A obrigatoriedade de notificar a Advocacia-Geral da União sempre que um magistrado constatar conduta culposa do empregador em casos de acidentes de trabalho deve ter um efeito pedagógico positivo para a sociedade. Isso porque a maior possibilidade de a União ajuizar ações de regresso para cobrir os custos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) servirá de reforço para o cumprimento de normas de segurança do trabalho, conforme avaliam advogados trabalhistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico.

7 de abril de 2025, 8h45

Ao saber da conduta culposa, a AGU poderá pedir na Justiça Federal que o empregador arque com os custos que seriam do INSS

A regra foi editada pela Justiça do Trabalho no Ato Conjunto 4/2025. O documento, assinado pelo presidente do Tribunal Superior do Trabalho e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, e pelo corregedor-geral da Justiça do Trabalho, ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, substitui a Recomendação Conjunta 2/2011 — que, como o nome sugere, apenas recomendava a notificação da União. E é uma continuação do acordo de cooperação técnica firmado pelo CSJT e a AGU em 2023 para criar um fluxo de informações sobre acidentes de trabalho entre os órgãos.

A norma, publicada em 23 de janeiro, determina a inclusão da União como terceira interessada nas sentenças do tipo que transitarem em julgado. Os magistrados também terão de expedir uma intimação informando os nomes das partes do processo.

Processo aprimorado

Para Jane Piñeiro, sócia do escritório Pessoa & Pessoa Advogados, o ato conjunto revela uma preocupação crescente do poder público com dois aspectos: estimular a criação de ambientes de trabalho cada vez mais seguros e atribuir responsabilidade ampla aos empregadores que desrespeitam regulamentos de segurança.

“Talvez essa recomendação gere, dentro das realidades das empresas, uma maior preocupação com a não observância das normas que regulamentam a saúde e segurança do trabalho, de modo a criar um ambiente de trabalho mais seguro.”

Marcos Fantinato, sócio do Machado Meyer Advogados, e Renata Olandim, advogada do mesmo escritório, entendem que o Ato Conjunto 4/2025 vem para solucionar um problema de comunicação entre a Justiça do Trabalho e a AGU. Isso porque a notificação de conduta culposa já era desejada, mas não obrigatória.

A adoção de novas tecnologias, como a implementação de um sistema digital único para a tramitação do processos, tornou possível a determinação. Eles acreditam que a medida é positiva para a sociedade em geral, dado seu “efeito pedagógico” contra eventual má-fé ou displicência por parte dos empregadores.

A sócia da área trabalhista do escritório Andrade Maia Advogados Larissa Almeida tem o mesmo entendimento. Ela afirma que, apesar de a maioria das empresas já dar atenção às medidas de prevenção de acidentes, o principal impacto do normativo é fazer “elas se acautelarem mais“.

Porém, há quem se preocupe com a possibilidade de um efeito adverso na criação de vagas de trabalho. É o caso de Rafael Teles, advogado trabalhista e sócio do Nicoli Sociedade de Advogados.

Ele entende que havia a necessidade de tornar o procedimento obrigatório para aumentar a conscientização sobre riscos de acidentes e doenças ocupacionais, mas faz questão de apresentar suas ressalvas. “Eu não sei qual é o impacto disso para o empresariado, de modo que isso poderia, eventualmente, desestimular a geração de empregos, o empresariado e o empreendedorismo”, diz.

Como efeito secundário, Fantinato vislumbra um aumento do número de ações de regresso ajuizadas pela União na Justiça Federal, mas não bate o martelo. Ter conhecimento das causas não é sinônimo de ter estrutura para disputá-las.

Almeida também freia as expectativas. Para ela, a Justiça Federal é uma “justiça atolada”, onde “nada anda”: “Isso vai ser um problema e eu não sei o quanto, de fato, a União vai conseguir reaver”.Chance para os acordos

A possibilidade de o empregador entrar no radar da AGU dará mais poder de barganha ao trabalhador acidentado. Morosa ou não, a simples perspectiva de encarar um segundo round na Justiça Federal caso perca um processo na Justiça do Trabalho pode deixar as empresas mais suscetíveis a acordos.

“Se realizar acordo, eu não vou ter um trânsito julgado de uma decisão que reconheça a minha responsabilidade. De modo que, nesse contexto, o magistrado não vai precisar observar o procedimento estabelecido pela norma”, afirma Piñeiro.

Almeida reitera: “Se sou eu a advogada da empresa e vejo que tem um risco de ser reconhecida conduta culposa, um risco de se apurar uma negligência, eu já faço o acordo de cara. Eu não vou correr o risco de ficar constatada culpa em uma sentença e depois ter que devolver para o INSS”.

Clique aqui para ler o ato conjunto

  • Por Mateus Mello – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Consultor Jurídico