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Ministra registrou que decisão questionada comprometia a ordem pública

Publicado em 29/11/2022

A presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Maria Thereza de Assis Moura, deferiu o pedido do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e restabeleceu o andamento da ação que trata do pagamento de multa de R$ 10,3 bilhões pelo grupo J&F. A decisão da ministra é do último dia 23 de novembro. Uma decisão anterior, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), havia determinado a suspensão do andamento de ação revisional da multa bilionária pactuada em acordo de leniência entre a J&F Investimentos S/A e o Ministério Público Federal (MPF).

Ao deferir o pedido, a ministra registrou que a decisão questionada comprometia a ordem pública ao gerar incerteza sobre a força vinculante dos acordos de leniência. “Nem se fale das consequências deletérias para o caso específico dos autos, quando sanções pecuniárias deixarão de ser honradas simplesmente porque se discute, paralelamente, se os beneficiários devem ou não participar da ação revisional em curso ainda na primeira instância da Justiça Federal do Distrito Federal”, acrescentou. 

Entenda

Em junho de 2017, a J&F celebrou acordo de leniência relacionado a fatos apurados nas Operações Greenfield, Sépsis, Cui Bono (Lava Jato) e Carne Fraca, pelo qual se comprometeu a contribuir com as investigações e pagar multa de R$ 10,3 bilhões, destinada a diversas instituições lesadas, entre elas o BNDES, a Caixa Econômica Federal, a Fundação dos Economiários Federais (Funcef), a Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros) e a União. Ao BNDES caberiam R$ 1,75 bilhão. Porém, depois de ter assinado o acordo voluntariamente, a J&F alegou ilegalidades no cálculo da multa e entrou com ação revisional do valor. A 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal autorizou que a empresa apresentasse seguro garantia judicial até o julgamento definitivo da ação. Posteriormente, o mesmo juízo deferiu o ingresso nos autos de dois destinatários dos pagamentos da multa, a Petros e a Funcef.

Em seguida, a J&F entrou com agravo de instrumento no TRF1, questionando o ingresso das duas entidades, e o tribunal, por considerar plausível a tese de inexistência de interesse jurídico da Petros e da Funcef para serem admitidas como assistentes do MPF, deferiu o pedido para suspender a tramitação da ação revisional até o julgamento final do recurso.

O BNDES, então, ajuizou no STJ o pedido de suspensão da decisão do TRF1, apontando grave lesão à ordem pública. De acordo com o banco, “a ação de origem se encontra suspensa, não havendo qualquer previsão de sua retomada, e, enquanto isso, os pagamentos das parcelas da multa prevista no acordo de leniência estão paralisados aguardando o seu prosseguimento”. Esse pedido de suspensão é o que foi acolhido pela presidente do STJ na nova decisão. 

Força de lei

A ministra Maria Thereza de Assis Moura destacou que os acordos de leniência devem receber especial atenção e proteção do sistema de Justiça, tendo em vista os resultados positivos que têm trazido para a ordem jurídica nacional.

“Há de ser considerado, sobretudo, que suas bases estão assentadas no voluntarismo das pessoas jurídicas que, envolvidas em atos ilícitos, comprometem-se em romper com essas condutas, reconhecem suas responsabilidades, colaboram com a identificação de outros envolvidos e buscam reparar os danos causados”, afirmou.

Diante disso, observou a magistrada, a validade e a força dos termos ajustados nos acordos de leniência devem ser protegidas, “evitando-se discussões prolongadas e sem fim de eventuais questionamentos em juízo posteriormente à sua celebração”.

A ministra destacou que uma das consequências legais do acordo de leniência é a reparação integral dos danos causados, o que, na hipótese analisada, é representada pela multa imposta ao grupo J&F.

Procurada pela Agência Brasil a J&F disse não vai comentar o assunto pois não houve decisão de mérito.

*Por Agência Brasil – Brasília

Casos de indisciplina, violência e ofensas morais, em campo ou nas arquibancadas, frequentemente acabam se transformando em processos judiciais – mas não necessariamente no Poder Judiciário, pois o esporte, no Brasil, tem sua Justiça própria.

28/11/2022

As comissões disciplinares, os Tribunais de Justiça Desportiva e o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) formam uma estrutura de direito privado – são órgãos arbitrais –, porém de interesse público, previstos na Constituição Federal. E é o texto constitucional que determina: o Poder Judiciário só deve atuar depois que estiverem esgotadas todas as instâncias da Justiça Desportiva.

Apesar dessa reserva, a Justiça estatal recebe e julga um número expressivo de demandas relacionadas às atividades desportivas, muitas tratando do futebol. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reúne julgados sobre grande variedade de conflitos em torno do mais popular dos esportes.

Agressão de jogador contra árbitro é ato ilícito indenizável na Justiça comum

Por maioria, a Terceira Turma do STJ decidiu que agressões físicas e verbais praticadas por jogador profissional contra árbitro, durante a partida, constituem ato ilícito indenizável na Justiça comum, independentemente de eventual punição aplicada pela Justiça Desportiva.

No caso julgado pelo colegiado, por discordar de uma decisão em campo, um jogador agrediu o juiz pelas costas, além de ofendê-lo. Em primeira instância, o agressor foi condenado a pagar indenização de R$ 25 mil por danos morais, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), invocando o parágrafo 1º do artigo 217 da Constituição, considerou que a punição disciplinar da Justiça Desportiva seria suficiente.

O relator do REsp 1.762.786, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, observou que a conduta do jogador não configurou transgressão de cunho estritamente esportivo e, por isso, pode ser submetida ao crivo do Poder Judiciário estatal e julgada à luz do Código Civil.

O magistrado ressaltou que o jogador, além de transgredir as regras do futebol, ofendeu a honra e a imagem do árbitro. Desse modo, segundo Cueva, surge o dever de indenizar a vítima que, no exercício regular de suas funções, sofreu injusta e desarrazoada agressão.

“No tocante à responsabilidade civil aplicada aos esportistas durante a prática de sua atividade, a doutrina preconiza que, mesmo naquelas modalidades em que o contato físico é considerado normal, como no futebol, ainda assim os atletas devem sempre zelar pela integridade física do seu adversário. Eventual ato exacerbado, com excesso de violência, que possa ocasionar prejuízo aos demais participantes da competição, pode gerar a obrigação de reparação”, afirmou o relator.

Uso publicitário de imagem de torcedor em estádio não gera dano moral

Em 2020, a Terceira Turma entendeu que não configura dano moral o uso, em campanha publicitária, da imagem de um torcedor de futebol no estádio, captada sem maior destaque individual no conjunto da torcida.

A relatora do REsp 1.772.593, ministra Nancy Andrighi, destacou que se a imagem é – segundo a doutrina – a emanação de uma pessoa, por meio da qual ela se projeta, se identifica e se individualiza no meio social, não se pode falar em ofensa a esse bem personalíssimo quando não configuradas a projeção, a identificação e a individualização da pessoa representada.

Embora não seja possível presumir que “o torcedor presente no estádio para assistir à partida de futebol, tenha, tacitamente, autorizado a recorrida a usar sua imagem em campanha publicitária de automóvel, não há falar em dano moral, porque o cenário delineado nos autos revela que as filmagens não destacam a sua imagem, senão inserida no contexto de uma torcida, juntamente com vários outros torcedores”, concluiu a magistrada.

Time mandante que não oferece segurança deve responder pelos danos causados

Ao julgar o REsp 1.924.527 e REsp 1.773.885, a Terceira Turma entendeu que o local do evento esportivo não se restringe ao estádio ou ao ginásio, mas abrange também o seu entorno; por isso, o time mandante que não oferecer segurança necessária para evitar tumultos na saída do estádio deverá responder pelos danos causados, solidariamente com a entidade organizadora da competição.

Em ambos os processos, torcedores alegaram que sofreram agressões ou tiveram seu patrimônio depredado pela torcida adversária nas proximidades dos estádios.

Os relatores dos recursos, ministra Nancy Andrighi e ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, apontaram que o artigo 13 do Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/2003) garante aos torcedores o direito à segurança antes, durante e após os eventos esportivos.

A magistrada apontou que, conforme os artigos 14 19 do estatuto, o clube mandante deve organizar a logística no entorno do estádio de modo a proporcionar a entrada e a saída de torcedores com celeridade e segurança.

Nessa mesma linha, Cueva ressaltou que o clube detentor do mando de jogo tem responsabilidade objetiva – e solidária com a entidade que organiza a competição – diante dos prejuízos causados aos torcedores por falhas de segurança.

Segundo o magistrado, em relação à responsabilidade, o Estatuto do Torcedor prevê a aplicação subsidiária do Código de Defesa do Consumidor (CDC), cujos artigos 12 a 14 tratam do vício grave que gera acidente de consumo, sendo a federação e o clube mandante equiparados, para esse efeito, à condição de fornecedores de serviço.

“O fato de a primeira bomba ter sido arremessada da parte externa do estádio não interfere no dever de indenizar”, observou o ministro. Para ele, “a fiscalização das redondezas também foi defeituosa, visto que havia torcedores munidos de artefatos explosivos”.

Pedidos de cunho desportivo direcionados à CBF devem ser julgados no local de sua sede

A Segunda Seção, ao julgar o CC 165.987, decidiu que, quando o processo versa também sobre pedidos de cunho desportivo direcionados à Confederação Brasileira de Futebol (CBF), o seu caráter eminentemente consumerista é afastado, definindo-se a competência no foro onde se localiza a sede da entidade futebolística.

De acordo com os autos, um grupo de torcedores pediu indenização por danos morais e materiais sofridos durante uma partida de futebol, além da destituição de dois dirigentes de um clube e do cancelamento do jogo, com a consequente alteração da tabela do Campeonato Brasileiro da Série A de 2014.

O relator no STJ, ministro Marco Buzzi, com base no posicionamento firmado sob o Tema 794, quando do julgamento do CC 133.244, lembrou que o juízo do local em que está situada a sede da entidade organizadora do campeonato é competente para todas as ações que questionem a validade e a execução de decisões da Justiça Desportiva.

O magistrado destacou que, segundo esse mesmo julgado, a entidade esportiva de caráter nacional, responsável pela organização (no caso, a CBF), deve, necessariamente, integrar o polo passivo das demandas, sob pena de ela não vir a ser atingida pelos efeitos subjetivos da coisa julgada, e de tornar o julgado desprovido de efetividade.

Tendo em vista que a demanda pretendia a nulidade da partida, com a execução de novo jogo, ou, subsidiariamente, que o placar fosse considerado 3×0 para o time visitante, Buzzi concluiu que ela não se relacionava exclusivamente ao direito do consumidor e, assim, decidiu pela competência do foro do Rio de Janeiro, que é onde fica a sede da CBF

Caso da Máfia do Apito não configurou dano moral coletivo

No escândalo conhecido como Máfia do Apito, a Terceira Turma decidiu não ter sido configurado dano moral coletivo (REsp 1.664.186). Segundo o colegiado, para manter a condenação ao pagamento de danos morais coletivos, seria necessário demonstrar, minimamente, o sentimento de angústia e intranquilidade de toda uma coletividade de torcedores, com a afetação do círculo primordial de seus valores sociais.

No caso em discussão, dois juízes e um empresário foram condenados por manipularem, em 2005, o resultado de diversos jogos do Campeonato Brasileiro e do Campeonato Paulista, com o objetivo de favorecer grandes apostadores.

O relator do recurso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, ressaltou que, segundo a jurisprudência do STJ, para haver a condenação à reparação por dano moral coletivo, é essencial que o ato antijurídico praticado atinja alto grau de reprovabilidade e transborde os limites do individualismo, afetando, por sua gravidade e sua repercussão, o círculo primordial de valores sociais, não bastando a mera infringência à lei ou ao contrato para a sua caracterização.

“Na específica hipótese dos autos, não se antevê tamanha lesão à esfera extrapatrimonial dos torcedores, de maneira totalmente injusta e intolerável, com inadmissível agressão ao ordenamento jurídico e aos valores éticos fundamentais dessa coletividade. A conduta atribuída aos demandados é muito mais prejudicial às agremiações esportivas, que obtiveram resultados associados não ao maior ou menor esforço de sua equipe, mas à conduta fraudulenta daqueles que deveriam assegurar plena observância às regras do jogo”, disse o magistrado.

Nas transações envolvendo futebolistas, clubes devem contribuir para a FAAP

Em junho deste ano, a Segunda Turma, no julgamento do AREsp 1.970.374, decidiu que, nas transações envolvendo jogadores de futebol, os clubes devem contribuir não só para a Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol (Fenapaf), mas também para a Federação das Associações de Atletas Profissionais (FAAP).

No recurso, um clube sustentava que a contribuição à FAAP – prevista no revogado artigo 57, inciso I, alínea “b”, da Lei 9.615/1998 (Cide – Lei Pelé) – só se aplicaria às entidades de outras modalidades que não o futebol, já que, para as do futebol, há a contribuição específica do artigo 57, inciso II, da mesma lei (Fenapaf).

Em seu voto, o relator do recurso, ministro Mauro Campbell Marques, afirmou que o argumento da recorrente estava em flagrante contrariedade com o princípio da capacidade contributiva, disposto no artigo 145, parágrafo 1º, da Constituição Federal.

Para o magistrado, considerar que os clubes de futebol só estariam sujeitos à contribuição para a Fenapaf seria assumir uma tributação regressiva no setor, submetendo aqueles com maior capacidade econômica a uma alíquota menor de 0,2% sobre o valor correspondente às transferências (destinado à Fenapaf), enquanto as entidades com menor capacidade econômica ficariam submetidas a uma alíquota maior que 0,8% do valor correspondente às transferências (destinado à FAAP).

“Esse tipo de interpretação isolaria o futebol das demais modalidades desportivas, impedindo que a modalidade mais rica do país contribuísse para o bem-estar de todos os atletas profissionais, os ex-atletas e os atletas em formação, de todas as modalidades, em contrariedade também ao princípio constitucional da solidariedade social e aos objetivos da Cide de criar um ambiente econômico melhor na área desportiva em geral” declarou o relator.

Contrato de exploração de atleta entre clube e empresa decorre de relação comercial

O contrato de exploração comercial de atleta ou de técnico de futebol, firmado entre clube desportivo e sociedade empresarial, decorre de relação comercial, e, por isso, eventual ação para discutir ajuste no contrato deve ser encaminhada à Justiça estadual.

Foi o que entendeu a Terceira Turma ao julgar REsp 1.953.586, interposto por um clube de futebol que embargou a execução de título executivo extrajudicial, sob o fundamento de que a execução seria decorrente de relação trabalhista, pois se refere à exploração comercial de jogador de futebol, devendo, portanto, ocorrer a declinação da competência para a Justiça do Trabalho. 

A ministra Nancy Andrighi, relatora, destacou que os contratos que deram origem ao ajuizamento da ação de execução de título executivo extrajudicial foram firmados entre duas pessoas jurídicas, sendo a recorrida detentora dos direitos econômicos e de imagem, voz e apelido do atleta profissional.

“Não há dúvidas de que a execução iniciada pela recorrida advém de uma relação de natureza civil, o que não se confunde com as hipóteses de contratos coligados de trabalho e de imagem celebrados pelo próprio atleta”, apontou a relatora.

Em outro julgamento (CC 155.045), a Segunda Seção, sob relatoria do então desembargador convocado Lázaro Guimarães, fixou o entendimento de que também deve ser julgada pela Justiça comum a ação que busca rescindir o contrato comercial firmado entre clube de futebol e empresa de marketing que adquiriu os direitos de imagem de um ex-técnico de futebol.

O magistrado explicou que o exame dos elementos da ação afasta a competência da Justiça do Trabalho, pois, mesmo que a causa de pedir faça referência ao desempenho do técnico como motivação para a rescisão do contrato de marketing, firmado exclusivamente entre o clube e as empresas especializadas, a pretensão deduzida não é dirigida contra o ex-treinador, tampouco as cláusulas contratuais preveem a sujeição da relação comercial à conservação da relação de trabalho ou a seus termos.

“Pensar o contrário seria transferir para a Justiça laboral a competência para decidir acerca da rescisão de contrato comercial, com a dispensa das penas contratuais, ainda que usado como justificativa o alegado baixo desempenho do empregado na vigência do contrato laboral, mera causa de pedir próxima”, concluiu o ministro.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1772593REsp 1773885REsp 1762786REsp 1924527REsp 1664186REsp 1953586CC 155045AREsp 1970374CC 165987

Fonte: STJ

A dívida de pensão alimentícia compensatória, concedida com o objetivo de evitar o desequilíbrio financeiro causado pelo fim do casamento ou da união estável, não justifica a execução pelo rito da prisão civil.

25 de novembro de 2022

Pensão foi fixada para evitar queda abrupta do padrão de vida da ex-companheira que, por 20 anos, se dedicou a cuidar da família

Com esse entendimento, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu um salvo-conduto para evitar a prisão de um empresário de 83 anos que acumulou dívida de R$ 35,4 mil a título de pensão alimentícia a ser paga à ex-companheira.

O pagamento foi determinado pela Justiça de São Paulo porque a ex-companheira se uniu ao homem muito nova e, por 20 anos, viveu com ele e cuidou da família, sem desenvolver atividade profissional. Nesse tempo, ostentou padrão de vida bastante confortável.

O valor inicialmente fixado para a pensão compensatória foi de cinco salários mínimos, o qual foi pago regularmente por nove anos. Ao fim desse período, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou a apelação do caso e resolveu aumentar a pensão para 15 salários mínimos.

Com isso, surgiu para o empresário a dívida de R$ 35,4 mil. Na execução do valor, a justificativa apresentada para o não-pagamento foi rejeitada. O juízo então expediu mandado de prisão civil. O devedor impetrou HC para se manter em liberdade e ação revisional, ainda não julgada.

Relator no STJ, o ministro Raul Araújo analisou o contexto e entendeu que a prisão, de fato, não é cabível. Essa medida só se justifica quando o pagamento da pensão foi imprescindível para a sobrevivência do alimentando, o que não é o caso dos autos.

A pensão se destina a compensar a drástica queda do padrão de vida da ex-companheira, após o término do relacionamento. Portanto, não tem natureza propriamente alimentar, mas indenizatória.

“Diante das circunstâncias fáticas do presente caso, vislumbra-se a ilegitimidade da coação civil extrema, uma vez que os valores devidos não consubstanciam necessário risco alimentar para a credora, nem se constata o caráter inescusável da dívida alimentar, que são elementos imprescindíveis para a legitimidade da prisão civil”, concluiu o relator. A votação foi unânime.


HC 744.673

*Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 25 de novembro de 2022, 8h48

24/11/2022

Por constatar grave lesão ao interesse público, a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Maria Thereza de Assis Moura, deferiu pedido do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para afastar os efeitos de decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que suspendeu o andamento de ação revisional da multa bilionária pactuada em acordo de leniência entre a J&F Investimentos S/A e o Ministério Público Federal (MPF).

Ao deferir o pedido, a ministra registrou que a decisão questionada comprometia a ordem pública ao gerar incerteza sobre a força vinculante dos acordos de leniência. “Nem se fale das consequências deletérias para o caso específico dos autos, quando sanções pecuniárias deixarão de ser honradas simplesmente porque se discute, paralelamente, se os beneficiários devem ou não participar da ação revisional em curso ainda na primeira instância da Justiça Federal do Distrito Federal”, acrescentou. 

Ação revisional de multa de R$ 10,3 bilhões

De acordo com o que consta dos autos do pedido de suspensão, em junho de 2017, a J&F celebrou acordo de leniência relacionado a fatos apurados nas Operações Greenfield, Sépsis, Cui Bono (Lava Jato) e Carne Fraca, pelo qual se comprometeu a contribuir com as investigações e pagar multa de R$ 10,3 bilhões, destinada a diversas instituições lesadas, entre elas o BNDES, a Caixa Econômica Federal (CEF), a Fundação dos Economiários Federais (Funcef), a Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros) e a União. Ao BNDES caberiam R$ 1,75 bilhão.

Ainda pelo que se depreende da documentação e da petição inicial da SLS, depois de ter assinado o acordo voluntariamente, a J&F alegou ilegalidades no cálculo da multa e entrou com ação revisional do valor. A 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal autorizou que a empresa apresentasse seguro-garantia judicial até o julgamento definitivo da ação. Posteriormente, o mesmo juízo deferiu o ingresso nos autos de dois destinatários dos pagamentos da multa, a Petros e a Funcef.

A J&F entrou com agravo de instrumento no TRF1, questionando o ingresso das duas entidades, e o tribunal, por considerar plausível a tese de inexistência de interesse jurídico da Petros e da Funcef para serem admitidas como assistentes do MPF, deferiu o pedido para suspender a tramitação da ação revisional até o julgamento final do recurso.

O BNDES, então, ajuizou no STJ o pedido de suspensão da decisão do TRF1, apontando grave lesão à ordem pública. De acordo com o banco, “a ação de origem se encontra suspensa, não havendo qualquer previsão de sua retomada, e, enquanto isso, os pagamentos das parcelas da multa prevista no acordo de leniência estão paralisados aguardando o seu prosseguimento”.

Acordos de leniência trouxeram resultados positivos para a ordem jurídica

A presidente do STJ destacou que os acordos de leniência devem receber especial atenção e proteção do Sistema de Justiça, tendo em vista os resultados positivos que têm trazido para a ordem jurídica nacional.

“Há de ser considerado, sobretudo, que suas bases estão assentadas no voluntarismo das pessoas jurídicas que, envolvidas em atos ilícitos, comprometem-se em romper com essas condutas, reconhecem suas responsabilidades, colaboram com a identificação de outros envolvidos e buscam reparar os danos causados”, afirmou.

Diante disso, observou a magistrada, a validade e a força dos termos ajustados nos acordos de leniência devem ser protegidas, “evitando-se discussões prolongadas e sem fim de eventuais questionamentos em juízo posteriormente à sua celebração”.

A ministra destacou que uma das consequências legais do acordo de leniência é a reparação integral dos danos causados, o que, na hipótese analisada, é representada pela multa imposta ao grupo J&F.

“É, pois, à vista de todo arcabouço normativo, doutrinário e prático que envolve os acordos de leniência que há de se pautar o exame dos efeitos da decisão que ordenou a suspensão do curso da ação revisional, ressalte-se, pelo simples fato de terceiros interessados discutirem sua legitimidade para intervir no processo”, afirmou.

“O sobrestamento do curso processual e, com isso, do pleno cumprimento dos termos do acordo de leniência traz ofensa à ordem pública, assim visto o respeito ao ordenamento jurídico nacional e às bases estabelecidas para se buscarem meios alternativos e eficazes para a composição de litígios, especialmente, quando envolvem ilícitos praticados contra a administração pública”, declarou a presidente do STJ.

Intervenção de terceiros interessados no processo

Sobre a possibilidade de intervenção dos destinatários da multa bilionária no processo, a ministra ponderou que a sistemática processual civil prevê seu cabimento, em qualquer procedimento e grau de jurisdição, sem implicar renovação de atos ou reabertura de prazos, por receberem o processo no estado em que se encontra, conforme o artigo 119, parágrafo único, do Código de Processo Civil (CPC).

Maria Thereza de Assis Moura também observou que o parágrafo único do artigo 120 do CPC preceitua que, “se qualquer parte alegar que falta ao requerente interesse jurídico para intervir, o juiz decidirá o incidente, sem suspensão do processo”.

21/11/2022

Cor preta, suspeito padrão. Esse é o estereótipo presente na maior parte das abordagens e na identificação de pessoas consideradas suspeitas pelos agentes de segurança do Estado.

Divulgada em fevereiro deste ano, uma pesquisa coordenada pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) confirmou, com dados inéditos, o que grande parte da população brasileira vive na pele: o racismo estrutural está presente na atividade policial e no sistema de Justiça criminal brasileiro; afinal, os jovens negros são os maiores alvos dos agentes de segurança.

Segundo o estudo, o percentual de negros entre as pessoas que já foram abordadas pela polícia chega a 63%, contra 31% de brancos, na cidade do Rio de Janeiro – cuja população total se divide em 51% de brancos, 48% de negros e 1% de outras raças. Dos que já sofreram abordagem policial mais de dez vezes, 66% são pretos ou pardos.

Outro número a ser considerado é o da proporção de negros no sistema prisional brasileiro: o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) de 2017, no quesito Perfil da População Prisional, mostrou que aproximadamente 64% dos presos são pretos ou pardos.

Na mesma linha, um levantamento feito pelo Colégio Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege) mostra que, entre as pessoas acusadas indevidamente com base em reconhecimento fotográfico realizado em delegacias – as quais acabaram sendo absolvidas na sentença –, 83% eram negras.

As três pesquisas traduzem, em números, fatos que alimentam as engrenagens do racismo estrutural no Brasil: a colocação prioritária de pessoas negras na posição de suspeitas, o encarceramento em massa da população de pele preta ou parda e a violência das abordagens policiais contra essa parcela da sociedade – temas que pedem uma reflexão especial neste 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra.

Racismo estrutural no sistema jurídico

Em novembro de 2020, um homem negro foi espancado até a morte por dois homens brancos dentro de um supermercado em Porto Alegre. A brutalidade do crime, filmado por testemunhas, chocou o Brasil.

Após esse episódio, a Câmara dos Deputados instituiu uma comissão de juristas – presidida pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Benedito Gonçalves – que apresentou, no fim de 2021, um relatório de mais de 500 páginas com propostas para dotar o sistema jurídico brasileiro de instrumentos capazes de enfrentar os problemas históricos ligados ao racismo estrutural.

Ao final dos trabalhos, Benedito Gonçalves afirmou que, apesar dos avanços legais, o enfrentamento à discriminação e ao racismo estrutural ainda não é, mas precisa se tornar, prioridade das instituições públicas e privadas, e de toda a sociedade brasileira.

“A luta contra o racismo e a discriminação racial deve ser diária, constante e permanente. No relatório final da comissão, fizemos um convite ao parlamento e ao povo brasileiro para lutarmos juntos, a fim de que tenhamos uma sociedade livre, justa e solidária”, declarou.

Igualdade racial como política de Estado

Ao sugerir alterações que vão além da repressão legal ao racismo – com proposições envolvendo o sistema de Justiça criminal; o direito econômico, tributário e financeiro; os direitos sociais e medidas de combate ao racismo institucional nos setores público e privado –, o documento elaborado pela comissão de juristas teve como denominador comum o propósito de tornar a promoção da igualdade racial uma política perene de Estado.

Para o ministro Benedito Gonçalves, o racismo precisa ser tratado em duas dimensões. O racismo institucional, segundo ele, reflete-se, por exemplo, na desconfiança sem justificativa dos agentes de segurança sobre a população negra. A outra vertente é o racismo estrutural, ainda menos explícito.

“A presença do racismo estrutural pode ser constatada pelas poucas pessoas negras que ocupam lugar de destaque nas instituições”, afirmou.

Um exemplo disso são as cotas raciais como mecanismo de ingresso nas carreiras do Judiciário, que começaram a ser implantadas em 2015. Os resultados já são visíveis, tanto entre os servidores quanto nos rostos dos novos juízes e juízas.

Injúria racial é equiparada ao racismo

Benedito Gonçalves celebrou o fato de que os trabalhos da comissão continuam a dar frutos. Ele destacou a recente aprovação, pelo Senado, de um projeto de lei que equipara o crime de injúria racial ao de racismo, tornando-o imprescritível e inafiançável.

Com isso, observou o ministro, os senadores seguiram as recomendações do relatório da comissão e referendaram uma decisão de 2021 do Supremo Tribunal Federal (STF) no mesmo sentido.

“A injúria racial equiparada ao racismo fez com que trouxéssemos para o sistema de Justiça o que o STF decidiu em 2021: um avanço muito grande”, ressaltou.

Ilegalidades na abordagem de suspeitos

A evolução jurisprudencial do STJ também tem integrado os esforços no combate ao racismo estrutural. Recentemente, as turmas de direito penal do tribunal começaram a dar visibilidade ao tema em diferentes julgados.

Em um deles, o RHC 158.580, o tribunal utilizou a expressão “racismo estrutural” ao analisar ilegalidades na abordagem policial de suspeitos – escolhidos muitas vezes em razão de sua raça e condição econômica pelas forças de segurança.

No julgamento ocorrido na Sexta Turma, o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, apontou que, como decorrência da “ainda latente mentalidade escravista, cujos efeitos perduram até os dias de hoje” no Brasil, “o controle sobre os corpos negros no espaço público se acentua por meio da repressão criminal, que se volta não apenas contra condutas concretas e danosas, mas também contra condições pessoais vistas, por si sós, como perigosas e indesejáveis”.

Ações das forças de segurança concentradas na população negra

Em entrevista sobre o assunto, Schietti afirmou que vários estudos têm analisado o tema do racismo estrutural, que também chega ao tribunal suscitado em muitos recursos, frequentemente relacionados a práticas policiais que se concentram sobre pessoas negras na periferia dos grandes centros urbanos.

Segundo o ministro, é importante ressaltar que o racismo estrutural não é encontrado somente nas polícias, mas também nas corporações e no próprio Poder Judiciário.

“É só analisar a composição da magistratura e dos próprios tribunais superiores. O que temos é uma quase escassez de representantes de cor preta nesse grupamento social”, observou.

O integrante da Sexta Turma avaliou que o STJ pode contribuir muito para o debate desse tema “sensível”, que, em sua opinião, deve ser tratado na corte sem nenhuma “reticência em expor uma realidade que precisa ser modificada”.

Reconhecimento fotográfico influenciado por estereótipos raciais

Uma questão que vem sendo enfrentada pelos colegiados de direito penal diz respeito ao reconhecimento fotográfico de suspeitos, momento em que a vítima, ao analisar imagens do suposto criminoso, pode ser influenciada por preconceitos e estereótipos, mesmo que de forma inconsciente.

Ao julgar o HC 652.284, a Quinta Turma acompanhou a reorientação de jurisprudência inaugurada pela Sexta Turma e assentou o entendimento de que a inobservância do artigo 226 do Código de Processo Penal (CPP) invalida o reconhecimento do acusado feito na polícia, o qual não poderá servir de base para a condenação, nem mesmo se for confirmado na fase judicial.

Leia também – Reconhecimento de pessoas: um campo fértil para o erro judicial

Para o relator do caso, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, a identificação, mesmo ratificada em juízo, não teve amparo nas provas independentes e idôneas que foram produzidas na fase judicial, com contraditório e ampla defesa, tendo o reconhecimento se mostrado falho e incapaz de embasar qualquer condenação.

O magistrado destacou que estereótipos culturais relacionados a cor, classe social, sexo ou etnia podem influenciar negativamente a identificação, que também se sujeita à falibilidade da memória humana, afetada tanto pelo esquecimento quanto por emoções e sugestões, capazes de gerar “falsas memórias”.

De acordo com Reynaldo Soares da Fonseca, debater o racismo estrutural nas decisões proferidas pela corte é fundamental para promover a igualdade em uma sociedade que se pretende justa, livre e solidária. 

“Isso diz respeito ao princípio da igualdade. Todos têm que ser tratados de maneira igual. Se nós temos uma massa carcerária composta por pessoas pobres, jovens, analfabetas e negras – mais de 60% –, significa que o sistema carcerário é seletivo e que nós precisamos, como sistema de Justiça, tratar isso de forma que a gente retire essa seletividade”, afirmou.

Precedentes do STJ na vanguarda do combate ao racismo

Para o ministro Ribeiro Dantas, membro da Quinta Turma, o STJ tem sido vanguarda na formulação de precedentes que buscam repelir as práticas racistas nas investigações criminais.

Segundo ele, o trabalho do tribunal na construção da jurisprudência que vai orientar a atuação das cortes de segundo grau e dos juízos em todo o país é decisivo para o combate ao racismo estrutural.

“Com o aprimoramento da legislação, da jurisprudência, da doutrina, e com uma maior conscientização dos profissionais do direito e de uma maior e melhor estruturação, nesse ponto, do sistema de Justiça, é possível combater, efetivamente, o racismo estrutural que permeia nossa sociedade”, afirmou.

Ao citar a mudança jurisprudencial sobre a identificação de suspeitos por meio de reconhecimento fotográfico, Ribeiro Dantas explicou que a questão racial se manifesta no sistema de persecução penal principalmente, na formação da investigação.

“Muitas pessoas negras são pobres e periféricas, dada a herança da escravidão em nosso país. E isso, infelizmente, constrói estereótipos, que devem ser combatidos”, ponderou o ministro.

O magistrado defendeu o aperfeiçoamento da preparação das forças de segurança e a obediência rigorosa aos procedimentos previstos no Código de Processo Penal, além do aprimoramento da própria legislação, para proporcionar um processo criminal mais justo e menos sujeito à influência da discriminação racial.

Fonte: STJ

Por unanimidade, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou o julgamento do processo administrativo no qual o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) condenou a siderúrgica Gerdau S/A ao pagamento de multa por suposta formação de cartel. O colegiado decidiu, ainda, que o julgamento deverá ser reiniciado após a produção da prova pericial de natureza econômica requerida pela empresa.

21/11/2022

Segundo os autos, ao fim de uma investigação na Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, a Gerdau – juntamente com as siderúrgicas Belgo Mineira e Barra Mansa – foi acusada de prática de cartel na comercialização de vergalhões de aço para a construção civil.

Em 2005, o Cade condenou as três empresas, por formação de cartel, a pagarem multa equivalente a 7% do seu faturamento bruto em 1999, ano anterior ao início da investigação. A Gerdau entrou na Justiça contra a decisão, mas não teve êxito nas instâncias ordinárias.

Processo deve respeitar garantias fundamentais do acusado

No recurso especial apresentado ao STJ, a empresa pleiteou a anulação do processo administrativo e da pena que lhe foi imposta, em razão do indeferimento de seu pedido para a produção de prova pericial, bem como da falta de exame integral e imparcial do conjunto das provas – o que teria violado o devido processo legal.

Segundo o relator, ministro Benedito Gonçalves, no contexto do direito sancionador – “por meio do qual a administração pública exerce a sua prerrogativa de punir atos que repute contrários às normas jurídicas prescritivas de comportamentos” –, devem incidir as limitações próprias das garantias asseguradas a todos aqueles que se encontram no polo passivo da relação jurídica.

O ministro considerou que o indeferimento da perícia requerida pela empresa, pelo fato de o pedido ter sido feito supostamente fora do prazo, não se amolda ao devido processo administrativo, pois a punição deve ser baseada em prova efetiva, observadas as garantias que o direito assegura aos acusados em geral.

“Essa conclusão não é uma incursão no mérito administrativo, ou nas conclusões a que chegou o julgador administrativo, mas sim uma exigência de observância das garantias fundamentais que devem ser asseguradas ao acusado, no contexto de um devido e regular processo administrativo”, afirmou o magistrado.

Empresa insistiu na necessidade da prova pericial

O relator frisou que o artigo 2º, X, da Lei 9.784/1999 assegura a produção da prova ao acusado, no contexto de um processo do qual possam resultar sanções. No caso sob análise – acrescentou –, em que o processo administrativo tem o objetivo de apurar a prática de infração à ordem econômica, podendo resultar na aplicação de penalidade, “o livre convencimento motivado, aplicável aos juízos de natureza cível, cede espaço à garantia legal de efetiva produção probatória ao acusado”.

Benedito Gonçalves ressaltou que a necessidade da prova pericial foi sustentada e reiterada em dois momentos pela Gerdau, que, inclusive, juntou oportunamente um parecer técnico para justificar a sua produção.

Para o ministro, nesse contexto, deve ser afastada a extemporaneidade da prova requerida, conforme preceituam os artigos  e 50 da Lei 9.784/1999, os quais impõem a necessidade de efetiva produção da prova pericial.

“Consequentemente, no caso, o título executivo deve ser desconstituído, ante a nulidade do julgamento do processo administrativo pelo Cade, o qual deverá ser reiniciado a partir da produção da prova pericial de natureza econômica requerida”, afirmou o relator, ao dar provimento ao recurso da empresa.

REsp 1.979.138.

Fonte: STJ

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que é cabível o acesso aos dados telemáticos de celular de advogado, quando a medida é autorizada em razão da existência de graves indícios de que o aparelho tenha sido usado para a prática de crime.

17/11/2022

A decisão foi tomada na análise de recurso em habeas corpus interposto por dois advogados, presos em flagrante pela suposta prática dos crimes de participação em organização criminosa e coação de testemunhas. Eles teriam entrado em contato com duas testemunhas de acusação para coagi-las a prestar depoimentos falsos em ação penal deflagrada na Operação Regalia.  

A investigação teve por finalidade apurar a existência de organização criminosa – composta por policiais civis, um agente penitenciário e um preso – que se dedicaria a acusar agricultores e empresários do Paraná de crime ambiental, para depois exigir dinheiro em troca da promessa de não aplicação de multa ou persecução criminal.

Ao lavrar o auto de prisão em flagrante, a polícia representou pela quebra do sigilo dos dados telemáticos dos celulares dos advogados, que foi deferida. Ao STJ, os réus alegaram constrangimento ilegal e violação de sigilo profissional, visto que a devassa nos celulares apreendidos resultaria em acesso indevido a dados relativos a seus clientes.

Inviolabilidade dos instrumentos de trabalho do advogado não acoberta crimes

Segundo o relator, ministro Sebastião Reis Júnior, é pacífico no STJ o entendimento de que a inviolabilidade prevista no artigo 7º, II, da Lei n 8.906/1994 não se destina a afastar a punição de advogados pela prática de delitos pessoais – em concurso ou não com seus supostos clientes –, mas a garantir o exercício da advocacia e proteger o dever constitucional exercido por esses profissionais em relação a seus clientes.

O relator afirmou que, na busca em escritório de advocacia, autorizada diante da suspeita da prática de crime pelo advogado, não se pode exigir que os agentes executores do mandado filtrem imediatamente o que interessa ou não à investigação, mas aquilo que não tiver interesse deve ser prontamente restituído ao investigado após a perícia.

“Tal raciocínio pode perfeitamente ser aplicado no acesso aos dados telemáticos do aparelho celular, quando a medida é autorizada em razão da existência de sérios indícios da prática de crime por meio da utilização do aparelho pelo advogado”, disse o relator.

Execução da medida mediante acompanhamento pelo representante da OAB

Sebastião Reis Júnior observou ainda que, segundo o processo, tanto o juízo de primeiro grau quanto o departamento de polícia científica foram cautelosos ao acessar os dados, medida que foi deferida mediante o acompanhamento por representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

“A garantia do sigilo profissional entre advogado e cliente, em que pese esteja sendo preterida em relação à necessidade da investigação da prática de crimes pelos investigados, seguirá preservada com a transferência do sigilo para quem quer que esteja na posse dos dados telemáticos extraídos dos celulares apreendidos”, declarou o ministro.

RHC 157.143.

Fonte: STJ

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento — pacífico no âmbito da 2ª Seção — de que cabem honorários advocatícios na primeira fase da ação de exigir contas. A relatoria foi da ministra Nancy Andrighi.

14 de novembro de 2022

A ministra Nancy Andrighi, do STJ
Gustavo Lima
/STJ

“No âmbito da 2ª Seção, é uníssono o entendimento de que, com a procedência do pedido do autor (condenação à prestação das contas exigidas), o réu fica vencido na primeira fase da ação de exigir contas, devendo arcar com os honorários advocatícios, como consequência do princípio da sucumbência”, afirmou a magistrada.

A decisão teve origem em ação de exigir contas ajuizada pelo cliente de um banco, relativamente à movimentação de sua conta-corrente. Em primeira instância, o banco foi condenado a prestar contas, porém ficou estabelecido que as custas e os honorários seriam disciplinados na sentença a ser proferida ao final da segunda fase.

Houve recurso do autor da ação. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) consignou que, julgada a primeira fase da ação de exigir contas com a determinação ao réu para prestá-las, é indevida a sua condenação em honorários sucumbenciais, pois se trata de decisão interlocutória.

“O TJ-DF, ao decidir que a hipótese ‘não comporta a fixação de honorários advocatícios de sucumbência’, divergiu da jurisprudência sobre a questão”, destacou Andrighi.

Critério para fixação dos honorários
Em seu voto, a ministra destacou que, apesar do entendimento uniforme das duas turmas de direito privado do STJ quanto ao cabimento dos honorários na primeira fase da ação, há divergência sobre o critério para a sua fixação.

Para a 3ª Turma, o critério que deve ser adotado é o da equidade, pois, nesse momento, o proveito econômico é inestimável, nos moldes do artigo 85, parágrafo 8º, do Código de Processo Civil (CPC).

Já a 4ª Turma entende que, na primeira fase da ação de exigir contas, há proveito econômico em favor daquele que teve reconhecido o direito de ver prestadas as contas ou em favor de quem se desincumbiu do dever de prestá-las, devendo ser aplicado para a fixação dos honorários o parágrafo 2º do artigo 85 do CPC.

Sobre essa questão, Nancy recordou que a ação de exigir contas tem duas fases: na primeira, apenas se verifica se há o direito de exigir as contas; na segunda, analisa-se a adequação das contas prestadas, determinando-se a existência ou não de saldo credor ou devedor.

De acordo com a ministra, só é possível falar em proveito econômico depois de iniciada a segunda fase da ação de exigir contas, “momento em que, efetivamente, exsurgirá o benefício patrimonial em favor de uma das partes, que será a medida de seu preço ou de seu custo”.

Com informações da assessoria do STJ.


REsp 1.874.920

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 14 de novembro de 2022, 9h02

A presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Maria Thereza de Assis Moura, assinou nesta quarta-feira (9) acordo de cooperação entre o STJ, o Tribunal Superior de Justiça de Buenos Aires e o Conselho da Magistratura de Buenos Aires, com o objetivo de implementar ações conjuntas para a melhoria na qualidade da prestação jurisdicional nos dois países.

10/11/2022

Celebrado na Argentina – a ministra participa do Encontro Anual do El PAcCTO (Programa de Assistência contra o Crime Transnacional Organizado) –, o termo de cooperação também foi assinado pela presidente do Tribunal Superior de Justiça de Buenos Aires, Inés Weinberg, e pelo presidente do Conselho da Magistratura de Buenos Aires, Alberto Maques.

“O acordo representa a possibilidade de profunda troca de experiências entre o STJ e instituições estratégicas no sistema de Justiça da Argentina. Iniciativas como esta permitem que o nosso tribunal conheça soluções de gestão judicial adotadas em outros países e, ao mesmo tempo, contribua para o aprimoramento do Judiciário em nível internacional”, afirmou a ministra Maria Thereza.

Cooperação envolve gestão, planejamento e tecnologia da informação

O acordo estabelece que os órgãos de Justiça promoverão transferências de informação em áreas como gestão, planejamento e tecnologia da informação, com foco no aprimoramento da qualidade da prestação jurisdicional bilateral.

Também é prevista a possibilidade de consulta e de envolvimento de outras instituições, cujas competências sejam de utilidade para a execução do instrumento de colaboração, a exemplo das faculdades de direito de ambos os países e da Universidade de Buenos Aires.

O prazo de duração do acordo é de dois anos, podendo ser automaticamente renovado por períodos iguais e sucessivos. A colaboração não acarreta compromissos financeiros para os órgãos envolvidos.

Fonte: STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de duas filhas do fundador da Sadia, que pediam indenização com base na teoria da perda de uma chance, em razão da dificuldade para obter elementos de prova a tempo de impugnar supostas doações inoficiosas de ações – realizadas décadas atrás – que teriam favorecido seus irmãos unilaterais.

09/11/2022

As recorrentes pretendiam responsabilizar a BRF S/A, sucessora da Sadia, por não ter apresentado dois livros societários em prazo hábil para subsidiar o ajuizamento de ação destinada a anular as doações e restabelecer a participação societária de seu pai. Os ministros, porém, entenderam que não foi demonstrado o nexo de causalidade entre o extravio dos documentos e o prejuízo que as recorrentes alegam ter sofrido.

As duas herdeiras ajuizaram ação indenizatória de danos materiais e morais argumentando que receberam participação acionária inferior à que seria efetivamente devida. Pediram reparação de danos causados pela conduta da empresa, que deixou de apresentar dois livros societários em ação de exibição de documentos, os quais comprovariam sua alegação de que o pai doou cotas de participação societária somente aos outros filhos.

Aplicação da teoria da perda de uma chance exige certeza do prejuízo

A sentença julgou a ação improcedente. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou a decisão, ao entendimento de que “nem toda chance perdida é indenizável, mas somente aquela plausível e provável, à luz das circunstâncias do caso concreto”.

Segundo o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, na perda de uma chance, há prejuízo certo, e não apenas hipotético, situando-se a certeza na probabilidade de obtenção de um benefício, frustrado por força do evento danoso imputado. “Repara-se a chance perdida, e não o dano final”, acrescentou o magistrado.

No processo analisado – afirmou o ministro –, a alegação central é de que teriam sido realizadas diversas doações pelo dono da Sadia, ao longo da vida, beneficiando os irmãos unilaterais das recorrentes e privando as duas da participação societária a que teriam direito.

Sanseverino entendeu que os pressupostos para o reconhecimento da responsabilidade civil por perda de uma chance foram bem sintetizados pelo acórdão do TJSP, segundo o qual, ainda que a companhia tivesse cumprido a decisão judicial que determinou a exibição dos livros, a situação hereditária das recorrentes dificilmente seria modificada.

Pretensão das herdeiras foi atingida pela prescrição

A corte estadual considerou que as doações foram realizadas há cerca de 60 ou 70 anos e, embora a anulação de doação inoficiosa seja imprescritível, o mesmo não ocorre com a pretensão de restituir a participação social, nem com a possível ação de sonegados – as quais já estariam prescritas, afastando-se a probabilidade segura de sucesso da ação anulatória e de seus efeitos patrimoniais.

Ao negar provimento ao recurso especial das herdeiras, o relator destacou não haver nexo de causalidade entre o extravio dos dois livros da companhia e o insucesso que elas tiveram em sua tentativa de anular as doações.

Conforme Sanseverino, como o TJSP reconheceu a prescrição da pretensão de restabelecer a participação acionária do autor da herança, a revisão dos fundamentos dessa decisão – quanto à ocorrência ou não de causa interruptiva do prazo prescricional – exigiria o reexame das provas do processo, o que é vedado pela Súmula 7.

REsp 1.929.450

Fonte: STJ