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O Superior Tribunal de Justiça vai reavaliar se a reclamação constitucional pode ser utilizada contra o descumprimento das teses vinculantes que fixa, por meio dos julgamentos de recursos repetitivos.

23 de setembro de 2024

STJ sede prédio

Divulgação/STJ

STJ adotou jurisprudência defensiva para evitar explosão do número de reclamações constitucionais

Previsto no artigo 102, inciso I, alínea “l”, da Constituição, a reclamação permite a preservação da competência e da autoridade das decisões dos tribunais, sempre que forem informados pelas partes de algum desrespeito ou descumprimento legal.

A posição no STJ até agora é de vetar esse uso para discutir a aplicação errada ou mesmo a não aplicação das teses vinculantes. Trata-se de jurisprudência defensiva adotada pelos colegiados.

Foi o que levou a Comissão de Jurisprudência a sugerir a edição de uma súmula sobre o tema:

A reclamação constitucional não é instrumento adequado para o controle da aplicação dos entendimetnos firmados pelo Superior Tribunal de Justiça em recursos especiais repetitivos

A proposta foi feita à Corte Especial, que reúne os 15 ministros mais antigos do STJ. Na última quarta-feira (18/9), eles deram indícios de que podem rever essa orientação.

O julgamento da súmula foi suspenso por pedido de vista da ministra Nancy Andrighi. Enquanto isso, os demais se comprometeram a selecionar processos que possam suscitar o debate, para uma reavaliação no STJ.

Distorção no sistema

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, a posição do STJ cria uma distorção no sistema: o tribunal fixa posição e exige seu cumprimento, mas abre mão de fazer qualquer tipo de controle sobre isso.

Essa postura defensiva decorre do fato de que admitir o uso da reclamação significaria receber e julgar cada descumprimento de precedente, o que aumentaria ainda mais o volume de processos.

Esse entendimento é alvo de críticas dos próprios ministros e de especialistas como o constitucionalista, Lenio Streck, colunista da ConJur, que vê uma violação da Constituição praticada pelo STJ.

Tanto é assim que o próprio Supremo Tribunal Federal aceita o uso da reclamação contra o desrespeito de suas teses firmadas em controle de constitucionalidade e com repercussão geral reconhecida.

A existência dessa classe processual é uma criação do STF, com base na doutrina dos poderes implícitos (implied powers), delineada na Suprema Corte dos Estados Unidos. Ela só passou a constar “no papel” a partir da Constituição de 1988.

Assim, o STF tem usado a reclamação até para esclarecer a extensão do conteúdo da decisão paradigma (função integrativa) e para exercer um novo juízo sobre casos já julgados.

Esse cenário é o que levou os ministros da Corte Especial do STJ a se oporem, inicialmente, à aprovação da súmula sobre o tema, apesar da jurisprudência.

Chegou o dia

A primeira a se manifestar foi a ministra Isabel Gallotti, que ponderou que “vai chegar o dia que vamos ter que ter alguma forma de exercer controle sobre a aplicação dos repetitivos”.

Uma das possibilidades citadas por ela é a de admitir a reclamação constitucional por um critério de relevância do desrespeito à tese.

“Se for uma coisa flagrantemente contrária à ratio (razão de decidir) do precedente, penso que deveria caber a reclamação, sim”, disse. “Está havendo uma aplicação totalmente distorcida dos repetitivos e nós não temos instrumento para verificar isso.”

Em seguida, o ministro Raul Araújo classificou como “paradoxal” o fato de o STJ admitir reclamação quando a decisão afronta acórdãos em recursos especiais “comuns” e, mas não quando trata de repetitivos.

Já o ministro Luis Felipe Salomão disse que passou a reavaliar o tema a partir da jurisprudência do Supremo. “Podemos, por razões defensivas, fazer o que estamos a fazer, mas sabemos que, em algum momento, isso terá que receber um reexame de nossa parte.”

Membro da comissão de jurisprudência, o ministro Sebastião Reis Júnior disse que a proposta de súmula somente aplicou a jurisprudência pacífica e ponderou que a recusa poderia abrir o caminho para o aumento de reclamações.

“Não sei se houve a diminuição desse tipo de ação. Com essa possibilidade de rediscutir o tema, acho que isso vai dar corda que a reclamação volte a ser usada”, afirmou.

*Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Fonte: Consultor Jurídico

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, decidiu que a data de vencimento dos títulos protestados deve ser inserida no banco de dados das instituições mantenedoras de cadastros de inadimplentes, como a Serasa. Segundo o colegiado, a medida ajuda a assegurar a precisão das informações e garantir o controle do prazo de manutenção dos registros negativos, que é de cinco anos a partir do vencimento da dívida, conforme o artigo 43, parágrafo 1º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

20/09/2024

O caso foi levado à Justiça por uma mulher impedida de obter crédito devido à restrição em seu nome, registrada pela Serasa com base em protesto de título. Na ação, ela argumentou que a falta de dados completos – como nome do credor, CNPJ ou CPF, endereço, tipo de título, numeração e, especialmente, data de vencimento – violava o CDC.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a sentença que julgou a ação improcedente, por entender que a falta de informações no registro poderia ser facilmente suprida com uma consulta ao cartório de protesto.

Cadastro não precisa trazer todos os dados da certidão de protesto

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso no STJ, observou que, de acordo com o CDC, a Lei do Cadastro Positivo e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, as informações constantes no cadastro de proteção ao crédito devem ser objetivas, claras, verdadeiras e de fácil compreensão.

Apesar disso, o ministro destacou que a administradora do cadastro não tem a obrigação de inserir no seu banco de dados todas as informações da certidão de protesto do título, uma vez que a publicidade dos dados presentes no título de crédito protestado cabe ao tabelião (artigos 2º, 3º e 27 da Lei 9.492/1997).

Segundo o relator, a função do tabelionato de protesto não se confunde com a da entidade mantenedora do cadastro de inadimplentes, à qual compete apenas, após prévia notificação do devedor, manter o banco de dados atualizado a fim de subsidiar a concessão de crédito.

Inclusão do vencimento do título protege direito do consumidor

Antonio Carlos Ferreira também ressaltou que, conforme a Lei do Cadastro Positivo (Lei 12.414/2011), o banco de dados deve conter informações úteis para a análise de risco financeiro, tanto as negativas quanto as positivas. No entanto, ele explicou que a maior parte dos dados reclamados pela recorrente não tem relação direta com a análise de risco de crédito e poderia ser obtida diretamente no tabelionato.

Por outro lado, o ministro ponderou que a data de vencimento do título, considerada essencial na análise de risco de crédito, deve constar obrigatoriamente no banco de dados de inadimplentes. “Essa prática tem por finalidade salvaguardar os direitos dos consumidores, assegurando que dados desatualizados não comprometam seu acesso ao crédito por um período excessivamente prolongado”, concluiu o relator ao dar provimento parcial ao recurso.

REsp 2.095.414.

Fonte: STJ

STJ reafirma necessidade de comprovação de esforço comum para partilha de bens adquiridos antes da Lei da União Estável

19 Setembro de 2024

Reprodução Pixabay

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou um importante entendimento para a partilha de bens em uniões estáveis. Em recente decisão, a Corte determinou que, mesmo para bens adquiridos antes da promulgação da Lei nº 9.278/1996, é possível que o patrimônio acumulado durante a união estável seja partilhado, desde que haja comprovação do esforço comum entre as partes envolvidas. A decisão alinha-se ao entendimento já estabelecido pela Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal.

De forma geral, os bens adquiridos antes da união estável não são comunicados na partilha, permanecendo na propriedade individual de cada um dos companheiros. 

No entanto, há algumas situações em que a partilha pode ser diferente, como: 

Quando um dos companheiros entra na união estável com um bem financiado e o outro ajuda nos pagamentos, a partilha é proporcional à quantia paga pelo outro. 

Quando um carro comprado antes da união é usado para complementar a compra de um imóvel durante a união, o imóvel não é partilhado de forma igual.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, a escritura pública lavrada posteriormente não retroage para estabelecer o regime de comunhão parcial, a menos que seja demonstrada a efetiva prova do esforço comum. “É crucial compreender que, nos casos anteriores à Lei, a responsabilidade de provar o esforço conjunto recai sobre o autor da ação”, ressalta Franco Mauro Brugioni, do Raeffray Brugioni Advogados.

Com a entrada em vigor da Lei nº 9.278/1996, a presunção absoluta do esforço comum passou a ser aplicada automaticamente aos casos de partilha de bens. “Essa decisão do STJ reforça a importância de uma gestão patrimonial cuidadosa e um planejamento sucessório bem estruturado, especialmente em contextos de união estável”, complementa Franco Brugioni, do Raeffray Brugioni Advogados.

*Por Gabriela Romão

Fonte: Jornal Jurid

Para haver a desconsideração da personalidade jurídica e a extensão da falência, é preciso que seja demonstrado de que forma foram transferidos recursos de uma empresa para outra, ou comprovar abuso ou desvio da finalidade da empresa em relação à qual se pede a desconsideração, a partir de fatos concretamente ocorridos em detrimento da pessoa jurídica prejudicada.

18/09/2024

Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) cassou os efeitos da extensão da falência decretada contra três empresas, cujos bens foram atingidos no processo falimentar de uma companhia têxtil com a qual mantinham relação econômica.

A companhia teve sua falência decretada em 2009 e, em 2010, foi instaurado incidente de extensão da quebra contra outras três empresas, sob a alegação de que o grupo econômico teria maquiado relações comerciais, motivo pelo qual deveriam ser atingidos os bens das pessoas jurídicas coligadas.

Em recurso ao STJ, as empresas alegaram que não teriam sido apontados os requisitos do artigo 50 do Código Civil para a desconsideração da personalidade jurídica das empresas recorrentes e para a consequente extensão dos efeitos da falência.

Necessidade de provas de confusão patrimonial ou de desvio de finalidade

Segundo a relatora, ministra Isabel Gallotti, para desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa é necessário verificar se existe confusão patrimonial com a falida ou desvio de finalidade. A ministra observou que, no caso em julgamento, foi feita perícia com o objetivo de apurar “eventual concentração de prejuízos e endividamento exclusivo em apenas uma, ou algumas, das empresas participantes falidas”.

Embora tais hipóteses não tenham sido provadas pela perícia, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) manteve a extensão da falência, com base na descrição que o laudo pericial fez das “transações estabelecidas entre as sociedades empresárias, desde o repasse da matéria prima até a venda do produto industrializado”.

Requisitos para estender a responsabilidade pelas obrigações da empresa falida

Para a relatora, contudo, essa relação das empresas não permite concluir pela existência dos elementos necessários à desconsideração da personalidade jurídica e à extensão da falência. “O tipo de relação comercial ou societária travada entre as empresas, ou mesmo a existência de grupo econômico, por si só, não é suficiente para ensejar a desconsideração da personalidade jurídica. Igualmente não é relevante para tal finalidade perquirir se as empresas recorrentes agiram com a intenção de ajudar a falida ou com o objetivo de lucro”, disse.

A ministra ponderou que a extensão da responsabilidade pelas obrigações da falida às empresas que nela fizeram investimentos dependeria de “eventual concentração de prejuízos e endividamento exclusivo em apenas uma, ou algumas, das empresas participantes falidas” – o que não foi comprovado pela perícia.

Na avaliação de Gallotti, a afirmação genérica de que os custos e riscos ficavam exclusivamente com a falida e os lucros com as demais empresas não é amparada em nenhum elemento de prova do processo, assim como não ficou demonstrada de forma objetiva a confusão patrimonial.

Leia o acórdão no REsp 1.897.356.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1897356REsp 1900147REsp 1900147

Fonte: STJ

O legítimo proprietário de um imóvel tem o direito de reivindicá-lo, em detrimento do terceiro adquirente de boa-fé, caso o registro na matrícula tenha sido cancelado por estar amparado em escritura pública inexistente.

16/09/2024

Esse entendimento levou a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a negar provimento ao recurso especial de uma empresa que, após adquirir um imóvel com base em escritura pública de compra e venda falsa, buscava ficar com o bem invocando a proteção conferida ao terceiro adquirente de boa-fé, prevista no artigo 54, parágrafo 1º, da Lei 13.097/2015.

“Essa norma, contudo, não regulamenta especificamente as consequências jurídicas na hipótese de ocorrer o cancelamento do registro anterior, situação tratada expressamente no artigo 1.247 do Código Civil (CC), que não foi revogado pela referida Lei 13.097/2015 e permanece vigente”, destacou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi.

A discussão teve origem quando o espólio do legítimo proprietário ajuizou ação para provar que o imóvel nunca foi vendido ao réu e que a suposta escritura de compra e venda registrada anos mais tarde seria falsa. Posteriormente, o bem foi vendido a uma empresa, que reivindicou o direito de ficar com ele por ter adotado todas as cautelas necessárias ao comprá-lo.

As instâncias ordinárias declararam a inexistência da escritura pública, sendo nulas as operações de compra e venda. Aplicando o artigo 1.247, parágrafo único, do CC, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afirmou que o cancelamento do registro de título aquisitivo dá ao proprietário o direito de reivindicação, independentemente da boa-fé e do título do terceiro adquirente.

Lei 13.097/2015 não regula cancelamento de registro anterior de imóvel

Nancy Andrighi observou que os registros públicos buscam garantir a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos, como previsto no artigo 1º da Lei 6.015/1973. No entanto – continuou –, se isso não ocorrer, o artigo 1.247 do CC permite a retificação ou a anulação do ato.

“Conforme o parágrafo único desse dispositivo, ‘cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente’. A presente hipótese se amolda ao artigo 1.247 do CC, tendo em vista que o registro na matrícula do imóvel não exprimia a verdade”, analisou a ministra.

Quanto à aplicação do artigo 54, parágrafo 1º, da Lei 13.097/2015, Nancy Andrighi lembrou que esse normativo aborda diversos temas, incluindo questões envolvendo registros na matrícula dos imóveis e a proteção do adquirente de boa-fé. Porém, alertou a relatora, ele não regulamenta especificamente as consequências jurídicas do cancelamento do registro anterior, situação que é tratada no artigo 1.247 do CC.

“O objetivo do artigo 54 da Lei 13.097/2015 foi homenagear o princípio da concentração de dados na matrícula do imóvel, de modo a retirar do adquirente o ônus de diligenciar por eventuais ações, assegurando a sua posição de boa-fé por ter confiado no registro, não podendo a ele serem opostos eventuais direitos que interessados tinham sobre o imóvel, mas não registraram”, detalhou.

Código Civil apresenta solução equilibrada para conflito de interesses

Segundo a ministra, apesar de o caso trazer o conflito de interesses legítimos de partes que confiaram no registro do imóvel, o proprietário jamais poderia imaginar que perderia a sua propriedade por meio da simples apresentação de uma escritura fraudulenta em cartório. “Não por outro motivo que o CC regulamenta essa problemática de forma específica e equilibrada, protegendo, em um primeiro momento, o legítimo proprietário, e, após, o adquirente de boa-fé”, concluiu a relatora.

Por fim, Nancy Andrighi salientou que o adquirente de boa-fé pode pleitear indenização por perdas e danos contra o réu do processo, que lhe vendeu o imóvel de forma indevida.

REsp 2.115.178.

Fonte: STJ

12/09/2024

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), especializada em direito público, aprovou dois novos enunciados sumulares na sessão desta quarta-feira (11).

As súmulas são resumos de entendimentos consolidados nos julgamentos e servem para a orientação da comunidade jurídica a respeito da jurisprudência do tribunal. Os enunciados serão publicados no Diário da Justiça Eletrônico, por três vezes, em datas próximas, nos termos do artigo 123 do Regimento Interno do STJ.

Confira as novas súmulas:

Súmula 672 – A alteração da capitulação legal da conduta do servidor, por si só, não enseja a nulidade do processo administrativo disciplinar.

Súmula 673 – A comprovação da regular notificação do executado para o pagamento da dívida de anuidade de conselhos de classe ou, em caso de recurso, o esgotamento das instâncias administrativas são requisitos indispensáveis à constituição e execução do crédito.

Fonte: STJ

Por maioria de votos, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça admitiu o uso de ação rescisória para adequar um acórdão à posição que apenas hoje vigora sobre o cabimento de honorários de sucumbência.

12 de setembro de 2024

Foto: Lucas Pricken / STJ

Voto do ministro Moura Ribeiro defendeu que aplicação da Súmula 343 do STF seja sopesada para evitar desigualdades

A decisão é relevante porque deixa de aplicar uma jurisprudência consolidada no sentido de que não cabe rescisória com base em precedente posterior ao trânsito em julgado da decisão questionada.

Essa posição tem origem em entendimento do Supremo Tribunal Federal, consolidada na Súmula 343, e trata dos casos em que a rescisão tem como base a ofensa literal ao que está disposto na lei.

A ideia é que não existe esta ofensa se a sua interpretação ainda é controversa nos tribunais. Isso evita que mudanças jurisprudenciais levem à revisão de casos que já têm decisão definitiva.

Na ocasião, a 3ª Turma do STJ passou por cima dessa ideia para afastar a incidência de honorários advocatícios sob a justificativa de evitar ofensa aos princípios da isonomia e da igualdade.

Venceu a posição do relator, ministro Moura Ribeiro. Formaram a maioria os ministros Nancy Andrighi e Humberto Martins.

Prescrição intercorrente

O caso trata de uma execução de título extrajudicial ajuizada pelo Itaú e que foi alvo de exceção de pré-executividade — o instrumento por meio do qual a pessoa pode informar ao Judiciário que está sendo erroneamente cobrado por uma dívida.

A execução acabou extinta pelo reconhecimento da prescrição intercorrente — ou seja, o processo ficou parado por tempo suficiente para a parte autora perder o direito de pedir o pagamento da dívida.

A extinção ocorreu em 2018, época em que a jurisprudência do STJ ainda discutia se, nesses casos, o exequente deve pagar honorários advocatícios em virtude do acolhimento da exceção de pré-executividade. Havia decisões em sentidos opostos.

Assim, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul entendeu que caberiam os honorários. O acórdão transitou em julgado e gerou cumprimento de sentença, em que o juiz homologou os cálculos fixando a verba em R$ 6 milhões.

Diante da exorbitância do valor, o Itaú pediu a rescisão do acórdão, alegando que o devedor foi quem deu causa à instauração e à extinção da execução, devido à ausência de bens penhoráveis. Portanto, não caberia a condenação.

Isonomia e igualdade

Relator, o ministro Moura Ribeiro reconheceu que a posição do TJ-RS era admitida pela jurisprudência do STJ. Foi apenas depois disso que consolidou-se o posicionamento de afastar a sucumbência quando a execução é extinta devido à prescrição intercorrente.

Ainda assim, ele afastou a aplicação da Súmula 343 do STF. Para o ministro, essa antiga diretriz precisa ser devidamente entendida e sopesada, pois sua aplicação automática é uma afronta aos princípios da isonomia e da legalidade.

“Obviamente que isso não significa, em absoluto, que as decisões transitadas em julgado que se tenham baseado em orientação diferente da atual, percam automaticamente sua validade”, ponderou o relator.

“Mas é certo também que, em determinados casos especiais, a alteração fundamental do entendimento torna imperiosa a rescindibilidade, para que não reste ofendido o princípio da isonomia, pois a coerência é imprescindível para que a igualdade não seja violada”, disse.

Condenação afastada

A superação da Súmula 343 fez o ministro Moura Ribeiro a afastar a condenação e o pagamento de R$ 6 milhões em honorários de sucumbência.

Isso porque o reconhecimento da prescrição intercorrente faz com que a execução não tenha vencedor, nem vencido. Nenhum direito foi declarado em favor do devedor. Houve apenas a perda do objeto da demanda.

“Se o esvaziamento de objeto ocorre por um fato não imputável ao autor, não há lógica nem justificativa para que se lhe sejam carreados os ônus dos honorários advocatícios”, defendeu o relator.

O voto ainda contesta a base de cálculo usada pelo TJ-RS para arbitrar os honorários: 10% sobre o proveito econômico obtido, consistente no valor da dívida que estava sendo cobrada pelo banco.

“No caso, não houve condenação e também, em verdade, não foi ‘obtido’ nenhum proveito econômico, porque o reconhecimento da prescrição na prática nada mais propiciou ao devedor. Por ela, ele nada ganhou, mas apenas deixou de pagar o que por direito devia.”

Súmula 343

Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, acompanhado pelo ministro Marco Aurélio Bellizze. Eles votaram por aplicar a Súmula 343 do STJ para julgar improcedente a ação rescisória.

“Perscrutando a jurisprudência daquela corte, o tribunal local concluiu que a matéria era controvertida à época da prolação da decisão rescindenda, citando, a propósito, diversos precedentes”, ressaltou.


REsp 2.148.566

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que, no contrato de seguro sobre a vida de terceiro, a morte do segurado causada por ato ilícito do contratante impede o recebimento da indenização securitária pelos demais beneficiários do seguro.

11/09/2024

“O indivíduo que contrata um seguro sobre a vida de outrem com a intenção de ceifar a vida do segurado e, por conseguinte, obter a indenização securitária, além de buscar a garantia de interesse ilegítimo, age, de forma deliberada, com a intenção de prejudicar outrem. A ausência de interesse na preservação da vida do segurado acarreta a nulidade do contrato de seguro por violação ao disposto nos artigos 757762 e 790 do Código Civil (CC)”, afirmou a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi.

Para o TJPR, nulidade alcançaria apenas o beneficiário que praticou a conduta ilícita

Uma mulher contratou um seguro cujo objeto era a vida do seu marido, tendo como beneficiários ela própria e os filhos. Cerca de seis meses após a contratação, o segurado foi morto. Acusada de ser a mandante do crime, a esposa foi condenada pela prática de homicídio duplamente qualificado. Constatou-se no processo penal que o crime foi motivado pela intenção de obter a indenização securitária.

Os filhos do segurado, então, ajuizaram ação de cobrança contra a seguradora, com o objetivo de receber o pagamento do seguro. O pedido foi negado em primeiro grau, mas o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) entendeu que o contrato deveria ser considerado nulo apenas em relação ao beneficiário que praticou a conduta ilícita, permanecendo válido quanto aos demais, de acordo com o artigo 792 do CC.

No recurso ao STJ, a seguradora alegou que a nulidade prevista no artigo 762 do CC é absoluta e torna o contrato inválido para todos os fins.

Contrato deve ter por objeto a garantia de um interesse legítimo do segurado

A ministra Nancy Andrighi observou que, no seguro sobre a vida de outra pessoa, o segurado é o portador do risco de morte, mas não participa da contratação, enquanto o contratante é quem celebra o contrato, assumindo todas as obrigações e adquirindo a qualidade de beneficiário do seguro, por ser titular do interesse garantido.

Segundo a relatora, esse tipo de contrato de seguro tem por objeto a garantia de um interesse legítimo do segurado, de modo que será nulo o contrato quando o contratante tiver a intenção de prejudicar o segurado por meio de ação ou omissão.

“Com o propósito de evitar a contratação dessa modalidade de seguro para fins espúrios, o artigo 790 do CC estabelece que, no seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a declarar, sob pena de falsidade, o seu interesse pela preservação da vida do segurado, sendo presumido tal interesse, até prova em contrário, quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do proponente”, declarou.

É nulo o negócio jurídico quando a lei proíbe sua prática sem lhe cominar sanção

Nancy Andrighi destacou que, embora a legislação seja omissa quanto à consequência da ausência de interesse na preservação da vida do segurado, deve ser aplicado o disposto no artigo 166, inciso VII, do CC, o qual estabelece ser nulo o negócio jurídico quando a lei proibir a sua prática sem lhe cominar sanção.

Segundo a ministra, ante a gravidade do vício de nulidade existente no contrato, ele não pode produzir qualquer efeito jurídico. “Logo, ainda que haja outros beneficiários do seguro além do autor do ato ilícito, eles não receberão a indenização securitária”, concluiu.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

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A legislação brasileira permite que pessoas jurídicas – assim como acontece com as pessoas físicas – sejam consideradas consumidoras. É o que diz o artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), ao prever – adotando a chamada teoria finalista – que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.

09/09/2024

Segundo explicou a ministra Nancy Andrighi no julgamento do REsp 2.020.811, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) adota a teoria finalista mitigada – ou aprofundada – para a definição de consumidor. Dessa forma, disse, o conceito abrange também o comprador que, embora não seja o destinatário final do produto ou serviço (no sentido de encerrar a cadeia de produção), se enquadre em condição de vulnerabilidade capaz de causar desequilíbrio na relação econômica.

Assim, o sistema protetivo do CDC pode ser aplicado no caso de quem, mesmo adquirindo produtos ou serviços para o desenvolvimento de sua atividade empresarial, apresente hipossuficiência técnica ou fática diante do fornecedor. A dificuldade surge na hora de reconhecer a vulnerabilidade: enquanto para o consumidor pessoa física ela é presumida, no caso da pessoa jurídica é necessário comprovar essa condição especial que autoriza a aplicação das regras protetivas do CDC – avaliação que, conforme a jurisprudência do tribunal, deve ser feita de acordo com o caso concreto.

Esta reportagem apresenta situações em que o STJ teve de decidir sobre o enquadramento de pessoas jurídicas, especialmente de empresas, na posição de consumidoras, apontando em cada caso as razões pelas quais a corte entendeu estar configurada – ou não – a condição que justifica a incidência do CDC.

Aquisições para desenvolvimento de atividade econômica

No julgamento do REsp 2.020.811 uma empresa vendedora de ingressos eletrônicos para eventos ajuizou ação de cobrança contra uma sociedade especializada em serviços de intermediação de pagamentos online, em razão de débitos que teriam sido lançados indevidamente em sua conta.

A autora da ação alegou que o vínculo estabelecido com a intermediadora configuraria uma relação de consumo, sustentando a sua hipossuficiência fática diante da outra parte – uma empresa com atuação virtual em mais de 50 países –, e que o contrato celebrado entre elas seria de adesão.

A Terceira Turma, entretanto, entendeu que não ficou demonstrada a situação de vulnerabilidade, indispensável para o reconhecimento da condição de consumidor quando o produto ou serviço é adquirido durante o desenvolvimento de atividade empresarial, como no caso em análise.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, ressaltou que cabe ao adquirente do produto ou do serviço comprovar sua vulnerabilidade perante o fornecedor, caso pretenda a incidência das normas do CDC.

O serviço adquirido é bem de consumo ou insumo?

Entendimento semelhante foi adotado pela Quarta Turma ao julgar o REsp 1.497.574, em que se decidiu pela não aplicação do CDC aos contratos de empréstimo firmados por uma sociedade empresária para incrementar seus negócios.

O caso se referia a uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público de Santa Catarina contra o Banco do Estado do Rio Grande do Sul para discutir cláusulas e encargos bancários supostamente abusivos nos contratos celebrados com os clientes.

Para a Quarta Turma, as instâncias originárias aplicaram o CDC sem fazer a necessária distinção quanto à natureza das contratações entre as partes – se de insumo ou consumo. Dessa forma, o colegiado reformou a decisão do tribunal estadual para limitar a aplicação do CDC aos casos em que fosse constatada a existência de relação de consumo.

A decisão reafirmou a jurisprudência do STJ, que não admite a aplicação do CDC nos contratos de empréstimo tomados por empresas quando elas são consideradas consumidoras intermediárias (insumo), somente sendo possível a mitigação dessa regra na hipótese em que ficar demonstrada a hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica da tomadora.

Características do negócio podem impedir a incidência do CDC

Em outras situações, é a própria natureza do negócio que pode impedir a incidência do CDC. No julgamento do REsp 2.001.086, a Terceira Turma decidiu pela inaplicabilidade do código a um contrato de empréstimo de capital de giro.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que não se pode falar em incidência da lei consumerista nos contratos bancários celebrados por pessoa jurídica para obtenção de capital de giro, já que, conforme a orientação consolidada no STJ, nesses casos a empresa não é considerada a destinatária final do serviço.

Além disso, no caso, não houve demonstração de vulnerabilidade técnica, jurídica, fática e/ou informacional da empresa. De acordo com a ministra, a mera condição de microempresa não basta para que seja entendida como vulnerável.

Existência de relação de consumo afeta competência para julgamento da demanda

Já no julgamento do AREsp 1.321.083, de relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido), a Terceira Turma estabeleceu que uma empresa que adquiriu aeronave como destinatária final pode ser considerada consumidora. A decisão definiu, por consequência, o foro competente para processamento e julgamento da demanda.

Uma empresa que se dedicava à administração de imóveis ajuizou ação em Curitiba para rescindir o contrato da compra de um avião, em razão de suposto inadimplemento contratual da vendedora – cuja sede é em Belo Horizonte –, pedindo a devolução dos valores pagos.  

A vendedora alegou incompetência do juízo. Segundo ela, a compradora se valeu da prerrogativa prevista no artigo 101, inciso I, do CDC, que permite o ajuizamento da ação no domicílio do consumidor, mas a relação entre as empresas teria caráter paritário. Desse modo, sem haver relação de consumo, não seria possível ajuizar a ação em outra comarca que não aquela indicada pela regra geral de competências do Código de Processo Civil (CPC).

Os argumentos da vendedora não foram acolhidos nas instâncias ordinárias nem na decisão monocrática do ministro Sanseverino. Em recurso à Terceira Turma, a vendedora defendeu que a aeronave teria sido adquirida para incrementar os negócios da compradora e que esta não seria hipossuficiente, circunstâncias que afastariam a aplicação da legislação consumerista.

O colegiado, entretanto, de forma unânime, decidiu pela aplicação das regras do CDC ao caso. Em voto-vista no qual acompanhou integralmente o relator, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva esclareceu que a aeronave foi adquirida para atender a uma necessidade da própria pessoa jurídica, não integrando diretamente produto ou serviço postos à disposição do mercado por ela, motivo pelo qual se aplicariam à relação as normas da lei consumerista.

Relações de consumo na contratação de seguros

A Terceira Turma, ao julgar o REsp 1.660.164, de relatoria do ministro Marco Aurélio Bellizze, decidiu que a pessoa jurídica que firma contrato com o objetivo de proteger seu patrimônio é considerada destinatária final dos serviços securitários e, por isso, aplicam-se a seu favor as disposições do CDC.

No caso julgado, uma empresa teve um de seus caminhões segurados destruído por incêndio iniciado por uma fagulha de descarga de energia durante a operação de transferência de produto inflamável. A seguradora alegou que a hipótese estava prevista nas cláusulas de exclusão de cobertura, ao passo que a segurada sustentou que a cláusula excludente de cobertura não estava incluída na minuta encaminhada pela seguradora no momento da contratação.

Apesar de ter sido acolhida em primeira e segunda instâncias, a argumentação da seguradora foi rejeitada pelo ministro Bellizze, relator do caso no STJ. Ao analisar os princípios do CDC, como o da transparência, o relator lembrou que o fornecedor tem obrigação de dar ao consumidor conhecimento sobre o conteúdo do contrato, sob pena de não haver a sua vinculação ao cumprimento do que foi acordado.

Entendimento parecido foi adotado pela Quarta Turma no AREsp 1.392.636, decorrente de ação indenizatória movida por uma instituição de ensino superior contra a seguradora devido à recusa de cobertura de sinistro.

A universidade privada acionou o seguro depois que chuvas e ventos fortes danificaram a estrutura física do estabelecimento. Na ocasião, a seguradora alegou não haver previsão de cobertura para a hipótese de rajadas de vento cuja velocidade fosse inferior àquela que caracteriza um vendaval, como no caso, o que impediria o pagamento da indenização.

O relator, ministro Raul Araújo, com base no acórdão do tribunal estadual, destacou que, independentemente da velocidade medida pela estação meteorológica, a tempestade efetivamente causou danos ao imóvel. Segundo ele, a cláusula que estipula velocidade mínima para haver indenização configura desvantagem excessiva ao segurado.

Assim, o colegiado reforçou o entendimento de que uma empresa que firma contrato de seguro visando à proteção de seu próprio patrimônio pode ser considerada destinatária final dos serviços securitários.

Cobertura securitária deve estar claramente descrita no contrato

A Quarta Turma decidiu, ao julgar o REsp 1.176.019, que o transportador que contrata seguro para proteger sua frota ou cobrir danos a terceiros também é consumidor. O colegiado destacou, no entanto, que a abrangência da cobertura securitária deve estar claramente descrita no contrato.

No caso em análise, durante a vigência do contrato de seguro, um dos veículos de uma transportadora colidiu com um caminhão pertencente a pessoa física. Após o trâmite de demanda indenizatória, a empresa foi condenada ao pagamento de lucros cessantes e despesas com advogado e preposto. A transportadora, então, ajuizou ação indenizatória contra a seguradora para pedir o reembolso dos valores pagos.

Tanto o juízo de primeira instância quanto o tribunal estadual julgaram o pedido improcedente, fundamentando-se na inexistência de cobertura para a hipótese de colisão com veículo particular, descabendo, portanto, a condenação da seguradora ao pagamento de lucros cessantes relativos a terceiro prejudicado.

Em seu voto, o relator do recurso no STJ, ministro Luis Felipe Salomão, reconheceu a condição de consumidora da empresa, esclarecendo que a transportadora que contrata seguro objetivando a proteção de sua frota veicular ou contra danos causados a terceiros, em regra, enquadra-se no conceito de consumidor, pois é destinatária final do produto.

Apesar de estar configurada a relação de consumo no caso concreto, a cláusula contratual em torno da qual as partes litigavam limitava a cobertura de lucros cessantes a categorias profissionais específicas, como táxis, lotações, vans escolares regulamentadas e motoboys, não incluindo o ressarcimento a pessoa física dona de caminhão. Por isso, o colegiado negou provimento ao recurso.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2020811REsp 1497574REsp 2001086AREsp 1321083REsp 1660164AREsp 1392636REsp 1176019

Fonte: STJ

O fato de o crédito somente poder ser exigido pelo novo credor após o pedido de recuperação judicial não altera sua classificação como concursal. Assim, ele se submete aos efeitos do processo de soerguimento

6 de setembro de 2024

Marcelo Camargo/Agência Brasil

Caso teve início em ação trabalhista contra construtora contratada por prefeitura

Essa conclusão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso especial de uma construtora que, em recuperação judicial, é cobrada por um crédito trabalhista pago pelo município de Sorocaba.

O resultado do julgamento confirma a forma como o colegiado trata os casos em que a dívida da empresa em recuperação é alvo de sub-rogação — a transferência dos direitos do credor para aquele que quitou a obrigação ou emprestou o necessário para a quitação.

Se o crédito tem origem em período anterior ao pedido de recuperação judicial do devedor, ele se submete aos efeitos do processo. Esse é o marco temporal eleito pelo artigo 49 da Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei 11.101/2005).

Ou seja, o crédito entrará em uma fila para pagamento e poderá sofrer deságio de acordo com o plano aprovado pelos credores. Isso acontecerá ainda que esse crédito só se torne exigível em momento posterior ao pedido da recuperação.

“Se o credor originário tinha um crédito submetido aos efeitos da recuperação judicial, é isso o que ele tem a transferir ao sub-rogado. Não se trata de uma característica ligada à pessoa do sujeito sucedido, ou ao momento do pagamento, mas ao próprio direito de crédito, que é repassado com seus defeitos e qualidades”, resumiu o relator da matéria, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

Esse entendimento foi o mesmo usado pela 3ª Turma do STJ recentemente para concluir que a fiança bancária contratada pelo devedor antes da recuperação a ela se submete mesmo se o crédito surgiu depois.

Crédito trabalhista

No caso julgado, o crédito sub-rogado decorre de uma reclamação trabalhista ajuizada por um trabalhador que foi contratado pela construtora para prestar um serviço acertado com a prefeitura de Sorocaba (SP).

A ação foi ajuizada contra o ente público, que se viu obrigado a pagar R$ 21,8 mil de indenização pelo desrespeito às normas trabalhistas praticado pela construtora em período anterior ao pedido de recuperação judicial.

Depois de quitar a obrigação com o trabalhador, o município ajuizou ação de regresso para cobrar o valor da construtora, que já estava em recuperação, e obteve decisão favorável nas instâncias ordinárias.

A empresa, então, recorreu ao STJ sustentando que essa obrigação deve se submeter à recuperação judicial, pois o fato gerador é anterior ao pedido.

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva deu razão à empresa ao destacar que o fato de os créditos não estarem vencidos — e, portanto, serem inexigíveis — não afasta sua sujeição à recuperação judicial.

“Até mesmo créditos ilíquidos estão sujeitos à recuperação. Assim, a data relevante é a do fato gerador, na hipótese, a da prestação do serviço, e não a da sentença trabalhista ou do pagamento que gerou a sub-rogação”, disse o magistrado.

Assim, se a dívida originária é anterior ao pedido, o crédito está submetido aos efeitos da recuperação judicial, não importando a data em que se tornou exigível.

Não existe credor sem crédito

A votação na 3ª Turma foi por maioria, encampada pelos ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Humberto Martins. Abriu a divergência e ficou vencida a ministra Nancy Andrighi.

Para ela, tratando-se de obrigação que surgiu a partir da condenação imposta pela Justiça do Trabalho, o município somente se tornará credor do responsável principal (a empresa) se e quando vier a promover o pagamento da dívida não adimplida por ele.

Assim, o crédito do município só surgiu depois de, condenado subsidiariamente na ação trabalhista, ter quitado o valor. E esse é o momento que deve ser observado para se concluir se há submissão à recuperação judicial.

“A condição de credor somente pode ser atribuída a alguém a partir do momento em que esse alguém seja titular de um crédito em face de outrem. Não existe credor se não existir crédito em seu favor”, defendeu a ministra em voto-vista.

Se o fato gerador do crédito em questão foi o pagamento efetuado pela condenação trabalhista, em razão da inércia da construtora em quitar a obrigação, esse deve ser o momento para avaliar se ele se submete à recuperação.

“Portanto, tratando-se de situação em que, à data do pedido de recuperação judicial (17/8/2016), o recorrido não era titular de crédito contra a sociedade recuperanda (o pagamento foi realizado em 30/9/2020), impõe-se a manutenção do acórdão recorrido”, concluiu Nancy.


REsp 2.108.103

  • Por Danilo Vitalé correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur