A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, decorrente da mera constatação de insolvência do devedor, não autoriza que o sócio colocado no polo passivo da ação seja compelido a pagar multa por litigância de má-fé imposta à sociedade desconsiderada, em momento anterior ao seu ingresso no processo.
Na origem, a ação de uma consumidora contra a empresa foi julgada procedente. Na fase de cumprimento de sentença, foi decretada a desconsideração da personalidade jurídica da executada, e uma sócia – também pessoa jurídica – passou a integrar o polo passivo da demanda. Essa sócia foi intimada para pagar o valor total executado, incluindo a multa por litigância de má-fé imposta à devedora originária.
A impugnação apresentada pela sócia foi rejeitada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que entendeu que a responsabilidade pelo pagamento abrangeria também o valor da multa.
No STJ, foi sustentado que não seria possível presumir que os sócios tivessem conhecimento da litigância de má-fé praticada pela sociedade. Além disso, argumentou-se que a desconsideração da personalidade jurídica não se estende às obrigações decorrentes de multas processuais.
Aplicação da teoria menor na relação de consumo
O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, cujo voto prevaleceu no julgamento, explicou que, ao contrário da teoria maior – em que a desconsideração da personalidade jurídica funciona como uma punição –, para a aplicação da teoria menor não é necessária a comprovação de fraude ou abuso de direito, bastando demonstrar a insolvência da empresa ou o fato de a personalidade jurídica estar impedindo o ressarcimento dos prejuízos causados a terceiros.
De acordo com o ministro, a aplicação da teoria menor exige autorização expressa em lei e é restrita a alguns ramos do direito, como o do consumidor, no qual incide para evitar que o lado mais vulnerável da relação de consumo tenha de suportar o risco da atividade empresarial do fornecedor.
Litigância de má-fé não integra a atividade da empresa
Por outro lado, o relator enfatizou que a litigância de má-fé não integra a atividade empresarial, assim como a multa respectiva não está inserida no risco que lhe é inerente, mas decorre do comportamento contrário ao dever de boa-fé processual.
Para Cueva, o fato de a multa aplicada à empresa executada ser cobrada nos mesmos autos em que se discute a relação de consumo “não altera a natureza dessa sanção nem transforma a atuação processual em risco da atividade empresarial”, o que impede que a sócia seja responsabilizada pelo seu pagamento mediante a aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica.
Embora a multa por litigância de má-fé tenha força executiva equivalente à das demais condenações, o ministro observou que “a dificuldade na sua satisfação não representa obstáculo ao adimplemento de obrigação originada no direito consumerista, requisito indispensável para a aplicação da teoria menor“. Assim, de acordo com o voto vencedor no julgamento, a responsabilização da sócia pela multa por litigância de má-fé exigiria que fossem demonstrados os requisitos da teoria maior – o que não ocorreu no processo.
