A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que a presunção de veracidade de uma assinatura eletrônica, certificada por pessoa jurídica de direito privado, não pode ser afastada pelo simples fato de a entidade não estar credenciada na Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil).

03/12/2024

O recurso especial julgado pelo colegiado decorre de ação de busca e apreensão de veículo alienado fiduciariamente como garantia de um empréstimo formalizado em Cédula de Crédito Bancário, assinada digitalmente por meio da plataforma Clicksign e endossada por uma entidade que atua como correspondente bancária e sociedade de crédito direto.

O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) manteve a decisão de primeiro grau que extinguiu o processo, destacando que as assinaturas digitais, feitas por uma entidade não credenciada na ICP-Brasil, não eram suficientes para garantir a autenticidade dos documentos.

No recurso ao STJ, a credora defendeu a validade da assinatura digital do contrato, autenticada por meio de token, conforme acordado entre as partes. Argumentou que a autenticidade pode ser conferida no site da plataforma Clicksign e que o uso de assinatura certificada pela ICP-Brasil é opcional. Por fim, destacou o princípio da liberdade das formas e a validade dos contratos eletrônicos, classificando a assinatura como eletrônica avançada, capaz de garantir a integridade e a veracidade do documento.

Assinatura digital avançada tem a mesma validade da assinatura física

A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que o sistema de certificação pela ICP-Brasil, embora amplamente utilizado, não exclui outros métodos de validação jurídica para documentos e assinaturas eletrônicas. Segundo ela, o parágrafo 2º do artigo 10 da MP 2200/2001 prevê expressamente isso.

A ministra ressaltou que a Lei 14.063/2020 criou níveis diferentes de força probatória das assinaturas eletrônicas, conforme o método de autenticação utilizado, e, ao mesmo tempo, conferiu validade jurídica a qualquer tipo de assinatura eletrônica, levando em consideração a autonomia privada e a liberdade das formas de declaração de vontade entre os particulares.

Para Nancy Andrighi, a assinatura eletrônica avançada tem presunção de veracidade menor quando comparada à assinatura eletrônica qualificada, que utiliza certificação ICP-Brasil. “Ainda assim, ela possui uma carga razoável de força probatória e – mais importante – validade jurídica idêntica, conforme endossado pelo próprio Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), para o qual o documento com a assinatura digital avançada tem a mesma validade de um documento com assinatura física, apenas dependendo da aceitação do emitente e do destinatário”, completou.

Partes concordaram em usar assinatura eletrônica por meio de plataforma digital

A relatora apontou que, no caso em julgamento, as partes acordaram expressamente em utilizar o método de “assinatura eletrônica da CCB através de plataforma indicada pela credora”, ou seja, há presunção de acordo de vontades quanto à utilização do método de assinatura eletrônica por meio da plataforma Clicksign. Além disso, ela enfatizou que o processo reúne vários elementos de verificação que confirmam a veracidade das assinaturas. 

De acordo com Nancy Andrighi, negar validade a um título de crédito apenas pelo fato de a autenticação da assinatura e da integridade documental ter sido feita por uma entidade não credenciada no sistema ICP-Brasil seria o mesmo que negar validade a um cheque cuja assinatura não foi reconhecida em cartório, “evidenciando um excessivo formalismo diante da nova realidade do mundo virtual”.

Leia o acórdão no REsp 2.159.442.

Fonte: STJ

Um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV) mostrou que a decisão da arbitragem foi mantida pelo Poder Judiciário em 68% das apelações das ações anulatórias de decisão arbitral movidas no Brasil entre 2018 e 2023. Em 13% dos processos, houve anulação integral da sentença e em 7%, anulação parcial. Já em 10% dos procedimentos houve imposição de outras medidas.

3 de dezembro de 2024

A pesquisa foi divulgada em abril de 2024 pelo ministro do STJ Luis Felipe Salomão durante o seminário “Arbitragem e Judiciário”, na FGV Rio. O ministro, que é coordenador da FGV Justiça, comandou a pesquisa ao lado do professor Peter Sester. As informações foram colhidas pelo Jusbrasil, que selecionou decisões dos tribunais de Justiça e do STJ entre 2018 e 2023. “A arbitragem tem um papel relevante na atração de investimentos. Quando contratada, ela tem de ser respeitada. É um acordo de vontades. Mas é preciso fazer mudanças na lei. Nosso estudo procurou examinar quais são os pontos que precisam ser aperfeiçoados e discutir isso com especialistas em arbitragem no país”, afirmou Salomão.

O estudo analisou 358 apelações e 32 recursos especiais. Em segunda instância, a taxa de procedência das ações anulatórias foi de 22,6%. No STJ, 9,4% das ações anulatórias tiveram sucesso. O TJ de Goiás foi o que contou com mais apelações de ação anulatória, com taxa de procedência de 15,6%. Em segundo lugar, aparece o TJ de São Paulo, com taxa de procedência de 34,5%. Já o TJ do Rio de Janeiro não anulou sentença arbitral em sede de apelação.

A alegação mais comum para pedir a anulação da sentença arbitral é a imparcialidade e o livre convencimento dos árbitros. Também são citadas decisões que extrapolam os limites da convenção de arbitragem ou que violam os princípios do contraditório e da igualdade das partes.

Levantamento do Observatório da Arbitragem, coordenado pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr) e pela Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ), vai ao encontro do que diz a FGV. O estudo, divulgado em novembro de 2023, mostrou que há apenas 1,5% de chance para anulação de sentença arbitral pela Justiça. Foram analisadas 289 ações não sigilosas, julgadas pelas varas especializadas em Direito Empresarial e Arbitragem da comarca de São Paulo, entre março de 2018 e novembro de 2022.

André Abbud, um dos autores da pesquisa e ex-presidente do CBAr, disse ao site Jota que “a pesquisa mostra que, nos casos em que o Judiciário tem sido chamado a agir, isso tem ocorrido mais para dar suporte do que para controlar a arbitragem, e que problemas que geram a anulação de sentenças arbitrais são excepcionais”. Marcelo Guedes Nunes, também autor da pesquisa e presidente da ABJ, diz que “a relação entre o Judiciário e a arbitragem é saudável e harmônica” e que “o Poder Judiciário tem papel fundamental na garantia da força da arbitragem”.

O advogado e participante da Comissão de Arbitragem da OAB-RJ Gabriel de Britto Silva, em artigo publicado no ConJur em abril de 2024, destaca que a comunidade arbitral sempre sustentou que eram poucas as anulações, mas que o tema está crescentemente presente em artigos, palestras e “apresenta-se como um temor para o investidor que busca na escolha da sede de arbitragem um lugar que irá lhe promover segurança jurídica”.

A pesquisa “Arbitragem em Números”, feita pela advogada e professora Selma Ferreira Lemes, mostrou que, entre 2021 e 2022, a impugnação de árbitros somou menos de 5% do número de arbitragem processadas. Se falar em impugnações aceitas, o percentual representou menos de 1%. “A sistemática de análise de impugnações de árbitros previstas nos regulamentos das câmaras de arbitragem tem-se mostrado efetiva e adequada na análise da questão colocada pelas partes, sobressaindo de importância a qualidade dessas decisões”, destaca a pesquisa. O estudo analisou dados das oito principais câmaras de arbitragem do país.

O levantamento mostra ainda que, em 2021, foram feitos 35 pedidos de impugnações em 1.047 arbitragens em andamento, sendo que sete foram acolhidas. Já em 2022, houve um aumento, com 52 pedidos de impugnação em 1.116 arbitragens em tramitação, sendo 11 acolhidas.

Apesar dessa discussão no Poder Judiciário, o estudo mostra que a quantidade de impugnações é baixa. Selma Ferreira Lemes explica que “é muito comum quando uma parte perde, tentar anular a sentença arbitral alegando falha no dever de revelação do árbitro. Tem que se afastar o ‘achismo’ e alegações frívolas”. Ela diz ainda que as causas aceitas para impugnação de árbitros estão relacionadas a conflito de interesses e dependência econômica com uma das partes ou advogados, por exemplo. “A ótica da análise para impugnar uma decisão não é a falha de revelação em si, mas o motivo não revelado”, disse.

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 3.293/2021, que altera a Lei 9.307/1996, para disciplinar a atuação do árbitro, aprimorar o dever de revelação, estabelecer a divulgação das informações após o encerramento do procedimento arbitral e a publicidade das ações anulatórias. A norma obriga os árbitros a revelar qualquer fato que signifique “dúvida mínima” sobre a sua imparcialidade, ao invés de “dúvida justificada”, como está na lei atual. Além disso, foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 1.050), que busca estabelecer critérios sobre o dever de revelação dos árbitros.

Arbitragem em Números

Eduardo de Albuquerque Parente, doutor e mestre em Direito Processual pela USP e advogado da Salusse, Marangoni, Parente e Jabur Advogados, diz em artigo publicado pelo portal Migalhas que “essas medidas têm o potencial de alterar substancialmente a Lei de Arbitragem e, apesar de se apresentarem como ‘aprimoramentos’, a nosso ver colocam em risco a autonomia do sistema arbitral ao desafiar os mecanismos legais intencionalmente flexíveis que promovem a confiança das partes no árbitro”.

Para ele, as medidas têm a finalidade de reduzir a margem interpretativa intencionalmente presente no parágrafo 1º, do artigo 14 da Lei de Arbitragem. “No entanto, ao contrário do que se propõem, elas podem gerar efeitos adversos aos que se desejava evitar. Não se discute a importância da imparcialidade do árbitro. O que se discute é se o enrijecimento dos parâmetros do dever de revelação por via legislativa e/ou judicial tem como resultado a garantia da imparcialidade do árbitro e, por extensão, o aprimoramento da segurança jurídica”, destacou. “Por um lado, os parâmetros buscam ‘sistematizar’ tudo aquilo que deve ser revelado. Por outro, a revelação de fatos que não possuem relevância para a arbitragem pode ser instrumentalizada para tentativas de anulação de sentenças arbitrais”, avaliou.

Como forma de minimizar os impactos do dever de revelação, dar mais transparência ao processo e reforçar a segurança do processo arbitral, o Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr) divulgou um conjunto de recomendações sobre o tema. Conforme esclareceu o ex-presidente do CBAr, André Abbud, “as diretrizes são um conjunto de breves recomendações que buscam uniformizar entendimentos e orientar as condutas dos árbitros, partes, advogados, câmaras e juí-zes a respeito do dever de revelação, com base na nossa lei e nas práticas e conceitos compartilhados pela doutrina e pela comunidade internacional”.

Na mesma linha, o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC) atualizou, em novembro de 2023, o questionário de conflitos de interesse e disponibilidade, acrescentando perguntas sobre relacionamentos profissionais prévios entre os árbitros, os advogados e as partes. “Nós revimos o questionário pois começou um burburinho no mercado de que os árbitros não estão fazendo as revelações adequadas, os árbitros estão deixando de contar para as partes o relacionamento que têm com uma ou com outra, estão surgindo impugnações demais aos árbitros. Então, o CAM-CCBC também incrementou o seu questionário para que todas as perguntas possíveis sobre aquilo que pode ser suscitado como conflito de interesses sejam esclarecidas para as partes”, explicou a vice-presidente da câmara, Silvia Rodrigues Pachikoski, em entrevista ao Anuário da Justiça.

Especialistas, no entanto, têm destacado que o Brasil se tornou referência da prática da arbitragem, em relação ao cenário internacional. O assunto foi abordado durante a Conferência Latino-Americana de Arbitragem (CLA), em junho de 2024, no Rio de Janeiro. “Eu tenho observado o cenário de arbitragem internacional há quatro décadas e, durante esse tempo, o uso da arbitragem se expandiu [no Brasil]. Os valores aumentaram também o número de procedimentos. Expandiu-se quantificadamente no sentido também de pessoas, instituições, suporte do Judiciário”, afirmou a professora suíça Gabrielle Kaufmann-Kohler, uma das principais árbitras do mundo na atualidade e presidente honorária do Conselho Internacional para Arbitragem Comercial (ICCA).

Para a vice-presidente do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá, Silvia Pachikoski, existe uma perspectiva positiva do aumento no número de arbitragens no país. “O volume de patrimônio em disputa está crescente. É um cenário positivo, em desenvolvimento. O Brasil é visto como um excelente player da arbitragem”, afirmou em entrevista ao Anuário da Justiça.

De acordo com a CAM-CCBC, o valor médio das ações subiu cerca de 40%, passando de R$ 79,9 milhões em 2022, para R$ 114 milhões em 2023. Relatório da câmara mostra que também aumentou a presença de partes internacionais nos procedimentos administrados no Brasil. Em 2023, as ações envolveram pelo menos 17 países. “O Brasil hoje se tornou uma das maiores jurisdições da América Latina e desperta interesse dos nossos vizinhos, dos Estados Unidos, Europa e todos os demais interessados nessa integração, o que fortalece e traz ganhos para a arbitragem brasileira”, afirmou Rodrigo Garcia da Fonseca, presidente do câmara durante a conferência.

Entre os principais desafios da arbitragem, Silvia Pachikoski destaca que é necessário se manter atento para a acomodação das necessidades do mercado. “Como é um mercado que se autorregula, a lei da arbitragem é uma lei padrão e o regulamento das câmaras é que vai se ajustando para melhorar a prática do dia a dia da arbitragem”, destacou. “A preocupação do Brasil é se manter em linha com o que se pratica no mundo. Se o Brasil cria uma legislação que não é compatível com o mundo, a gente acaba criando um lugar onde a parte internacional não quer fazer arbitragem no país ou não confia em ter uma arbitragem aqui”, pontuou.

Um aspecto da arbitragem que mais tem suscitado discussões nos últimos tempos é o dever de revelação dos árbitros, previsto no artigo 14, parágrafo 1º da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996): “As pessoas indicadas para funcionar como árbitro têm o dever de revelar, antes da aceitação da função, qualquer fato que denote dúvida justificada quanto à sua imparcialidade e independência”. Em junho de 2024, houve decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema.

Alegando imparcialidade do árbitro escolhido pela outra parte envolvida em uma disputa com grupo empresarial, um médico entrou na Justiça para tentar a anulação de uma decisão arbitral. Entre as alegações, a defesa apontou que o árbitro não informou no questionário para verificação de conflitos de interesse e disponibilidade, fornecido pela câmara arbitral, que dividia escritório com outra banca que atende empresa interessada e omitiu que integrava escritório de advocacia que prestava serviços para uma empresa que depende financeiramente de uma das partes. O processo teve início em 2021 e o recurso foi desprovido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Ao ser analisado pelo STJ, o recurso foi negado novamente. Por maioria, o colegiado entendeu que não basta a mera violação do dever de revelação do árbitro para anular uma sentença arbitral. Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, “no entendimento da doutrina, a violação do dever de revelação, por si só, é insuficiente para comprometer a atuação do árbitro, sendo necessário que o juiz faça a avaliação a respeito da relevância e do impacto da omissão para saber se ela afetou a imparcialidade e a independência do árbitro”.

Ela explicou em seu voto que são necessárias provas contundentes da parcialidade do árbitro para anular sentença arbitral, o que não foi verificado na hipótese. Isso porque todos os pontos alegados pelos recorrentes já eram de conhecimento público antes e durante a arbitragem. “É necessário observar que o artigo 20 da Lei de Arbitragem determina que ‘a parte que pretender arguir questões relativas à competência, suspeição ou impedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se manifestar, após a instituição da arbitragem’, embora não haja prejuízo de posterior exame do Poder Judiciário, nos termos do artigo 33”, diz o voto.

Vencidos, os ministros Humberto Martins e Moura Ribeiro afirmaram que não cabe ao Judiciário analisar o tamanho do impacto da falha do dever de revelação. Para eles, a mera desconfiança em relação ao árbitro já deveria respaldar a anulação. “Eu sou favorável ao cumprimento estrito da própria Lei de Arbitragem. Ela foi feita no sentido da própria segurança jurídica e, ao mesmo tempo, para dar maior agilidade ao processo, para que você não vá diretamente para o judicial. Por isso nós queremos que a Lei de Arbitragem seja seguida à risca, com o princípio da transparência, para que as empresas possam escolher o árbitro como solução, para que as demandas corram no tempo mais razoável com a solução dos litígios”, avaliou o ministro Humberto Martins, em entrevista à série Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito, da revista eletrônica Consultor Jurídico.

Sobre o tema, alguns especialistas manifestaram sua opinião à ConJur, em reportagem de junho de 2024. Para o advogado Marcelo Levitinas, sócio do Graça Couto Advogados especializado em Solução de Disputas, a decisão do STJ é correta, “tanto porque eventual falha no dever do árbitro de revelar não gera, necessariamente, nulidade da sentença arbitral, quanto porque reafirma o essencial posicionamento do STJ de ratificar a independência da jurisdição arbitral, mantendo no Judiciário o mero controle de legalidade nos limites postos na Lei da Arbitragem”. Evelyn Barreto de Souza, professora de Direito Internacional e Resolução de Disputas da Universidade Mackenzie, concorda: “O julgamento no STJ foi extremamente positivo para a manutenção da higidez e principalmente da segurança jurídica da arbitragem no país, vez que o objetivo magno do poder de revelação do árbitro, conforme a dicção da Lei de Arbitragem, é salvaguardar a imparcialidade e a independência do árbitro.”

Já para a advogada Daniela Poli, do Poli Advogados & Associados, a decisão pode causar uma sensação de permissividade com pequenas omissões de árbitros. “Pode surgir uma sensação de insegurança sobre a transparência do processo arbitral, já que omissões menores, mas ainda potencialmente significativas, não resultariam automaticamente na anulação da sentença. Isso poderia ser interpretado como uma permissividade em relação à completa abertura e transparência que se espera de um processo arbitral”, ressaltou. Ela entende ainda que, apesar de a decisão nortear futuras discussões, pode haver aumento de litígios envolvendo questionamentos sobre a relevância das informações omitidas.

*Reportagem publicada no Anuário da Justiça Direito Empresarial 2024, lançado na última semana, na Fiesp. A versão impressa está à venda na Livraria ConJur (clique aqui). Acesse a versão digital pelo site do Anuário da Justiça (anuario.conjur.com.br).

  • Por Rayane Fernandes – repórter da revista Consultor Jurídico.
  • Fonte: Conjur
Ministro Dias Toffoli é o relator da ação do Podemos e do Solidariedade.

03/12/2024

Os partidos Podemos e Solidariedade apresentaram no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 93, com pedido de que a Corte valide trechos de leis federais que garantem imunidade tributária a entidades religiosas. A ação foi distribuída ao ministro Dias Toffoli.

De acordo com os partidos, a Lei 7.689/1988, com a redação dada pela Lei 14.057/2020, trata da impossibilidade de as entidades religiosas figurarem como contribuintes da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Já a Lei 8.212/1991, também com a redação dada pela lei de 2020, prevê a não incidência de Contribuição Previdenciária Patronal (CPP) sobre os valores pagos a pessoas que atuam nessas entidades religiosas a título de remuneração ou para financiamento de sua formação religiosa.

As legendas argumentam que, mesmo depois da alteração das normas, a falta de um entendimento pacificado sobre o tema estaria gerando uma série de autuações e execuções indevidas contra igrejas de diversas denominações religiosas. Como exemplo, citam que diversas decisões judiciais e administrativas em âmbito nacional limitam a imunidade dos valores recebidos por religiosos no exercício de suas funções típicas.

Diante da relevância da matéria, o relator decidiu que a questão será submetida ao Plenário diretamente no mérito, sem prévia análise do pedido de liminar

(Suélen Pires/CR//CF)

Fonte: STF

A decisão liminar que autoriza a mineração de uma área sem que se comprove que os proprietários dela foram informados e deram permissão expressa gera risco de danos irreparáveis e não pode ser mantida.

2 de dezembro de 2024

Agência Nacional de Mineração exigiu o licenciamento ambiental da área

Com esse entendimento, a desembargadora Shirley Fenzi Bertão, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, suspendeu uma decisão de primeiro grau em favor da Vale do Rio Sul, que autorizava a exploração de ferro em Coimbra (MG) e Cajuri (MG).

A empresa é titular de direito de mineração na região e, para conclusão do procedimento de Requerimento de Concessão de Lavra e outorga da Concessão de Lavra, a Agência Nacional de Mineração exigiu o licenciamento ambiental da área.

Para concedê-lo, a Secretaria de Meio Ambiente exigiu a apresentação de comprovante de propriedade ou autorização dos proprietários acerca do uso do local para mineração.

Ao ajuizar a ação para obter a liminar, a mineradora apontou que os proprietários da área apresentaram resistência em consentir, o que gerou risco de sanções administrativas que levariam à perda do direito minerário e de todo o investimento feito.

Faltou negociar a mineração

Os proprietários das terras, representados pelo advogado Leonardo Rezende, recorreram para dizer que não houve qualquer contato ou negociação com a mineradora. Portanto, não se justifica a concessão da liminar.

Ao analisar o caso, a desembargadora Shirley Fenzi Bertão observou que não há indícios de recusa por parte dos donos das terras, tampouco de que houve tentativa de negociação para obtenção da respectiva anuência.

“Nesse contexto, o deferimento de liminar pretendida pela agravada, frente à especial complexidade da presente caso, sem atendimento ao contraditório e a ampla defesa é medida demasiadamente abrupta e vai de encontro ao direito de propriedade resguardado pelo competente órgão ambiental, podendo causar danos irreparáveis ou de difícil reparação à parte agravante, sendo necessário, por derradeiro, análise profunda e criteriosa da questão”, concluiu.

Segundo Rezende, a decisão do TJ-MG é acertada. “Não se pode admitir que a anuência do proprietário seja suprida sem que se prove ter ocorrido a prévia negociação entre as partes. O diálogo, neste tipo de processo, é muito importante.”

AG 1.0000.24.504158-7/001

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur
STJ reafirma que a impenhorabilidade do bem de família legal e voluntário pode coexistir. A Lei 8.009/1990 não foi revogada pelo CPC de 2015.

2 de dezembro de 2024

​A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que o bem de família voluntário, que encontra previsão no artigo 1.711 do Código Civil (CC) e no artigo 833, inciso I, do Código de Processo Civil (CPC), mantém com o bem de família legal, disposto na Lei 8.009/1990, relação de coexistência, e não de exclusão.

Na origem, o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) ajuizou execução fiscal contra uma empresa e seus devedores solidários. No curso do processo, o juízo reconheceu a impenhorabilidade de imóvel que era utilizado por um dos devedores como moradia da família.

O recurso especial chegou ao STJ após o tribunal de segundo grau afastar a impenhorabilidade, por entender que o CPC teria revogado tacitamente o diploma legal que dispõe sobre o tema (Lei 8.009/1990).

Não houve revogação tácita de dispositivos da Lei 8.009/1990

O relator, ministro Paulo Sérgio Domingues, destacou que, conforme os artigos 1º e 5º da Lei 8.009/1990, o fato de o imóvel não estar registrado como bem de família não o torna penhorável. Segundo o magistrado, a proteção conferida pela lei ao bem de família não foi revogada com a entrada em vigor do CPC de 2015.

“A tese de que esses dispositivos foram revogados contraria o próprio Código de Processo Civil, que admite a convivência com outras declarações legais de impenhorabilidade”, ressaltou o ministro, apontando o disposto no artigo 832 do CPC.

O relator enfatizou que adotar como taxativo o rol das hipóteses de impenhorabilidade, dispostas no artigo 833 do CPC, é incompatível com a prática jurídica que regula o tema. Conforme explicou, a tradição jurídica brasileira sempre regulou o bem de família por outros diplomas e normas, como o antigo e o novo Código Civil e a Lei 8.009/1990. 

Para o ministro, a redação do artigo 833, inciso I, do CPC não implica revogação tácita do artigo 5º, caput e parágrafo único, da Lei 8.009/1990, mas trata de hipótese diversa, que “declara a impenhorabilidade do bem de família de menor valor, quando outro não for indicado no registro público”.

*Fonte: Superior Tribunal de Justiça

Bolsa alterna altas e baixas, mas encerra com queda de 0,34%

02/12/2024

Em mais um dia de turbulência no mercado financeiro, o dólar voltou a subir e a fechar no maior valor nominal desde a criação do real. A bolsa de valores alternou altas e baixas, mas encerrou o dia com queda.

O dólar comercial encerrou esta segunda-feira (2) vendido a R$ 6,069, com alta de R$ 0,068 (+1,13%). A cotação operou o dia inteiro em alta. Na máxima do dia, por volta das 13h, chegou a R$ 6,09.

No mercado de ações, o dia foi marcado pela volatilidade. O índice Ibovespa, da B3, fechou aos 125.235 pontos, com queda de 0,34%. O indicador chegou a subir 0,13% por volta das 14h50, mas voltou a ficar negativo nas horas finais de negociação.

A indefinição em relação ao pacote fiscal e ao aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda interferiu nas negociações. Das medidas anunciadas na última quinta-feira (28), o governo até agora não enviou a proposta de emenda à Constituição que limita o valor do abono salarial nem os projetos de lei que reformulam a previdência dos militares e que pretendem mudar a cobrança de Imposto de Renda.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, passou a tarde no Palácio do Planalto fechando o texto final das propostas.

*Com informações da Reuters

*Por Wellton Máximo – Repórter da Agência Brasil*

Fonte: Agência Brasil

MURRAY ADVOGADOS

O mercado vê com bons olhos o corte de R$ 70 bilhões, mas a isenção de IR causa incertezas nas projeções fiscais. Entenda o impacto dessa medida.

28 de Novembro de 2024

O governo federal anunciou um corte de R$ 70 bilhões no orçamento, o que foi recebido com otimismo pelo mercado, sinalizando um movimento em direção ao equilíbrio fiscal. No entanto, a surpresa ficou por conta da proposta de isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil mensais, o que gerou incertezas em relação ao impacto fiscal dessa medida.

O mercado, que inicialmente via com bons olhos o pacote de contenção, agora se questiona sobre as possíveis dificuldades para atingir o equilíbrio fiscal sem sobrecarregar os mais ricos. O ajuste fiscal, prometido pelo governo, pode enfrentar obstáculos para ser eficaz a longo prazo, principalmente devido à proposta de isenção do IR.

O impacto da isenção do IR no ajuste fiscal

A medida que mais chamou a atenção foi a isenção do Imposto de Renda para pessoas com renda abaixo de R$ 5 mil. Atualmente, a faixa de isenção do IR é de R$ 2.259,20, abrangendo aqueles que ganham até dois salários mínimos. No entanto, a alteração proposta ampliaria significativamente essa faixa, o que, de acordo com especialistas, custaria ao governo cerca de R$ 45,8 bilhões. Essa isenção é vista como uma medida popular, com grande apelo social, mas que pode comprometer os objetivos fiscais do país a longo prazo.

Felipe Salto, economista-chefe da Warren Rena, destaca que, embora a proposta de isenção seja positiva para os mais pobres, ela pode ser insuficiente para atingir as metas fiscais. “A medida é positiva, mas não suficiente para garantir o equilíbrio fiscal a médio e longo prazo”, explica Salto. Além disso, a isenção terá que ser compensada por um aumento na tributação de pessoas que ganham acima de R$ 50 mil mensais, o que gera uma nova fonte de incerteza. A falta de detalhes sobre como essa compensação será realizada é um ponto de preocupação para economistas e analistas.

Reações do mercado ao pacote fiscal

Antes do anúncio da isenção do IR, a reação do mercado ao corte de R$ 70 bilhões era relativamente positiva. Segundo uma sondagem realizada pela corretora BGC Liquidez, 50% dos investidores acreditavam que o corte seria bem recebido pelo mercado, enquanto outros 40% indicaram que a medida teria um impacto neutro. O foco das discussões estava em como o governo poderia implementar um pacote fiscal que contribuísse para a redução da dívida pública sem causar uma desaceleração econômica.

Entretanto, com a surpresa da isenção do IR, os analistas começaram a questionar a viabilidade do pacote. Daniel Cunha, estrategista-chefe da BGC Liquidez, alerta que a isenção pode gerar um impacto fiscal negativo, a menos que o governo consiga implementar um aumento substancial na taxação dos mais ricos. “Misturar a isenção com a necessidade de maior tributação dos ricos cria uma mensagem confusa, que pode dificultar a aceitação das reformas fiscais”, afirma Cunha.

Medidas de compensação: Desafios à vista

O governo federal propôs aumentar a taxação sobre quem ganha mais de R$ 50 mil mensais para compensar a perda de receita da isenção do IR. No entanto, a falta de detalhamento sobre essas medidas cria uma certa apreensão entre os economistas. Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos, afirma que a proposta ainda carece de clareza, o que pode gerar incertezas quanto à sua efetividade. “Sem detalhes claros, essa compensação pode se mostrar ineficaz, causando um rombo fiscal significativo”, aponta Veronese.

Além disso, a meta fiscal do governo para os próximos anos é de déficit zero, ou seja, o objetivo é equilibrar as receitas e despesas sem aumentar a dívida pública. Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, acredita que o corte de R$ 70 bilhões é insuficiente para alcançar esse objetivo, principalmente diante da projeção de um déficit de R$ 55 bilhões em 2025. Para ele, o governo precisará de cortes mais profundos e medidas adicionais para reduzir a relação dívida/PIB e garantir a sustentabilidade fiscal do país.

O contexto das reformas fiscais e as expectativas para 2025

A grande questão que paira sobre o pacote fiscal anunciado é se ele será suficiente para atingir os objetivos fiscais do Brasil a médio e longo prazo. Embora a proposta de corte de R$ 70 bilhões seja positiva para reduzir o déficit fiscal em 2024 e 2025, ela não resolve os problemas estruturais da dívida pública e da necessidade de ajustes fiscais contínuos. A reforma tributária, que inclui a revisão da taxação sobre grandes rendas e a reavaliação de benefícios fiscais, será essencial para alcançar um ajuste fiscal mais robusto no futuro.

O economista André Roncaglia, diretor-executivo do FMI, acredita que o pacote tem um viés progressivo, ao aumentar a taxação sobre os mais ricos, mas destaca que será necessário ir além para garantir uma recuperação fiscal duradoura. “As reformas propostas atacam algumas injustiças históricas, mas o alcance do impacto ainda precisa ser melhor avaliado”, afirma Roncaglia.

Fonte: Jornal Jurid

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, considerou possível atribuir efeitos extraterritoriais à decisão da Justiça brasileira que determina ao provedor de internet a retirada de conteúdo considerado ofensivo. Para o colegiado, embora a ordem para tornar o conteúdo indisponível seja baseada nas normas brasileiras, sua efetivação em outros países é um efeito natural do caráter transfronteiriço e global da internet.

27/11/2024 

Com esse entendimento, o colegiado negou provimento a recurso da empresa Google Brasil Internet contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que, ampliando os efeitos da sentença de primeiro grau, determinou ao provedor que retirasse da rede, em nível global, certo conteúdo difamatório contra uma empresa, postado originalmente no YouTube.

No recurso especial, o Google alegou, entre outras questões, que a atribuição de efeitos extraterritoriais à ordem judicial de remoção de conteúdo violaria a limitação da jurisdição brasileira e seria incompatível com os procedimentos específicos de cada país para validação das decisões judiciais estrangeiras.

Segundo o provedor, o Judiciário brasileiro não poderia impor “censura” de discursos para além do território nacional, porque determinado conteúdo pode, ao mesmo tempo, ser considerado ofensivo pela legislação brasileira e ser aceito em outros países.

Lei brasileira busca permitir efeitos extraterritoriais das ordens judiciais

A ministra Nancy Andrighi, relatora, citou precedentes de tribunais de diversos países ao comentar que a preocupação com a efetividade das decisões judiciais na proteção de vítimas de difamação na internet é um “fenômeno de jurisdição global”, comparável ao próprio alcance da rede mundial de computadores.

No âmbito do STJ, a relatora também apontou precedentes que, sobretudo em ações de natureza penal, entenderam não haver violação da soberania de país estrangeiro em situações como a quebra de sigilo e a ordem para fornecimento de mensagens de correio eletrônico.

Também no direito civil – apontou a ministra –, o Marco Civil da Internet adotou mecanismos como a aplicação do direito brasileiro nos casos em que a coleta de dados ocorra em território nacional, ainda que o seu armazenamento ou tratamento se dê por meio de provedor sediado no exterior (artigo 11 da Lei 12.965/2024).

“A intenção do legislador é, portanto, claro indicativo de permitir efeitos extraterritoriais de ordens judiciais de indisponibilidade proferidas pelos tribunais brasileiros, especialmente, quando o conteúdo infrator ainda está disponível fora dos limites territoriais tradicionais”, afirmou.

Empresa comprovou que conteúdo ainda estava disponível em outros países

No caso dos autos, Nancy Andrighi observou que a empresa vítima do conteúdo ofensivo demonstrou que, apesar de a decisão judicial ter sido cumprida no Brasil, ainda era possível encontrar o material difamatório em países como a Colômbia e a Alemanha.

Para a ministra, enquanto o Google não demonstrar a existência concreta de um conflito entre o direito brasileiro e o direito de país estrangeiro, “não cabe a este STJ emitir juízo de valor sobre violação de soberania de outros países de forma abstrata”.

“Provimentos jurisdicionais com efeitos globais nessas particulares circunstâncias estão presentes em outros continentes e evidenciam uma tendência mais proativa da comunidade judicial internacional em conferir maior efetividade à resolução de controvérsias que não mais se limitam aos conceitos tradicionais de territórios ou fronteiras”, concluiu a relatora.

Leia o acórdão no REsp 2.147.711.

Fonte: STJ

Representantes do Facebook e do Google defenderam nesta quarta-feira (27/11), no plenário do Supremo Tribunal Federal, a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014). O dispositivo estabelece que as plataformas digitais e os provedores só podem ser responsabilizados civilmente quando descumprem ordem judicial de retirada do ar de conteúdo apontado como ilegal.

27 de novembro de 2024

Supremo começou a analisar ações sobre responsabilização de redes

O STF começou a analisar nesta quarta duas ações com repercussão geral que discutem, entre outras coisas, a constitucionalidade do artigo 19, a responsabilização das plataformas por conteúdos de usuários e a remoção de conteúdos e perfis mediante notificação extrajudicial.

O artigo 19 do Marco Civil, tema central da discussão dos ministros, diz o seguinte:

Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

No Recurso Extraordinário 1.037.396 (Tema 987 da repercussão geral, com relatoria do ministro Dias Toffoli), será discutida a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet. Ele exige o descumprimento de ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização do provedor pelos danos decorrentes de atos praticados por terceiros — ou seja, as publicações feitas por usuários. O caso concreto é o de um perfil falso criado no Facebook.

Já no Recurso Extraordinário 1.057.258 (Tema 533 da repercussão geral, com relatoria do ministro Luiz Fux) será discutida a responsabilidade de provedores de aplicativos e ferramentas de internet pelo conteúdo publicado por usuários, assim como a possibilidade de remoção de conteúdos ilícitos a partir de notificações extrajudiciais. O caso trata de decisão que obrigou o Google a apagar uma comunidade do Orkut.

O que diz o Facebook

O Facebook foi representado no julgamento iniciado nesta quarta pelo advogado José Rollemberg Leite Neto. De acordo com ele, se o Supremo decidir que notificações extrajudiciais são o suficiente para a retirada do ar de qualquer tipo de conteúdo, haverá um ambiente de “censura massiva”, que pode afetar até mesmo os jornais.

“Isso importa na preservação do jornalismo profissional. Em extensa medida, os conteúdos postados nas plataformas vêm dessas fontes. E qualquer conteúdo que represente denúncia ou crítica pode ser visto como ofensivo e instado a ser removido. O que causaria um gravíssimo prejuízo ao debate público.”

De acordo com o advogado, não há inércia das plataformas para a supressão de conteúdos ilícitos. Ele afirmou, por exemplo, que no ano passado 208 milhões de postagens com pedofilia, violência e discurso de ódio foram removidas globalmente pelo Facebook a partir de identificações feitas pela própria plataforma.

Leite Neto também afirmou que a maioria dos processos do gênero trata não da retirada de publicações, mas da reinclusão de material anteriormente removido.

Ele pediu que, caso o Supremo não considere o artigo 19 integralmente constitucional, seja dada interpretação conforme à Constituição determinando que a retirada obrigatória de perfis e páginas só se dê em casos de exploração sexual infantil, terrorismo, racismo, abolição violenta do Estado democrático de Direito e golpe de Estado.

“Por que não mais do que isso? Porque conceitos abertos como ‘fake news’, ‘desinformação’, ‘crimes contra a honra’ e ‘postagens manifestamente ilegais’ incentivariam remoções excessivas e levariam a uma judicialização massiva.”

Por fim, questionado pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente da corte, sobre o modo como a plataforma exclui perfis falsos, ele disse que em 98% dos casos há a retirada automática após a comunicação feita por usuários da plataforma.

O que diz o Google

O Google foi representado pelo advogado Eduardo Bastos Furtado de Mendonça, que também apresentou dados sobre a remoção de conteúdos. Ele disse que em 2023 o YouTube (plataforma de vídeos da empresa) removeu 1,6 milhão de publicações no Brasil por violações de políticas da empresa, enquanto no mesmo período os casos judicializados somaram 614 pedidos.

“Não existe uma inércia que seja parte do modelo de negócio das plataformas. Nem haveria sentido que existisse. A maioria dos usuários e a generalidade dos anunciantes repudia esses conteúdos (ilícitos). Não é proveitoso esse tipo de conteúdo.” Os pedidos que chegam ao Judiciário, disse ele, são de fato casos em que há controvérsias que merecem intervenção judicial.

Ainda segundo o advogado, “nenhum país democrático do mundo” adota um modelo de responsabilidade objetiva, em que as plataformas são responsáveis por todo e qualquer conteúdo de terceiros, ficando obrigadas a monitorar publicações globalmente.

Ele citou modelos adotados na Europa, sustentando que o que existe lá são normas que definem que há responsabilidade objetiva quando há descumprimento de decisões, e que o marco para a responsabilização é a notificação extrajudicial. No entanto, prosseguiu Mendonça, a responsabilização só vale para casos específicos, e não para qualquer tipo de conteúdo.

“No caso da lei alemã, a eventual responsabilização está relacionada à indicação de ilicitudes específicas e tipos penais específicos, e o que se prevê é uma responsabilidade pela falha sistêmica de responder adequadamente a essas notificações.”

“Não faria sentido responsabilizar uma plataforma por não ter removido um conteúdo cujo exame é polêmico e sujeito a valorações subjetivas, e que muitas vezes é objeto de divisão no próprio Judiciário”, prosseguiu o advogado.

Ele também destacou que o artigo 21 do Marco Civil prevê a exclusão de conteúdos após notificação extrajudicial, mas em casos específicos de nudez e atos sexuais privados. Para Mendonça, em casos de crimes objetivos, as plataformas identificam e apagam os conteúdos. O mesmo não deveria ser aplicado em conceitos amplos como desinformação, disse ele.

Além dos dois casos de repercussão geral, está na agenda da corte um terceiro processo que está sob a relatoria do ministro Edson Fachin.

Na ADPF 403, os ministros vão discutir se é possível o bloqueio de aplicativos por decisões judiciais ou se a intervenção do Judiciário ofende os direitos à liberdade de expressão e de comunicação.

RE 1.037.396
RE 1.057.258
ADPF 403

  • Por Tiago Angelo – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur