais de União, estados e municípios, além de processos correlatos a débitos tributários e não tributários.”

Ela explica que o seguro-garantia judicial contempla atualização monetária e que, embora a maioria das apólices exija a correção periódica do valor segurado para acompanhar as atualizações dos débitos judiciais (à exceção das apólices com valor 30% superior ao débito), essa responsabilidade recai sobre a seguradora.

“Por meio de endossos, preferencialmente anuais, a seguradora ajusta a importância segurada, garantindo que o valor da cobertura permaneça adequado e evitando desequilíbrios no risco assumido ao longo do tempo.”

REsp 2.007.865
REsp 2.037.787
REsp 2.050.751

  • – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
    Fonte: Conjur
Para instituição, prática revela falta de idoneidade moral
24/06/2025

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aprovou neste mês súmula que proíbe a inscrição na entidade de formados em direito que tenham sido condenados pela prática de racismo. 

Prevaleceu ao final o entendimento da relatora do processo, a conselheira federal Shynaide Mafra Holanda Maia (PE), para quem a prática de racismo revela falta de idoneidade moral, um dos requisitos previstos pela OAB para o exercício da advocacia.

Outras súmulas editadas em 2019 pela OAB já previam a falta de idoneidade moral em relação a condenados em casos de violência contra a mulher, bem como contra crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência e LGBTI+.

A proposição de estender a limitação também aos condenados por racismo partiu do presidente da seccional do Piauí da OAB, Raimundo Júnior, do conselheiro federal Ian Cavalcante e da secretária da secional piauiense, Noélia Sampaio.

A aprovação da súmula foi feita por aclamação, tendo como fundamento a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reconhecem a gravidade do racismo e proíbem os acordos de não persecução penal relativos a esse crime.

Na ocasião, foram feitas homenagens a Esperança Garcia, mulher negra e piauiense reconhecida como a primeira advogada do Brasil, e a lideranças negras da advocacia contemporânea.

Sem a inscrição na OAB, obtida mediante exame nacional realizado todos os anos, e a averiguação da idoneidade moral, os bacharéis em direito ficam proibidos de exercer a advocacia. O exercício irregular da profissão é crime previsto na Lei de Contravenções Penais, com pena de prisão ou multa.

*Felipe Pontes – Repórter da Agência Brasil

Fonte: Agência Brasil

A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da Vara da Família e das Sucessões de Indaiatuba que negou pedido de abertura de inventário de irmãos e sobrinhos de homem que faleceu sem ter pais, avôs e filhos vivos nem deixar testamento ou documento de transferência de bens. A sentença reconheceu que a cônjuge sobrevivente, casada com o falecido sob o regime de separação obrigatória de bens, é a única herdeira, afastando a legitimidade dos colaterais.

Ausência de descendentes e ascendentes.
Em seu voto, relator do recurso, desembargador Carlos Castilho Aguiar França, apontou que, não havendo descendentes nem ascendentes do autor, a sucessão legítima defere-se por inteiro ao cônjuge sobrevivente, uma vez que o Código Civil não faz nenhuma distinção em relação ao regime de bens do casamento em casos de falecimento.
O magistrado salientou as diferenças entre dois institutos jurídicos distintos: o regime de bens no casamento e o direito sucessório. “O regime de bens, seja ele qual for, regula as relações patrimoniais entre os cônjuges durante a vigência do matrimônio, disciplinando a propriedade, administração e disponibilidade dos bens, bem como a responsabilidade por dívidas”, salientou. “Por outro lado, o direito sucessório regula a transmissão de bens, direitos e obrigações em razão da morte. A vocação hereditária, estabelecida no artigo 1.829 do Código Civil, determina a ordem de chamamento dos herdeiros para suceder o falecido.
O artigo 1.829, III, do Código Civil é expresso ao estabelecer que, na ausência de descendentes e ascendentes, o cônjuge sobrevivente herda a totalidade do patrimônio do falecido, sem qualquer condicionante relacionada ao regime de bens adotado”, reforçou.
Participaram do julgamento, de votação unânime, os magistrados Mauricio Velho e Vitor Frederico Kümpel.
Fonte: Comunicação Social TJSP – imprensatj@tjsp.jus.br

 

Para especialistas, veto a honorários para quem desiste de ação fortalece transações tributárias

23 de junho de 2025

A posição de vetar a condenação em honorários pela desistência de uma ação judicial, com o intuito de aderir à transação tributária prevista pela Lei 13.988/2020, elimina inseguranças e torna a negociação fiscal mais atrativa e eficaz.

A opinião é de advogados entrevistados pela revista eletrônica Consultor Jurídico, que comentaram o julgamento recente da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.

Por 3 votos a 2, o colegiado decidiu que não se aplica, nos casos de transação tributária, a regra geral do artigo 90 do Código de Processo Civil, segundo a qual quem desiste da ação arca com os honorários advocatícios da parte adversa.

Isso porque a desistência da ação é um dos requisitos para que o crédito tributário seja alvo de transação. E a Lei 13.988/2020 não traz qualquer previsão sobre honorários, o que foi interpretado como silêncio eloquente.

O precedente é importante em um contexto de incentivo à desjudicialização de questões tributárias. Em 2023, as transações tributárias foram responsáveis por quase metade dos valores recuperados pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

Foram obtidos dessa maneira R$ 20,7 bilhões. Sucesso no âmbito federal, essa alternativa tem avançado no âmbito dos estados — até abril, 13 das 27 unidades da federação haviam regulamentado a transação tributária em nível local.

Transação tributária fortalecida

Newton Domingueti, do Velloza Advogados, classifica a decisão da 1ª Turma do STJ como um importante precedente para a consolidação da transação tributária como política pública eficaz, segura e legítima de enfrentamento do contencioso fiscal.

“A ausência de condenação em honorários advocatícios nas ações renunciadas à luz da Lei 13.988/2020 não representa um privilégio ao contribuinte, mas sim um ajuste lógico e proporcional à natureza consensual do instituto, reforçando o compromisso do Judiciário com a evolução do direito tributário brasileiro rumo a soluções mais justas, racionais e individualizadas.”

Para a tributarista Isabella Paschoal, do Caputo, Bastos e Serra Advogados, o tribunal reconhece que a lógica da transação tributária exige um tratamento processual diferenciado, que não pode ser prejudicado pela aplicação de dispositivos legais concebidos especialmente para litígios judiciais.

“No aspecto prático, a decisão elimina um obstáculo que vinha gerando indecisão entre contribuintes, que, por vezes, deixavam de buscar a transação tributária pelo receio da condenação em honorários sucumbenciais”, diz.

Ela destaca que a maioria dos contribuintes que adere às transações tributárias promovidas pela PGFN está classificada nos graus C ou D de recuperabilidade. São aqueles com dívida mais antiga e discussões judiciais mais complexas, com potencial de honorários elevados.

Assim, a aplicação do artigo 90 do CPC conflitaria com a lógica cooperativa dos programas de composição fiscal. “Impor honorários à parte que renuncia à demanda para viabilizar uma transação enfraquece o instituto e, sim, é suficiente para desestimular a adesão”, diz Paschoal.

Fundamentos da consensualidade

Marco Antônio Ruzene, advogado tributarista e sócio do Ruzene Sociedade de Advogados, diverge nesse ponto, por entender que a mera aplicação do artigo 90 do CPC não se mostra, por si só, capaz de desestimular a adesão à transação tributária.

Ainda assim, afirma que a imposição desse ônus adicional, sem a devida previsão na Lei 13.988/2020, contraria os fundamentos da consensualidade e da boa-fé que regem o instituto da transação.

“Embora a discussão sobre honorários seja juridicamente relevante, ela não deve obscurecer o verdadeiro propósito da transação tributária: oferecer uma alternativa eficaz para a regularização fiscal e para a promoção de um ambiente mais equilibrado nas relações entre Fisco e contribuinte. É nesse equilíbrio que reside a força transformadora desse mecanismo, e é nele que deve se concentrar o foco do legislador, da administração tributária e do Poder Judiciário.”

Em sua visão, o precedente da 1ª Turma do STJ é uma sinalização relevante não apenas para o presente, mas também para a evolução das práticas de negociação fiscal no Brasil, ao impedir que o contribuinte seja onerado por exercer uma faculdade legal estimulada pelo próprio Estado.

“Ao eliminar inseguranças quanto aos custos indiretos da adesão, o STJ torna a transação mais atrativa e eficaz, consolidando-a como uma das melhores — senão a melhor — alternativa para contribuintes que desejam alcançar a conformidade tributária de maneira estruturada, transparente e menos litigiosa.”

Contexto da Lei 13.988/2020

Newton Dominguetti cita o contexto de edição da Lei 13.988/2020 para elogiar a decisão do STJ. Até então, a administração tributária recorria a modelos de anistia e remissão amplas, aplicadas indistintamente a todos os contribuintes.

Esses programas, além de não fazerem distinção entre inadimplentes contumazes e de boa-fé, acabavam por gerar um incentivo à litigiosidade, comprometendo a cultura da conformidade fiscal.

Com a lei da transação tributária, passou-se ao modelo estruturado e seletivo de resolução. O negócio entabulado leva em conta a capacidade contributiva, a natureza do débito, o histórico de adimplemento e o grau de recuperabilidade do crédito.

“Trata-se, portanto, de instrumento moderno e alinhado com os princípios constitucionais da razoabilidade, eficiência e isonomia, conforme destacou a Ministra Regina Helena Costa em seu voto”, diz.

Vem tese vinculante aí

A corrente vencida na 1ª Turma do STJ, encabeçada pelo relator, ministro Gurgel de Faria, teceu críticas à discussão travada entre Fazenda Nacional e contribuintes por conta dos honorários. “Se as partes entraram em acordo e fizeram a transação, elas que resolvam os honorários. É absurdo que isso chegue até uma corte superior”, disse.

Tema semelhante ainda está em discussão em julgamento da 1ª Seção, que reúne as duas turmas de Direito Privado do STJ.

O objetivo é definir se a extinção dos embargos à execução fiscal pela desistência do contribuinte para fins de adesão a programa de recuperação judicial, que já prevê o pagamento de verba honorária, permite nova condenação em honorários.

O relator é também o ministro Gurgel de Faria, que propôs uma solução mais favorável ao contribuinte: para ele, impor honorários nas duas situações configuraria bis in idem (dupla punição pelo menos fato).

“Não havendo inclusão de honorários advocatícios no valor parcelado, aí, sim, poderá a Fazenda, após o encerramento dos embargos à execução, exigir verba honorária”, sugeriu. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Paulo Sérgio Domingues.

REsp 2.032.814

  • – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
    Fonte: Conjur