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A decisão foi unânime

16 de Janeiro de 2024

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que o deferimento de pedido de recuperação judicial de empresa que tenha sua personalidade jurídica desconsiderada não impede o andamento da execução redirecionada aos sócios. De acordo com o colegiado, eventual constrição dos bens dos sócios não afeta o patrimônio da empresa em recuperação, tampouco atinge a sua capacidade de reestruturação.

No mesmo julgamento, a turma entendeu que a desconsideração da personalidade jurídica com base na teoria menor prevista pelo artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor também se aplica às sociedades anônimas.

Diferentemente da teoria maior trazida pelo artigo 50 do Código Civil, a teoria menor admite a desconsideração apenas com a demonstração do estado de insolvência da empresa e de que a personalidade jurídica constitui obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados, sem a necessidade de comprovação de desvio de finalidade ou da confusão patrimonial entre os sócios e a sociedade empresária.

No caso dos autos, a desconsideração da personalidade jurídica da empresa em recuperação ocorreu no âmbito de uma ação de consumo. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), segundo o qual a recuperação judicial não alcançaria as demandas envolvendo os devedores solidários, a exemplo dos sócios e dos administradores.

Ao STJ, os recorrentes alegaram ser acionistas – e não sócios – das empresas que tiveram a personalidade jurídica desconsiderada e que o veto ao parágrafo 1° do artigo 28 do CDC excluiria sua responsabilização pela teoria menor, uma vez que não seria possível a desconsideração das sociedades anônimas. Eles também defendiam a suspensão do cumprimento da execução em virtude do deferimento do pedido de recuperação judicial.

Tipo societário para fins de aplicação da teoria menor é irrelevante

O relator do caso no colegiado, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, citou precedentes do STJ (entre eles o REsp 1.658.648 e o REsp 1.900.843) para destacar que a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, embora não exija a prova de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, não possibilita a responsabilização pessoal de que não integra o quadro societário da empresa, ainda que atue nela como gestor, e de quem, mesmo que tenha a condição de sócio, não desempenha atos de gestão na sociedade.

Por outro lado, segundo o relator, a desconsideração da personalidade jurídica fundamentada na teoria menor pode ser admitida para sociedades anônimas, desde que seus efeitos se restrinjam às pessoas que detenham efetivo controle sobre a gestão da companhia. Nesse sentido, o ministro apontou precedente estabelecido pela Quarta Turma no AREsp 1.811.324, no qual o colegiado definiu que o tipo societário da empresa não é fator determinante para a aplicabilidade da teoria menor.

Em relação ao pedido de suspensão das execuções, Villas Bôas Cueva comentou que, conforme decidido pela Segunda Seção no REsp 1.333.349, o deferimento da recuperação judicial, a despeito de suspender as ações e as execuções contra e sociedade em recuperação, não impede o prosseguimento das execuções nem gera a suspensão ou a extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários.

“Justamente por não afetar o patrimônio do devedor principal, ou seja, da empresa em recuperação, é que o legislador ressalvou os direitos e os privilégios dos credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (artigo 49, parágrafo 1º, da LREF), admitindo o prosseguimento de eventuais execuções contra eles instauradas”, completou.

No caso concreto analisado, o ministro Cueva ressaltou que, segundo as instâncias ordinárias, os recorrentes são acionistas e controladores da sociedade, e, por consequência, possuem o poder de controle sobre a gestão da sociedade anônima que teve a personalidade desconsiderada. “No caso, portanto, não há óbice a que os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica recaiam sobre o patrimônio dos recorrentes”, concluiu.

Fonte: STJ 

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, estabeleceu que as decisões proferidas pelo STJ no âmbito de recurso interposto contra acórdão que confirmou a pronúncia não estão inseridas entre as causas interruptivas da prescrição, nos moldes previstos pelo artigo 117, inciso III, do Código Penal (CP).

12/01/2024

​A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, estabeleceu que as decisões proferidas pelo STJ no âmbito de recurso interposto contra acórdão que confirmou a pronúncia não estão inseridas entre as causas interruptivas da prescrição, nos moldes previstos pelo artigo 117, inciso III, do Código Penal (CP).

De acordo com o dispositivo do CP, o curso da prescrição é interrompido, entre outros, pela decisão que confirma a pronúncia. Entretanto, para o ministro Reynaldo Soares da Fonseca – no voto que foi acompanhado pela maioria do colegiado –, não é possível extrair do texto legal uma autorização para que haja a interrupção da prescrição a cada decisão proferida após a pronúncia.

“As causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva listadas no referido dispositivo legal guardam íntima relação com o curso da ação penal em primeira e segunda instâncias, que são as instâncias nas quais, em regra, é formada a culpa”, completou.

Segundo o ministro, o único pronunciamento do STJ que pode ser considerado, no contexto analisado, como marco interruptivo da prescrição é a decisão que restabelece a pronúncia, nas hipóteses em que o réu tenha sido despronunciado pela corte local. Nesse caso, ponderou o magistrado, o reconhecimento da interrupção é cabível porque o julgamento pelo tribunal do júri só se torna possível após a decisão proferida pelo tribunal superior.

“No entanto, já tendo a pronúncia sido confirmada pelo tribunal de justiça, autorizando, inclusive, o julgamento pelo conselho de sentença, conforme jurisprudência uníssona desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal, não há se falar em nova confirmação da decisão de pronúncia, no julgamento dos recursos manejados para as instâncias extraordinárias”, apontou.

Por opção político-legislativa, decisões de tribunais superiores não foram incluídas como causas interruptivas da prescrição

Em relação ao inciso IV do artigo 117 do CP – segundo o qual também é causa interruptiva de prescrição a publicação de sentença ou acórdão condenatórios recorríveis –, Reynaldo Soares da Fonseca comentou que o STF, ao analisar a amplitude do inciso (HC 176.473), não avançou no tema a ponto de considerar que as decisões proferidas pelo STJ também deveriam ser consideradas como acórdão condenatório ou confirmatório recorrível.

Para o ministro, a discussão travada no Supremo se limitou aos pronunciamentos judiciais de primeiro e segundo graus, com a confirmação de jurisprudência adotada mesmo antes de alteração legislativa de 2007 (que incluiu o acórdão, ao lado da sentença, entre as decisões recorríveis que interrompem a prescrição). 

“Assim, não obstante a decisão proferida por esta Corte Superior revelar ‘pleno exercício da jurisdição penal’, tem-se que as decisões proferidas pelos tribunais superiores não foram contempladas como causas interruptivas da prescrição, mas apenas as decisões proferidas pelas instâncias ordinárias. Trata-se de opção política-legislativa que, a meu ver, não pode ser desconsiderada por meio de interpretação extensiva em matéria que deve ser interpretada restritivamente”, concluiu o ministro.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):HC 826977

Fonte: STJ

Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica, e a sua utilização em qualquer modalidade depende de autorização prévia e expressa

12 de janeiro de 2024, 8h22

câmera fotográfica fotografia

Empresa usou foto em divulgação comercial sem autorização do autor

Esse entendimento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que manteve a condenação de uma agência de viagens por usar de forma irregular uma fotografia para a promoção de sua atividade empresarial em redes sociais. A empresa terá de pagar indenização ao fotógrafo.

Em primeira instância, a Justiça de São Paulo rejeitou o pedido de indenização, com o argumento de que não havia na obra sinal que identificasse o autor da foto e que “não foi realizado o registro na forma legalmente estabelecida”.

O autor, então, recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) argumentando que as fotografias estavam, sim, registradas devidamente em cartório de registro público de títulos e documentos e depositadas junto à Biblioteca Nacional. A corte paulista deu provimento ao recurso, mas a agência recorreu ao STJ.

Em seu voto, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator do caso, disse que obras artísticas são protegidas pela lei de direitos autorais, “sendo que eventual exposição em rede social, sem consentimento, remuneração e identificação do autor por meio dos devidos créditos, lesionam os direitos patrimoniais e morais do autor”.

“A contrafação constitui no uso empresarial das fotografias sem autorização do autor, a quem cabe permitir a exploração econômica ou comercial de sua obra”, afirmou o ministro.

O voto do relator foi acompanhado por unanimidade. Ao seguir Cueva, o ministro Humberto Martins destacou que, demonstrada a autoria, deve-se reconhecer que a divulgação do trabalho corresponde “à contrafação”, pois a imagem foi utilizada com clara intenção de lucro.

“Ressalta-se, ainda, que, de acordo com o art. 108 da LDA, quem, na utilização, por qualquer modalidade, de obra intelectual, deixar de indicar ou de anunciar, como tal, o nome, pseudônimo ou sinal convencional do autor e do intérprete, além de responder por danos morais, está obrigado a divulgar a identidade, o que não ocorreu na hipótese dos autos”, afirmou Martins.

REsp 1.831.080

Fonte: STJ

Para a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no âmbito de cumprimento de sentença comum (procedimento ordinário), não é cabível determinação judicial que obrigue a Fazenda Pública a apresentar, como devedora na fase de execução, os cálculos e o valor atualizado do débito – procedimento conhecido como execução invertida.

11/01/2024

Relator do caso, o ministro Herman Benjamin destacou em seu voto que a execução invertida é uma construção jurisprudencial – ou seja, não tem previsão expressa na lei – e representa a modificação do rito estabelecido pelo Código de Processo Civil, segundo o qual, como regra, cabe ao credor a apresentação dos valores atualizados do débito.

De acordo com posicionamento do STJ – explicou o ministro – o fundamento da execução invertida é a conduta espontânea da parte devedora, a qual busca se antecipar na apresentação dos cálculos e, como recompensa, ter o benefício de não ser condenada ao pagamento de honorários advocatícios, além de acelerar o trâmite da ação.

O relator lembrou que essa técnica de execução é importante nas causas previdenciárias, especialmente nas ações em curso nos juizados especiais. Sobre esse tema, lembrou decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADPF 219, considerando legítimo que a União, nas ações dos juizados em que figure como ré, apresente os cálculos necessários à execução de natureza previdenciária.

“Conquanto abrangente, por tratar-se de ação constitucional, o precedente acima possui nuanças próprias, dentre as quais os próprios limites de aplicabilidade do precedente jurisprudencial: decisões proferidas pelos juizados especiais”, ponderou.

Execução invertida pode ser adotada pela Fazenda Pública, mas não de maneira impositiva

Para Herman Benjamin, embora relevantes, os princípios que fundamentam o microssistema dos juizados especiais não podem ser impostos automaticamente aos processos ordinários. O ministro ressaltou que, na esfera do Código de Processo Civil, outros princípios e orientações prevalecem, a exemplo do princípio da cooperação e da boa-fé.

No caso analisado pela turma, o relator apontou que o tribunal de origem deveria ter intimado previamente a Fazenda Pública, ofertando-lhe a possibilidade do cumprimento espontâneo da sentença. Estando intimada, caberia à Fazenda decidir pela apresentação ou não dos cálculos e dos valores devidos, ciente de que, não o fazendo, ela assumiria a responsabilidade por eventual condenação em honorários advocatícios.   

“Recomendável que a Fazenda Pública adote, principalmente na seara previdenciária, o procedimento de antecipação voluntária na demonstração dos cálculos para execução. Desse modo, cumpriria o princípio da celeridade processual, bem como se desvencilharia de custos para o erário com condenações em honorários advocatícios (princípio da causalidade). Contudo, repita-se, tal procedimento, com base na jurisprudência do STJ, possui a característica primordial da espontaneidade da parte executada, não cabendo imposições cogentes da autoridade judicial”, concluiu o ministro.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):AREsp 2014491

Fonte: STJ

Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de empréstimos tomados por sociedade empresária para implementar ou incrementar suas atividades negociais, uma vez que, nesses casos, a contratante não é considerada destinatária final do serviço e, por esse motivo, não pode ser classificada como consumidora.

Esse entendimento é da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso especial. Venceu no julgamento o voto do relator do caso, ministro Raul Araújo.

10 de janeiro de 2024

Prevaleceu no julgamento o voto do relator, ministro Raul Araújo

Na ação civil pública julgada pelo colegiado, o Ministério Público de Santa Catarina questionou cláusulas e encargos bancários supostamente abusivos em contratos celebrados com o Banco do Estado do Rio Grande do Sul.

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) decidiu pela aplicação do CDC a todos os contratos de crédito operados pelo banco, sem distinção, com o argumento de que as regras consumeristas incidem nas relações bancárias.

De acordo com a 4ª Turma do STJ, no entanto, a aplicação do CDC deve se limitar aos casos em que há relação de consumo, ficando afastada a revisão de contratos para fins de obtenção de capital de giro.

“O acórdão estadual deve ser reformado, no ponto, para limitar a aplicação do CDC e, consequentemente, a revisão automática das cláusulas contratuais resultantes da presente ação civil pública somente aos casos em que constatada a existência de relação de consumo. Fica, assim, afastada a revisão nos contratos firmados com precípua natureza de insumo”, afirmou o relator em seu voto.

O ministro citou entendimento semelhante firmado pela 3ª Turma do STJ em ação revisional de empréstimos ajuizada por uma cooperativa de crédito. Na ocasião, o colegiado estabeleceu que o CDC não se aplica à relação jurídica oriunda de contratação de empréstimo para estímulo de atividade empresarial.

“Nos termos da jurisprudência do STJ, em regra, com base na Teoria Finalista, não se aplica o CDC aos contratos de empréstimo tomados por sociedade empresária para implementar ou incrementar suas atividades negociais, uma vez que a contratante não é considerada destinatária final do serviço e não pode ser considerada consumidora”, prosseguiu o relator.

A regra, no entanto, disse ele, pode ser afastada quando demonstrada a “específica condição de hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica da pessoa jurídica”.


REsp 1.497.574

Fonte: Revista Consultor Jurídico

Segundo o colegiado, para o exame dessa violação, é necessário analisar se a invenção principal está ou não sendo utilizada na composição do produto apontado como infrator

09 de Janeiro de 2024

​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a titularidade de modelo de utilidade concedida pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) não afasta, por si só, a possibilidade de violação da patente do objeto principal que compõe a nova criação. Segundo o colegiado, para o exame dessa violação, é necessário analisar se a invenção principal está ou não sendo utilizada na composição do produto apontado como infrator.

No caso em julgamento, um empresário e a sociedade empresária entraram na Justiça contra outra empresa para que esta parasse de comercializar, divulgar e expor – de forma não autorizada – um tipo de bloco modular para floreiras verticais cuja invenção havia sido patenteada pelos autores da ação. O juízo de primeiro grau, com base em laudo pericial, reconheceu a violação do direito de propriedade industrial e determinou que a ré parasse de usar o produto fabricado por ela.

Na petição de embargos de declaração opostos contra a sentença, a ré informou um fato novo: a concessão, em seu favor, da patente do modelo de utilidade implementado no produto apontado como violador do direito de propriedade dos autores.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), analisando o produto patenteado pelos autores (patente de invenção) e as imagens do modelo de utilidade da ré, concluiu que seria o mesmo objeto; e que, portanto, como o INPI concedeu à ré a patente do modelo de utilidade, a utilização do objeto por ela fabricado não implicaria violação do direito dos autores.

Patente de modelo de utilidade não dá o direito de usar invenção sem autorização

A ministra Nancy Andrighi, relatora no STJ, observou que o modelo de utilidade se caracteriza pela introdução de uma nova forma ou disposição em objetos já conhecidos, para criar alguma melhoria funcional. Segundo a ministra, é possível que a nova forma conferida pelo modelo de utilidade recaia sobre objeto constituído por algum elemento protegido por patente de invenção de terceiros.

A relatora destacou que o titular da patente de modelo de utilidade tem o direito de explorar sua criação e de impedir que ela seja usada por terceiros, mas não lhe é permitido utilizar, sem autorização, uma invenção patenteada por outro que integre o objeto sobre o qual foi implementada a melhoria.

“Ficará caracterizada infração ao direito do titular da invenção toda vez que, sem autorização deste, uma reivindicação constante da carta patente em vigor estiver presente em produto fabricado ou comercializado por terceiro sem autorização”, declarou.

Características do objeto devem ser cotejadas com reivindicações da carta patente

Nancy Andrighi ressaltou que, para a adequada solução da controvérsia, não têm relevância as características de forma e função que assemelham ou diferem os produtos finais dos litigantes, assim como não importa saber se a empresa ré possui algum direito de propriedade industrial sobre alguma das características técnicas integrantes do objeto que produz.

De acordo com a ministra, o que é imprescindível para o exame da contrafação é analisar se a invenção específica, cujos direitos de propriedade foram concedidos aos autores, está ou não sendo utilizada na composição do produto apontado como infrator. “Faz-se necessário examinar as características técnicas do objeto fabricado pela ré em cotejo com as reivindicações constantes da carta patente expedida em favor do recorrente”, explicou a relatora.

Por considerar que o fundamento do TJSP não sustenta a solução dada ao processo, pois viola o artigo 41 da Lei 9.279/1996, a Terceira Turma decidiu devolver os autos à segunda instância para o prosseguimento do julgamento da apelação. Entre outros motivos, a relatora esclareceu que a devolução do processo se deve à necessidade de análise das características do produto apontado como infrator e de interpretação das reivindicações da carta patente – o que não poderia ser feito pelo STJ, em razão da Súmula 7.

Fonte: STJ

De acordo com o colegiado, é preciso flexibilidade para conciliar o cumprimento das formalidades legais com o respeito à última vontade do testador

08 de Janeiro de 2024

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, validou um testamento particular em que as testemunhas não foram capazes de confirmar em juízo a manifestação de vontade da testadora, a data em que o testamento foi elaborado, o modo como foi assinado e outros elementos relacionados ao ato.

De acordo com o colegiado, é preciso flexibilidade para conciliar o cumprimento das formalidades legais com o respeito à última vontade do testador.

No caso dos autos, duas pessoas interpuseram recurso especial no STJ depois que as instâncias ordinárias negaram seus pedidos de abertura, registro e cumprimento de um testamento particular, pois as testemunhas ouvidas em juízo não esclareceram as circunstâncias em que o documento foi lavrado nem qual era a manifestação de vontade da testadora.

Apuração das instâncias ordinárias se distanciou dos requisitos legais

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, observou que a confirmação do testamento particular está condicionada à presença de requisitos alternativos: ou as testemunhas confirmam o fato da disposição ou confirmam que o testamento foi lido perante elas e que as assinaturas no documento são delas e do testador.

Contudo, a ministra apontou que, na hipótese dos autos, as testemunhas foram questionadas especificamente sobre a vontade da testadora, as circunstâncias em que foi lavrado o testamento, a data ou o ano de sua assinatura, se foi assinado física ou eletronicamente e se a assinatura se deu em cartório ou na casa da testadora.

Segundo a relatora, a apuração fática das instâncias ordinárias se distanciou dos requisitos previstos no artigo 1.878, caput, do Código Civil (CC), uma vez que as testemunhas foram questionadas sobre detalhes distintos daqueles previstos em lei.

“O legislador não elencou uma parte significativa dos elementos fáticos que foram apurados nas instâncias ordinárias porque o distanciamento temporal entre a lavratura do testamento e a sua confirmação pode ser demasiadamente longo, inviabilizando que as testemunhas confirmassem, anos ou décadas depois, elementos internos ou inerentes ao testamento”, declarou.

Para o STJ, é possível flexibilizar as formalidades exigidas para a validade do testamento

A relatora também ressaltou que, tendo como base a preservação da vontade do testador, o STJ possui jurisprudência consolidada no sentido de que é admissível alguma espécie de flexibilização nas formalidades exigidas para a validade de um testamento.

A título de exemplo, a ministra citou a decisão proferida no REsp 828.616, em que se reconheceu que o descumprimento de determinada formalidade – no caso, a falta de leitura do testamento perante três testemunhas reunidas concomitantemente – não era suficiente para invalidar o documento, pois as testemunhas confirmaram que o próprio testador foi quem leu o conteúdo para elas e, ainda, confirmaram as assinaturas presentes no testamento.

“O exame da jurisprudência revela que esta corte tem sido ciosa na indispensável busca pelo equilíbrio entre a necessidade de cumprimento de formalidades essenciais nos testamentos particulares (respeitando-se, pois, a solenidade e a ritualística própria, em homenagem à segurança jurídica) e a necessidade, também premente, de abrandamento de determinadas formalidades para que sejam adequadamente respeitadas as manifestações de última vontade do testador”, concluiu Nancy Andrighi ao dar provimento ao recurso especial.

Fonte: STJ

A Constituição Federal de 1988, pela primeira vez, inscreveu a defesa do consumidor entre os direitos fundamentais

08 de Janeiro de 2024

Constituição Federal de 1988, pela primeira vez, inscreveu a defesa do consumidor entre os direitos fundamentais. Até então, o Brasil não contava com uma proteção jurídica sistematizada para o consumidor em razão de sua condição de sujeito vulnerável do mercado.

Ao colocar “a defesa do consumidor” como obrigação do Estado, prevista no rol de direitos e garantias fundamentais (artigo 5º, XXXII), o texto constitucional a tornou cláusula pétrea, ou seja, não pode ser eliminada nem alterada por emenda. Mais adiante, o texto afirma que a ordem econômica, entre outros princípios, deve observar a defesa do consumidor. Por fim, nas Disposições Constitucionais Transitórias, ficou estabelecido que o Congresso Nacional, dentro de 120 dias da promulgação da Constituição, teria de elaborar o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Embora fora do prazo, a Lei 8.078 foi promulgada em 11 de setembro de 1990, entrando em vigor seis meses depois. O CDC colocou o Brasil numa posição de vanguarda na defesa dos direitos do consumidor e se tornou um importante marco do fortalecimento da cidadania.

Em seu artigo 6°, o código passou a assegurar a proteção da vida e da segurança contra os riscos de produtos e serviços, com efetiva prevenção e reparação, inclusive invertendo-se o ônus da prova pelo juiz; a informação adequada; a proibição da publicidade enganosa e abusiva; a modificação das cláusulas contratuais abusivas, ou sua revisão quando fatos supervenientes as tornarem excessivamente onerosas; o acesso à Justiça; a participação na formulação de políticas de consumo e a educação para o consumo, além da exigência de adequação e eficiência nos serviços públicos.

A proteção do consumidor é uma das múltiplas faces do exercício da cidadania

Esta quarta matéria da série especial Faces da Cidadania mostra como o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao interpretar e aplicar as normas consumeristas, vem atuando para garantir o pleno exercício dos direitos do cidadão também nesse campo. Mostra ainda, pelo exemplo de uma iniciativa do Procon do Distrito Federal, como é possível empoderar o consumidor por meio da informação sobre tais direitos.

Nas mais de três décadas que se seguiram à promulgação da Constituição e do CDC, o STJ produziu ampla jurisprudência sobre a matéria, com mais de 20 súmulas relacionadas ao direito do consumidor, dentre as quais se destacam:

Para a ministra Nancy Andrighi, o consumo cada vez maior de bens, serviços e informações passou a ser um critério de aferição da cidadania. A condição de consumidor, disse, é um importante papel que assumem os cidadãos na sociedade contemporânea, “sendo fácil perceber que o direito do consumidor está intimamente relacionado à tutela da cidadania”.

Complemento ao microssistema de processos coletivos

Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e membro da comissão que elaborou o anteprojeto do CDC, o professor e advogado Kazuo Watanabe destacou que o código é reconhecido por seu conteúdo principiológico, isto é, “como estatuto que contém princípios tutelares abrangentes, e não normas específicas voltadas a fatos típicos”.

Na sua avaliação, a lei vem cumprindo adequadamente a função de proteger os consumidores, ainda que, em razão do tempo decorrido, tenha precisado de atualizações – como as que disciplinaram o comércio eletrônico e trataram do superendividamento (Lei 14.181/2021).

O professor também ressaltou que o CDC complementou o sistema brasileiro de processos coletivos – o qual, até então, contava apenas com a ação popular e a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), que tutela interesses difusos. “O Código de Defesa do Consumidor, além de dispor sobre os aspectos faltantes na lei de 1985, como a disciplina da competência, da coisa julgada, das espécies de provimentos, criou e disciplinou mais duas espécies de ação coletiva: a que tutela os interesses coletivos stricto sensu e a que tutela os interesses individuais homogêneos”, explicou.

Cidadania instrumental do consumidor

Para Dennis Verbicaro, procurador do Estado do Pará, doutor e professor de direito do consumidor, a identidade coletiva como consumidor permite a ocupação de mais espaços políticos de deliberação, o que influi diretamente no aprimoramento dos deveres éticos do fornecedor. “É o que chamo de cidadania instrumental do consumidor, ou seja, a cidadania emerge da identidade política comum de todos nós, que nos impõe o dever de participar desse diálogo com os agentes econômicos do mercado, sob a mediação do Estado e em prol da harmonia das relações de consumo”, declarou. 

Segundo o procurador, essa nova perspectiva de grupo ou de coletividade de consumidores tem uma capacidade muito maior de transformar a realidade: “Essa rede solidária de influência e articulação política impõe aos empresários a mudança de comportamento, seja voluntariamente – sob a forma de marketing de aproximação –, seja coercitivamente – pela sujeição jurídica às normas administrativas, civis e penais de proteção ao consumidor, cuja exigibilidade é garantida pela atenta e oportuna atuação cívica da sociedade e pela fiscalização diligente do Estado”.

Quem pode ser considerado consumidor

Estendendo a ideia de consumidor para muito além do adquirente de bens ou serviços, o artigo 17 do CDC prevê a figura do consumidor por equiparação (bystander): também goza da proteção da lei aquele que, mesmo sem participar diretamente da relação de consumo, sofre as consequências do acidente de consumo, decorrente de defeito exterior que ultrapassa o objeto do produto ou do serviço e põe em risco sua segurança física ou psíquica.

“Na hipótese de danos individuais decorrentes do exercício de atividade empresarial destinada à fabricação de produtos ou à prestação de serviços, é possível, em virtude da caracterização do acidente de consumo, o reconhecimento da figura do consumidor por equiparação, o que atrai a incidência das disposições do CDC”, disse a ministra Nancy Andrighi.

A ministra relatou o REsp 2.018.386, no qual a Segunda Seção estabeleceu que as vítimas de supostos danos decorrentes da exploração de uma usina hidrelétrica podem ser consideradas consumidoras por equiparação. Elas alegaram que a produção de energia elétrica no complexo de Pedra do Cavalo (BA) causou danos materiais e morais em razão do impacto na sua atividade pesqueira e de mariscagem.

O colegiado, no julgamento do CC 143.204, em hipótese envolvendo derramamento de óleo, também considerou que os pescadores artesanais prejudicados eram vítimas de acidente de consumo, motivo pelo qual estaria caracterizada a figura do consumidor por equiparação e justificada a incidência do CDC.

Limites da publicidade no CDC

Uma das decisões mais impactantes do STJ na interpretação do CDC foi o primeiro precedente em que se considerou abusiva a publicidade de alimentos dirigida direta ou indiretamente ao público infantil. O julgamento ocorreu em 2016 na Segunda Turma (REsp 1.558.086).

Para o relator do recurso, ministro Humberto Martins, a decisão sobre compra e consumo de gêneros alimentícios, sobretudo em época de crise de obesidade, deve caber aos pais, não às crianças. “Daí a ilegalidade, por abusivas, de campanhas publicitárias de fundo comercial que utilizem ou manipulem o universo lúdico infantil (artigo 37, parágrafo 2º, do CDC)”, afirmou à época.

Da mesma forma, o tribunal tem vários outros entendimentos sobre os limites da publicidade diante dos direitos do consumidor – entre eles, o que considerou enganosa, capaz de induzir em erro o consumidor, a mensagem que consta em letras minúsculas nas informações contratuais (REsp 1.599.423).

Responsabilidade solidária da cadeia de produção

O CDC também ampliou o campo de incidência da responsabilidade, que passou a alcançar não apenas o fornecedor diretamente ligado ao evento danoso, mas toda a cadeia produtiva envolvida na atividade de risco.

A Quarta Turma, no REsp 1.358.513, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, decidiu que uma empresa engarrafadora de gás de cozinha e uma distribuidora – revendedora exclusiva da primeira – eram responsáveis solidárias por atropelamento ocorrido durante a entrega do produto, que culminou na morte de um menino de quatro anos, em 2008. A criança andava de bicicleta quando foi atingida pelo caminhão de entrega, no momento em que o motorista realizava manobra em marcha à ré.

Conforme o relator, o CDC estabelece expressamente, no artigo 34, que o fornecedor de produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos. “Ou seja, estabelece a existência de responsabilidade solidária de quaisquer dos integrantes da cadeia de fornecimento, que venham a dela se beneficiar, pelo descumprimento dos deveres de boa-fé, transparência, informação e confiança, independentemente, inclusive, de vínculo trabalhista ou de subordinação”, afirmou Salomão.

O superendividamento na mira das instituições

De acordo com o ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido em abril de 2023), o superendividamento se tornou uma grande preocupação do direito do consumidor em todo o mundo, devido às facilidades de acesso ao crédito.

Ele foi o relator do REsp 1.584.501, no qual a Terceira Turma analisou se o desconto de empréstimo consignado poderia alcançar quase o valor total do salário do devedor. Por reconhecer que tal situação trazia risco à subsistência do consumidor, o colegiado limitou a 30% os descontos na conta em que ele recebia seus rendimentos.

A decisão da Terceira Turma foi tomada quando ainda tramitava no Congresso o projeto que viria a se transformar na Lei 14.181/2021, a chamada Lei do Superendividamento, que disciplina o crédito ao consumidor. Mesmo reconhecendo que as relações contratuais são regidas pelo princípio da autonomia privada, Sanseverino ponderou que esse princípio se submete a outros, como o da dignidade da pessoa humana.

O problema do superendividamento do consumidor tem recebido atenção especial do Poder Judiciário. Em agosto de 2022, foi lançada no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a Cartilha sobre o Tratamento do Superendividamento do Consumidor, elaborada por um grupo de especialistas que teve o ministro do STJ Marco Buzzi como coordenador.

Em novembro do mesmo ano, o STJ promoveu o seminário O Tratamento do Consumidor Superendividado à Luz da Lei 14.181/2021: da trajetória legislativa à sua efetivação. Na opinião do ministro Buzzi, coordenador-geral do evento, o controle do superendividamento exige não apenas a atuação do Judiciário, mas um conjunto de ações a serem desempenhadas por vários segmentos sociais e instituições em favor de uma necessária mudança de mentalidade.

Relação entre o direito do consumidor e a proteção de crédito

A relação entre direito do consumidor e proteção de crédito é uma questão frequente nos processos que chegam ao STJ. Em 2009, ao julgar os Temas 40 e 41 dos recursos repetitivos (REsp 1.062.336), a Segunda Seção discutiu a possibilidade de indenização por danos morais diante da falta da comunicação prévia ao consumidor sobre a inscrição de seu nome em cadastros restritivos de crédito – exigência do parágrafo 2º do artigo 43 do CDC –, nos casos em que exista inscrição anterior feita regularmente. O julgamento levou à edição da Súmula 385.

A corte entendeu que o dano moral é configurado quando a entidade de proteção ao crédito aponta como inadimplente alguém que efetivamente não o é. Quando a anotação é irregular, mas o consumidor tem contra si alguma inscrição legítima, não se verifica o direito à indenização, mas apenas ao cancelamento.

Recentemente, no julgamento do REsp 2.056.285, a Terceira Turma estabeleceu que a notificação do consumidor sobre a inscrição de seu nome em cadastro restritivo de crédito exige o envio de correspondência ao seu endereço, sendo vedada a notificação exclusiva por e-mail ou mensagem de texto de celular (SMS).

Escola do consumidor fornece cursos para a população e para fornecedores

Em funcionamento desde 2019, a Escola do Consumidor integra o Instituto de Defesa do Consumidor do Distrito Federal (Procon-DF) e ministra, gratuitamente, cursos a respeito dos direitos dos consumidores – voltados tanto para a população em geral quanto para os fornecedores.

Inicialmente, as aulas eram ofertadas apenas de maneira presencial, mas desde 2020, na pandemia da Covid-19, a instituição passou a publicar vídeos de orientação em seu canal no YouTube, bem como a oferecer cursos on-line. Os temas variam de acordo com as demandas que chegam à instituição e abordam questões como “Educação financeira”, “Formação prática ao micro e pequeno empresário” e “Introdução ao direito do consumidor”. No YouTube, o vídeo mais visualizado fala de “Parcelamento automático da fatura do cartão de crédito”.

O objetivo da escola, segundo o diretor do Procon-DF, Marcelo de Souza do Nascimento, é utilizar uma linguagem clara, de fácil acesso, para empoderar o consumidor por meio da informação. “O consumidor bem informado poderá exercer o seu direito diretamente com o fornecedor”, afirmou. 

Nascimento comentou que a questão do consumidor é transversal a diversas outras, de modo que os direitos e deveres relacionados diretamente ao consumo, muitas vezes, precisam ser abordados em conjunto com discussões mais amplas sobre cidadania, que envolvem, por exemplo, a importância do saneamento básico, os direitos das pessoas com deficiência e até mesmo a discriminação racial.

Ao todo, 2.100 alunos já participaram de alguma formação oferecida pelo Procon-DF. Atualmente, a escola também organiza cursos voltados a segmentos específicos, como o setor varejista, e possui um acordo de cooperação técnica com o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) para auxiliar os consumidores superendividados.

Fonte: STJ

O Superior Tribunal de Justiça vai encerrar o ano de 2023 com resultados positivos quanto ao trato dos recursos repetitivos, o principal instrumento que a corte possui, até o momento, para vincular as posições que adota e, dessa maneira, reduzir a recorribilidade.

19 de dezembro de 2023

Uso de repetitivos é a principal forma de o STJ construir jurisprudência vinculante

Neste ano, a corte alcançou 34 temas julgados e ao menos 59 afetados — há uma afetação ainda em julgamento, com término previsto para esta segunda-feira (18/12).

O rito dos recursos repetitivos foi estabelecido pela Lei 11.672/2008 e permitiu ao STJ fixar teses jurídicas que devem obrigatoriamente ser aplicadas pelas instâncias ordinárias para solucionar múltiplos processos com a mesma controvérsia.

Cada tese firmada significa milhares de processos que não precisarão ser reapreciados pelo STJ. Desde 2008, o tribunal afetou 1.222 temas e julgou 949 deles. Restam 89 pendentes de julgamento, sendo que a corte cancelou 184 temas.

Ministros do tribunal creditam ao uso dos repetitivos o fato de a distribuição processual não ser ainda pior do que a atual, apesar de o número de casos enviados ao STJ ter batido recorde histórico em 2023 — a expectativa é terminar o ano com 465 mil novas ações.

Essa eficiência atual se deve ao uso da inteligência artificial. Neste ano, 72% dos temas afetados aos recursos repetitivos foram identificados com ajuda de um robô, no chamado Sistema Athos.

Por meio dele, o tribunal identifica antes mesmo da triagem os processos que podem ser submetidos à afetação para julgamento sob o rito dos repetitivos.

Repetitivos para julgamento
1ª Seção42
2ª Seção14
3ª Seção23
Corte Especial13
TOTAL92

Essa identificação é feita pela Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas (Cogepac), que prepara um relatório recomendando ao relator da ação a afetação.

Se o magistrado decidir seguir a recomendação, vai submeter essa decisão ao colegiado responsável por meio de julgamento virtual. Em 2023, a Cogepac criou 116 controvérsias com potencial para serem apreciadas sob o rito dos repetitivos.

A eficiência do Athos em seu uso na afetação de temas mostra que, por mais um ano, as instâncias ordinárias não deram a devida atenção à indicação de temas pelos quais o STJ poderia firmar precedentes qualificados.

O tribunal, por meio da Cogepac, colhe indicações das cortes de segundo grau sobre controvérsias. Há ainda a possibilidade de definição de teses pelo julgamento de recursos interpostos ao STJ contra julgamentos de incidentes de resolução de demandas repetitivas (IRDRs).

Como já mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, mesmo essa ferramenta de uniformização de jurisprudência tem sido pouco utilizada pelos tribunais de segundo grau por causa de entraves legais, regimentais e práticos.

A preocupação de contar com a ajuda das instâncias ordinárias para identificar essas demandas de massa foi ressaltada pela ministra Assusete Magalhães, presidente da Cogepac, em evento sobre precedentes qualificados sediado pelo STJ em novembro.

Os dados sobre o trabalho da comissão na identificação desses temas repetitivos seguem uma alta iniciada em 2020. Desde então, mais de metade dos temas afetados foi motivada pelo trabalho interno feito com ajuda da inteligência artificial.

Presidente da Comissão Gestora de Precedentes, ministra Assusete Magalhães cobrou das instâncias ordinárias mais interesse na afetação de temas

Resultado positivo
Outro índice a ser celebrado pelo STJ é a redução do tempo entre a afetação de um recurso repetitivo e o seu efetivo julgamento.

O artigo 1.037 do Código de Processo Civil estabelece que esse prazo deve ser de, no máximo, um ano. Já a meta 7 do Conselho Nacional de Justiça é um pouco mais ousada: 365 dias entre a data da afetação e a publicação do acórdão.

O STJ vai encerrar 2023 com a média de 377,9 dias entre esses marcos temporais exigidos pelo CNJ. Esse dado aumenta graças ao período do recesso judicial. Até novembro, a marca era de 353,7 dias.

Restam 92 repetitivos a serem julgados, a maioria pela 1ª Seção, que é a campeã no uso dessa ferramenta, provavelmente graças à natureza do trabalho executado — o colegiado se dedica a temas de Direito Público, terreno fértil para demandas massificadas.

Hoje, ela é a única seção que reserva uma sessão de julgamento ao mês especificamente para estabelecer teses sob o rito dos repetitivos. Em 2023, o colegiado resolveu 19 controvérsias com julgamento de mérito.

Outro destaque vem da 3ª Seção, que historicamente era a que menos utilizava os repetitivos, uma vez que se dedica a temas criminais. Neles, a uniformização de posições é mais difícil, devido ao impacto de filigranas nas definições judiciais.

Como o recém-criado filtro da relevância não afetará os colegiados de Direito Penal, já que esses casos terão relevância presumida, fará bem à 3ª Seção fixar a maior quantidade de teses possíveis. Em 2023, foram 12.

Por outro lado, há uma queda de interesse na 2ª Seção, que faz um uso mais restrito dos repetitivos. A afetação, em regra, só ocorre quando a 3ª e a 4ª Turmas já se debruçaram sobre o assunto e estabeleceram suas posições.

Foram apenas três teses firmadas neste ano. Isso apesar de o colegiado ter a posição privilegiada de quase sempre ter a palavra final sobre as controvérsias, uma vez que muito pouco do Direito Privado pode ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal.

Por fim, a Corte Especial, que reúne os 15 ministros mais antigos do tribunal, afetou oito temas ao rito dos repetitivos e, com isso, tem 13 para julgamento. Neste ano, o colegiado não conseguiu encerrar nenhum julgamento para definição de tese.

*Por Danilo Vital

Fonte: Consultor Jurídico

A falta de registro do contrato de compra e venda de imóvel com alienação fiduciária em garantia não dá ao devedor fiduciante o direito de promover a sua rescisão por meio diverso do pactuado, nem impede o credor fiduciário de, fazendo o registro, promover a alienação do bem em leilão, para só então entregar eventual saldo remanescente ao devedor, descontadas a dívida e as despesas comprovadas.

15/12/2023

Em julgamento de embargos de divergência, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adotou o entendimento de que, ainda que o registro do contrato no competente registro de imóveis seja imprescindível à constituição da propriedade fiduciária de coisa imóvel, nos termos do artigo 23 da Lei 9.514/1997, sua ausência não retira a validade e a eficácia dos termos livre e previamente ajustados entre os contratantes, inclusive da cláusula que autoriza a alienação extrajudicial do imóvel em caso de inadimplência.

Na origem do caso, os compradores ajuizaram ação de rescisão do contrato e pediram a devolução dos valores pagos. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a sentença de procedência da ação, por desistência imotivada dos compradores, com aplicação da Súmula 543 do STJ em detrimento do procedimento previsto na Lei 9.514/1997, diante da falta de registro da alienação fiduciária. O entendimento foi mantido pela Terceira Turma do STJ.

A credora entrou com os embargos de divergência apontando que a Quarta Turma, em caso semelhante, concluiu pela desnecessidade do registro, por entender que este tem apenas o objetivo de dar ciência a terceiros.

Ausência de registro não retira validade e eficácia do contrato

O autor do voto que prevaleceu no julgamento, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, explicou que “o registro, conquanto despiciendo para conferir eficácia ao contrato de alienação fiduciária entre devedor fiduciante e credor fiduciário, é, sim, imprescindível para dar início à alienação extrajudicial do imóvel, tendo em vista que a constituição do devedor em mora e a eventual purgação desta se processa perante o oficial de registro de imóveis, nos moldes do artigo 26 da Lei 9.514/1997”.

Ao citar precedentes do tribunal, o ministro lembrou que, mesmo sem registro, já foram reconhecidas a validade da hipoteca entre os contratantes e a legitimidade do compromissário comprador para a oposição de embargos de terceiro.

Reconhecimento da validade do contrato é favorável a ambas as partes

O ministro lembrou que esse reconhecimento da validade e da eficácia do contrato de alienação fiduciária, mesmo sem o registro, favorece ambas as partes. Segundo observou, uma vez constituída a propriedade fiduciária, com o consequente desdobramento da posse, o credor perde o direito de dispor livremente do bem. Nessa hipótese, somente se houver inadimplência do devedor, e após a consolidação da propriedade, respeitado o procedimento do artigo 26 da Lei 9.514/1997, o credor poderá alienar o bem.

Cueva destacou que o registro é indispensável para dar início à alienação extrajudicial do imóvel, tendo em vista que a constituição do devedor em mora e a eventual purgação desta se processam perante o oficial do registro imobiliário, nos moldes do artigo 26 da Lei 9.514/1997.

Para o ministro, contudo, essa exigência não confere ao devedor o direito de rescindir a avença por meio diverso daquele contratualmente previsto, não importando se era dele ou do credor a obrigação de registrar o contrato, pois o credor fiduciário sempre poderá requerer tal providência ao cartório antes de dar início à alienação extrajudicial.

EREsp 1.866.844.

Fonte: STJ