Por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é incabível o reconhecimento de união estável simultânea ao casamento, assim como a partilha de bens em três partes iguais (triação), mesmo que o início da união seja anterior ao matrimônio.
O entendimento foi firmado no julgamento do recurso especial interposto por uma mulher que conviveu três anos com um homem antes que ele se casasse com outra e manteve o relacionamento por mais 25 anos. Ao STJ, a recorrente reiterou o pedido de reconhecimento e dissolução da união estável, com partilha de bens em triação.
Ao dar parcial provimento ao recurso, o colegiado considerou que não há impedimento ao reconhecimento da união estável no período de convivência anterior ao casamento, mas, a partir desse momento, tal união se transforma em concubinato (simultaneidade de relações).
Ordenamento jurídico consagra a monogamia
O juiz acolheu o pedido da mulher e reconheceu todo o período de convivência como união estável, com a consequente partilha em triação. Porém, acolhendo recurso do casal, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) reformou a sentença, entendendo que o casamento deve prevalecer sobre o concubinato.
Relatora do caso no STJ, a ministra Nancy Andrighi afirmou que, segundo a jurisprudência, “é inadmissível o reconhecimento de união estável concomitante ao casamento, na medida em que aquela pressupõe a ausência de impedimentos para o casamento, ou, ao menos, a existência de separação de fato”.
A magistrada também lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF), em situação análoga, fixou a tese de que a preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes impede o reconhecimento de novo vínculo, em virtude da consagração da monogamia pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Desse modo, Nancy Andrighi reconheceu como união estável apenas o período de convivência anterior ao casamento. Segundo ela, a partilha referente a esse intervalo, por se tratar de união anterior à Lei 9.278/1996, requer a prova do esforço comum na aquisição do patrimônio, nos termos da Súmula 380 do STF.
Concubinato equiparado a sociedade de fato e meação da esposa
Acerca do período posterior à celebração do matrimônio, a relatora destacou que a recorrente e o recorrido tiveram dois filhos durante o concubinato que durou 25 anos e era conhecido por todos os envolvidos. Segundo ela, essa relação se equipara à sociedade de fato, e a partilha nesse período também é possível, desde que haja prova do esforço comum na construção patrimonial (Súmula 380 do STF).
Ao reformar o acórdão recorrido, Nancy Andrighi apontou que, resguardado o direito da esposa à metade dos bens (meação), a partilha deve ser feita em liquidação de sentença, uma vez que as instâncias ordinárias não mencionaram se há provas da participação da recorrente na construção do patrimônio ou quais bens fazem parte da meação da esposa.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-15 10:09:482022-09-15 10:09:51É incabível o reconhecimento de união estável paralela, ainda que iniciada antes do casamento
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o meio adequado para ter a posse do bem, no caso de aquisição de imóvel locado, é a ação de despejo, não servindo para esse propósito a ação de imissão na posse.
O entendimento teve origem em ação de imissão na posse ajuizada pela compradora de um imóvel alugado, após denúncia do contrato de locação firmado pelos antigos proprietários, com o objetivo de entrar na posse do bem. A autora alegou que o contrato não estava averbado na matrícula do imóvel e que o locatário não respondeu às tentativas de renovação do aluguel, não pagou as parcelas em atraso nem restituiu o imóvel.
Por seu turno, o locatário apontou a inviabilidade do instrumento processual manejado pela nova proprietária, pois, com base nos artigos 5º e 8º da Lei 8.245/1991, a ação adequada seria a de despejo, independentemente do fundamento do término da locação.
Alienação do imóvel durante a relação locatícia não rompe a locação
Relator do processo no STJ, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva ressaltou que a alienação do imóvel permite ao comprador a denúncia do contrato de locação (artigo 8º da Lei 8.245/1991), tendo em vista o princípio da relatividade dos efeitos contratuais (as estipulações do contrato só produzem efeitos entre as partes contratantes).
Entretanto, ele observou que o artigo 5º da Lei 8.245/1991 é expresso ao determinar que a exigência da posse por quem adquire imóvel alugado seja feita em ação de despejo, porque a alienação durante a relação locatícia não rompe a locação, que continuará tendo existência e validade.
“O adquirente que assume a posição do antigo proprietário tem o direito de denunciar o contrato, se assim desejar, ou de permanecer inerte e sub-rogar-se nos direitos e deveres do locador, dando continuidade à relação locatícia”, afirmou o relator.
Retomada da posse não pode ferir o direito de quem ocupa o imóvel regularmente
Em relação à averbação do contrato junto à matrícula do imóvel, Cueva ponderou que ela só é necessária nos contratos de locação com cláusula de vigência, para afastar a denúncia pelo novo proprietário antes de vencido o prazo.
“Se não há cláusula de vigência ou não há averbação, o novo adquirente não está obrigado a respeitar o contrato, podendo exercer livremente seu direito potestativo de denunciá-lo, mas, para imitir-se na posse direta do imóvel, deve seguir o rito processual adequado, valendo-se da ação de despejo”, disse o ministro.
O magistrado ressaltou que entendimento diverso poderia “malferir o direito de terceiro que regularmente ocupa o bem”, recordando que a mesma posição foi manifestada pelo ministro Antonio Carlos Ferreira no REsp 1.590.765, que tratava da mesma controvérsia e do mesmo locatário.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-14 17:18:202022-09-14 17:18:25Ação de despejo é a via processual adequada para comprador tomar posse de imóvel locado
Nesta terça-feira, 13, a 4ª turma do STJ manteve apreendido passaporte de empresário por dívida em processo de falência. Segundo o colegiado, a realização de viagens internacionais e gastos de grandes quantias, demonstram indícios que o devedor possui patrimônio passível ao pagamento da dívida.
O empresário responde como administrador de empresas em processo de falência, motivo pelo qual teve apreensão de seu passaporte pelo juízo de 1º grau. Na Justiça, pleiteou a liberação do documento até o julgamento final do processo.
Ao votar, o ministro Raul Araújo, relator, destacou que jurisprudência do STJ considera cabível a adoção de meio coercitivo atípico, quando verificado a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável. Nesse sentido, afirmou que, no caso, houve esgotamento dos meios de execução ou mecanismo de localização de patrimônio do devedor, motivo pelo qual foi determinada a apreensão do passaporte do paciente.
Pontuou, ainda, que documentos juntados no processo comprovaram que o falido realizava viagens internacionais e gastos de grandes quantias. Em seu entendimento, tais atos demonstram indícios que o paciente possui patrimônio passível ao pagamento da dívida.
No mais, asseverou que as justificativas apresentadas pelo homem não esclareceram pontos importantes como “a ocultação do patrimônio em paraísos fiscais, descumprimento de obrigação legal, realização de viagens luxuosas sem evidência de fins religiosos alegados e doação de patrimônio aos familiares que atualmente arcam com suas despesas de viagem”.
Por fim, a turma negou o pedido de HC do paciente. A decisão foi unânime.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-14 11:02:552022-09-14 11:03:00STJ mantém retido passaporte de devedor que fazia viagens luxuosas Colegiado concluiu que o falido não esclareceu pontos como a ocultação do patrimônio em paraísos fiscais e descumprimento de obrigação legal.
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que não se exige o esgotamento das instâncias ordinárias como pressuposto para o conhecimento da reclamação fundamentada em descumprimento de acórdão prolatado em Incidente de Assunção de Competência (IAC).
O entendimento foi adotado na análise de reclamação na qual a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) apontou possível descumprimento, pelo juízo da 2ª Vara Cível Federal de Goiânia, do acórdão proferido pelo STJ no IAC 5 (REsp 1.799.343).
A reclamante sustentou que o juízo teria se equivocado ao afastar a competência da Justiça do Trabalho para julgar ação em que um grupo de ex-funcionários aposentados questiona a validade de acordo coletivo que alterou os benefícios de auxílio à saúde fornecidos anteriormente na modalidade autogestão – hipótese que se amoldaria exatamente à exceção prevista no IAC 5.
Por seu lado, os aposentados, além de defenderem a continuação do processamento da ação na Justiça Federal, alegaram não caber a reclamação, visto que não houve esgotamento da instância ordinária, conforme estaria regulado no artigo 988, parágrafo 5º, II, do Código de Processo Civil (CPC/2015).
Segundo o enunciado do IAC 5, compete à Justiça comum julgar as demandas relativas a plano de saúde de autogestão empresarial, exceto quando o benefício for regulado em contrato de trabalho, convenção ou acordo coletivo, hipótese em que a competência será da Justiça do Trabalho, ainda que figure como parte trabalhador aposentado ou dependente do trabalhador.
Esgotamento de instância é exigido na reclamação para preservação da competência do STJ
O relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, destacou que, nas reclamações direcionadas ao STJ, o exaurimento das instâncias ordinárias somente constitui pressuposto de conhecimento quando a demanda é proposta com a finalidade de preservar a competência do tribunal, conforme os artigos 988 do CPC/2015 e 187 do Regimento Interno do tribunal (RISTJ), mas esse não era o caso analisado, no qual se discutia o descumprimento de IAC.
Bellizze ponderou que, ao contrário do entendimento do juízo federal de Goiânia, a superveniência de sentença na ação originária, ainda que substitutiva da decisão interlocutória reclamada, não acarreta a perda ulterior de objeto da reclamação quando a controvérsia reside na análise da competência do juízo.
“Trata-se de preliminar cujo exame precede ao de mérito, sendo que o resultado da reclamação influi diretamente no julgamento do feito, possuindo o condão, inclusive, de invalidar a sentença em razão da incompetência do juízo sentenciante”, disse o ministro.
A hipótese dos autos se amolda ao definido pelo IAC 5/STJ
Quanto ao caso em discussão, o relator salientou que a pretensão dos aposentados era a manutenção das regras do benefício de saúde anterior, concedido mediante acordo coletivo de trabalho e oferecido por plano na modalidade autogestão, sobretudo em virtude de supostas ilegalidades constantes do auxílio à saúde que entraria em vigor na época do ajuizamento da ação, em decorrência do novo acordo.
“Estando os pedidos da ação originária estritamente vinculados a acordos coletivos de trabalho, com pedido primordial de restabelecimento do regramento anterior do benefício de plano de saúde de autogestão – fornecido pela empregadora mediante acordo coletivo de trabalho –, sobressai competente a Justiça do Trabalho para o julgamento da demanda, tal como definido no IAC 5 do STJ”, afirmou Bellizze.
O ministro concluiu ainda que o fato de o novo auxílio à saúde, fornecido mediante indenização pela Infraero, ter entrado em vigência logo após a propositura da ação originária não desnatura a causa de pedir e o pedido formulado pelos autores – o qual é claro a respeito da pretensão de manutenção do regramento relativo ao sistema de autogestão.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-13 14:53:362022-09-13 15:36:26Reclamação por descumprimento de IAC não exige esgotamento das instâncias ordinárias
Por maioria, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que as medidas coercitivas atípicas – como a apreensão de passaporte de pessoa inadimplente – podem ser impostas pelo tempo suficiente para dobrar a renitência do devedor, de modo a efetivamente convencê-lo de que é mais vantajoso cumprir a obrigação do que, por exemplo, não poder viajar ao exterior.
Com esse entendimento, o colegiado negou habeas corpus a uma mulher que pretendia reaver seu passaporte, apreendido há dois anos como medida coercitiva atípica para obrigá-la a pagar uma dívida de honorários advocatícios de sucumbência.
Segundo os autos, a mulher, sua filha e seu genro perderam uma ação judicial e foram condenados, em abril de 2006, ao pagamento de honorários advocatícios estipulados, na época, em R$ 120 mil. O valor atualizado da dívida, com juros e correção monetária, é de R$ 920 mil.
Na execução movida pela advogada credora dos honorários, foi alegado que a mãe e a filha eram empresárias do ramo de petróleo e combustível e que havia muitas outras execuções ajuizadas contra elas.
Como, passados mais de 15 anos do início do cumprimento de sentença, a dívida não foi paga e não houve o oferecimento de bens à penhora pelos executados, o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a ordem judicial de retenção dos passaportes.
Alternativa de quitação da dívida apresentada pela paciente é ineficaz Para quitar a dívida e liberar o documento, a paciente no habeas corpus submetido ao STJ ofereceu 30% de seus rendimentos como aposentada e pensionista – o que significaria um pagamento mensal de aproximadamente R$ 1,5 mil.
Diante disso, a relatora do voto que prevaleceu no colegiado, ministra Nancy Andrighi, afirmou que, mesmo que o valor de R$ 920 mil não fosse mais atualizado ou corrigido a partir de 2022, seriam necessários 601 meses, ou 50 anos, para a quitação total da dívida.
A ministra ressaltou que a devedora tem 71 anos de idade e que a expectativa média de vida dos brasileiros, de acordo com o IBGE, é de 76,8 anos. Para Nancy Andrighi, “é bastante razoável inferir que nem mesmo metade da dívida será adimplida a partir do método sugerido pela paciente, de modo que está evidenciada a absoluta inocuidade da medida”.
Segundo a relatora, essa proposta “é até mesmo desrespeitosa e ofensiva ao credor e à dignidade do Poder Judiciário, na medida em que são oferecidas migalhas em troca de um passaporte para o mundo e, quiçá, para a inadimplência definitiva”.
Medidas executivas atípicas não substituem patrimonialidade da execução Nancy Andrighi salientou que as medidas executivas atípicas, sobretudo as coercitivas, não superam o princípio da patrimonialidade da execução e nem são penalidades judiciais impostas ao devedor.
De acordo com a ministra, as medidas atípicas “devem ser deferidas e mantidas enquanto conseguirem operar, sobre o devedor, restrições pessoais capazes de incomodar e suficientes para tirá-lo da zona de conforto, especialmente no que se refere aos seus deleites, aos seus banquetes, aos seus prazeres e aos seus luxos, todos bancados pelos credores”.
A limitação temporal das medidas coercitivas atípicas, segundo a relatora, é questão inédita no STJ. Para ela, não deve haver um tempo fixo pré-estabelecido para a duração de uma medida coercitiva, a qual deve perdurar pelo tempo suficiente para dobrar a renitência do devedor.
“Não há nenhuma circunstância fática justificadora do desbloqueio do passaporte da paciente e que autorize, antes da quitação da dívida, a retomada de suas viagens internacionais”, concluiu Nancy Andrighi.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-13 13:02:512022-09-13 13:02:58Medidas coercitivas atípicas para forçar pagamento de dívida não devem ter limitação temporal
No direito brasileiro, a regra é que os danos sejam comprovados pelo ofendido para que se justifique o arbitramento judicial de indenização. Entretanto, em hipóteses excepcionais, são admitidos os chamados danos in re ipsa, nos quais o prejuízo, por ser presumido, independe de prova.
A possibilidade da presunção de um dano – material ou moral – constitui uma vantagem para o ofendido e uma dificuldade para o ofensor, na medida em que há, como consequência, a superação da fase probatória no processo.
Ao longo do tempo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já estabeleceu uma série de situações em que há a configuração do dano in re ipsa, e continua analisando, cotidianamente, os mais diversos casos em que se pode ou não presumir a existência do dano.
Nesse sentido, serão julgados dois novos recursos repetitivos sobre o assunto. No Tema 1.096, a Primeira Seção vai definir “se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)”.
Já no Tema 1.156, a Segunda Seção vai estabelecer “se a demora na prestação de serviços bancários superior ao tempo previsto em legislação específica gera dano moral individual in re ipsa apto a ensejar indenização ao consumidor”.
Dano moral pela contaminação de alimento com corpo estranho
Em 2021, no julgamento do REsp 1.899.304, a Segunda Seção unificou a jurisprudência das turmas de direito privado do STJ e considerou irrelevante a efetiva ingestão do alimento contaminado por corpo estranho – ou do próprio corpo estranho – para a caracterização do dano moral, pois a compra do produto insalubre é potencialmente lesiva ao consumidor.
Para a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, “a distinção entre as hipóteses de ingestão ou não do alimento insalubre pelo consumidor, bem como da deglutição do próprio corpo estranho, para além da hipótese de efetivo comprometimento de sua saúde, é de inegável relevância no momento da quantificação da indenização, não surtindo efeitos, todavia, no que tange à caracterização, a priori, do dano moral”.
No caso julgado, o consumidor pediu indenização contra uma beneficiadora de arroz e o supermercado que vendeu o produto, em razão da presença de fungos, insetos e ácaros na embalagem. Os ministros reformaram acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para restabelecer a sentença que fixou o dano moral em R$ 5 mil.
Uso indevido de marca dispensa prova de dano material e moral
A jurisprudência do STJ também entende que é devida reparação por danos patrimoniais (a serem apurados em liquidação de sentença) e por danos extrapatrimoniais na hipótese de se constatar a violação de marca, independentemente de comprovação concreta do prejuízo material e do abalo moral resultante do uso ilícito.
Com esse entendimento, a Quarta Turma, no julgamento do REsp 1.507.920, manteve em R$ 15 mil a indenização por danos morais a que a empresa Sonharte Brasil foi condenada pelo uso indevido da marca de outra empresa do mesmo ramo, a Sonhart.
As instâncias de origem reconheceram que a Sonharte se valeu da expressão para a divulgação de seus serviços e produtos, a despeito de ser inequivocamente semelhante à marca da concorrente, e concluíram que houve violação do direito de propriedade intelectual da Sonhart.
Para a relatora, ministra Isabel Gallotti, houve concorrência desleal e aproveitamento parasitário, mediante a comercialização de produtos com o uso de nome “praticamente idêntico” ao registrado pela concorrente “no mesmo ramo de atividade econômica, de forma a induzir em erro o consumidor”.
Indenização por violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar
Nos casos de violência contra a mulher em âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de produção de provas.
A tese foi fixada pela Terceira Seção em julgamento de recurso repetitivo (Tema 983). Em um dos processos julgados como representativos da controvérsia, o colegiado restabeleceu a condenação de R$ 3 mil por danos morais imposta ao ex-companheiro da vítima. De acordo com os autos, ele lhe deu um tapa no rosto com força suficiente para jogá-la no chão e, logo depois, acelerou seu veículo e a atropelou.
Segundo o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, no âmbito da reparação por danos morais, a Lei Maria da Penha – complementada pela Lei 11.719/2008, que alterou o Código de Processo Penal – permitiu que um único juízo, o criminal, decida sobre o valor de indenização, o qual, “relacionado à dor, ao sofrimento e à humilhação da vítima, de difícil mensuração, deriva da própria prática criminosa experimentada”.
Para o ministro, não é razoável exigir instrução probatória sobre o dano psíquico, o grau de humilhação ou a diminuição da autoestima, “se a própria conduta criminosa empregada pelo agressor já está imbuída de desonra, descrédito e menosprezo à dignidade e ao valor da mulher como pessoa”.
Na sua avaliação, a não exigência de produção de prova dos danos morais, nesses casos, também se justifica pela necessidade de melhor concretizar,com o suporte processual já existente, “o atendimento integral à mulher emsituação de violência doméstica, de sorte a reduzir sua revitimização e as possibilidades de violência institucional, consubstanciadas em sucessivasoitivas e pleitos perante juízos diversos”.
Recusa do plano de saúde a autorizar tratamento médico emergencial
As turmas de direito privado do STJ têm orientação firmada no sentido de que a recusa indevida de tratamento médico emergencial, pela operadora de plano de saúde, enseja reparação por danos morais, pois agrava a situação de aflição psicológica e de angústia do beneficiário, estando caracterizado o dano moral in re ipsa.
Esse entendimento levou a Terceira Turma, no julgamento do REsp 1.839.506, a reformar acórdão que negou a indenização a um paciente cujo tratamento ocular quimioterápico, prescrito por seu médico, não foi autorizado pelo plano de saúde, sob a justificativa de que ele não preencheria os requisitos estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para a cobertura do exame e do tratamento postulados.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) entendeu que o dano moral não seria devido, embora tenha concluído que a recusa de tratamento foi injusta.
O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, lembrou que a jurisprudência do STJ reconhece que, em algumas situações, há dúvida razoável na interpretação de cláusula contratual, de forma que a conduta da operadora, ao optar pela restrição da cobertura sem ofender os deveres anexos do contrato – como a boa-fé –, não pode ser reputada ilegítima ou injusta, violadora de direitos imateriais, o que afasta qualquer pretensão de compensação por danos morais.
No entanto, ele verificou que esse não era o caso dos autos, pois não havia discussão em torno da interpretação de cláusula contratual. Assim, configurado o abuso da operadora na recusa da cobertura, o colegiado concluiu que era devida a indenização por danos morais.
Agressão a criança não exige prova de dano moral
Em 2017, no REsp 1.642.318, a Terceira Turma estabeleceu que o reconhecimento do dano moral sofrido por criança vítima de agressão não exige o reexame de provas do processo – o que seria inviável na discussão de recurso especial –, sendo suficiente a demonstração de que o fato ocorreu.
Os ministros rejeitaram o recurso especial de uma mulher condenada a pagar R$ 4 mil por danos morais em razão de agressões verbais e físicas contra uma criança de dez anos que havia brigado com sua filha na escola.
Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, “a sensibilidade ético-social do homem comum, na hipótese, permite concluir que os sentimentos de inferioridade, dor e submissão sofridos por quem é agredido injustamente, verbal ou fisicamente, são elementos caracterizadores da espécie do dano moral in re ipsa“.
A ministra destacou que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) assegura o direito à inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral (artigo 17), bem como a legislação brasileira garante a primazia do interesse das crianças e dos adolescentes, com a proteção integral dos seus direitos.
“Logo, a injustiça da conduta da agressão, verbal ou física, de um adulto contra uma criança ou adolescente independe de prova e caracteriza atentado à dignidade dos menores”, acrescentou a relatora.
Comercialização de dados pessoais em banco de dados
Para a Terceira Turma, a disponibilização ou a comercialização de informações pessoais do consumidor em banco de dados, sem o seu conhecimento, configura hipótese de dano moral in re ipsa. No julgamento do REsp 1.758.799, os ministros mantiveram em R$ 8 mil a indenização devida a um consumidor que teve seus dados divulgados por uma empresa de soluções em proteção ao crédito e prevenção à fraude.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, lembrou que as informações sobre o perfil do consumidor, mesmo as de cunho pessoal, ganharam valor econômico no mercado de consumo e, por isso, o banco de dados constitui serviço de grande utilidade, seja para o fornecedor, seja para o consumidor, mas, ao mesmo tempo, atividade potencialmente ofensiva a direitos da personalidade deste.
Ela afirmou que a gestão do banco de dados impõe a estrita observância das respectivas normas de regência – Código de Defesa do Consumidor (CDC) e Lei 12.414/2011. Segundo a ministra, a legislação impõe o dever de informação, que tem como uma de suas vertentes o dever de comunicar por escrito ao consumidor a abertura de cadastro com seus dados pessoais e de consumo, quando não solicitada por ele, conforme determina o parágrafo 2º do artigo 43 do CDC.
“O consumidor tem o direito de tomar conhecimento de que informações a seu respeito estão sendo arquivadas/comercializadas por terceiro, sem a sua autorização, porque desse direito decorrem outros dois que lhe são assegurados pelo ordenamento jurídico: o direito de acesso aos dados armazenados e o direito à retificação das informações incorretas”, disse.
De acordo com a ministra, a inobservância dos deveres associados ao tratamento dos dados do consumidor – entre os quais se inclui o dever de informar – faz nascer para este a pretensão de indenização pelos danos causados e de fazer cessar, imediatamente, a ofensa aos direitos da personalidade.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-12 11:51:062022-09-12 11:51:11In re ipsa: os entendimentos mais recentes do STJ sobre a configuração do dano presumido (II)
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou os Recursos Especiais 1.986.304, 1.996.013, 1.996.014, 1.996.685 e 1.996.784, de relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, para julgamento sob o rito dos repetitivos.
A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.160 na base de dados do STJ, está assim ementada: “A possibilidade de incidência do Imposto de Renda (IR) retido na fonte e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre o total dos rendimentos e ganhos líquidos de operações financeiras, ainda que se trate de variações patrimoniais decorrentes de diferença de correção monetária”.
Aplicação equivocada de precedentes estimula a litigância
Segundo o relator, está presente o caráter repetitivo da demanda, sendo que pelo menos 42 acórdãos e 413 decisões monocráticas já foram proferidos por ministros do STJ em processos com controvérsia similar. Além disso, outros 950 processos sobre o mesmo assunto estão em tramitação na corte e nos Tribunais Regionais Federais.
Segundo Campbell Marques, é pacífico o entendimento, nas duas turmas de direito público do STJ, no sentido da possibilidade de tributação.
No entanto – destacou o magistrado –, a litigância tem sido encorajada pela equivocada aplicação, no STJ e em outros tribunais, de precedentes que se referem à tributação do lucro inflacionário prevista no artigo 21 da Lei 7.799/1989, e também por uma interpretação ampliativa dada aos precedentes do Supremo Tribunal Federal que reconheceram a não incidência do IR sobre juros de mora.
O ministro considerou que está configurada “típica demanda de massa”, que envolve a insurgência de contribuintes contra atos normativos federais que interpretam a legislação tributária de modo padronizado. Além disso, “são invocados nas razões dos recursos especiais precedentes consolidados e referentes a temas também julgados em repetição/repercussão geral, o que põe em risco as características de integridade, estabilidade e coerência da jurisprudência desta casa”, afirmou.
Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica
O Código de Processo Civil de 2015 regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.
A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-12 11:44:192022-09-12 11:44:23Primeira Seção discute incidência do IR e da CSLL sobre rendimentos de operações financeiras
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que o sócio devedor possui legitimidade e interesse recursal para impugnar a decisão que deferiu o pedido de desconsideração inversa da personalidade jurídica das empresas de que participa.
O colegiado deu parcial provimento ao recurso especial em que o devedor buscava reformar a decisão que, no curso do cumprimento de sentença contra ele, deferiu o pedido de desconsideração inversa para que fosse alcançado o patrimônio das empresas de que é sócio.
O devedor havia interposto agravo de instrumento no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) a fim de demonstrar a inexistência dos requisitos para o deferimento da desconsideração inversa da personalidade jurídica, com base no regramento do artigo 50 do Código Civil. O TJDFT não conheceu do recurso, sob o fundamento de que o sócio devedor não teria legitimidade nem interesse recursal para questionar a decisão do juízo de primeiro grau.
Perante o STJ, o devedor argumentou que a prática dos atos que levaram à desconsideração foi atribuída à pessoa física do sócio administrador; por isso, seria evidente o seu interesse em rediscutir a decisão que lhe atribuiu o exercício da atividade empresarial mediante conduta antijurídica.
Uso do patrimônio da empresa para quitação da dívida pode afetar relação entre sócios
O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, observou que, pela literalidade da lei, na desconsideração da personalidade jurídica, apenas a parte cujo patrimônio será alcançado pela medida excepcional – o sócio ou a sociedade empresária (desconsideração inversa) – é que integrará o polo passivo do incidente, não se exigindo, em princípio, a intimação do devedor.
No entanto, o ministro ressaltou que, em casos semelhantes, a doutrina considera evidente o interesse jurídico do devedor originário, pois, se o patrimônio da empresa for utilizado para a quitação da dívida, poderá haver ação de regresso, situação com potencial de influir na relação entre os sócios, levando à quebra da affectio societatis – vínculo psicológico entre os integrantes de uma sociedade, cuja perda conduz à sua dissolução parcial ou integral.
Devedor pode intervir no feito na condição de assistente
Bellizze afirmou que, segundo a doutrina, o pedido de desconsideração formulado na petição inicial ou em caráter superveniente resultará, respectivamente, em litisconsórcio facultativo inicial ou ulterior. Para o magistrado, mesmo que o devedor não figure como litisconsorte no incidente, ele poderá intervir no feito na condição de assistente, dado o seu manifesto interesse jurídico.
Segundo o relator, são nítidos “o interesse e a legitimidade do sócio devedor tanto para figurar no polo passivo do incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica quanto para impugnar a decisão que lhe ponha fim – seja na condição de parte vencida, seja na condição de terceiro em relação ao incidente –, em interpretação dos artigos 135 e 996 do Código de Processo Civil de 2015“, concluiu o relator ao dar parcial provimento ao recurso especial e determinar o retorno dos autos ao TJDFT para julgamento do agravo de instrumento.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-12 11:39:042022-09-12 11:39:11Sócio devedor tem legitimidade para impugnar desconsideração inversa da personalidade jurídica
No direito brasileiro, a regra é que os danos sejam comprovados pelo ofendido para que se justifique o arbitramento judicial de indenização. Entretanto, em hipóteses excepcionais, são admitidos os chamados danos in re ipsa, nos quais o prejuízo, por ser presumido, independe de prova.
A possibilidade da presunção de um dano – material ou moral – constitui uma vantagem para o ofendido e uma dificuldade para o ofensor, na medida em que há, como consequência, a superação da fase probatória no processo.
Ao longo do tempo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já estabeleceu uma série de situações em que há a configuração do dano in re ipsa, e continua analisando, cotidianamente, os mais diversos casos em que se pode ou não presumir a existência do dano.
Nesse sentido, serão julgados dois novos recursos repetitivos sobre o assunto. No Tema 1.096, a Primeira Seção vai definir “se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)”.
Já no Tema 1.156, a Segunda Seção vai estabelecer “se a demora na prestação de serviços bancários superior ao tempo previsto em legislação específica gera dano moral individual in re ipsa apto a ensejar indenização ao consumidor”.
Dano moral pela contaminação de alimento com corpo estranho Em 2021, no julgamento do REsp 1.899.304, a Segunda Seção unificou a jurisprudência das turmas de direito privado do STJ e considerou irrelevante a efetiva ingestão do alimento contaminado por corpo estranho – ou do próprio corpo estranho – para a caracterização do dano moral, pois a compra do produto insalubre é potencialmente lesiva ao consumidor.
Para a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, “a distinção entre as hipóteses de ingestão ou não do alimento insalubre pelo consumidor, bem como da deglutição do próprio corpo estranho, para além da hipótese de efetivo comprometimento de sua saúde, é de inegável relevância no momento da quantificação da indenização, não surtindo efeitos, todavia, no que tange à caracterização, a priori, do dano moral”.
No caso julgado, o consumidor pediu indenização contra uma beneficiadora de arroz e o supermercado que vendeu o produto, em razão da presença de fungos, insetos e ácaros na embalagem. Os ministros reformaram acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para restabelecer a sentença que fixou o dano moral em R$ 5 mil.
Uso indevido de marca dispensa prova de dano material e moral A jurisprudência do STJ também entende que é devida reparação por danos patrimoniais (a serem apurados em liquidação de sentença) e por danos extrapatrimoniais na hipótese de se constatar a violação de marca, independentemente de comprovação concreta do prejuízo material e do abalo moral resultante do uso ilícito.
Com esse entendimento, a Quarta Turma, no julgamento do REsp 1.507.920, manteve em R$ 15 mil a indenização por danos morais a que a empresa Sonharte Brasil foi condenada pelo uso indevido da marca de outra empresa do mesmo ramo, a Sonhart.
As instâncias de origem reconheceram que a Sonharte se valeu da expressão para a divulgação de seus serviços e produtos, a despeito de ser inequivocamente semelhante à marca da concorrente, e concluíram que houve violação do direito de propriedade intelectual da Sonhart.
Para a relatora, ministra Isabel Gallotti, houve concorrência desleal e aproveitamento parasitário, mediante a comercialização de produtos com o uso de nome “praticamente idêntico” ao registrado pela concorrente “no mesmo ramo de atividade econômica, de forma a induzir em erro o consumidor”.
Indenização por violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar Nos casos de violência contra a mulher em âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de produção de provas.
A tese foi fixada pela Terceira Seção em julgamento de recurso repetitivo (Tema 983). Em um dos processos julgados como representativos da controvérsia, o colegiado restabeleceu a condenação de R$ 3 mil por danos morais imposta ao ex-companheiro da vítima. De acordo com os autos, ele lhe deu um tapa no rosto com força suficiente para jogá-la no chão e, logo depois, acelerou seu veículo e a atropelou.
Segundo o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, no âmbito da reparação por danos morais, a Lei Maria da Penha – complementada pela Lei 11.719/2008, que alterou o Código de Processo Penal – permitiu que um único juízo, o criminal, decida sobre o valor de indenização, o qual, “relacionado à dor, ao sofrimento e à humilhação da vítima, de difícil mensuração, deriva da própria prática criminosa experimentada”.
Para o ministro, não é razoável exigir instrução probatória sobre o dano psíquico, o grau de humilhação ou a diminuição da autoestima, “se a própria conduta criminosa empregada pelo agressor já está imbuída de desonra, descrédito e menosprezo à dignidade e ao valor da mulher como pessoa”.
Na sua avaliação, a não exigência de produção de prova dos danos morais, nesses casos, também se justifica pela necessidade de melhor concretizar, com o suporte processual já existente, “o atendimento integral à mulher em situação de violência doméstica, de sorte a reduzir sua revitimização e as possibilidades de violência institucional, consubstanciadas em sucessivas oitivas e pleitos perante juízos diversos”.
Recusa do plano de saúde a autorizar tratamento médico emergencial As turmas de direito privado do STJ têm orientação firmada no sentido de que a recusa indevida de tratamento médico emergencial, pela operadora de plano de saúde, enseja reparação por danos morais, pois agrava a situação de aflição psicológica e de angústia do beneficiário, estando caracterizado o dano moral in re ipsa.
Esse entendimento levou a Terceira Turma, no julgamento do REsp 1.839.506, a reformar acórdão que negou a indenização a um paciente cujo tratamento ocular quimioterápico, prescrito por seu médico, não foi autorizado pelo plano de saúde, sob a justificativa de que ele não preencheria os requisitos estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para a cobertura do exame e do tratamento postulados.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) entendeu que o dano moral não seria devido, embora tenha concluído que a recusa de tratamento foi injusta.
O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, lembrou que a jurisprudência do STJ reconhece que, em algumas situações, há dúvida razoável na interpretação de cláusula contratual, de forma que a conduta da operadora, ao optar pela restrição da cobertura sem ofender os deveres anexos do contrato – como a boa-fé –, não pode ser reputada ilegítima ou injusta, violadora de direitos imateriais, o que afasta qualquer pretensão de compensação por danos morais.
No entanto, ele verificou que esse não era o caso dos autos, pois não havia discussão em torno da interpretação de cláusula contratual. Assim, configurado o abuso da operadora na recusa da cobertura, o colegiado concluiu que era devida a indenização por danos morais.
Agressão a criança não exige prova de dano moral Em 2017, no REsp 1.642.318, a Terceira Turma estabeleceu que o reconhecimento do dano moral sofrido por criança vítima de agressão não exige o reexame de provas do processo – o que seria inviável na discussão de recurso especial –, sendo suficiente a demonstração de que o fato ocorreu.
Os ministros rejeitaram o recurso especial de uma mulher condenada a pagar R$ 4 mil por danos morais em razão de agressões verbais e físicas contra uma criança de dez anos que havia brigado com sua filha na escola.
Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, “a sensibilidade ético-social do homem comum, na hipótese, permite concluir que os sentimentos de inferioridade, dor e submissão sofridos por quem é agredido injustamente, verbal ou fisicamente, são elementos caracterizadores da espécie do dano moral in re ipsa”.
A ministra destacou que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) assegura o direito à inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral (artigo 17), bem como a legislação brasileira garante a primazia do interesse das crianças e dos adolescentes, com a proteção integral dos seus direitos.
“Logo, a injustiça da conduta da agressão, verbal ou física, de um adulto contra uma criança ou adolescente independe de prova e caracteriza atentado à dignidade dos menores”, acrescentou a relatora.
Comercialização de dados pessoais em banco de dados Para a Terceira Turma, a disponibilização ou a comercialização de informações pessoais do consumidor em banco de dados, sem o seu conhecimento, configura hipótese de dano moral in re ipsa. No julgamento do REsp 1.758.799, os ministros mantiveram em R$ 8 mil a indenização devida a um consumidor que teve seus dados divulgados por uma empresa de soluções em proteção ao crédito e prevenção à fraude.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, lembrou que as informações sobre o perfil do consumidor, mesmo as de cunho pessoal, ganharam valor econômico no mercado de consumo e, por isso, o banco de dados constitui serviço de grande utilidade, seja para o fornecedor, seja para o consumidor, mas, ao mesmo tempo, atividade potencialmente ofensiva a direitos da personalidade deste.
Ela afirmou que a gestão do banco de dados impõe a estrita observância das respectivas normas de regência – Código de Defesa do Consumidor (CDC) e Lei 12.414/2011. Segundo a ministra, a legislação impõe o dever de informação, que tem como uma de suas vertentes o dever de comunicar por escrito ao consumidor a abertura de cadastro com seus dados pessoais e de consumo, quando não solicitada por ele, conforme determina o parágrafo 2º do artigo 43 do CDC.
“O consumidor tem o direito de tomar conhecimento de que informações a seu respeito estão sendo arquivadas/comercializadas por terceiro, sem a sua autorização, porque desse direito decorrem outros dois que lhe são assegurados pelo ordenamento jurídico: o direito de acesso aos dados armazenados e o direito à retificação das informações incorretas”, disse.
De acordo com a ministra, a inobservância dos deveres associados ao tratamento dos dados do consumidor – entre os quais se inclui o dever de informar – faz nascer para este a pretensão de indenização pelos danos causados e de fazer cessar, imediatamente, a ofensa aos direitos da personalidade.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-12 11:05:402022-09-12 11:05:45In re ipsa: os entendimentos mais recentes do STJ sobre a configuração do dano presumido
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que os danos decorrentes da prestação de serviço público por fundação privada de apoio à universidade pública se submetem ao prazo prescricional de cinco anos previsto no artigo 1º-C da Lei 9.494/1997.
A controvérsia analisada pelo colegiado teve origem em ação de danos morais e materiais ajuizada por uma pós-doutoranda que, em virtude de falha no serviço de desembaraço aduaneiro prestado por fundação privada de apoio à universidade pública, alega ter perdido amostra genética destinada à sua pesquisa.
A pesquisadora, bolsista da Fapesp, fazia o estudo em formato “sanduíche”, parte em Portugal, parte no Brasil. A pesquisa foi concebida em 2013, em seu doutorado. Após produzir as amostras genéticas na Europa, com cruzamentos de duas gerações de indivíduos com mutações de interesse, seriam feitas dissecção dos tecidos, extração de RNA e seu sequenciamento, na Unicamp.
Entretanto, após retornar ao Brasil, em 2015, ela teve as amostras retidas na aduana. A fundação de apoio à universidade afirmou ter enviado os documentos necessários para o desembaraço, mas a pesquisadora, após estranhar a demora na entrega do material e se informar diretamente com a Anvisa, soube que os tecidos haviam sido devolvidos a Portugal por falta da documentação. Todo o material genético se degradou, levando ao cancelamento do experimento.
A fundação alegou ser entidade de direito privado e não ter nenhuma relação contratual com a cientista, visto que a parceria foi firmada diretamente com a universidade. Assim, haveria apenas uma responsabilidade extracontratual sujeita ao prazo prescricional de três anos (artigo 206, parágrafo 3º, inciso V, do Código Civil) – tese acolhida pelo tribunal de origem.
Prescrição é de cinco anos no caso de falha de serviço público prestado por entidade privada
Após identificar a ausência de controvérsia acerca da assunção do desembaraço por prepostos da fundação, o relator, ministro Og Fernandes, destacou ser irrelevante a natureza privada da fundação, pois a prescrição quinquenal descrita na Lei 9.494/1997 se aplica a qualquer entidade que preste serviço público, conforme a jurisprudência do STJ.
O magistrado lembrou que a própria Constituição Federal, em seu artigo 37, parágrafo 6º, dispõe sobre a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos pelos danos causados a terceiros.
“Diante da existência de serviço público na relação entabulada entre a fundação privada e a universidade pública, atrai-se a responsabilidade objetiva extracontratual perante terceiros das pessoas jurídicas de direito privado que prestem serviços públicos, configurando-se hipótese de incidência do prazo prescricional quinquenal”, concluiu o relator.
Conforme o ministro, a hipótese pode ser equiparada aos casos de responsabilização de hospitais privados conveniados ao SUS. Para o STJ, nessa situação, o prazo prescricional também é quinquenal, à luz da mesma norma invocada pela pesquisadora prejudicada pela atuação da fundação privada prestadora de serviço público.
https://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.png00Gelcy Buenohttps://murray.adv.br/wp-content/uploads/2016/06/logo-murray-advogados-300x138.pngGelcy Bueno2022-09-08 12:14:042022-09-08 12:14:17Prazo prescricional por danos causados por fundação privada de apoio à universidade pública é de cinco anos