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A promulgação da Lei 14.754/23 marca um ponto de inflexão na tributação brasileira de investimentos  no exterior por residentes no Brasil. Embora tenha havido uma simplificação da forma de declaração, a questão da variação cambial causa preocupação e merece atenção.

12 de abril de 2024

A sistemática anteriormente vigente para a tributação de rendimentos auferidos no exterior, que exigia a apuração mensal tanto para o ganho de capital, aplicável aos juros, quanto para o carnê-leão, aplicável aos dividendos, foi alterada. A

gora, adota-se uma modalidade de apuração anual, a ser realizada na declaração de ajuste anual do exercício subsequente, sob uma alíquota unificada de 15%. Essa mudança resulta na supressão das isenções previamente aplicáveis, que eram de até R$ 35 mil por mês para o ganho de capital e de até R$ 2.112 por mês para o carnê-leão. Essa alteração simplificou tanto o processo de apuração quanto o de recolhimento desses tributos.

No que toca ao tema da variação cambial, que era regulado pelo artigo 24 da Medida Provisória MP 2.158-35/01, não era tributada a variação cambial decorrente de aplicações financeiras no exterior adquiridos com rendimentos originalmente auferidos em moeda estrangeira, um regime que favorecia a neutralidade fiscal das flutuações cambiais sob determinadas condições.

Contudo, a Lei 14.754/23 acabou com a distinção entre ativos adquiridos no exterior com rendimentos auferidos originalmente em reais e ativos com rendimentos auferidos originalmente em moeda estrangeira. Institui-se, assim, uma tributação sobre ganhos de capital originados de variação cambial de investimentos no exterior, independentemente da origem dos recursos utilizados para a aquisição desses ativos.

Pelo novo regramento, as alíquotas incidentes sobre os ganhos de capital, derivados de qualquer forma de variação cambial, seguem a regra geral de tributação de 15%, se acima do limite anual equivalente a US$ 5 mil.

Essa alteração legislativa não somente aumenta a carga tributária sobre investidores brasileiros com ativos fora do país, mas também instaura uma série de questionamentos jurídicos e práticos.

Princípios constitucionais de necessária observação na análise do tema

Diante disso, se faz essencial analisar o tema à luz da irretroatividade, da neutralidade fiscal, e da capacidade contributiva.

Quanto a irretroatividade tributária, princípio fundamental no ordenamento jurídico brasileiro, consubstancia-se na vedação à aplicação de leis tributárias a fatos geradores ocorridos antes de sua vigência. Este princípio está intrinsecamente relacionado à segurança jurídica e à previsibilidade. A irretroatividade é expressamente assegurada pelo artigo 150, III, a, da CRFB/88, que proíbe a cobrança de tributos “antes da vigência da lei que os instituiu ou aumentou”.

Por sua vez, a neutralidade fiscal representa uma diretriz no desenho das políticas tributárias, segundo o qual a carga tributária não deve influenciar as decisões econômicas dos agentes, preservando a eficiência e a livre concorrência no mercado. Esse princípio busca evitar distorções nas escolhas de consumo, investimento ou produção, provocadas por tratamentos fiscais diferenciados. Em teoria, a neutralidade fiscal promove a alocação ótima de recursos, maximizando o bem-estar econômico sem favorecer ou prejudicar setores específicos, mantendo a competitividade das empresas e a equidade entre os contribuintes, contribuindo para um ambiente econômico mais estável e previsível.

Ainda, a capacidade contributiva é um princípio constitucional tributário que assegura que os impostos devem ser cobrados de acordo com as possibilidades econômicas do contribuinte, visando uma distribuição equitativa da carga tributária. Fundamenta-se na ideia de justiça fiscal, estabelecendo que quem possui maior riqueza deve contribuir proporcionalmente mais para as despesas públicas.

Este princípio, expresso nos artigos 145, § 1º, e 150, II, da CRFB/88, orienta a criação de tributos progressivos, garantindo que a tributação respeite a heterogeneidade das condições socioeconômicas dos contribuintes, reduzindo desigualdades e promovendo a equidade fiscal.

Todos esses três princípios devem ser filtros pelos quais se analisam as regras de tributação.

O tema da tributação da variação cambial de investimentos no exterior por residentes no Brasil, sob a égide da Lei 14.754/23, abre um vasto campo de análise tanto no âmbito da técnica tributária quanto no dos princípios constitucionais que regem a matéria.

Esta análise perpassa, além de pelos princípios acima citados, pela conceituação de renda sob a ótica tributária, confrontando-a com a variação cambial enquanto possível manifestação de acréscimo patrimonial.

Sob a ótica do Direito Tributário, renda é conceituada como um acréscimo patrimonial, uma riqueza nova que se agrega ao patrimônio do contribuinte. Este conceito implica uma mutação positiva do patrimônio, refletindo a diferença entre o que é auferido e o que é dispendido num determinado período​​. Essa mutação patrimonial, caracterizada pela entrada líquida de recursos, é o que tradicionalmente se espera para configurar o fato gerador de impostos sobre a renda.

O que se sustenta nesse artigo é que a variação cambial, sobretudo a variação cambial decorrente de aplicações financeiras no exterior adquiridos com rendimentos originalmente auferidos em moeda estrangeira não é renda.

A Lei 14.754/23 determina a tributação sobre a variação cambial de investimentos realizados no exterior por residentes no Brasil, considerando-a como um acréscimo patrimonial tributável. Esta decisão legislativa reacende o debate sobre se a variação cambial, por si só, constitui uma riqueza nova, suscetível de tributação, ou se apenas reflete ajustes de valores já existentes no patrimônio do contribuinte, especialmente em cenários onde a aquisição do investimento foi realizada com recursos já detidos em moeda estrangeira.

Nesse ponto, se impõe a análise à luz da irretroatividade da lei tributária. A CRFB/88, em seu artigo 150, III, a, veda expressamente a cobrança de tributos de forma retroativa.

A aplicação da Lei 14.754/23 a ganhos de capital derivados de variação cambial acumulada antes de sua vigência colide frontalmente com esse princípio constitucional. A análise da retroatividade, relacionada aos investimentos já realizados, suscita questionamentos quanto à sua constitucionalidade.

Além disso, parece que as novas previsões legais afrontam a neutralidade fiscal, que como demonstrado é essencial para evitar distorções nas escolhas dos contribuintes.

E, por fim, as novas disposições legais suscitam dúvida quanto ao respeito a capacidade contributiva. A variação cambial não caracteriza demonstração de renda capaz de gerar tributação, uma vez que, se trata de situação não definitiva.

Reflexão

A partir dessa perspectiva, aconselha-se aos contribuintes afetados pela Lei 14.754/23 uma cuidadosa análise de seus investimentos no exterior, bem como das implicações tributárias decorrentes da variação cambial. É imprescindível considerar estratégias de planejamento tributário e, se necessário, buscar a via judicial para contestar a aplicação retroativa da lei ou sua aplicação em casos nos quais não se verifica efetivo acréscimo patrimonial.

Em conclusão, a tributação da variação cambial sobre investimentos no exterior introduzida pela Lei 14.754/23 traz consigo uma série de desafios interpretativos e práticos. O tema toca em pontos sensíveis do Direito Tributário, como o conceito de renda, neutralidade fiscal e o princípio da irretroatividade da lei e da capacidade contributiva, demandando dos contribuintes e operadores do direito um exame detalhado de suas disposições e potenciais efeitos sobre os investimentos no exterior.

Assim, torna-se crucial um debate aprofundado sobre sua conformidade com os princípios constitucionais tributários e a busca por soluções que harmonizem os objetivos fiscais do Estado com os direitos e garantias dos contribuintes.

Fonte: Conjur

Regularização começa nesta sexta e vai até 31 de maio

14/03/2024

Obrigadas a pagar 15% de Imposto de Renda (IR) sobre o lucro do ano anterior, as empresas de investimento no exterior, conhecidas como offshores, passaram a ter normas sobre o tratamento dos ativos fora do país. A Receita Federal publicou nesta quarta-feira (13) instrução normativa que regulamenta a Lei 14.754/2023, que taxou os rendimentos no exterior.

A partir desta sexta-feira (15) e até 31 de maio, as pessoas físicas que moram no Brasil e mantêm aplicações financeiras, lucros e dividendos de empresas controladas no exterior poderão regularizar os bens. O prazo também vale para quem embolsa rendimentos e ganhos de capital associados a trustes, empresas cujo dono transfere bens para terceiros administrarem em outros países.

Desde o início do ano, esses cidadãos são obrigados a pagar 15% Imposto de Renda sobre rendimentos auferidos (ganhos) no exterior. Anteriormente, o tributo só incidia sobre o ganho de capital se o dinheiro voltasse para o Brasil. Nesse caso, a tributação ocorria de forma progressiva, variando de 0% a 27,5% conforme o tamanho do rendimento.

A lei dos fundos exclusivos e das offshores estabeleceu que quem antecipasse o pagamento do Imposto de Renda sobre o estoque dos rendimentos até o fim do ano passado pagasse 8% de alíquota em quatro vezes, com a primeira parcela em dezembro de 2023. Quem decidiu não antecipar pagará 15% de IR a partir de maio de 2024, em 24 vezes. A instrução normativa regulou tanto o pagamento dos estoques como a tributação do dinheiro que renderá a partir deste ano.

A própria lei estabeleceu duas situações em que os rendimentos ficarão isentos de IR, caso pessoas que mantenham dinheiro no exterior fora de aplicações financeiras lucrem com uma eventual desvalorização do real. A variação cambial de depósitos não remunerados, como contas-correntes, cartão de débito e de crédito fora do país, não pagará imposto. Eventuais ganhos de capital de moeda em espécie até o valor de US$ 5 mil também continuarão isentos.

Confira os principais detalhamentos trazidos pela instrução normativa:

Aplicações financeiras

•     Ativos que pagarão Imposto de Renda:

–     depósitos bancários remunerados;

–     carteiras digitais;

–     ativos virtuais (como criptomoedas);

–     investimentos financeiros;

–     cotas de fundos de investimento;

–     apólices de seguro;

–     títulos de renda fixa e de renda variável;

–     fundos de previdência;

–     operações de crédito em que devedor more ou tenha domicílio no exterior;

–     derivativos;

–     participações societárias.

•     Momento da tributação:

–     Rendimentos: Imposto de Renda incide quando o investidor recebe o dinheiro;

–     Ganhos de capital e variação cambial: tributação no resgate, na amortização, na alienação, no vencimento ou na liquidação da aplicação financeira.

Entidades controladas no exterior

•     Base de cálculo:

–     Imposto de Renda incidirá em 31 de dezembro de cada ano sobre lucro apurado;

–     Lucro apurado inclui ganhos decorrentes de marcação a mercado (valores atualizados pela cotação do mercado).

–     Lucro apurado inclui variação cambial do valor principal aplicado (eventuais ganhos com desvalorização do real).

•     Proporção:

–     Imposto calculado com base na participação efetiva da pessoa física no capital, não da participação expressa em contrato;

–     Se marcação a mercado aumentar lucro expressivamente, a pessoa física poderá declarar bens e direitos da offshore como se fossem detidos diretamente por ela, na proporção de sua participação. No entanto, essa opção precisa ser informada na declaração do Imposto de Renda e vigorará durante todo o prazo da aplicação.

•     Apólices de seguros:

–     Apólices de seguros que permitem influência do detentor na estratégia de investimento passam a ser equiparadas a entidades controladas no exterior.

•     Passarão a pagar Imposto de Renda (fim de isenção):

–     Ganho na alienação, liquidação ou resgate de bens e direitos no exterior;

–     Bens e aplicações financeiras adquiridos quando pessoa física morava fora do Brasil;

–     Variação cambial na venda de bens, direitos e aplicações financeiras.

Trustes

•     Definição:

–     empresa estrangeira que terceiriza a administração de bens e direitos de uma pessoa ou família;

•     Declaração de bens:

–     Bens de um trustprecisarão ser declarados no Imposto de Renda

•     Tributação:

–     Rendimentos e ganho de capital dos bens aplicados será devido pelo titular da truste;

–     Se bem tributado for transferido, seja por escritura ou por falecimento do titular, o beneficiário indicado pagará Imposto de Renda.

–     Transferência de bens pelo truste, por morte ou doação, também pagará Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), cobrado pelos estados, além de Imposto de Renda.

Compensação de perdas

•     Abatimento:

–     Perdas com aplicações financeiras no exterior poderão ser abatidas dos rendimentos de outras aplicações no exterior no mesmo período de apuração;

–     Compensação ocorre na ficha de “apuração de ajuste anual”

•     Se perdas superarem ganhos:

–     Compensação poderá ser feita no mesmo ano com lucros e dividendos de entidades controladas no exterior;

–     Caso haja acúmulo de perdas não compensadas, compensação poderá ser feitas em anos posteriores, diminuindo o Imposto de Renda a pagar.

•     Vedação:

–     Instrução normativa veda compensação de perdas com aplicações no exterior sobre o Imposto de Renda de aplicações oferecidas no Brasil.

Tributação antecipada

•     Atualização:

–     Todas as pessoas físicas residentes no Brasil com bens e direitos no exterior poderão atualizar o valor de aquisição pelo valor de mercado em 31 de dezembro de 2023;

–     Sobre a diferença entre os dois valores incidirá alíquota de 8%, com desconto em relação à alíquota geral de 15%.

•     Tipos de bens:

–     Atualização exercida sobre bens em conjunto ou em separado, para cada bem.

–     Bens de trustou de offshores poderão pagar tributação antecipada.

•     Permissão para utilizar o mecanismo:

–     aplicações financeiras;

–     bens imóveis ou ativos relacionados;

–     veículos, aeronaves, embarcações, mesmo em alienação fiduciária (leasing);

–     participações em entidades controladas

•     Opção não abrange bens sem ganho de capital, como:

–     moeda estrangeira em espécie;

–     joias, pedras e metais preciosos;

–     obras de arte;

–     antiguidades com valor histórico;

–     animais de estimação ou esportivos;

–     bens comprados em 2023.

* Por Wellton Máximo – Repórter da Agência Brasil – Brasília

Fonte: Agência Brasil

Informações estão em pesquisa da Fundação Dom Cabral e ApexBrasil

13/09/2023
Porto de Santos/SP (27/05/2021) – Foto: Ricardo Botelho/MInfra

Pesquisa da Fundação Dom Cabral (FDC) mostra que a maioria das empresas brasileiras que atuam no exterior aumentou os investimentos no mercado externo nos últimos dois anos. O estudo teve o apoio da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), ligada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, do governo federal.

Segundo o levantamento “Trajetórias FDC de Internacionalização das Empresas Brasileiras”, divulgado nessa terça-feira (12), 45,1% das empresas brasileiras internacionais aumentaram os investimentos no exterior; 38,2% mantiveram no mesmo patamar; e 16,8% reduziram.

A maior parte das empresas ouvidas (56,9%) disse que aumentou os investimentos no Brasil; 38,2%, que mantiveram no mesmo patamar; e 12,1%, que reduziram.

A pesquisa ouviu 237 empresas brasileiras internacionais, principalmente as que atuam com exportação ou que têm subsidiárias no exterior. Entre as pesquisadas, a maior parte é do ramo do comércio (16,5%), seguido de fabricação de máquinas e equipamentos (10,2%), e fabricação de produtos químicos (7,1%).

Segundo o levantamento, 54,6% das empresas ouvidas disseram que os resultados financeiros no exterior melhoraram nos últimos dois anos; 27%, que se mantiveram estáveis, e 18,3%, que reduziram. 

O resultado é muito parecido com o que as empresas afirmaram sobre seus resultados no mercado doméstico: 57,9% disseram que os resultados melhoraram; 22,4%, que se mantiveram estáveis; e 19,7%, que reduziram.

Planos para o futuro     

Apenas 10,5% das empresas ouvidas disseram que planejam diminuir as operações nos mercados externos em que elas já atuam, nos próximos dois anos. Segundo a pesquisa, os motivos são atribuídos, em geral, a fatores como os impactos da pandemia da covid-19, a guerra na Ucrânia, o aumento de fretes, os altos juros e inflação.

Já 64,4% das empresas afirmaram que planejam, nos próximos dois anos, a expansão nos mercados em que já atuam. “Os principais motivos para essa expansão são: novas possibilidades no exterior, crescimento do e-commerce, consolidação de alianças e parcerias, oferta de produtos inovadores, investimento em qualificações técnicas e operacionais e maior reconhecimento da marca”, diz o texto da pesquisa.

*Por Bruno Bocchini – Repórter da Agência Brasil – São Paulo

Fonte: Agência Brasil