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27 de janeiro de 2022

Seria um contrassenso o Estado, que age em nome da coletividade no papel de guardião do meio-ambiente ecologicamente equilibrado, brindar com contratos, incentivos fiscais, registro, licença e autorização a pessoa física ou jurídica que contamina ou degrada a natureza.

Pesca predatória com uso de redes de arrasto geral dano ambiental indenizável

Com esse entendimento, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado pelo Ibama para determinar sanções extras a uma empresa e seu sócio, ambos condenados a indenizar o Estado brasileiro por praticar a pesca de arrasto.

O caso ocorreu no litoral do Rio Grande do Sul, onde agentes do Ibama flagraram e reportaram o dano ambiental. Na pesca de arrasto, embarcações usam grandes e pesadas redes para, em movimento, exatamente arrastá-la pelo fundo do oceano, trazendo com si espécies não visadas e outras estruturas, como corais.

Em primeiro grau, o juízo identificou o dano ambiental e condenou a empresa a pagar R$ 200 mil por danos materiais e outros R$ 20 mil em danos morais coletivos, com a possibilidade de desconsideração da pessoa jurídica no momento da execução da pena, para alcançar os sócios.

O Ibama recorreu para que fosse cancelado o registro da empresa e cassadas a licença e incentivos fiscais. Elas estão previstas no artigo 14, incisos II a IV da Lei 6.938/1981 e no artigo 72, incisos IV a XI da Lei 9.605/1998.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região registrou que a sanção é possível, mas entendeu que, no caso concreto, não seriam aplicável. E acrescentou que as mesmas medidas poderiam ser buscadas na seara administrativa.

Para o ministro Herman Benjamin, seria contrassenso manter registro e benefícios à empresa que degrada o meio ambiente

“Não se está aqui a dizer que as esferas cível e administrativa dependam uma da outra, mas sim de concluir, conforme a situação trazida aos autos e de acordo com o entendimento dos julgadores, com base no livre convencimento”, disse o desembargador Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, relator do caso no TRF-4, ao julgar os embargos de declaração.

Relator no STJ, o ministro Herman Benjamin reformou essa parte do acórdão. Destacou que tais sanções se encaixam no vasto leque do poder geral do juiz em demandas de responsabilidade civil ambiental. São diligências acessórias, saneadoras e pedagógicas.

“Até porque representaria contrassenso o Estado — que age em nome da coletividade atual e vindoura, no seu papel de guardião do meio ambiente ecologicamente equilibrado — brindar com contratos, incentivos fiscais ou creditícios, e preservar registro, licença ou autorização, em benefício de pessoa física ou jurídica que contamina ou degrada a natureza”, pontuou.

Apontou que o artigo 12 da Lei 6.938/1981 fixa que entidades e órgãos de financiamento e incentivos governamentais devem condicionar a concessão desses benefícios ao licenciamento e ao cumprimento das normas fixadas por órgãos ambientais e pelo próprio legislador ordinário.

“No caso em tela, foi reconhecido, expressamente, pelo Tribunal a quo o dano ambiental. Portanto, é pertinente e adequada a pretensão recursal quanto ao cálculo corrigido do dano e à imposição de medidas complementares à empresa-ré”, concluiu o ministro Herman Benjamin.


REsp 1.745.033

Fonte: STJ

27 de janeiro de 2022

Apesar de a Lei 11.101/2005 expressamente excluir de sua aplicação as cooperativas de crédito, ainda assim é possível a decretação da falência das mesmas, tendo em vista que essa é uma hipótese prevista na Lei 6.024/1974, após liquidação extrajudicial pelo Banco Central.

Para ministro Sanseverino destacou que lei que trata da liquidação extrajudicial de instituições financeiras prevê a falência

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento a um recurso especial para manter a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul de admitir a falência de uma cooperativa de crédito rural.

Por se equiparar a instituição financeira, essa cooperativa se sujeita ao regime de liquidação especial previsto na Lei 6.024/1974.

E durante esse processo, o liquidante apurou que o ativo da cooperativa não seria suficiente para cobrir sequer a parcela de 50% dos créditos quirografários, além de identificar indícios de crimes falimentares.

Com isso, o Banco Central autorizou o liquidante a requerer a autofalência da cooperativa. Esse procedimento é previsto no artigo 21, alínea “b” da Lei 6.024/1974.

O autor do recurso especial no STJ é ex-cooperado e administrador da cooperativa. Ele defendeu que a falência não é aplicável nesse caso, pois o artigo 2º, inciso II da Lei de Falências (Lei 11.101/2005) expressamente diz que a norma não se aplica às cooperativas de crédito.

Relator, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino usou o princípio da especialidade para definir esse conflito de normas. Para ele, a Lei 6.024/1974 é mais específica, por tratar da liquidação extrajudicial de instituições financeiras — dentre as quais se inserem as cooperativas de crédito rural.

Instituições financeiras estão apenas parcialmente excluídas da Lei 11.101/2005, segundo a ministra Nancy Andrighi

Exclusão parcial
Em voto-vista, a ministra Nancy Andrighi concordou e acrescentou o entendimento da doutrina especializada segundo o qual a Lei 11.101/2005 impõe duas espécies de exclusão do regime falimentar: total ou parcial.

No caso das instituições financeiras, a exclusão seria parcial, justamente porque a Lei 6.024/1974 prevê a decretação da falência da instituição como forma de encerramento do procedimento de liquidação extrajudicial.

“Nesses casos — em que houve prévia intervenção ou liquidação extrajudicial —, a falência, segundo a doutrina majoritária, poderá ser decretada, mas tão somente se houver requerimento nesse sentido, devidamente autorizado pelo Banco Central, feito pelo interventor ou pelo liquidante”, afirmou.

O doutrinador citado é Fábio Ulhoa Coelho. A ministra Nancy também fez referência à doutrina de Mário Penteado, no que destaca que a falência é sim aplicável a algumas das entidades excluídas da Lei 11.101/2005, motivo pelo qual o objetivo da lei seria impedir o ingresso imediato delas no processo judicial de execução coletiva empresarial, passando antes por intervenção e liquidação extrajudicial.

A conclusão na 3ª Turma foi unânime. Votaram com o ministro Paulo de Tarso Sanseverino, além da ministra Nancy Andrighi, os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Moura Ribeiro e Marco Aurélio Bellizze.


REsp 1.878.653

Fonte: STJ

27 de janeiro de 2022

 A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu parcial provimento a um recurso da Fazenda Nacional para reconhecer que a revisão aduaneira de Declarações de Importação (DI) pode ser feita pela Receita em qualquer um dos quatro canais de parametrização existentes para a importação: verde, amarelo, vermelho e cinza.

Gurgel de Faria foi o relator do recurso especial

Assim, a Turma alinhou-se a entendimento já firmado na 2ª Turma, no sentido de que a primeira oportunidade (conferência) não ilide a segunda (revisão) — que surge após o desembaraço aduaneiro —, na qual o Fisco revisitará todos os atos praticados no primeiro procedimento.

Segundo as normas da Receita Federal, uma das etapas do desembaraço aduaneiro é chamada de parametrização, procedimento criado para conferência e verificação por amostragem.

Os canais recebem nomes de cores que identificam o grau de exame feito para o desembaraço, desde o automático (verde), passando pelo documental (amarelo), pela verificação física da mercadoria (vermelho) até o procedimento especial de controle aduaneiro (cinza), para verificar indícios de fraude.

O caso
O recurso julgado teve origem em uma ação ajuizada pelo importador contribuinte, que objetivava a anulação de auto de infração aduaneiro, bem como o afastamento de multas impostas pelo fisco. Havia mercadorias parametrizadas para os canais verde, amarelo e vermelho. Os pedidos foram julgados parcialmente procedentes.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) considerou possível a revisão aduaneira apenas na hipótese de mercadora importada direcionada para o “canal verde”, oportunidade em que a mercadoria é desembaraçada automaticamente, sem qualquer verificação.

Para o TRF4, nesse caso, como a autoridade fiscal não desenvolveu qualquer procedimento de conferência dos documentos e das informações da DI (o que só acontece nos canais amarelo, vermelho e cinza), seria permitida a revisão aduaneira, mesmo sem a constatação de alguma fraude. 

Recurso especial
No STJ, o relator do recurso, ministro Gurgel de Faria, afirmou que a parametrização para o canal vermelho ou amarelo de conferência aduaneira (como no caso analisado) em nada afeta a possibilidade de revisão aduaneira.

Ele destacou o conceito do artigo 638 do Decreto 6.759/2009 (Regulamento aduaneiro), segundo o qual a “revisão aduaneira é o ato pelo qual é apurada, após o desembaraço aduaneiro, a regularidade do pagamento dos impostos e dos demais gravames devidos à Fazenda Nacional, da aplicação de benefício fiscal e da exatidão das informações prestadas pelo importador na declaração de importação, ou pelo exportador na declaração de exportação”.

O magistrado observou que a legislação que rege a matéria “não vincula o direito do fisco de proceder à revisão da regularidade do pagamento dos impostos a determinado tipo de canal de conferência aduaneira ao qual a mercadoria foi submetida, quais sejam, canais de parametrização verde, amarelo, vermelho ou cinza”.

O ministro Gurgel de Faria também destacou precedente da 2ª Turma (REsp 1.201.845) em que foi abordada a necessária diferenciação dos processos de “conferência aduaneira”, “desembaraço aduaneiro” e “revisão aduaneira”. A conferência exige celeridade (tem prazo de cinco dias úteis), porque a mercadoria está em depósito por conta do contribuinte, e quanto mais tempo levar, mais demorará o desembaraço aduaneiro.

De acordo com o relator, o precedente corroborou o entendimento de inexistência de óbice à revisão aduaneira de mercadorias importadas e parametrizadas para os canais amarelo e vermelho na fase de conferência. Segundo o precedente, essa primeira oportunidade de fiscalização não impede a revisão de todos os atos que foram celeremente praticados.

No caso analisado, a 1ª Turma definiu o retorno do processo ao TRF-4, para que o mérito da declaração de importação questionada seja analisado, bem como as questões remanescentes. 

REsp 1.826.124

Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

Por unanimidade, o colegiado considerou que o ajuizamento da demanda no juízo cível não dependia do desfecho do caso na área criminal.

Postado em 25 de Janeiro de 2022

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a prescrição de ação indenizatória proposta por um auditor fiscal da Receita Federal que pretendia ser compensado pelo suposto dano moral decorrente da instauração de inquérito policial contra ele. Por unanimidade, o colegiado considerou que o ajuizamento da demanda no juízo cível não dependia do desfecho do caso na área criminal.

Relator do recurso especial, o ministro Villas Bôas Cueva afirmou que o artigo 200 do Código Civil – segundo o qual a prescrição civil não começa antes de sentença definitiva no juízo criminal – não se aplica ao caso analisado, pois a ação indenizatória estava fundada em uma série de atos, a maioria praticada na esfera administrativa, que teriam prejudicado a honra pessoal e profissional do auditor.

De acordo com o relator, o prazo prescricional teve início com o evento danoso narrado na petição inicial, ou seja, aquele conjunto de atos praticados pelos réus com o suposto objetivo de colocar sob suspeita o trabalho do auditor fiscal.

Falsa imputação de crime

O servidor da Receita Federal ajuizou a ação indenizatória após o arquivamento de representações criminais e administrativas nas quais ele foi acusado do crime de excesso de exação. Contudo, as instâncias ordinárias entenderam que o pedido estaria prescrito, uma vez que foi apresentado cerca de dez anos após os fatos causadores do alegado dano moral.

Ao STJ, o auditor alegou que o prazo prescricional da ação indenizatória só deveria ser contado a partir da data do arquivamento do inquérito policial, porque somente após a apuração criminal seria possível dimensionar o dano.

Segundo o ministro Villas Bôas Cueva, a regra geral é que o prazo prescricional seja contado a partir do momento em que se configurou a lesão – exceto quando a própria lei estabelece um marco inicial distinto, a exemplo das ações relacionadas a fatos que devam ser apurados no juízo criminal, como dispõe o artigo 200 do Código Civil.

Representações ilegítimas

Contudo, no caso em análise, o magistrado verificou que a ação indenizatória foi ajuizada com base em atos – tidos como desabonadores da conduta do auditor – perfeitamente delimitados no tempo, e que os réus já eram identificáveis desde o momento em que ofereceram as representações apontadas como ilegítimas, de forma que o pedido indenizatório, calcado na ofensa à honra pessoal e profissional do auditor, não dependia da verificação de nenhum fato no âmbito criminal.

Ao manter a decisão de segunda instância, Villas Bôas Cueva afirmou que não houve causa impeditiva do prazo prescricional no âmbito cível e reconheceu o decurso da prescrição trienal.

Segundo o relator, a superveniência do arquivamento do inquérito instaurado contra o auditor até poderia reforçar uma eventual condenação com base no alegado abuso da representação criminal apresentada contra ele, mas não se pode considerar que a instauração da demanda no juízo cível dependesse disso.

Fonte: STJ

25 de janeiro de 2022

Por não identificar risco iminente de dano grave ou de difícil reparação, o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Jorge Mussi, no exercício da presidência, indeferiu tutela de urgência requerida pela Oi Móvel S.A. para suspender os efeitos de acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) que manteve multa aplicada pelo Procon estadual no valor de cerca de R$ 2,2 milhões.

O Procon aplicou multa de R$ 2,2 milhões a empresa de telefonia 

A penalidade foi imposta em razão de suposta venda casada entre o serviço de comunicação multimídia oferecido pela Oi e o serviço de provedor de acesso à internet disponibilizado por outra empresa.

Na petição contra a execução da multa, a operadora alegou que o impacto financeiro gerado pela multa prejudicará o cumprimento do seu plano de recuperação judicial. Ainda de acordo com a empresa, a análise de eventuais medidas de constrição do seu patrimônio seria de competência exclusiva do juízo responsável pelo processo de recuperação judicial.

Ao negar o pedido da Oi, o vice-presidente do STJ entendeu que a operadora não demonstrou situação de risco capaz de causar danos graves e irreversíveis. “Com efeito, limitou-se a deduzir alegações genéricas, no sentido de que ‘a qualquer momento’ poderia ter início o cumprimento de sentença”, destacou Jorge Mussi.

O ministro disse, também, que não foi possível identificar as alegadas omissões na decisão do TJ-MG, já que a operadora não apresentou o inteiro teor do acórdão questionado. 

Pet 14.858

Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

21 de janeiro de 2022

Se uma empresa deliberar por não pagar dividendos para, em vez disso, formar reserva financeira, essa decisão seria nula por ofensa à Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/1976), e não pelo fato de não ter sido confirmada por meio de assembleia especial.

Assembleia só seria necessária se houvesse mudança do estatuto da empresa

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado pelo Banco do Nordeste, que, na qualidade de representante legal de um fundo de investimento, esperava receber dividendos de uma empresa de ligas à base de silício e magnésio.

O banco tem ações preferenciais na classe “A” da companhia. De acordo com assembleia de 2003, ficou determinado que essa classe teria prioridade na distribuição de dividendos mínimos de 6% ao ano, calculado sobre o capital representativo desse espécie e classe de ações.

Em 2009, no entanto, a empresa teve lucro, mas decidiu não distribui-lo aos acionistas, para formação de reserva. Com isso, o banco deixou de receber R$ 1,4 milhão. Para a instituição, a decisão de 2009 é nula, pois era preciso que fosse confirmada pela assembleia especial dos preferencialistas.

A decisão é realmente nula. A criação de reservas contingenciais é admitida no artigo 195 da LSA, mas o artigo 203 da mesma lei indica que isso não prejudicará o direito dos acionistas preferenciais de receber os dividendos fixos ou mínimos a que tenham prioridade, inclusive os atrasados, se cumulativos.

Relator, ministro Villas Bôas Cueva manteve a conclusão do TJ-MG sobre o caso

“A questão que se põe a debate é a forma como o acionista prejudicado poderia receber os dividendos ilegalmente retidos”, indicou o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator do recurso especial na 3ª Turma.

Assim, indicou que o Banco do Nordeste escolheu a maneira errada para cobrar os dividendos. A instituição invocou violação ao artigo 163, inciso II, parágrafos 1º e 4º, normas que tratam da necessidade de realização de assembleia especial.

No entanto, essa exigência só cabe para eventual alteração das vantagens e preferências atribuídas a cada classe de ações, o que é fixado no estatuto da companhia.

“No caso dos autos, contudo, não houve proposta de alteração do estatuto, tendo a deliberação assemblear questionada se cingido a determinar a formação de reserva com o não pagamento dos dividendos prioritários, o que se mostra incompatível com o disposto no artigo 203 da LSA, mas não encontra equivalência com a hipótese em que se exige a realização de assembleia especial ratificadora”, disse o relator.

Em segundo grau, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais entendeu que seria necessário anular a deliberação assemblear de 2009, que determinou o não pagamento de dividendos. Como não foi esse o pedido dos autos, a pretensão não poderia ser acolhida.

A votação na 3ª Turma foi unânime, conforme a posição do ministro Villas Bôas Cueva. Ele foi acompanhado pelos ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino.


REsp 1.844.748

Fonte: STJ

18 de janeiro de 2022

Embora o Código de Processo Civil autorize os tribunais a, por meio de ato administrativo, designar varas e câmaras especializadas, esse poder não pode ser usado para alterar ou restringir normas de competência fixadas em lei e pela Constituição.

TJ-MT fixou competência exclusiva para diversas ações, dentre elas as de saúde, na Vara Especializada de Várzea Grande

Com esse entendimento, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça fixou teses com o intuito de proibir que tribunais elejam varas especializadas como as únicas competentes para tramitar processos cuja competência prevista em lei é sensivelmente maior.

O julgamento foi feito em sede de incidente de assunção de competência (IAC). Ao todo, foram fixadas quatro teses, na sessão de 21 de outubro de 2021.

O acórdão foi publicado em 9 de dezembro e encaminhado aos presidentes dos Tribunais Regionais Federais, aos presidentes dos Tribunais de Justiça, à Turma Nacional Uniformizadora, ao Conselho Nacional de Justiça e ao Conselho da Justiça Federal.

O tema não é novo no STJ e trata especificamente da Resolução 9/2019 do Tribunal de Justiça do Mato Grosso. A norma atribui arbitrariamente à Vara Especializada de Várzea Grande (MT) a competência exclusiva para tramitar todas as causas sobre saúde pública, ações civis públicas, ações individuais, cartas precatórias, ações alusivas à Infância e Juventude e de competência dos Juizados Especializados da Fazenda Pública afetos à saúde.

Isso significa que, estando o estado presente no polo passivo da causa, isoladamente ou em litisconsórcio com municípios, todos os 3,5 milhões de habitantes do Mato Grosso — distribuídos em uma área territorial de 903 mil km² — que vierem a mover processos deverão se deslocar a Várzea Grande, cidade vizinha da capital Cuiabá.

Ministro Og Fernandes consolidou posição pacífica do STJ em teses para o IAC
STJ

Acesso à Justiça
Para a 1ª Seção do STJ, a resolução fere diversas leis que tratam da competência para julgamento sob o viés de ampliar o acesso à Justiça pela dispersão territorial.

É o caso, por exemplo, do Estatuto da Criança e do Adolescente, que coloca como competente a Vara da Infância e Juventude do local onde ocorreu a ação ou a omissão. O mesmo vale para normas do Estatuto do Idoso e do próprio Código de Processo Civil.

“Isso tudo porque, a despeito das eventuais vantagens da concentração e especialização das varas, nessas matérias, o legislador foi expresso em optar por uma política pública processual de facilitação do acesso à Justiça, visando a promover a mais ampla tutela aos interesses de pessoas hipossuficientes ou vulneráveis”, explicou o ministro Og Fernandes, relator do IAC.

A lógica, conforme explicou no voto, é simples. O Estado está presente em todo o seu território, mas o cidadão não pode ser onerado pela imposição de foro único escolhido arbitrariamente pela administração judicial para ser o competente para tais feitos, especialmente se for distante de seu domicílio.

No caso do Mato Grosso, um cidadão de Vila Rica que precisasse ajuizar ação civil pública teria de percorrer 1.268 km de estrada até o município de Várzea Grande.

“Enfatize-se que o ato normativo secundário não pode contrariar lei ou a Constituição. No caso específico, a resolução administrativa do Tribunal matogrossense, concreta e efetivamente, viola as garantias processuais dessas classes de pessoas”, disse o ministro Og Fernandes.

Leia a íntegra das teses:

Tese A
Prevalecem sobre quaisquer outras normas locais, primárias ou secundárias, legislativas ou administrativas, as seguintes competências de foro:
i) em regra, do local do dano, para ação civil pública (art. 2º da Lei n. 7.347/1985);
ii) ressalvada a competência da Justiça Federal, em ações coletivas, do local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano de impacto restrito, ou da capital do estado, se os danos forem regionais ou nacionais, submetendo-se ainda os casos à regra geral do CPC, em havendo competência concorrente (art. 93, I e II, do CDC).

Tese B
São absolutas as competências:
i) da Vara da Infância e da Juventude do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou a omissão, para as causas individuais ou coletivas arroladas no ECA, inclusive sobre educação e saúde, ressalvadas a competência da Justiça Federal e a competência originária dos tribunais superiores (arts. 148, IV, e 209 da Lei n. 8.069/1990; e Tese n. 1.058/STJ);
ii) do local de domicílio do idoso nas causas individuais ou coletivas versando sobre serviços de saúde, assistência social ou atendimento especializado ao idoso portador de deficiência, limitação incapacitante ou doença infectocontagiosa, ressalvadas a competência da Justiça Federal e a competência originária dos tribunais superiores (arts. 79 e 80 da Lei n. 10.741/2003 e 53, III, e, do CPC/2015);
iii) do Juizado Especial da Fazenda Pública, nos foros em que tenha sido instalado, para as causas da sua alçada e matéria (art. 2º, § 4º, da Lei n. 12.153/2009);
iv) nas hipóteses do item (iii), faculta-se ao autor optar livremente pelo manejo de seu pleito contra o estado no foro de seu domicílio, no do fato ou ato ensejador da demanda, no de situação da coisa litigiosa ou, ainda, na capital do estado, observada a competência absoluta do Juizado, se existente no local de opção (art. 52, parágrafo único, do CPC/2015, c/c o art. 2º, § 4º, da Lei n. 12.153/2009).

Tese C
A instalação de vara especializada não altera a competência prevista em lei ou na Constituição Federal, nos termos da Súmula n. 206/STJ (“A existência de vara privativa, instituída por lei estadual, não altera a competência territorial resultante das leis de processo.”). A previsão se estende às competências definidas no presente IAC n. 10/STJ.

Tese D
A Resolução n. 9/2019/TJMT é ilegal e inaplicável quanto à criação de competência exclusiva em comarca arbitrariamente eleita em desconformidade com as regras processuais, especificamente quando determina a redistribuição desses feitos, se ajuizados em comarcas diversas da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Várzea Grande/MT. Em consequência:
i) fica vedada a redistribuição à 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Várzea Grande/MT dos feitos propostos ou em tramitação em comarcas diversas ou em juizados especiais da referida comarca ou de outra comarca, cujo fundamento, expresso ou implícito, seja a Resolução n. 9/2019/TJMT ou normativo similar;
ii) os feitos já redistribuídos à 1ª Vara Especializada de Várzea Grande/MT com fundamento nessa norma deverão ser devolvidos aos juízos de origem, salvo se as partes, previamente intimadas, concordarem expressamente em manter o processamento do feito no referido foro;
iii) no que tange aos processos já ajuizados – ou que venham a ser ajuizados – pelas partes originalmente na 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Várzea Grande/MT, poderão prosseguir normalmente no referido juízo;
iv) não se aplicam as previsões dos itens (ii) e (iii) aos feitos de competência absoluta, ou seja: de competência dos Juizados Especiais da Fazenda, das Varas da Infância e da Juventude ou do domicílio do idoso, nos termos da Tese B deste IAC n. 10/STJ.


RMS 64.531
RMS 64.525
RMS 64.625
RMS 65.286

Fonte: STJ

14/01/2022

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) emitiu comunicado informando sobre a indisponibilidade do Sistema Eletrônico de Informações (SEI) e módulos Peticionamento e Intimações Eletrônicos, a partir das 20h30 de sexta-feira (14/1).

A indisponibilidade ocorrerá em razão de atualização do sistema durante o fim de semana. O acesso será liberado somente após a avaliação de conformidade das novas versões, que será realizada no domingo (16/1).

Em razão disso, as intimações eletrônicas cujo último dia de prazo seja na sexta-feira (14/1) serão prorrogadas para o primeiro dia útil seguinte ao retorno do sistema, conforme disposto no § 3º do art. 55 da Instrução Normativa STJ/GDG nº 17, de 3 de julho de 2019.

Fonte: STJ

14 de janeiro de 2022

Não é porque o contrato de compra e venda de um carro foi rescindido devido à existência de problema do produto que o financiamento feito pelo cliente para pagar por esse veículo deixa de ser válido.

Contrato de compra e venda foi rescindido porque o carro apresentou defeito; contrato de financiamento foi mantido pelo STJ

Com essa conclusão, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado pelo Itaucard, para manter a cobrança de parcelas referentes a financiamento de R$ 20,3 mil feito por um homem para adquirir um veículo.

O carro foi comprado zero km em 2014 e, de cara, apresentou vício na coluna da porta do motorista, o qual não foi sanado pela concessionária. Com isso, o comprador ajuizou ação para rescisão contratual, com pedido de devolução de valores e compensação por danos morais.

As instâncias ordinárias condenaram a concessionária e a montadora a devolver os valores pagos diretamente pelo consumidor a título de entrada (R$ 14,6 mil), além de indenizar outros prejuízos sofridos, pela instalação de alarme e película nos vidros.

Já o Itaucard foi condenado a restituir as parcelas do financiamento até então quitadas. O Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que o contrato de financiamento era coligado ao de compra e venda. Assim, o vício no produto levaria à resolução dos dois acordos.

Ao STJ, o banco defendeu que não houve vício no contrato de financiamento. Logo, ele deveria seguir válido. A argumentação foi acatada pelo relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, que votou por dar provimento ao recurso especial.

Isso porque a jurisprudência da corte é pacífica no sentido de que não há responsabilidade da instituição financeira que atua como mero “banco de varejo” por vício do veículo financiado. A exceção é quando o banco financiador integra o mesmo grupo econômico da montadora do veículo.

A posição do relator se sagrou vencedora por margem mínima. Ele foi acompanhado pelos ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze.

Maioria no STJ definiu que contrato de compra e venda e de financiamento não podem ser definidos como interligados

Divergência
Abriu a divergência e ficou vencida a ministra Nancy Andrighi, acompanhada pelo ministro Moura Ribeiro. Para ela, não houve responsabilização do banco pelo vício do produto. Nesse sentido, apenas concessionária e montadora foram condenadas.

Segundo a ministra, a solução adotada pela maioria reduz proteção do consumidor contra os vícios redibitórios de produtos adquiridos no mercado de consumo, na hipótese de venda financiada.

“O consumidor, apesar de destituído da posse e da propriedade do veículo, será obrigado a conviver com um contrato de financiamento que perdeu sua base econômica e sua função, tendo que suportar os encargos financeiros do negócio como se fosse obter o benefício inicialmente vislumbrado quando da contratação”, comentou.

O voto divergente defende que a hipótese caracteriza contrato coligado, em que um depende do outro de tal modo que, isoladamente, nenhum deles é interessante. Eles não se fundem, mas possuem o que a doutrina define como conexão funcional.

Assim, sem o contrato de compra e venda, o contrato de financiamento perde sua própria razão de ser, desequilibrando os interesses inicialmente desenhados no conjunto da operação econômica.

“Embora a resolução do contrato de compra e venda implique, necessariamente, a resolução do contrato de financiamento conexo, não se torna a casa bancária responsável solidariamente pelo ressarcimento dos prejuízos sofridos pelo consumidor, como se se tratasse de um garante universal de toda a transação”, concluiu a ministra.


REsp 1.946.388

Fonte: STJ

04/01/2022

Com base no princípio da precaução – garantia contra riscos potenciais que, de acordo com o conhecimento atual, não podem ser ainda identificados – e a fim de resguardar a saúde e a vida da população, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, negou o pedido de um servidor do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) para circular nas dependências do órgão sem ter de apresentar comprovante de vacinação contra a Covid-19.

A decisão foi proferida em habeas corpus ajuizado contra portaria editada pelo TRF3 em dezembro de 2021, que passou a exigir o comprovante de vacinação contra a Covid-19 – ou teste negativo para o vírus, realizado nas últimas 72 horas – para ingresso e permanência no prédio do tribunal.

No pedido submetido ao STJ, o servidor alegou que o ato normativo desrespeita sua liberdade de locomoção e atenta contra o livre exercício de sua atividade profissional – direitos resguardados pela Constituição. Ele requereu a liminar para garantir seu acesso imediato ao TRF3, mesmo sem a prova de imunização, além da fixação de prazo mensal para apresentar os testes negativos.

Medidas necessárias à proteção de bens jurídicos de valor supremo
Ao negar a liminar, Humberto Martins lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu decisões recentes autorizando o uso de instrumentos indiretos para compelir a população a se vacinar contra a Covid-19 – como a exigência do comprovante para ingresso em determinados locais públicos e privados. O ministro ressaltou que o STF já concluiu não haver constrangimento ilegal nessa exigência, por ser medida necessária à proteção de bens jurídicos irrenunciáveis.

“Em consonância com o disposto nos artigos 196 e 225, ambos da Constituição Federal, é firme o entendimento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que as decisões capazes de influenciar bens jurídicos de valor supremo, tais como a vida e a saúde, devem ser norteadas pelos princípios da precaução e da prevenção, de modo que, sempre que haja dúvida sobre eventuais efeitos danosos de uma providência, seja adotada a medida mais conservadora necessária a evitar a ocorrência do dano”, afirmou o presidente da corte.

O mérito do habeas corpus será avaliado pela Primeira Turma, sob a relatoria do desembargador convocado Manoel Erhardt.

Leia a decisão no HC 716.367.

HC 716367

Fonte: STJ