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31/05/2022

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, firmou o entendimento de que o valor existente em previdência complementar aberta, nas modalidades PGBL e VGBL, deve ser partilhado na separação do casal. Em fevereiro deste ano, a Quarta Turma havia adotado posição no mesmo sentido.

No julgamento da Terceira Turma, prevaleceu o voto da ministra Nancy Andrighi. Ela lembrou que, no ano passado, o colegiado já havia analisado questão semelhante e concluído que, no momento da dissolução do casamento – no caso dos autos, a morte de ambos os cônjuges –, seria necessário colacionar no espólio os valores existentes na previdência privada aberta.

A ministra destacou que o regime de previdência privada aberta é substancialmente distinto da previdência fechada. No sistema aberto, apontou, a previdência é operada por seguradoras autorizadas pela Superintendência de Seguros Privados e pode ser contratada por qualquer pessoa física ou jurídica, havendo grande flexibilidade e liberdade na gestão do fundo.

“Os planos de previdência privada aberta, de que são exemplos o VGBL e o PGBL, não apresentam os mesmos entraves de natureza financeira e atuarial que são verificados nos planos de previdência fechada e que são óbices à partilha, pois, na previdência privada aberta, há ampla flexibilidade do investidor, que poderá escolher livremente como e quando receber, aumentar ou reduzir contribuições, realizar aportes adicionais, resgates antecipados ou parcelados a partir da data que porventura indicar”, completou.

Acumulação da previdência aberta é semelhante a fundo de investimento comum

Segundo Nancy Andrighi, a natureza securitária e previdenciária complementar desses contratos é mais marcante no momento em que o investidor passa a receber, a partir de data futura e em prestações periódicas, os valores que acumulou ao longo da vida, como forma de complementação da previdência pública e com o objetivo de manter determinado padrão de vida.

Por outro lado, no período que antecede o recebimento desses valores – ou seja, durante a fase das contribuições –, a magistrada ressaltou que a formação do capital investido é bastante semelhante ao que ocorreria se os aportes fossem realizados em fundos de renda fixa ou na aquisição de ações – os quais seriam objeto de partilha no momento da dissolução do vínculo conjugal.

“Sublinhe-se que o hipotético tratamento diferenciado entre os investimentos realizados em previdência privada complementar aberta (incomunicáveis) e os demais investimentos (comunicáveis) possuiria uma significativa aptidão para gerar profundas distorções no regime de bens do casamento, uma vez que bastaria ao investidor direcionar seus aportes para essa modalidade para frustrar a meação do cônjuge”, afirmou a ministra.

Precedentes da Segunda Seção e das turmas de direito público não se aplicam aos autos

Em seu voto, Nancy Andrighi afastou a aplicabilidade, ao caso, do precedente firmado pela Segunda Seção no EREsp 1.121.719, por considerar que naquele recurso se discutiu questão diferente (a possibilidade de penhora de fundo de previdência complementar por dívida contraída com terceiro), a qual não envolvia propriamente a relação jurídica familiar.

A ministra reconheceu, ainda, a existência de precedentes das turmas de direito público no sentido da natureza puramente securitária dos valores depositados em previdência complementar aberta, para fins de incidência tributária. Entretanto, enfatizou que não há, nesse cenário, incoerência ou divergência de entendimento entre os colegiados, tendo em vista a dinâmica própria da relação jurídica familiar, em razão do esforço do casal para a constituição do patrimônio destacado e a sua característica preponderante de investimento financeiro.

“De outro lado, também é possível afirmar, sem que haja nenhuma incompatibilidade ou incoerência, que, sobre os valores aportados na previdência privada aberta, não incide um determinado tributo, seja porque, na relação jurídica dos cônjuges perante o fisco, sobressai a natureza securitária e mais protetiva da entidade familiar, seja porque não estão presentes todos os requisitos para a incidência do fato gerador do tributo”, concluiu a ministra.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

30 de maio de 2022

Não é possível considerar válida a citação de pessoa jurídica em seu antigo endereço, caso a mudança tenha sido comunicada à Junta Comercial, ainda que o endereço permaneça inalterado no site da empresa.

É inválida citação em endereço antigo se mudança foi registrada na Junta Comercial

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça considerou inválida a citação de uma empresa por meio de carta dirigida a local onde não mais se encontrava estabelecida a sua sede, embora o endereço antigo ainda aparecesse na internet.

Ao negar provimento ao recurso da empresa e rejeitar seu pedido de anulação da citação, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro afirmou que ela tinha a obrigação de manter o endereço atualizado na internet.

No recurso especial apresentado ao STJ, a empresa alegou ter alterado seu endereço na época da citação, que foi enviada pelo correio, e providenciado o arquivamento do ato societário correspondente na Junta Comercial.

Para o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a verificação da validade da citação deve levar em conta a importância do ato, especialmente à luz dos direitos e das garantias que envolvem o sistema processual.

“Justamente em razão da estreita ligação entre a citação e o exercício das garantias processuais do contraditório e da ampla defesa, o formalismo desse ato de comunicação assume papel fundamental e não pode ser afastado”, afirmou.

Segundo Sanseverino, devem ser preenchidos dois requisitos básicos para que a citação seja válida: a entrega do mandado ou da carta de citação no endereço da pessoa jurídica; e o recebimento por um funcionário seu, mesmo que não seja representante legal, mas que não faça qualquer ressalva quanto à inexistência de poderes de representação em juízo.

No caso, observou o magistrado, não foi preenchido o primeiro requisito, pois a carta de citação foi entregue em endereço no qual a empresa recorrente não mais mantinha a sua sede. Sobre o segundo requisito, o ministro ponderou não ser possível concluir se foi preenchido ou não, dado que não foi constatado, pelo TJ-RJ, se o recebedor da carta teria vínculo com a empresa ou se era apenas o porteiro do edifício.

“Independentemente dos deveres que devem ser observados no âmbito das relações de direito material e, evidentemente, não se olvidando da observância da boa-fé objetiva também na seara processual, é ônus do autor informar o endereço correto do réu, a fim de viabilizar a prática correta dos atos de comunicação processual, nos termos do artigo 282 do Código de Processo Civil de 1973 e do artigo 319, II, do CPC de 2015”, destacou o relator.

Sanseverino ressaltou que a lei é bastante cautelosa ao tratar do dever de informar endereços para a prática de atos de comunicação processual. Para ele, a obrigação legal de registro da alteração do contrato social com o novo endereço foi cumprida pela empresa, nos termos do artigo 32 da Lei 8.934/1994, garantindo a publicidade da modificação.

Para a citação por meio eletrônico, exemplificou o ministro, não é válido qualquer endereço divulgado pela empresa, como aquele informado para clientes e parceiros comerciais na internet. Segundo disse, é necessário observar o endereço eletrônico cadastrado especificamente para tal finalidade.

Ao dar provimento ao recurso e decretar a nulidade da citação da recorrente, o relator declarou que “não existe norma jurídica prevendo qualquer tipo de presunção de validade de citação encaminhada a endereço desatualizado”.

“Como se trata de ato processual de suma importância para o exercício do contraditório e da ampla defesa, não é lícita qualquer citação ficta além daquelas expressamente previstas em lei”, concluiu.


REsp 1.976.741

 Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

27 de maio de 2022

Para a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, nas ações relacionadas a contrato verbal em que não há determinação de prazo para o cumprimento da obrigação, aplica-se a regra geral que prevê a prescrição em dez anos, prevista no artigo 205 do Código Civil de 2002 (CC/2002).

A controvérsia julgada pelo colegiado teve origem em ação de obrigação de fazer com conversão em perdas e danos. Segundo o autor da demanda, os réus não teriam honrado o compromisso — assumido em troca de alguns bens — de pagar uma dívida com o Banco do Brasil, no valor histórico de RS 100 mil no ano de 1997.

O processo foi extinto em primeiro grau após o reconhecimento da prescrição. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) manteve a sentença, entendendo que, por se tratar de pretensão de reparação civil, a ação prescreveria em três anos.

No recurso especial submetido ao STJ, o autor alegou violação do CC/2002 e sustentou que a pretensão de conversão da obrigação de fazer não cumprida em perdas e danos prescreveria em dez anos. Ele argumentou, ainda, que o prazo deveria ser contado a partir da impossibilidade de cumprimento da obrigação de fazer, ou seja, o pagamento da dívida ao banco.

Não cumprimento da obrigação assumida
O relator, ministro Moura Ribeiro, lembrou que, em 2019, a Corte Especial do STJ, em duas oportunidades (EREsp 1.281.594 e EREsp 1.523.744), definiu que, nas pretensões relacionadas a responsabilidade contratual, deve ser aplicada a regra geral que prevê dez anos de prazo prescricional.

O ministro destacou que, nas demandas sobre responsabilidade extracontratual, o tribunal estabeleceu que deve ser aplicado o disposto no artigo 206, parágrafo 3º, V, do CC/2002, ou seja, o prazo de três anos.

Moura Ribeiro relatou que, no caso sob julgamento, em agosto de 2002, foi firmado um contrato verbal entre o autor da ação e os dois réus, no qual ficou combinado que estes últimos pagariam a dívida bancária do primeiro, mediante a transferência de alguns bens. No entanto, a dívida não foi paga.

Ele observou, ainda, que a ação de obrigação de fazer foi proposta em julho de 2012, quando ainda não havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional de 20 anos previsto no Código Civil de 1916. Dessa forma, conforme preceitua a jurisprudência do STJ, deve ser levado em conta o prazo para a propositura de ação decorrente de inadimplemento contratual: aquele previsto no artigo 205 do novo código.

Termo inicial do prazo prescricional
Para o relator, o termo inicial do prazo de prescrição está diretamente relacionado ao surgimento do interesse processual para a propositura da ação. Segundo ele, enquanto não houver interesse — condição da ação —, não se inicia a contagem do prazo.

No caso julgado, ressaltou o ministro, o contrato verbal não fixou prazo para o cumprimento das prestações combinadas. Assim, de acordo com os artigos 134 e 331 do CC/2002, a obrigação poderia ser exigida de imediato.

De acordo com o magistrado, na falta de predeterminação de data para o cumprimento da obrigação, é necessário constituir o devedor em mora, para então surgir a pretensão de cobrança. Não tendo sido prefixada data para o cumprimento da obrigação, concluiu Moura Ribeiro, os devedores deveriam ter sido constituídos em mora por meio de interpelação específica — “ou seja, a mora é ex persona“.

Ao reformar o acórdão do TJ-MT, ele anotou que a ação foi proposta antes do fim do prazo decenal após a notificação dos devedores, o que impõe o afastamento da prescrição. 


REsp 1.758.298

Com informações da assessoria de imprensa do Superior Tribunal de Justiça.

26 de maio de 2022

Apenas o sócio ou o administrador que participou do fechamento irregular da empresa pode responder pessoalmente pela dívida tributária da pessoa jurídica com a Fazenda Pública. Isso acontece mesmo quando ele não integrava o quadro societário ou administrativo no momento do fato gerador do tributo.

STJ delimitou redirecionamento da execução fiscal ajuizada contra sócios de empresas que são fechadas ilicitamente

Com esse entendimento, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça encerrou nesta quarta-feira (25/5) a definição de teses em recursos repetitivos que delimitam a forma como a Fazenda pode redirecionar a execução fiscal contra sócios e administradores de empresas que são fechadas ilicitamente, sem arcar com os próprios encargos.

Dois enunciados foram definidos. Em novembro de 2021, o colegiado fixou tese no Tema 962 determinando que apenas os sócios ou administradores que permaneceram na empresa podem ser alvos de redirecionamento da execução fiscal.

A orientação, portanto, livra aqueles que integravam a empresa no momento do fato gerador, mas que se afastaram dela regularmente antes da dissolução irregular. Nesse ponto, não houve divergência no colegiado, já que a orientação já era pacífica nas turmas de Direito Público.

Restou ao colegiado definir o Tema 981, para saber se o sócio ou administrador que dissolveu irregularmente uma empresa só pode ser responsabilizado pela dívida tributária se ele já ocupava essa posição no momento do fato gerador do tributo em questão.

Por maioria de votos, a 1ª Seção deu resposta negativa a essa indagação. Ou seja, a Fazenda pode responsabilizar quem fechou uma empresa devedora de tributos de forma irregular, ainda que este não seja diretamente responsável pela formação da dívida.

Ministra Assusete Magalhães relatou os dois recursos repetitivos na 1ª Seção do STJ

Divergência
O julgamento do Tema 981 foi encerrado nesta quarta após voto-vista do ministro Herman Benjamin. Até então, o assunto dividia os colegiados do STJ.

A tese passa pela interpretação do artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional, que trata da responsabilização de diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado pelas obrigações tributárias.

Para a 1ª Turma, o sócio ou o administrador que dissolveu irregularmente a empresa só poderia responder pela dívida tributária se ele fosse também o responsável por ela. Ou seja, se ele integrou a sociedade ou a administração da mesma após o fato gerador, não teria responsabilidade alguma.

Essa visão ficou vencida. Foi proposta em fevereiro, em voto-vista da ministra Regina Helena Costa, e restou acompanhada pelos ministros Gurgel de Faria e Benedito Gonçalves, que também integram a 1ª Turma.

Venceu a posição da 2ª Turma, apresentada pela ministra Assusete Magalhães, relatora de ambos os repetitivos.

Isso ocorre porque o fato de alguém ser sócio ou exercer a gerência da empresa não caracteriza no momento do fato gerador do tributo, por si só, não constituti ato de infração à lei ou ao contrato social.

A dissolução irregular da empresa, por outro lado, inviabiliza em definitivo a recuperação do crédito fiscal pela Fazenda. Esse ato ignora o procedimento imposto pela legislação civil-empresarial, que prevê a realização do ativo da empresa e a quitação do passivo antes de seu encerramento.

“Por essa razão, não é dado ao Poder Judiciário afastar prematuramente a convocação do sócio ou do administrador — que vai poder se defender — quando assim for requerido pela Fazenda, para que venha a dar explicações quanto a eventual escusa legítima para o procedimento flagrantemente contrário à lei (a dissolução irregular)“, explicou o ministro Herman Benjamin, no voto-vista.

Julgamento do Tema 981 foi reiniciado com voto-vista do ministro Herman Benjamin

Brecha evitada
Para a posição vencedora no julgamento da 1ª Seção, adotar a tese proposta pelos integrantes da 1ª Turma permitiria criar brecha para uma solução que não traria pacificação social, nem permitiria a recuperação do crédito pela Fazenda.

Isso porque não seria possível cobrar a dívida da pessoa jurídica (pois foi dissolvida irregularmente), nem do gerente que se afastou prematuramente do cargo sem praticar qualquer ato ilícito ou mesmo do gerente à época da dissolução irregular, caso não estivesse na empresa na época do fato gerador.

Na posição vencedora, é a dissolução irregular o ato ilícito que autoriza à Fazenda o redirecionamento.

“O pressuposto da responsabilidade é a prática de ato de infração à lei — no caso, a dissolução irregular, a qual inexiste modalidade culposa. Não se mostra lógico presumir a responsabilidade pela dissolução irregular promovida ‘sem querer’. Havendo ou não ativos na empresa que será ilicitamente dissolvida, não se concebe que ela deixe de existir por ato involuntário de seis sócios”, argumentou o ministro Herman Benjamin.

Teses
A tese aprovada no Tema 962 é:

  • O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, não pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio que, embora exercesse poderes de gerência ao tempo do fato gerador, sem incorrer em prática de atos com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos, dela regularmente se retirou e não deu causa à sua posterior dissolução irregular, conforme artigo 135, III, do CTN.

A tese aprovada no Tema 981 é:

  • O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência pode ser autorizado contra os sócios ou terceiro não sócio com poderes de administração na data em que configurada ou presumida a dissolução irregular, ainda que não tenha exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido, conforme artigo 135, inciso III, do CTN.

Tema 962
REsp 1.377.019
REsp 1.776.138
REsp 1.787.156

Tema 981
REsp 1.643.944
REsp 1.645.281
REsp 1.645.333

Fonte: STJ

25 de maio de 2022

Para que seja atendida a regra do artigo 124, parágrafo único da Lei 8.213/1991, que veda o recebimento conjunto do seguro-desemprego com qualquer benefício de prestação continuada da Previdência Social, basta que haja o abatimento dos valores recebidos a título de seguro-desemprego do montante devido pelo INSS.

Para o desembargador convocado Manoel Erhardt, não é razoável deduzir as parcelas da aposentadoria nos períodos coincidentes

Com esse entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado por um trabalhador, para permitir o acúmulo do benefício de seguro-desemprego e da aposentadoria, deferida judicialmente e com efeitos retroativos.

O pedido da aposentadoria por tempo de contribuição foi feito em maio de 2012 e negado administrativamente. O trabalhador ajuizou ação visando obter o benefício e, por isso, continuou trabalhando. Posteriormente, foi demitido e recebeu seguro-desemprego entre janeiro e maio de 2017.

O trabalhador, então, conseguiu decisão judicial que garantiu o pagamento da aposentadoria com efeitos retroativos. O valor da parcela mensal a ser paga pelo INSS se mostrou maior do que o que ele recebeu a título de seguro-desemprego.

Assim, no cumprimento da sentença, propôs a compensação desses benefícios: nos meses de janeiro a maio de 2017, ele receberia o pagamento da aposentadoria descontado o valor do seguro-desemprego.

O INSS impugnou o cálculo, apontando ofensa ao artigo 124, parágrafo único da Lei 8.213/1991 e pedindo a exclusão total da parcela da aposentadoria nos referidos meses. E a Justiça Federal deu razão. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região concluiu que a compensação ou o desconto pretendido equivaleria ao pagamento conjunto do seguro-desemprego e do benefício previdenciário, o que é vedado por lei.

Relator no STJ, o desembargador convocado Manoel Erhardt entendeu que o abatimento é possível, uma vez que o seguro-desemprego só foi recebido pelo trabalhador pelo fato de ele seguir trabalhando após o indevido indeferimento da aposentadoria pelo INSS.

Aplica-se ao caso a mesma conclusão alcançada pela 1ª Seção, quando fixou tese segundo a qual, no período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado tem direito a receber o salário e o benefício.

“Para que seja atendida a regra prevista no artigo 124, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, que veda o recebimento conjunto do seguro-desemprego com qualquer benefício de prestação continuada da Previdência Social, exceto pensão por morte ou auxílio-acidente, basta, no presente caso, que haja o abatimento dos valores recebidos a título de seguro-desemprego do montante devido”, concluiu o desembargador convocado Manoel Erhardt.


REsp 1.982.937

Fonte: STJ

23 de maio de 2022

É possível submeter o contrato de sociedade em conta de participação à disciplina do Código de Defesa do Consumidor. Para isso, é preciso haver a caracterização do sócio participante ou oculto como investidor ocasional vulnerável e que a figura empresarial seja constituída ou usada com fim fraudulento.

Empresa teria usado sociedade em conta
de participação para abastecer pirâmide

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado pela G44 Brasil, empresa acusada de operar esquema de pirâmide e de lesar diversos de seus sócios por meio de contratos de sociedade em conta de participação (SCP).

Na definição de Fábio Ulhôa Coelho, a sociedade em conta de participação é um modelo no qual um empreendedor (sócio ostensivo) associa-se a investidores (sócios participantes) para explorar uma atividade econômica. Todos os atos são feitos em nome do sócio ostensivo, que responde por eles individualmente.

Esse modelo está previsto no Código Civil, nos artigos 991 a 996. Apesar de ser modalidade societária, a jurisprudência brasileira tem admitido sua submissão às normas do Código de Defesa do Consumidor quando há o desvirtuamento para contrato de adesão.

Isso porque muitas vezes a sociedade em conta de participação é usada justamente para mascarar uma relação em que há o fornecimento de um serviço a uma pessoa que pode ser entendida como o consumidora nessa relação.

No caso dos autos, o particular celebrou contrato de sociedade em conta de participação com a G44 Brasil, investindo R$ 50 mil com a promessa de receber rendimentos bimestrais. Quando o pagamento passou a atrasar, ele solicitou o distrato, mas não recebeu a devolução do dinheiro no prazo de 90 dias.

Desvirtuamento da relação empresarial permite aplicar CDC, disse Nancy Andrighi

As instâncias ordinárias caracterizaram o particular como investidor ocasional vulnerável e concluíram que a G44 Brasil usou sociedade em conta de participação para fins de prática de pirâmide financeira. A empresa foi condenada a devolver o dinheiro.

Graças à incidência do CDC, o processo tramitou no foro de residência da vítima, na 22ª Vara Cível de Brasília. Para a G44 Brasil, a relação empresarial existente entre as partes demandaria a competência do foro da parte ré: uma das varas cíveis de Taguatinga (DF).

Relatora, a ministra Nancy Andrighi manteve o entendimento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Para ela, a conclusão do uso desviado da sociedade em conta de participação para despistar a existência de um verdadeiro contrato de investimento de cunho consumerista permite a incidência do CDC.

“Para incidência excepcional do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de sociedade em conta de participação, devem estar presentes dois requisitos: (a) a caracterização do sócio participante ou oculto como investidor ocasional vulnerável, e (b) ter sido a sociedade em conta de participação constituída ou utilizada com fim fraudulento, notadamente para afastar a incidência do Código de Defesa do Consumidor”, explicou.

Logo, em se tratando de relação de consumo, a competência é absoluta e deve ser fixada no domicílio do consumidor. A votação na 3ª Turma foi unânime.


REsp 1.943.845

Fonte: STJ

23 de maio de 2022

As sociedades de propósito específico (SPE) que atuam na atividade de incorporação imobiliária e administram patrimônio de afetação estão submetidas a um regime criado pela Lei de Incorporações que as torna incompatíveis com a recuperação judicial.

Grupo composto por incorporadoras pediu recuperação judicial, mas TJ-SP negou

Essa foi a conclusão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao negar provimento ao recurso especial ajuizado pelo grupo Esser contra o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que indeferiu o seu pedido de recuperação.

O processo de soerguimento abrangeria, além da empresa controladora, 49 sociedades integrantes do grupo econômico.

O deferimento da recuperação judicial foi contestado por dois bancos credores, com base na ausência dos atos de incorporação dessas pessoas jurídicas ao grupo Esser.

Trata-se do primeiro precedente sobre o tema no STJ, que acabou resolvido por votação unânime, conforme a posição apresentada pelo relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

O cenário
O caso envolve pedido de recuperação judicial da holding Esser, que inclui empresas que atuam sob a forma de sociedade de propósito específico (SPE). São pessoas jurídicas criadas com a única finalidade de executar um determinado projeto. Seu objeto social, uma vez definido, não pode ser alterado.

No Brasil, é um modelo especialmente popular para a incorporação imobiliária. Em geral, uma empresa controladora cria uma SPE para cada empreendimento — cada prédio ou condomínio que será construído e vendido. Encerrado o projeto, encerra-se também a SPE.

Isso deixou o mercado especialmente vulnerável devido a atrasos ou insolvência da SPE. As incorporadoras financiavam as construções, oferecendo como garantia o terreno e o próprio prédio, mas usavam a verba para outros gastos, o que levava à falência das pessoas jurídicas.

Voto do ministro Villas Bôas Cueva
explicou cenário do mercado imobiliário
Emerson Leal/STJ

Esse cenário levou à alteração na Lei de Incorporações (Lei 4.591/1964), com a inclusão dos artigos 31-A a 31-F. Criou-se a figura da afetação patrimonial: uma parte do patrimônio geral do incorporador fica separada para ser usada em um empreendimento específico, como uma garantia, a qual deve ser averbada em termo levado a efeito no Registro de Imóveis.

O problema é que a crise econômica de 2014, a crescente inadimplência dos compradores dos imóveis e o aumento de distratos prejudicaram a contabilidade das SPEs e das próprias empresas controladoras, e muitas delas passaram a pedir recuperação judicial.

Pode ou não pode?
Relator do recurso, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva afirmou que a inclusão da afetação patrimonial pela Lei de Incorporações criou nas sociedades de propósito específico um regime incompatível com a recuperação judicial.

A verba da afetação patrimonial não se submete ao controle do juízo universal. Ela fica separada, inclusive em conta corrente específica, e só volta ao patrimônio geral da incorporadora após a conclusão do projeto da SPE, se houver sobras.

Já se a SPE não funciona com o regime de afetação patrimonial, não há óbice para o deferimento da recuperação judicial. A ressalva é que ela deve ser estruturada a partir exclusivamente da situação da sociedade de propósito específico — sem levar em conta as contas de outras SPEs ou da própria empresa controladora.

Súmula 7
O caso julgado pela 3ª Turma acabou resolvido com aplicação da Súmula 7, que veda reanálise de fatos e provas em sede de recurso especial.

Não seria possível ao colegiado rever a conclusão do Tribunal de Justiça de São Paulo, no sentido de que a recuperação judicial do grupo Esser é inviável por não existir atividade econômica a ser preservada.

Essa situação foi confirmada por meio de perícia solicitada pelo juízo. “É oportuno mencionar que o tribunal de origem, ao constatar a ausência de atividade das recorrentes, não incursionou na viabilidade econômica das empresas mas, sim, verificou a ausência de um dos pressupostos para o deferimento do pedido de processamento — o exercício de atividade regular pelo prazo de 2 (dois) anos”, explicou o ministro Cueva.


REsp 1.973.180

Fonte: STJ

23 de maio de 2022

Se a lei tem por escopo de conferir ampla proteção ao direito de moradia, o fato de um imóvel usado como moradia familiar ser objeto de caução em contrato de locação comercial não afasta sua impenhorabilidade somente porque pertence a uma pequena sociedade empresária.

Imóvel da empresa usado pela família foi dado como caução em contrato de locação de loja de shopping center

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado por uma empresa administradora de shopping centers, que visava penhorar um apartamento pertencente a pessoa jurídica para saldar dívida.

O imóvel foi dado como caução em contrato comercial e é usado como moradia familiar do sócio contratante. Para a administradora, essa situação deve afastar a impenhorabilidade definida pela Lei 8.009/1990.

Relator no STJ, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva destacou que as exceções à impenhorabilidade do bem de família, descritas no artigo 3º da lei, devem receber interpretação restritiva.

E a jurisprudência da corte se firmou no sentido de que a exceção do inciso VII do artigo 3º, referente à “obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”, não se aplica à hipótese em que há oferecimento de caução.

Assim, a regra não pode ser afastada só porque o imóvel oferecido na caução é de propriedade da empresa, principalmente sendo ela de pequeno porte.

“Caso contrário, haveria o esvaziamento da salvaguarda legal e daria maior relevância do direito de crédito em detrimento da utilização do bem como residência pelo sócio e por sua família”, destacou o ministro Cueva.

Jurisprudência
A jurisprudência brasileira, de fato, faz a diferenciação entre o instituto da fiança e do caução, para fins de impenhorabilidade do imóvel oferecido em contrato de locação comercial.

O Supremo Tribunal Federal fixou tese, em março de 2022, segundo a qual é constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja comercial, seja residencial.

Em julgamento recente, a 4ª Turma do STJ, que também julga temas de Direito Privado, afastou a penhora de um imóvel de família oferecido como caução em contrato de aluguel comercial.

REsp 1.935.563

Fonte: STJ

20 de maio de 2022

No caso de micro ou pequena empresa, é possível a responsabilização dos sócios pelo inadimplemento do tributo devido, com base no artigo 134, inciso VII, do Código Tributário Nacional.

Mauro Campbell: sócio só se livra da dívida se provar que patrimônio é insuficiente

A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça adotou esse entendimento para dar provimento ao recurso especial da Fazenda para permitir que ela cobre dos sócios de uma mecânica pelos tributos não quitados antes do fechamento da empresa.

As instâncias ordinárias haviam entendido que o direcionamento da execução fiscal aos sócios era indevido porque, no caso da microempresa, a dívida tributária não decorreu de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Essa hipótese de responsabilização pessoal pela dívida tributária está prevista no artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional.

Para a Fazenda, essa aplicação dada pelo STJ diz respeito aos casos em que há dissolução irregular do contribuinte — quando os sócios, em vez de observarem o procedimento da lei para extinguir a pessoa jurídica, simplesmente debandam de forma precipitada.

Relator no STJ, o ministro Mauro Campbell entendeu que a argumentação é razoável, já que o artigo 9º da Lei Complementar 123/2006, que trata das micro e pequenas empresas, permite a dissolução regular sem a apresentação da certidão de regularidade fiscal.

Por outro lado, ele destacou que isso não implica extinção da satisfação de obrigações tributárias, nem afastamento da responsabilidade dos sócios, como dispõem os parágrafos 4º e 5º do mesmo artigo 9º da LC 123/2006.

“No caso de micro e pequenas empresas é possível a responsabilização dos sócios pelo inadimplemento do tributo, com base no artigo 134, VII, do CTN, cabendo-lhe demonstrar a insuficiência do patrimônio quando da liquidação para exonerar-se da responsabilidade pelos débitos”, afirmou o ministro Mauro Campbell.

A posição se baseia em acórdãos publicados pela 1ª Turma do STJ, que também julga temas de Direito Público. A votação na 2ª Turma foi unânime.


REsp 1.876.549

Fonte: STJ

18/05/2022

​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não é possível a prisão civil do devedor de alimentos indenizatórios, fixados provisoriamente aos pais de vítima de homicídio, no curso de ação fundada em responsabilidade civil por acidente de trânsito.

O colegiado concedeu habeas corpus para um homem condenado a prestar alimentos aos pais da vítima de forma provisória, no valor de dois terços do salário mínimo, até o julgamento da ação em que se discute a responsabilidade civil pelo acidente.

O habeas corpus foi impetrado após o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) concluir que a execução de alimentos indenizatórios pode ser processada pelo rito da prisão civil, sob o argumento de que o artigo 528 do Código de Processo Civil (CPC/2015) não faz diferença quanto à origem da obrigação alimentar; por isso, o inadimplemento voluntário e inescusável de qualquer prestação alimentícia autorizaria o encarceramento do devedor.

Prisão civil não admite interpretação extensiva

O relator do habeas corpus, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, ressaltou que a jurisprudência do STJ entende que a prisão civil por alimentos se restringe às obrigações decorrentes do direito de família.

Segundo o magistrado, a prisão civil, autorizada de forma excepcional pelo inciso LXVII do artigo 5º da Constituição Federal e pelo artigo 7º da Convenção Americana de Direitos Humanos, é restrita tão somente ao inadimplemento voluntário e inescusável da obrigação alimentar decorrente de relação familiar.

Isso porque, explicou o relator, no seio das relações familiares, os alimentos constituem instrumento essencial à manutenção da subsistência digna e da própria vida do alimentando.

Sanseverino destacou ainda que as expressões “obrigação alimentícia” e “obrigação alimentar”, previstas na Convenção Americana de Direitos Humanos, devem ser interpretadas restritivamente.

“Tratando-se de regra de exceção, a prisão civil não comporta interpretação extensiva, sob pena de se alargarem excessivamente as hipóteses de encarceramento por dívidas, subvertendo-se, assim, o próprio comando constitucional do inciso LXVII do artigo 5º”, reiterou.

Extensão do dano causado pelo ato ilícito

No entender do ministro, a pensão decorrente da responsabilidade civil, com natureza indenizatória, cujo fundamento não deriva da possibilidade do devedor, mas da própria extensão do dano causado pelo ato ilícito, serve apenas de parâmetro para se alcançar a reparação integral prevista no artigo 944 do Código Civil.

“Em matéria de responsabilidade civil, os alimentos não se mostram, a princípio, essenciais à manutenção da subsistência e da vida do credor, refletindo mero parâmetro de indenização, para melhor apuração do cálculo do valor a ser ressarcido”, ponderou o relator.

Ao conceder o habeas corpus e confirmar a liminar deferida anteriormente, Sanseverino observou que, na fixação de alimentos indenizatórios, não se levam em consideração a necessidade do credor, vítima do evento danoso – justamente porque deles não depende –, nem a possibilidade do devedor, mas, sim, a extensão do dano, isto é, a parcela do patrimônio indevidamente retirada por meio do ato ilícito.

Leia o acórdão no HC 708.634.

Fonte: STJ