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A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu afetar os Recursos Especiais 2.097.166 e 2.109.815, de relatoria do ministro Herman Benjamin, para julgamento sob o rito dos repetitivos.  

02/07/2024

A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.265 na base de dados do STJ, é definir se os honorários advocatícios devem ser fixados com base no valor da execução (artigo 85, parágrafos 2º e 3º, do Código de Processo Civil – CPC) ou por equidade (artigo 85, parágrafo 8º, do CPC), quando acolhida a exceção de pré-executividade e reconhecida a ilegitimidade de um dos coexecutados para compor o polo passivo da execução fiscal.

O colegiado determinou a suspensão dos recursos especiais e dos agravos em recurso especial que tratem da matéria, na segunda instância e no STJ.

Questão tem impacto jurídico e financeiro nas execuções fiscais

No REsp 2.097.166, representativo da controvérsia, o Estado do Paraná defende a fixação dos honorários por equidade, pois houve reconhecimento da ilegitimidade passiva de um sócio e ele foi excluído da execução fiscal; desse modo, não houve a exclusão do crédito tributário, inexistindo qualquer debate com conteúdo econômico para justificar a fixação dos honorários com base no valor da execução.

“A questão tem relevante impacto jurídico e financeiro”, disse o relator, acrescentando que “a solução irá balizar os critérios para a fixação de honorários advocatícios em inúmeras execuções fiscais semelhantes, nas quais a ilegitimidade da pessoa incluída no polo passivo da demanda seja reconhecida”.

O ministro observou que a discussão não se resolve apenas com a aplicação das teses jurídicas fixadas no Tema 1.076, uma vez que aquele julgamento não tratou da presente controvérsia, que discute se devem ser fixados honorários com base no valor da execução ou por equidade, caso a exceção de pré-executividade seja acolhida apenas para excluir o sócio do polo passivo.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O CPC regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Leia o acórdão de afetação no REsp 2.097.166.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2097166REsp 2109815

Fonte: STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a validade de uma sentença na qual o juízo falimentar decidiu acerca da prescrição intercorrente de créditos tributários em sede de habilitação de crédito.

28/06/2024

Na origem, um município pleiteou a habilitação de crédito tributário no processo de falência de uma empresa. O juízo concedeu parcialmente a habilitação e declarou a prescrição de parte dos créditos.

O tribunal de segundo grau afastou a prescrição de apenas uma das execuções fiscais e confirmou a competência do juízo falimentar para decidir quanto à exigibilidade do crédito tributário.

No recurso dirigido ao STJ, o município pleiteou o reconhecimento da incompetência do juízo falimentar, além de ter requerido que fosse afastada a prescrição e determinada a habilitação do crédito pretendido.

Sentença que reconheceu a prescrição foi anterior à vigência da Lei 14.112/2020

O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, reconheceu que há julgados da Primeira Seção –responsável por questões de direito público – sobre declaração da prescrição do crédito tributário em sede de habilitação de crédito.

Todavia, o relator destacou que a decisão que gerou o recurso em julgamento adveio de processo falimentar, e não de execução fiscal. Segundo observou, tal fato direciona a competência para as turmas de direito privado, que julgam recursos relativos à falência.

O ministro ressaltou que o artigo 7º-A da Lei 11.101/2005, introduzido pela Lei 14.112/2020, definiu expressamente a competência do juízo da execução fiscal para decidir sobre a prescrição dos créditos públicos. No entanto, ele apontou que, no caso sob análise, a sentença que reconheceu a prescrição parcial dos créditos tributários que o município pretendeu habilitar na falência foi anterior à entrada em vigor da Lei 14.112/2020, motivo pelo qual possibilitou sua análise pelo juízo falimentar.

O relator enfatizou que a fixação da competência em razão da matéria é norma de natureza processual consistente em alteração de competência absoluta, motivo pelo qual possui incidência imediata.

Todavia, o alcance da alteração legislativa, conforme reiterados precedentes do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da aplicação de norma nova que altera a competência absoluta, limita-se aos processos que ainda não possuíam sentença de mérito na época da entrada em vigor da nova lei.

REsp 2.041.563.

Fonte: STJ

A Terceira Turma do STJ decidiu que é lícito ao juiz, de ofício, converter o inventário de rito completo para arrolamento simples, desde que preenchidos os pressupostos legais. A ministra Nancy Andrighi destacou que a escolha de um rito mais complexo pode ser inadequada e prejudicial à celeridade e eficácia processual.

26 de Junho de 2024

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que, uma vez proposta a ação de inventário pelo rito solene ou completo, é lícito ao juiz, de ofício, determinar a sua conversão para o rito do arrolamento simples ou comum, desde que preenchidos os pressupostos do procedimento simplificado.

No caso dos autos, uma mulher propôs uma ação de inventário pelo rito completo, tendo o juízo de primeiro grau, em decisão interlocutória, determinado a conversão do rito do inventário para o arrolamento simples.

Após o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro confirmar a decisão de primeira instância, a autora da ação recorreu ao STJ alegando violação ao artigo 664 do Código de Processo Civil (CPC), pois, segundo ela, embora o arrolamento seja um procedimento simplificado e mais célere em relação ao de inventário, não cabe ao magistrado, de ofício, ordenar que os sucessores optem por esse procedimento.

Escolha de rito mais completo não impede reconhecimento de sua inadequação

A ministra Nancy Andrighi, relatora, destacou que, embora a legislação processual tenha superado a regra da absoluta rigidez procedimental e migrado para um modelo mais flexível, o rito continua sendo, em regra, questão diretamente relacionada à jurisdição e, como tal, de ordem pública. Dessa forma, segundo a relatora, “presentes os pressupostos previstos em lei, descabe à parte, em princípio, adotar unilateralmente procedimento distinto”.

A ministra também ressaltou que a adoção de um procedimento mais amplo e profundo do ponto de vista da análise do caso e da produção de provas, por si só, não impede que seja reconhecida a inadequação do rito escolhido pela parte, já que, ainda assim, poderá haver prejuízo às partes ou uma verdadeira incompatibilidade procedimental.

“A tramitação de uma ação em procedimento distinto daquele previsto pelo legislador está condicionada ao exame do interesse da jurisdição, verificando-se se a adoção de procedimento distinto provocará prejuízo à atividade jurisdicional, inclusive quanto à celeridade e à razoável duração do processo, e ao interesse dos réus, pois a adoção de procedimento distinto não poderá lhe causar indevidas restrições cognitivas ou probatórias”, declarou.

Utilização do rito completo não atende aos interesses da jurisdição e das demais partes

Nancy Andrighi ainda explicou que, no caso dos autos, a tramitação da ação de inventário pelo rito solene ou completo, quando cabível e adequado o rito do arrolamento simples ou comum, não atende aos interesses da jurisdição, uma vez que provocará um alongamento desnecessário do processo e uma provável prática de atos processuais que seriam dispensáveis, causando prejuízo na atividade jurisdicional.

“De outro lado, o procedimento eleito pela autora também não atende aos interesses das demais partes, pois, embora a adoção do rito mais completo não lhes cause, em princípio, restrições cognitivas ou probatórias, terão potencialmente prejuízos à solução da controvérsia em tempo razoável em decorrência do alongamento injustificado do processo”, concluiu ao negar provimento ao recurso.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

Os valores decorrentes da aplicação da taxa Selic para corrigir e remunerar tributos pagos indevidamente pelo contribuinte e devolvidos pelo Fisco devem integrar a base de cálculo de PIS e Cofins.

24 de junho de 2024

Ministro Mauro Campbell foi o relator do tema de recursos repetitivos (Lucas Pricken/STJ)

A conclusão é da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que fixou tese em julgamento na tarde da última quinta-feira (20/6). O enunciado aprovado é vinculante e precisa ser obedecido por juízes e tribunais de apelação.

O resultado apenas confirma a posição que já estava pacificada na 1ª e 2ª Turmas do STJ, que se dedicam a temas de Direito Público. A votação foi unânime, conforme posição do ministro Mauro Campbell, relator.

Renda x Receita

A controvérsia envolve os chamados indébitos tributários — valores gastos indevidamente pelo contribuinte em tributos e que precisam ser devolvidos pelo Fisco. Esses montantes são corrigidos pela taxa Selic, que embute juros e correção monetária.

Em 2021, o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional a incidência IRPJ e CSLL sobre os valores referentes à aplicação da Taxa Selic. A tese teve sua aplicação temporal modulada em 2022.

O STF entendeu que a Selic apenas recompõe as perdas sofridas no valor pago indevidamente ao Fisco. Por isso, não gera aumento da renda do contribuinte. Logo, não entram no cálculo de IRPJ e CSLL.

O STJ, por sua vez, adotou uma diferenciação importante: entendeu que essa característica não afeta o conceito de renda usado para tributar pelo IRPJ e CSLL, mas sim o de receita, em que se baseiam PIS e Cofins.

Tese

Valores de juros calculados pela taxa Selic ou outros índices recebidos em face de repetição de indébito tributário, na devolução de depósitos judiciais ou nos pagamentos efetuados decorrentes de obrigações contratuais em atraso, por se caracterizarem como receita bruta operacional, estão na base de cálculo da contribuição ao PIS/Pasep e Cofins cumulativas e, por integrarem o conceito amplo de receita bruta, estão na base de cálculo do PIS/Pasep e Cofins não cumulativas

REsp 2.065.817
REsp 2.068.697
REsp 2.075.276
REsp 2.109.512
REsp 2.116.065

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur

Ao definir se o banco que concede o financiamento para a compra de um imóvel pode ser arrastado para arcar com a dívida de condomínio feita pelo comprador, o Superior Tribunal de Justiça  pode estar incentivando uma crise quase tão grave quanto a da hipoteca, que arrasou o mercado imobiliário em 1980.

24 de junho de 2024

Penhora do imóvel para quitar dívida de condomínio terá impacto nas relações sociais e financeiras

O impacto negativo do julgamento sobre a possibilidade de penhorar um imóvel comprado com contrato com alienação fiduciária para quitar a taxa de condomínio é o principal fator levantado até agora pelo mercado. O tema será apreciado pela 2ª Seção.

Na alienação fiduciária, o banco dá o crédito para a compra do bem e se torna o proprietário. O comprador fica na posse e pode usufruir do imóvel, mas só recebe a propriedade depois de quitar as parcelas.

O imóvel, portanto, é a garantia real do financiamento. Se o devedor fiduciante não honrar as parcelas, a propriedade se consolida em favor do credor fiduciário (banco), que leva o bem a leilão para quitar a dívida e os encargos. O que sobrar — se sobrar — volta para o devedor.

Esse sistema, inaugurado pela Lei 9.514/1997, certamente será impactado se o STJ entender que o imóvel pode ser penhorado para quitar uma dívida em favor de quem não faz parte dessa relação: o condomínio.

A obrigação de pagar condomínio é propter rem (da própria coisa). A discussão é se o banco, que é proprietário da coisa, mas não usufrui dela, pode ser arrastado para essa relação.

Se isso não for possível, como ficam os condomínios, responsáveis pelo rateio das despesas e por garantir a manutenção e operação do próprio imóvel, em favor da valorização e preservação do bem?

Tamanho do problema

Essas crises são tão reais que o Judiciário ora pende para um lado, ora para outro. O STJ, responsável por uniformizar a interpretação do direito federal, também passou a divergir.

A 3ª Turma entende que não é possível penhorar o imóvel, mas apenas seu direito real de aquisição — ou seja, o direito de assumir a propriedade do bem, uma vez que a dívida seja quitada com o banco credor fiduciário.

Já a 4ª Turma diz que é possível a penhora do imóvel que originou a dívida, em razão da natureza propter rem da dívida condominial, a qual alcança tanto aquele que tem a posse (o devedor) como aquele que tem a propriedade (o banco).

Antonio Carlos Ferreira 2024

Antonio Carlos Ferreira é o relator do recurso que será julgado na 2ª Seção (Pedro França/STJ)

A 2ª Seção do STJ tem um recurso especial afetado para pacificar a questão. Relator, o ministro Antonio Carlos Ferreira promoveu audiência pública sobre o tema, ocasião em que ficou claro que caberá à corte observar bem a chance de crises.

A discussão se insere em um mercado de crédito imobiliário que, em fevereiro de 2024, tinha mais de R$ 1 trilhão de saldo, segundo dados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Esse valor representa cerca de 10% do produto interno bruto (PIB) brasileiro.

Há um evidente impacto social, já que 40% dos tomadores de crédito estão em famílias com renda de até três salários-mínimos. E afeta principalmente a Caixa Econômica Federal, hoje a principal agente do Sistema de Financiamento Habitacional (SFH), responsável por 70% do crédito imobiliário no Brasil.

Por outro lado, os condomínios por todo o país reúnem cerca de 23,5 milhões de pessoas, com faturamento anual de R$ 46 bilhões em taxas condominiais, segundo dados da Confederação Nacional do Comércio.

Levantamento da administradora BrCondos divulgado pelo Estadão mostrou que, entre janeiro de 2023 a janeiro de 2024, a média de inadimplência dessas obrigações ultrapassou 11%. Há um universo de casos em que a penhora pode ser a saída para evitar a ruína condominial.

A experiência da hipoteca

Independentemente de como o STJ definir a questão, sistema nenhum vai ruir — nem o de financiamento da habitação, muito menos o de rateio de despesas dos condomínios. Mas haverá impacto e, possivelmente, crises. E a resposta a essas crises é o mais importante.

Para os que defendem a impenhorabilidade do imóvel alienado fiduciariamente, o melhor exemplo vem da crise da hipoteca, instrumento que, até o surgimento da alienação fiduciária, era a principal garantia para o financiamento imobiliário.

Audiência Pública STJ 2ª Seção

2ª Seção do STJ promoveu audiência pública sobre o tema (Lucas Pricken/STJ)

Na hipoteca, o comprador dá o imóvel como garantia do financiamento, com o registro na matrícula junto ao cartório. Se houver inadimplência, o banco pode ajuizar a ação para requerer a propriedade do bem.

Além de ser um instrumento mais moroso e burocrático, a hipoteca ruiu no Brasil na década de 1980, em decorrência da hiperinflação e da crise que levou à extinção do Banco Nacional da Habitação (BNH), então o responsável por financiar empreendimentos imobiliários.

Em 1984, quando a inflação atingiu inimagináveis 246%, a ditadura militar percebeu que os tomadores de financiamento não conseguiriam arcar com os reajustes das parcelas e do saldo devedor. Por meio de decreto-lei, limitou a correção a 112%.

A diferença ficou para ser paga pelo Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS), criado em 1967 justamente para quitar saldos remanescentes de financiamentos imobiliários concedidos pelos mutuários do Sistema Financeiro de Habitação.

O resultado foi um rombo no FCVS que persiste até hoje. Em 1994, quando o Plano Real foi criado, era de R$ 1 bilhões. Em 2023, o jornal Valor Econômico noticiou que o governo federal buscava soluções para honrar créditos que já alcançavam R$ 92 bilhões.

Nesse cenário, a criação da garantia por alienação fiduciária renovou o financiamento imobiliário, viabilizando o retorno do capital ao mercado habitacional, tudo baseado em uma grande segurança: a garantia real representada no próprio imóvel.

Melhim Namem Chalhub

Melhim Namem Chalhub participa de audiência pública no STJ (Lucas Pricken/STJ)

Crédito mais caro

Anselmo Moreira Gonzalez, pela Febraban, destacou na audiência pública no STJ que a taxa de juros do crédito imobiliário é menor hoje porque há 20 anos a lei e o Judiciário vêm dando segurança a esse sistema. Quanto melhor é a garantia, menor o custo do capital.

“Não queremos atrair para ambiente de crédito imobiliário os problemas que vimos com a hipoteca”, disse. José Carlos Baptista Puoli, que falou pelo Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis de São Paulo (Secovi-SP) seguiu a mesma linha.

“A penhora que venha a atingir o patrimônio de quem não é devedor ou detentor da responsabilidade pelo condomínio trará problemas creditórios importantes, com a diminuição do volume de relações creditícias”, disse.

Na análise de Melhim Namem Chalhub, que representou a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), o temor é que decisões equivocadas hoje, como as da década de 1980, causem impacto negativo duradouro nesse sistema.

“Vai aumentar o custo do financiamento, porque o credor vai colocar na conta a eventualidade de ele ter que desembolsar o custo do condomínio. E, ao permitir-se isso, abre-se a porta para amanhã ou depois colocar também o IPTU ou o IPVA. E tem gente que defende isso”, disse, à revista eletrônica Consultor Jurídico.

Regina Céli Silveira Martins, pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), apontou que o banco financiador tem apenas uma forma de garantir a operação: usufruindo do imóvel como garantia real. Já os condomínios têm à disposição diversas ferramentas autorizadas pelo Judiciário e pela jurisprudência para cobrar a dívida.

Na prática, o banco sequer sabe que o devedor fiduciante está endividado, principalmente se ele estiver em dia com as parcelas do financiamento. “É justo o credor fiduciário perder sua garantia em razão de um condomínio não diligente?”, indagou. “É justo responder por um débito de condomínio de um imóvel que ele não pode usar e dispor?”, complementou.

Marco Aurélio Bellizze e Antonio Carlos Ferreira 2024

Marco Aurélio Bellizze participou da audiência pública organizad por Antonio Carlos Ferreira 2024 (Lucas Pricken/STJ)

A última chance

Para os condomínios, a penhora do próprio imóvel é mesmo a última chance, diante de devedores recalcitrantes. Principalmente porque a outra opção, de penhorar os direitos aquisitivos, é muito menos atrativa.

Roberto Garcia Merçon, que representou o Sindicato Patronal de Condomínios do Espírito Santo (Sipces), alertou que a possibilidade de penhora do bem é uma condição fundamental para evitar a inadimplência dos condôminos.

“Uma vez sabido dentro dessas comunidades de que o imóvel alienado fiduciariamente não vai ser mais passível de penhora, essa inadimplência vai crescer e muito”, disse.

O comprador em crise, ao perceber que terá que escolher para quem dever, perceberá que melhor será sacrificar o condomínio — justamente a entidade que faz o rateio das despesas, que é responsável pela imediata conservação do bem.

A melhor aposta é confiar no argumento vencedor na 4ª Turma: a obrigação de pagar o condomínio é ligada ao imóvel. Se há dois titulares de direito sobre a coisa — um com a propriedade, outro com a posse — ambos podem ser responsabilizados.

“O que é obrigação propter rem?”, indagou Marcus Vinicius Kikunaga, pela Academia Nacional de Direito Notarial e Registral (Ad Notare). “É uma obrigação de natureza mista. É aquela que surge da coisa e obriga seu titular, seja quem for. Na alienação fiduciária, temos dois titulares de direitos reais sobre a coisa”, seguiu.

Rubens Carmo Elias Filho, por sua vez, destacou que, quando o artigo 1.368-B do Código Civil diz que o credor fiduciário só responde pela taxa condominial a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem, isso não se aplica ao condomínio.

“Ela é aplicada no acertamento de contas entre credor fiduciário e devedor fiduciante. É uma regra prevista para que, no momento em que o credor consolidar a propriedade, se defina quando ele passa a pagar ou não, inclusive para consolidação da dívida.”

Rubens falou na audiência pública em nome de três entidades: Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC-SP), a Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis (ABADI) e Associação Brasileira de Empresas do Mercado Imobiliário (ABMI).

REsp 1.929.926

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, em julgamento sobre tutela antecipada antecedente, que a intimação específica do autor para aditar a petição inicial é necessária, não bastando a intimação sobre a concessão da medida. O colegiado também reforçou o entendimento de que o oferecimento de contestação – em vez de recurso – é suficiente para impedir a estabilização dos efeitos da tutela antecipada concedida em caráter antecedente.

24/06/2024

Na origem, um banco ajuizou pedido de tutela antecipada antecedente para bloquear, via BacenJud, o valor de quase R$ 620 mil em ativos do réu. O pedido foi negado em primeiro grau, mas concedido pelo tribunal estadual. O réu, porém, não foi intimado da decisão, pois ainda não havia sido incluído no processo.

Na audiência de conciliação designada em primeiro grau, o réu ofereceu contestação solicitando a extinção do processo por falta do aditamento à inicial, como prevê o artigo 303 do Código de Processo Civil (CPC) – pleito que foi concedido pelo magistrado e mantido pela corte de segundo grau.

No recurso ao STJ, o banco argumentou que a tutela concedida em caráter antecedente teria se tornado estável, já que não foi interposto recurso contra a decisão que a concedeu. Sustentou ainda que, a partir da estabilização, dada a ausência de interposição de recurso pelo réu, haveria dispensa do aditamento previsto no artigo 303, parágrafo 1º, I, do CPC – e, de todo modo, alegou não ter sido intimado para essa providência.

Precedentes do STJ esclarecem controvérsia sobre estabilização

A relatora do caso no STJ, ministra Isabel Gallotti, afirmou que há controvérsias quanto à estabilização da tutela antecipada antecedente, em razão do termo “recurso” constante no caput do artigo 304 do CPC, mas o STJ tem precedentes que elucidam o tema. A ministra citou o REsp 1.760.966, no qual a Terceira Turma fixou o entendimento de que a contestação é um meio de impugnação hábil para evitar a estabilização dos efeitos da tutela.

Segundo Gallotti, no caso em análise, foi demonstrado que o réu apresentou contestação, impedindo, assim, a estabilização dos efeitos da tutela – ficando prejudicada a tese do banco de que, diante da alegada estabilização, ele estaria dispensado de fazer o aditamento da inicial exigido pelo artigo 303, parágrafo 1º, I, do CPC.

No entanto, a relatora reconheceu que não houve intimação específica para o aditamento em primeiro grau, mas apenas a intimação, em segunda instância, da decisão concessiva da tutela antecipada, contando-se a partir daí o prazo para o autor aditar a petição inicial. Como, nessa ocasião, não foi possível intimar o réu – que ainda não tinha advogado no processo –, não se sabia se haveria a estabilização da tutela que poderia levar à extinção do processo.

Citando outro precedente da Terceira Turma (REsp 1.766.376), Gallotti comentou que os prazos do réu (para recorrer) e do autor (para aditar a inicial) não são concomitantes, mas subsequentes. Assim sendo, entendeu ser necessária a intimação específica para o início do prazo para aditamento da inicial.

Por fim, entendendo que a contestação impediu a estabilização da tutela antecipada concedida, a ministra Isabel Gallotti deu parcial provimento ao recurso especial e determinou o envio do processo à origem, para que o banco seja intimado, de forma específica, a emendar a petição inicial no prazo a ser assinalado pelo juízo.

Simples impugnação impede a estabilização da tutela antecipada deferida

O ministro Marco Buzzi, em voto-vista, acompanhou a solução dada pela relatora, mas expressou o entendimento de que não houve recurso nem propriamente contestação por parte do réu, e sim impugnação da antecipação de tutela – o que impediu a estabilização da demanda. Segundo o ministro, é inviável falar em contestação no caso, pois só após o aditamento à inicial é que o réu terá informações completas sobre a lide proposta; assim, o que houve foi mera impugnação ou simples comparecimento aos autos com uma petição superficial para afastar a pretendida estabilização.

Marco Buzzi disse que a doutrina e a jurisprudência têm admitido qualquer modalidade de defesa para a manifestação do réu contra a estabilização da tutela antecipada concedida, motivo pelo qual a impugnação do réu não tem de ser necessariamente mediante recurso.

De acordo com o ministro, não havendo a estabilização da tutela ante a impugnação do réu, passa-se a uma nova etapa processual – do procedimento provisório da tutela antecedente para o da tutela definitiva –, momento em que surge a necessidade de intimação específica do autor para promover o aditamento à inicial.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1938645

Fonte: STJ

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso da Fazenda Nacional contra decisão do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) que, confirmando a sentença de primeiro grau, dispensou a apresentação de certidões de regularidade fiscal para a homologação de um plano de recuperação judicial, bem como para a renovação d​e incentivos fiscais.

21/06/2024

De acordo com o colegiado, a partir da vigência da Lei 14.112/2020, tornou-se necessário apresentar as certidões de regularidade fiscal como requisito para a homologação do plano de recuperação judicial, nos termos dos artigos 57 da Lei 11.101/2005 e 191-A do Código Tributário Nacional. No entanto, para os processos anteriores – como o caso em julgamento –, as certidões continuam sendo dispensáveis.

Um grupo empresarial teve seu pedido de recuperação deferido pelo juízo de primeiro grau, tendo sido dispensada a apresentação de certidões de regularidade fiscal para a homologação do plano. A Fazenda Nacional contestou a dispensa, mas o TJPE entendeu que a apresentação das certidões não era um requisito indispensável para a concessão da recuperação.

Ao STJ, a Fazenda Nacional alegou que a homologação do plano de recuperação não poderia prescindir da apresentação das certidões de regularidade fiscal por parte da recuperanda.

Inovações trazidas pela Lei 14.112/2020 mudaram entendimento sobre a matéria

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso, comentou que, até a edição da Lei 14.112/2020, exigir prova de quitação de todo o passivo tributário para o acesso ao procedimento recuperacional tornaria absolutamente inócuo o instituto legal, pois as dívidas fiscais atingem normalmente valores altos, cujo pagamento costuma ser impossível para as empresas em situação de crise econômico-financeira.

Contudo, segundo o magistrado, a Lei 14.112/2020 trouxe diversas medidas para facilitar a reorganização da empresa recuperanda no tocante aos débitos tributários – entre elas, o parcelamento por dez anos.

O ministro apontou que, se a decisão que determinar a comprovação da regularidade fiscal não for atendida, a solução compatível com a disciplina legal em vigor atualmente não é a convolação da recuperação em falência. Em vez disso, deve-se suspender o processo, com a consequente descontinuidade dos efeitos favoráveis à empresa, como a suspensão das execuções contra ela.

Em processos anteriores à Lei 14.112/2020, aplica-se a jurisprudência antiga

Porém, disse o relator, nos processos anteriores à vigência da Lei 14.112/2020, deve ser aplicado o entendimento jurisprudencial da época, que não admitia a exigência de comprovação da regularidade fiscal. É o que decorre do princípio tempus regit actum (artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal e artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).

Antonio Carlos Ferreira lembrou que o artigo 52, II, da Lei 11.101/2005, em sua redação original, estabelecia que o juiz, ao deferir o processamento da recuperação, deveria determinar a dispensa da apresentação de certidões negativas para que a empresa pudesse exercer suas atividades, “exceto para contratação com o poder público ou para recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios”.

Segundo o ministro, naquele contexto legislativo, a jurisprudência do STJ se orientou no sentido de “mitigar o rigor da restrição imposta pela norma, dispensando, inclusive, a apresentação de certidões para a contratação com o poder público ou para o recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, a fim de possibilitar a preservação da unidade econômica”.

REsp 1.955.325.

Fonte: STJ

A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu alterar a data para modulação dos efeitos da tese segundo a qual o ICMS por Substituição Tributária (ICMS-ST) não compõe a base de cálculo de PIS e Cofins.

21 de junho de 2024

Ministro Gurgel de Faria alterou marco da modulação para casar com o usado pelo STF na “tese do século” (Lucas Pricken/STJ)

Nesta quarta-feira (20/6), o colegiado deu parcial provimento aos embargos de declaração no caso e retroagiu em seis anos o período a partir do qual o contribuinte poderá aproveitar a tese favorável fixada pelo colegiado.

Modular os efeitos de uma decisão significa restringir sua eficácia temporal. Ou seja, ela passa a ter efeito a partir de uma determinada data, de forma prospectiva — dali para frente —, de acordo com as especificidades de cada caso.

O marco escolhido pelo colegiado foi 15 de março de 2017, data em que o Supremo Tribunal Federal julgou a chamada “tese do século” no Tema 69 da repercussão geral — aquele em que retirou o ICMS da base de cálculo de PIS e Cofins e que também teve seus efeitos temporais modulados.

Isso significa que o ICMS-ST só pode ser excluído da base de cálculo de PIS e Cofins a partir dessa data, exceto nos casos em que o contribuinte já havia feito esse pedido administrativa ou judicialmente.

A coincidência de datas se justifica, segundo o ministro Gurgel de Faria, relator, porque há evidente identidade entre os casos. Ao decidir o caso do ICMS-ST, o STJ aplicou as mesmas razões de decidir que o STF usou para o ICMS.

A modulação é boa para o contribuinte porque aumenta em seis anos a janela temporal em que a tese pode ser plicada.

Quem pagou PIS e Cofins a mais pela indevida inclusão do ICMS-ST na base de cálculo desde março de 2017 terá, em tese, como pedir a restituição ou compensação.

O prazo prescricional para o pedido de repetição de indébito tributário é de cinco anos contados do pagamento indevido.

Bom para o contribuinte

O critério inicial usado a data de publicação da ata do julgamento da 1ª Seção no veículo oficial de imprensa, o que ocorreu em 14 de dezembro de 2023.

Esse caso marcou a primeira vez que o STJ usou a modulação temporal em casos tributários. Essa prática era restrita ao STF, mas, desde então, ganhou corpo do STJ.

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, a 1ª Seção modulou três posições tributárias e adotou três critérios diferentes, o que ligou alerta nos contribuintes e escritórios dedicados ao tema.

Com a mudança do critério de modulação dos efeitos para a tese do ICMS-ST na base de cálculo de PIS e Cofins, o cenário se mantém.

Outros dois critérios

A 1ª Seção modulou os efeitos de uma tese tributária pela segunda vez quando entendeu que as taxas de transmissão e distribuição de energia elétrica (Tusd e Tust) compõem a base de cálculo do ICMS.

O critério usado foi a data da decisão que fixou essa jurisprudência pela primeira vez. Isso ocorreu quando a 1ª Turma do STJ julgou o REsp 1.163.020, decidindo em 27 de março de 2017.

Quem obteve decisões até essa data para autorizar o recolhimento do ICMS sem essas taxas na base de cálculo pode continuar com esse privilégio até o dia de publicação do acórdão da 1ª Seção, o que ainda não ocorreu.

O terceiro critério foi usado quando o colegiado mudou de posição para considerar que o limite de 20 salários mínimos para o cálculo das contribuições parafiscais voltadas ao custeio do Sistema S deixou de existir com a edição do Decreto-Lei 2.318/1986.

O critério temporal usado nesse caso foi a data em que o colegiado começou a decidir a tese.

Isso significa que a tese não vale para as empresas que ingressaram com ação judicial e/ou protocolaram pedido administrativo até 25 de outubro de 2023, desde que tenham obtido decisão judicial ou administrativa favorável.

Essas empresas poderão continuar recolhendo as contribuições parafiscais calculadas sobre o limite de 20 salários mínimos, mas apenas até a publicação do acórdão, que ocorreu em 2 de maio de 2024.

Esse caso gera uma linha de corte mais ampla porque, quando o STJ afetou o tema ao rito dos repetitivos, em dezembro de 2020, determinou a suspensão nacional de todos os processos sobre o tema. Ou seja, judicialmente, ninguém obteve decisão favorável desde então.

REsp 1.896.678
REsp 1.958.265

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur

A decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que determinou que não basta a mera violação do dever de revelação do árbitro para anular uma sentença arbitral deu novos contornos ao instituto, que saiu do julgamento com mais autonomia, segundo especialistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico.

20 de junho de 2024

STJ decidiu que violação do dever de revelação do árbitro só gera anulação se ficar comprovada a influência na sua imparcialidade

O ponto é considerado sensível por embasar anulações de decisões proferidas em sede arbitral. Ainda que o tema não tenha se esgotado, o acórdão cerceou certas possibilidades do que os arbitralistas chamam de “anulação de bolso”  quando partes têm conhecimento de supostos conflitos envolvendo os árbitros indicados e guardam a informação para requerer nulidade em caso de derrota.

No caso analisado pela 3ª Turma, a parte derrotada na arbitragem acionou o Judiciário para alegar que houve ofensa ao dever de revelação do árbitro, previsto no artigo 14, parágrafo 1º, da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996).

O texto obriga os árbitros a revelarem, antes de assumirem o cargo, qualquer informação que possa levantar dúvida quanto à imparcialidade das suas análises.

Foram duas questões levantadas na inicial: o árbitro disse em questionário enviado pela câmara que nunca havia atuado na função anteriormente e omitiu que integrava escritório de advocacia que prestava serviços para uma empresa que depende financeiramente de uma das partes. Outro ponto citado posteriormente foi que o árbitro não informou que dividia o endereço do escritório com outra banca que atende empresa interessada.

O voto vencedor, da ministra relatora Nancy Andrighi, admitiu que houve violação do dever de revelação no caso, mas entendeu que isso não é suficiente para se anular a sentença arbitral. Essa infração tem de influenciar diretamente a imparcialidade do julgador escolhido para que haja nulidade.

Já os vencidos, ministros Humberto Martins e Moura Ribeiro, afirmaram que não cabe ao Judiciário analisar o tamanho do impacto da falha do dever de revelação. A mera desconfiança em relação ao árbitro, disseram os magistrados, já deveria respaldar anulação.

Andrighi citou expressamente que a parte derrotada na arbitragem já tinha conhecimento da violação do dever de revelação. Isso porque a omissão do árbitro foi relativa a um questionário que respondeu afirmando que não tinha experiência no ramo. Ele, no entanto, mostrou que a sua atuação em arbitragem constava em seu currículo profissional.

Nulidade e prejuízo

“A decisão do STJ está correta ao menos sob duas perspectivas. Tanto porque eventual falha no dever do árbitro de revelar não gera, necessariamente, nulidade da sentença arbitral, quanto porque reafirma o essencial posicionamento do STJ de ratificar a independência da jurisdição arbitral, mantendo no Judiciário o mero controle de legalidade nos limites postos na Lei da Arbitragem”, diz Marcelo Levitinas, sócio de Resolução de Disputas do Graça Couto Advogados.

“É exatamente isso o que preveem as Diretrizes sobre Dever de Revelação do Comitê Brasileiro de Arbitragem (‘eventual omissão não implica, necessariamente, falta de independência ou imparcialidade’, artigo 3º) e as Diretrizes sobre Conflito de Interesses da International Bar Association.”

Evelyn Barreto de Souza, professora de Direito Internacional e Resolução de Disputas da Universidade Presbiteriana Mackenzie, com ampla experiência em arbitragem, diz que o artigo que trata do tema na Lei de Arbitragem não pode “servir de subterfúgio para anulação de sentença arbitral pelo Poder Judiciário ou servir de via recursal para a parte perdedora.”

“O julgamento no STJ foi extremamente positivo para a manutenção da higidez e principalmente da segurança jurídica da arbitragem no país, vez que o objetivo magno do poder de revelação do árbitro, conforme a dicção da Lei de Arbitragem, é salvaguardar a imparcialidade e a independência do árbitro.”

Subjetivismo da parte

As hipóteses de imparcialidade do árbitro estão delineada na Lei de Arbitragem e seu suposto comprometimento não podem estar sujeitos às subjetividades das partes, diz o advogado Aluisio Berezowski, sócio do Tepedino Berezowski e Poppa Advogados.

“O dever de revelação não é um ato a ser exercido pelo árbitro em caráter “sacramental”, mas destituído de uma finalidade, de um “espírito”. Ele se presta tão somente a aferir se a sua parcialidade se torna ou não comprometida à luz dos institutos processuais do impedimento e da suspeição, previstos nos artigos 144 e 145 do CPC (aplicáveis ao árbitro porque juiz de fato e de direito)”, diz.

“Daí porque, mesmo quando se dá efetiva falta ao dever de revelação do árbitro, não há um comprometimento imediato e automático da sua imparcialidade.”

Gustavo José Mizrahi, sócio do escritório Böing Vieites Gleich Mizrahi Rei Advogados, diz que, a despeito de a decisão ter sido por maioria, “o julgamento representou um aceno da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça favorável à segurança jurídica das soluções de conflitos através da arbitragem”.

A advogada Daniela Poli, do Poli Advogados & Associados, aponta que a decisão reforça a confiança do Judiciário nas sentenças arbitrais, o que contribui para a previsibilidade e, consequentemente, para a segurança jurídica. Ela alerta, no entanto, para uma sensação de permissibilidade com pequenas omissões dos árbitros, o que pode ser interpretado como uma fragilidade do instituto.

“Pode surgir uma sensação de insegurança sobre a transparência do processo arbitral, já que omissões menores, mas ainda potencialmente significativas, não resultariam automaticamente na anulação da sentença. Isso poderia ser interpretado como uma permissividade em relação à completa abertura e transparência que se espera de um processo arbitral”, argumenta.

Poli afirma ainda que, ainda que a decisão seja norteadora para futuras discussões sobre o tema, a tendência é que haja aumento dos questionamentos para delimitar quais são os limites dessa omissão, ou seja, até que ponto a violação do dever de revelação coloca, ou não, em xeque a sentença arbitral.

“Acredito que haverá um aumento de litígios envolvendo questionamentos sobre a relevância das informações omitidas. Abre-se uma polêmica quanto à extensão da transparência e ao rigor das revelações exigidas dos árbitros. A linha entre uma omissão tolerável e uma que compromete a imparcialidade pode ser tênue e subjetiva, gerando debates contínuos e desafiando a consistência nas futuras aplicações dessa diretriz.”

  • Por Alex Tajra – repórter da revista Consultor Jurídico.
  • Fonte: Conjur

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou a incidência da prescrição em ação de busca e apreensão de bens financiados com garantia de alienação fiduciária. Para o colegiado, a prescrição da pretensão de cobrança não implica a extinção da obrigação do devedor e não impede a recuperação dos bens por parte do credor fiduciário em ação de busca e apreensão.

19/06/2024

Devido à falta de pagamento das parcelas, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) entrou com ação para recuperar as máquinas adquiridas por uma empresa agroindustrial com financiamento garantido por alienação fiduciária. Mesmo notificada, a empresa não pagou a dívida e alegou que o BNDES não poderia mais cobrá-la, devido à prescrição.

O juízo de primeira instância declarou prescrita a pretensão do banco, pois já teria transcorrido o prazo de cinco anos estabelecido no artigo 206, parágrafo 5º, I, do Código Civil. O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), por outro lado, entendeu que o prazo de cinco anos se aplica apenas à cobrança da dívida, não à busca e apreensão dos bens alienados. Para o tribunal regional, o prazo para busca e apreensão, nesse caso, é de dez anos, conforme o artigo 205 do Código Civil.

Ao STJ, a empresa devedora argumentou que a prescrição da cobrança também extinguiria o vínculo de garantia acessório – consistente na propriedade indireta dos bens pelo banco credor –, o que lhe permitiria manter o maquinário alienado.

A prescrição da pretensão não extingue a obrigação

O relator do caso no STJ, ministro Antonio Carlos Ferreira, esclareceu que o descumprimento das obrigações de um contrato de alienação fiduciária faculta ao credor ajuizar ação de cobrança, ação de execução (se houver título executivo) ou ação de busca e apreensão do bem dado em garantia. Para o ministro, se a pretensão de cobrança da dívida civil está prescrita, mas há outro instrumento jurídico não atingido pela prescrição que permite ao credor obter resultado equivalente, é seu direito buscar a satisfação do crédito.

Ao escolher a ação de busca e apreensão, o credor age na qualidade de proprietário, exercendo uma das prerrogativas conferidas pelo artigo 1.228 do Código Civil. Antonio Carlos Ferreira declarou ainda, citando precedente da Terceira Turma (REsp 844.098), que, diante da falta de pagamento, a posse do bem alienado fiduciariamente se torna injusta, o que autoriza a propositura da busca e apreensão.

No caso em análise – explicou o ministro –, o banco credor tem como objetivo principal a obtenção da posse direta dos bens, por meio da ação de busca e apreensão, nos termos do Decreto-Lei 911/1969. Nesse sentido, para o relator, a regra do artigo 206 do Código Civil é inaplicável à hipótese, uma vez que a ação não pretende cobrar dívidas constantes de instrumentos públicos ou privados, mas recuperar bens.

Ao negar provimento ao recurso, o ministro declarou que a prescrição da pretensão de cobrança não extinguiu a garantia real do contrato de alienação fiduciária. “O objeto principal do contrato é a obrigação pecuniária, e não a pretensão de cobrança, esta sim extinta pelo fluxo do prazo prescricional”, concluiu Antonio Carlos Ferreira.

REsp 1.503.485

Fonte: STJ