Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.255), a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o delito de falsa identidade, previsto no artigo 307 do Código Penal, é crime de natureza formal, que se consuma quando o agente fornece, consciente e voluntariamente, dados inexatos sobre sua real identidade. Sendo assim, a caracterização da conduta independe da obtenção de vantagem para si ou para outrem, bem como de prejuízo a terceiros.
17/06/2025

O relator do repetitivo, ministro Joel Ilan Paciornik, explicou que o crime de falsa identidade tutela a fé pública na individualização pessoal, ou seja, a confiança que se tem, nas relações públicas ou privadas, quanto à identidade, à essência, ao estado civil ou outra qualidade juridicamente relevante da pessoa.

Segundo o magistrado, esse tipo penal exige a prática de uma conduta comissiva somada a uma vontade consciente de atribuir a falsa identidade a si mesmo ou a outra pessoa. Além disso, prosseguiu, é necessário verificar se o delito está associado à finalidade de obter algum tipo de vantagem ou causar dano a alguém.

Retratação do agente e alegação de autodefesa

No entanto, o relator lembrou que já existe entendimento doutrinário e posição consolidada da jurisprudência do STJ no sentido de que a efetiva obtenção do fim pretendido pelo agente é irrelevante para a configuração do crime, devido à sua natureza formal.

“Portanto, a consumação delitiva ocorre assim que o agente inculca a si ou a outrem a falsa identidade, sendo irrelevantes a causação de prejuízo ou a obtenção de efetiva vantagem pelo agente. É indiferente, para a consumação típica, o fato de o destinatário da declaração falsa verificar, em sequência, a real identidade do indivíduo, ou mesmo ter o próprio agente se identificado corretamente em momento posterior”, destacou Paciornik.

O ministro esclareceu que a eventual retratação do agente não afasta a tipicidade da conduta, nem justifica a aplicação do instituto do arrependimento eficaz, pois o crime de falsa identidade já se encontra consumado.

Outro ponto destacado por Paciornik quanto à tipicidade se refere à hipótese de atribuição da falsa identidade perante autoridade policial com base no princípio constitucional da autodefesa. Nesse caso, ele mencionou a Súmula 522 do STJ, além de precedentes da corte (Tema 646) e do Supremo Tribunal Federal (Tema 478) que rejeitam essa possibilidade.

Réu informou nome falso a policiais durante abordagem

Interposto pelo Ministério Público de Minas Gerais, o recurso representativo da controvérsia (REsp 2.083.968) diz respeito a um homem acusado de fornecer nome falso a policiais durante uma abordagem. Contudo, antes do registro do boletim de ocorrência e do interrogatório na delegacia, ele revelou sua verdadeira identidade.

Em primeiro grau, o réu foi condenado pelo crime de falsa identidade, mas o Tribunal de Justiça de Minas Gerais decidiu absolvê-lo por entender que a conduta não teve nenhuma repercussão administrativa ou penal.

“A retratação posterior do agente quanto à sua identidade, ainda que antes do registro do boletim de ocorrência, não tem o condão de tornar atípica a sua conduta, nem mesmo sob o pálio do instituto do arrependimento eficaz. Isso porque o delito já se encontra consumado com a simples atribuição de falsa identidade pelo agente, independentemente da verificação de ulteriores consequências”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso especial.

REsp 2.083.968.

Fonte: STJ