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A falta de recurso contra a decisão que homologou o plano de recuperação judicial com cláusula de exoneração das garantias pessoais do devedor não a torna aplicável a todo e qualquer credor indistintamente.

10 de maio de 2023
Voto do ministro Villas Bôas Cueva aplicou precedente da 2ª Seção ao caso concreto
Lucas Pricken/STJ

Essa foi a conclusão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar recurso ajuizado pelo Banco do Brasil contra uma empresa que se encontra em recuperação judicial e tem uma dívida de R$ 168 mil, decorrente de empréstimo não quitado.

O banco iniciou a execução contra a empresa e os avalistas da dívida. Eles, então, pediram a extinção do processo por causa da aprovação do plano de recuperação judicial, que tem cláusula que libera e desonera todos os coobrigados das dívidas da empresa.

O Tribunal de Justiça de Goiás negou o pedido por considerar que a desoneração ofende a Súmula 581 do STJ. O enunciado diz que “a recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória”.

Ao STJ, os avalistas alegaram que a posição do TJ-GO ofende a coisa julgada, uma vez que o plano de recuperação judicial foi aprovado e homologado pelo juízo, sem qualquer recurso do Banco do Brasil contra a cláusula que desonera as garantias pessoais.

A solução do problema passa pela posição recente da 2ª Seção do STJ, que em 2021 decidiu que a cláusula do plano de recuperação judicial que afastar as garantias reais e fidejussórias só vale para os credores que a aprovaram sem ressalvas.

Isso significa que seus efeitos não alcançam os credores ausentes na assembleia geral, que não votaram ou que votaram contrariamente. Logo, para manter a execução iniciada pelo Banco do Brasil, é preciso saber se o credor aprovou ou não a cláusula em questão.

A votação na 3ª Turma foi unânime e definida pelo voto-vista do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. A relatora da matéria, ministra Nancy Andrighi, incorporou os argumentos dele. O provimento do recurso devolve o caso ao TJ-GO, para avaliar a viabilidade do prosseguimento da execução iniciada pelo banco.

“Se a cláusula de desoneração não tem eficácia sobre o credor que com ela deixou de anuir, não faz sentido exigir que este mesmo credor recorra da decisão que homologou o plano, pois nem sequer interesse para tanto teria, já que contra ele não pode ser invocada a exoneração”, explicou o ministro Cueva.

“Se a jurisprudência já consolidou o entendimento de que nenhuma ação é exigida do credor para que ele possa ver mantida sua garantia, bastando a inércia diante da assembleia, dispensadas inclusive ressalvas e objeções, não há razão plausível para exigir dele que, depois de tudo isso, recorra da decisão que homologou o plano, a fim de ver reconhecido direito à garantia, do qual nunca deixou de ser titular”, reforçou o magistrado.

REsp 1.984.296

*Por Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 10 de maio de 2023, 8h48

Segundo o colegiado, a ação de habeas corpus não pode ser utilizada nessas circunstâncias porque o seu rito processual não permite o estudo aprofundado de fatos e provas do caso.

10 de Maio de 2023

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, reafirmou o entendimento de que o habeas corpus não é o meio adequado para a defesa de interesses relacionados a guarda de filhos menores e direito de visitas – temas próprios do direito de família. Segundo o colegiado, a ação de habeas corpus não pode ser utilizada nessas circunstâncias porque o seu rito processual não permite o estudo aprofundado de fatos e provas do caso.

Com base nesse entendimento, a turma não conheceu do habeas corpus impetrado por um homem em benefício de seu filho menor de idade, no qual ele alegou que, ao deferir tutela de urgência para suspender a visitação assistida, o tribunal de segunda instância estaria causando constrangimento ilegal à criança.

Tribunal local suspendeu a retomada gradual das visitas

A mãe ajuizou contra o ex-cônjuge ação de reconhecimento de alienação parental, com pedido de tutela de urgência para que fossem suspensas as visitas do pai ao filho. Entendendo haver indícios de violência física e psicológica do pai contra a criança, a juíza da vara de família suspendeu o direito de visitas.

Após a instrução probatória e a realização de estudos psicológicos, o Ministério Público pediu a revogação da liminar que suspendeu as visitas. A juíza, com fundamento no princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, restabeleceu de forma gradual o direito de visitas assistidas, e nomeou uma psicóloga para acompanhar os encontros.

Inconformada, a mãe recorreu ao tribunal de segundo grau, questionando o laudo de avaliação psicológica. Sustentou que os encontros causavam grande sofrimento para a criança e pediu a realização de um processo terapêutico com todos os envolvidos, aguardando-se que o filho voltasse a ter vontade de conviver com o pai. A corte, então, suspendeu a decisão que havia determinado a retomada gradual das visitas.

Criança não está em cárcere privado nem em abrigamento institucional

O relator do habeas corpus, ministro Moura Ribeiro, afirmou que não há informação de nenhuma ameaça ou violação ao direito de locomoção da criança que seja passível de proteção por meio do habeas corpus, pois ela não está em cárcere privado ou em situação de abrigamento institucional, tendo havido tão somente o sobrestamento da visitação paterna em tutela de urgência, a pretexto de atendimento do seu melhor interesse.

O ministro destacou que, especialmente em virtude da inviabilidade de incursão aprofundada na análise das provas, a jurisprudência do STJ considera o habeas corpus inadequado para veicular questões próprias do direito de família – a exemplo do direito de visita ou da discussão sobre guarda de menores –, as quais são reservadas às varas cíveis.

“É bem verdade que, em alguns julgamentos de processos prioritários por esta Terceira Turma, a jurisprudência excepcionalmente vem sendo mitigada, notadamente nas questões envolvendo abrigamento institucional de criança ou adolescente, o que não é o caso, devendo, ao meu juízo, ser observado o entendimento há muito tempo consolidado nas turmas que compõem a Segunda Seção”, declarou.

Poder Judiciário tem o dever de proteger as crianças

O relator também explicou que o direito de visitação tem por finalidade assegurar o relacionamento do filho com o genitor não guardião, que também compõe o seu núcleo familiar, interrompido pela separação do casal, tratando-se do direito fundamental de convivência familiar garantido pelo artigo 227, caput, da Constituição Federal.

Apesar disso, segundo Moura Ribeiro, a cláusula geral do melhor interesse da criança e do adolescente, decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, recomenda que o Poder Judiciário cumpra o dever de protegê-los com prioridade absoluta, proporcionando-lhes um adequado e saudável desenvolvimento físico e psíquico.

“É visível que o menor precisa ser preparado adequadamente para a retomada do convívio com o pai, que os genitores devem ser obrigatoriamente submetidos a tratamento psicológico para poderem auxiliar o filho nessa seara, e não há dúvidas que as instâncias ordinárias não estão medindo esforços para encontrar a melhor forma de equacionar a questão”, concluiu o ministro.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

O instrumento processual adequado para que o proprietário retome a posse direta de imóvel alugado é a ação de despejo, nos termos do artigo 5º da Lei 8.245/1991 (Lei de Locação), não servindo para esse objetivo o ajuizamento de ação possessória.

09 de Maio de 2023

​O instrumento processual adequado para que o proprietário retome a posse direta de imóvel alugado é a ação de despejo, nos termos do artigo 5º da Lei 8.245/1991 (Lei de Locação), não servindo para esse objetivo o ajuizamento de ação possessória.

O entendimento foi reafirmado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), segundo o qual a ação possessória seria cabível para que os possuidores indiretos – no caso, os herdeiros do proprietário falecido – reivindicassem a retomada do imóvel locado.

De acordo com os autos, após a morte de seu pai, um dos herdeiros avisou à locatária que não tinha mais interesse no aluguel, e solicitou a desocupação. Entretanto, a locatária se recusou a sair do imóvel, alegando que o teria comprado do proprietário anterior. 

Ao confirmar a sentença que determinou a reintegração de posse, o TJSP considerou que, tendo sido demonstrada a relação locatícia no imóvel transmitido aos herdeiros no momento da morte do pai (princípio da saisine), estava comprovada a posse indireta do autor da ação sobre o imóvel.

Apesar de considerar que, no caso, o procedimento adequado seria o da ação de despejo, o TJSP seguiu o princípio mihi factum, dabo tibi ius (“dá-me os fatos que lhe darei o direito”), concluindo que o juiz de primeiro grau agiu corretamente ao analisar o pedido de reintegração de posse.

Ações possessórias e de despejo têm natureza e fundamentos distintos

Relator do recurso da locatária no STJ, o ministro Antônio Carlos Ferreira comentou que o Código de Processo Civil, em seu artigo 554, prevê a fungibilidade (ou seja, a possibilidade de se aceitar um meio processual juridicamente inadequado) para os diferentes tipos de ação possessória: a reintegração de posse (no caso de esbulho), a manutenção de posse (na hipótese de turbação) e o interdito proibitório (em razão de ameaça à posse).

Por outro lado, observou, a ação de despejo prevê uma relação locatícia subjacente, da qual derivam os direitos e os deveres do locador e do locatário – sendo possível comprovar, a partir dessa relação, uma situação de posse indevida.

“Embora o pedido da reintegração de posse e da ação de despejo seja a posse legítima do bem imóvel, trata-se de pretensões judiciais com natureza e fundamento jurídico distintos, pois, enquanto a primeira baseia-se na situação fática possessória da coisa, a segunda se fundamenta em prévia relação contratual locatícia, regida por norma especial, o que, consequentemente, impossibilita sua fungibilidade”, completou.

Desocupação para uso próprio tem procedimentos específicos na Lei de Locação

No caso analisado, segundo o relator, o término do contrato de locação ocorreu em razão da necessidade de retomada do imóvel para moradia, contexto em que a Lei 8.245/1991 prevê procedimentos específicos para a desocupação, bem como sanções – até criminais – se o proprietário não utilizar o bem com a finalidade alegada.

“Ao se permitir o ajuizamento de ação possessória em substituição da ação de despejo, nega-se vigência ao conjunto de regras especiais da Lei de Locação, tais como prazos, penalidades e garantias processuais”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso especial e julgar improcedente a ação de reintegração de posse. 

Fonte: STJ

Prevista no artigo 183 da Constituição Federal e no artigo 1.240 do Código Civil (CC), a ação de usucapião especial de imóvel urbano possibilita o reconhecimento do direito ao domínio em favor da pessoa que, de forma pacífica e ininterrupta, tenha como sua área de até 250 metros quadrados, por cinco anos, sem oposição, utilizando-a para moradia própria ou de sua família, desde que não seja proprietária de outro imóvel urbano ou rural.

08/05/2023

Trata-se de uma forma originária de aquisição de imóvel que tem como objetivo atingir a função social da propriedade. Nas áreas urbanas, ela também é possível na forma do artigo 1.238 do CC, que disciplina a chamada usucapião extraordinária, com exigência de posse por 15 anos sem interrupção nem oposição.

No julgamento do REsp 1.818.564, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Moura Ribeiro explicou que “a usucapião está claramente vinculada à função social da propriedade, pois reconhece a prevalência da posse adequadamente exercida sobre a propriedade desprovida de utilidade social, permitindo, assim, a redistribuição de riquezas com base no interesse público”.

Em relação a outros dispositivos legais que abordam a usucapião de imóvel urbano, a ministra Nancy Andrighi destacou, em seu voto no REsp 1.777.404, a importância da Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), que trouxe esclarecimentos adicionais sobre quem pode se valer do instituto: “Veio regulamentar o texto constitucional e, nessa regulamentação, os legitimados a usucapir são o possuidor individualmente ou em litisconsórcio, os possuidores em composse e até a associação de moradores regularmente constituída, na qualidade de substituta processual”.

Comum nas cidades brasileiras, o instituto é alvo frequente de discussões: a aquisição de metade do imóvel impede o reconhecimento da usucapião? Ela pode ser reconhecida se o prazo só for alcançado no curso do processo judicial? A ação judicial de usucapião depende do prévio pedido na via extrajudicial? O uso simultâneo do imóvel para moradia e comércio compromete a usucapião especial urbana?

Essas e outras questões encontram resposta na jurisprudência do STJ.

Prazo para a usucapião pode ser reconhecido no curso do processo judicial

Ao julgar o REsp 1.361.226, a Terceira Turma considerou ser possível o reconhecimento da usucapião de bem imóvel se o requisito do prazo for alcançado durante a tramitação do processo judicial.

No início do caso, os recorrentes buscavam o reconhecimento da usucapião extraordinária, alegando a posse mansa, pacífica e ininterrupta do imóvel por mais de 17 anos, mas a sentença e o acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) negaram o pedido, ao fundamento de que o requisito temporal não tinha sido atingido quando do ajuizamento da ação. Ambos avaliaram que a situação estava sujeita ao artigo 550 do Código Civil de 1916, impondo-se o prazo de 20 anos para a usucapião extraordinária. Na data da sentença, entretanto, o juiz de primeiro grau destacou que a posse do imóvel já tinha mais de 20 anos. 

De acordo com o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, o magistrado deve considerar fato constitutivo ou extintivo de direito ocorrido após a propositura da ação, independentemente de provocação das partes. Nessa mesma linha, o ministro citou o Enunciado 497 da V Jornada de Direito Civil (STJ/CJF), segundo o qual “o prazo, na ação de usucapião, pode ser completado no curso do processo, ressalvadas as hipóteses de má-fé processual do autor”.

Além disso – destacou o ministro –, a contestação apresentada pelo réu não impede o transcurso do prazo. Para ele, a peça defensiva não é capaz de exprimir a resistência do demandado à posse exercida pelo autor, mas apenas a sua discordância com a aquisição do imóvel pela usucapião. “Contestar, no caso, impõe mera oposição à usucapião postulada pelos autores, e não à posse”, concluiu.

Aquisição de metade do imóvel não impede usucapião especial urbana

Em outubro de 2022, a Terceira Turma fixou que a aquisição de metade do imóvel não impede o reconhecimento da usucapião especial urbana. Para o colegiado, o fato de os moradores, autores do pedido, já terem a metade da propriedade não atrai a vedação do artigo 1.240 do CC, que impõe como condição não possuir outro imóvel urbano ou rural.

Ao dar provimento ao REsp 1.909.276, o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, observou que a jurisprudência do STJ admite a usucapião de bem em condomínio, desde que o condômino exerça a posse com exclusividade. Para ele, essa interpretação se aplicava ao caso em julgamento, pois os recorrentes agiram como donos exclusivos: adquiriram metade do imóvel e pagaram as taxas e os tributos incidentes sobre ele, além de realizarem benfeitorias.

“Sob essa perspectiva, o fato de os recorrentes serem proprietários da metade ideal do imóvel que pretendem usucapir não parece constituir o impedimento de que trata o artigo 1.240 do Código Civil, pois não possuem moradia própria, já que, eventualmente, teriam que remunerar o coproprietário para usufruir com exclusividade do bem”, afirmou.

Ação de usucapião é viável se a enfiteuse não for registrada

A Quarta Turma, por maioria de votos, entendeu que é possível a ação de usucapião de imóvel urbano na hipótese em que, mesmo convencionada a constituição de enfiteuse entre o possuidor e o proprietário, o título respectivo não tenha sido levado ao registro imobiliário.

Para o colegiado, como o registro é um pressuposto de existência para a maioria dos direitos reais, a sua falta impede a configuração da enfiteuse, ainda que, durante anos, tenha havido o pagamento do foro e tenha sido exercido o direito de resgate. Inexistindo uma efetiva relação jurídica de direito real entre o senhorio direto e o foreiro – avaliou a turma –, não há impedimento à aquisição originária da propriedade pelo possuidor.

O caso teve origem em ação proposta por um casal que alegava ter a posse mansa e pacífica de terreno foreiro por 20 anos, tendo sido realizado o resgate da enfiteuse. A sentença considerou o pedido improcedente, e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão, sob o fundamento de que o prazo para a prescrição aquisitiva não flui enquanto perdura a enfiteuse, pois faltaria o chamado animus domini ao enfiteuta.

Ao analisar o REsp 1.228.615, o relator do voto que prevaleceu no julgamento, ministro Luis Felipe Salomão, explicou que o artigo 1.227 do CC, combinado com o artigo 172 da Lei 6.015/1973, indica o efeito constitutivo do registro em relação a direitos reais sobre imóveis, estabelecendo o princípio da inscrição, segundo o qual a constituição, a transmissão e a extinção de direitos reais sobre imóveis só ocorrem por meio da inscrição no cartório de registro imobiliário.

“A mera convenção entre as partes não é condição suficiente a ensejar a constituição da enfiteuse, fazendo-se mister a efetivação de um ato formal de ingresso do título no registro imobiliário, o qual poderia ensejar o verdadeiro óbice à aquisição originária da propriedade pelo enfiteuta – o qual inexiste na situação vertente”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso especial.

Cabe usucapião extraordinária em área inferior ao módulo urbano

Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 985), a Segunda Seção estabeleceu que o reconhecimento da usucapião extraordinária, mediante o preenchimento de seus requisitos específicos, não pode ser impedido em razão de a área discutida ser inferior ao módulo estabelecido em lei municipal.

Para o relator dos recursos especiais (REsp 1.667.843 e REsp 1.667.842), ministro Luis Felipe Salomão, se o legislador quisesse definir parâmetros mínimos para a usucapião de área urbana, ele o teria feito de forma expressa, a exemplo da definição de limites territoriais máximos para a usucapião especial rural, prevista no artigo 1.239 do Código Civil.

O ministro citou decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 422.349, que não verificou inconstitucionalidade na lei municipal que fixa o módulo urbano em área superior a 250 metros quadrados, desde que isso não impeça ao particular a aquisição do direito de propriedade de área menor, no caso de o órgão de controle não questionar a aquisição no prazo legal.

Além disso, Salomão salientou que o parcelamento do solo e as normas de edificação são providências relativas à função social da cidade. Por outro lado – explicou –, a usucapião tem por objetivo a regularização da posse e, uma vez reconhecida judicialmente, assegura o cumprimento da função social da propriedade.

Ação de usucapião independe de prévio pedido na via extrajudicial

Em fevereiro de 2020, a Terceira Turma definiu que o ajuizamento da ação de usucapião não está condicionado à negativa do pedido em cartório, mesmo após as alterações feitas na Lei 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos) pelo Código de Processo Civil de 2015.

Com esse entendimento, o colegiado determinou o retorno de um processo que discutia a usucapião de imóvel ao juízo de origem, para prosseguimento da ação.

A sentença, desfavorável à autora, citou o Enunciado 108 do Centro de Estudos e Debates (Cedes-RJ), segundo o qual a ação de usucapião é cabível somente quando houver óbice ao pedido na esfera extrajudicial. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) manteve a decisão.

No REsp 1.824.133, a Defensoria Pública alegou que o CPC/2015 faculta ao interessado pedir a usucapião em cartório, porém sem prejuízo de optar pela via judicial.

O relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido), deu razão à DP, destacando que o artigo 216-A da Lei de Registros Públicos é claro: “Como se verifica já na abertura do caput desse enunciado normativo, o procedimento extrajudicial de usucapião foi disciplinado ‘sem prejuízo da via jurisdicional'”.

Gratuidade em ação de usucapião especial urbana não tem natureza objetiva

Ao julgar o REsp 1.517.822, a Terceira Turma entendeu ser inadmissível conferir isenções pecuniárias àquele que tem condições de arcar com as despesas da ação de usucapião especial urbana, mesmo que o parágrafo 2º do artigo 12 da Lei 10.257/2001 o permita. Para o colegiado, tal dispositivo deve ser interpretado conciliando-se com a norma especial que regula a matéria, a Lei 1.060/1950, e, a partir de 18 de março de 2016, com o CPC vigente.

Esse posicionamento foi adotado pela turma ao julgar recurso de um médico que ingressou com ação de usucapião especial urbana buscando a gratuidade da assistência judiciária estabelecida em lei, mesmo reconhecendo, na petição inicial, que não era “juridicamente pobre” e que não apresentaria falsa declaração de pobreza.

De acordo com o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Lei 10.257/2001 concede ao autor da ação uma presunção relativa de hipossuficiência, ou seja, de que aquele que pleiteia seja uma pessoa de baixa renda. Em razão disso, o benefício somente não será concedido se houver prova de que ele não é necessitado. No caso em julgamento, conforme apontou o relator, o próprio autor reconheceu que não preenchia os requisitos da Lei 1.060/1950 para obtenção da gratuidade.

Imóvel abandonado do Sistema Financeiro de Habitação não admite usucapião

No julgamento do REsp 1.874.632, a Terceira Turma definiu que não é possível usucapião de imóvel vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação (SFH), ainda que em situação de abandono. O colegiado avaliou que esse tipo de habitação está vinculado à prestação de serviço público, devendo ser tratado como bem público insuscetível à aquisição do direito de propriedade.

Com esse entendimento, foi negado recurso especial a um grupo de pessoas que buscava seguir na posse de um imóvel localizado em um conjunto residencial de Maceió.

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, “na eventual colisão de direitos fundamentais, como o de moradia e o da supremacia do interesse público, deve prevalecer, em regra, este último, norteador do sistema jurídico brasileiro, porquanto a prevalência dos direitos da coletividade sobre os interesses particulares é pressuposto lógico de qualquer ordem social estável”, explicou.

A relatora lembrou que o imóvel foi adquirido integralmente com recursos públicos e destinado à resolução do problema habitacional no país, não sendo admitida, portanto, a prescrição aquisitiva. Para ela, a inércia dos gestores públicos não pode justificar a ocupação ilícita de área pública, sob pena de serem chanceladas situações ilegais de invasão de terras.

Loteamento em Planaltina (DF) foi alvo de controvérsia envolvendo usucapião

Em julgamento de recurso repetitivo (Tema 1.025), a Segunda Seção confirmou que é cabível, por usucapião, a aquisição de imóveis particulares desprovidos de registro no Setor Tradicional de Planaltina (DF).

Os imóveis em discussão eram situados em loteamento que, embora consolidado havia décadas, não foi autorizado nem regularizado pela administração do Distrito Federal.

Na fundamentação do REsp 1.818.564, o relator, ministro Moura Ribeiro, ressaltou que a possibilidade de registro da sentença declaratória da usucapião não é indispensável para o reconhecimento do direito material de propriedade, fundado na posse ad usucapionem e no decurso do tempo. Para ele, o registro seria um efeito da sentença declaratória de usucapião, e não uma condição para o reconhecimento do direito material de propriedade ou para o exercício do direito de ação.

“Não há, portanto, como negar o direito à usucapião sob o pretexto de que o imóvel está inserido em loteamento irregular, porque o direito de propriedade declarado pela sentença (dimensão jurídica) não se confunde com a certificação e a publicidade que emergem do registro (dimensão registrária) ou com a regularidade urbanística da ocupação levada a efeito (dimensão urbanística)”, declarou Moura Ribeiro.

Uso de imóvel para moradia e comércio não impede usucapião especial urbana

O exercício simultâneo de pequena atividade comercial em propriedade que também é utilizada como residência não impede o reconhecimento da usucapião especial urbana. Com base nesse entendimento, a Terceira Turma deu provimento ao recurso especial (REsp 1.777.404) de dois irmãos e reconheceu a usucapião de um imóvel utilizado por eles de forma mista.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que a exclusividade de uso residencial não é requisito expressamente previsto em nenhum dos dispositivos legais e constitucionais que tratam da usucapião especial urbana. “O uso misto da área a ser adquirida por meio de usucapião especial urbana não impede seu reconhecimento judicial, se a porção utilizada comercialmente é destinada à obtenção do sustento do usucapiente e de sua família”, disse.

De acordo com a relatora, é necessário que o imóvel reivindicado sirva de moradia para o requerente ou sua família, mas não se exige que essa área não seja produtiva, especialmente quando é utilizada para o sustento do próprio requerente, como na hipótese em julgamento.

Não cabe intervenção de terceiros na modalidade de oposição em ação de usucapião

A Terceira Turma também definiu que não cabe intervenção de terceiros na modalidade de oposição em ações de usucapião. Com isso, foi confirmado acórdão do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) que não permitiu a participação de um terceiro interessado em ação judicial.

No julgamento do REsp 1.726.292, o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, explicou que a intervenção pretendida era desnecessária, pois a tutela buscada por meio da oposição poderia ser alcançada pela simples contestação à ação de usucapião.

“O opoente carece de interesse processual para o oferecimento de oposição na ação de usucapião porque, estando tal ação incluída nos chamados juízos universais (em que é convocada a integrar o polo passivo por meio de edital toda a universalidade de eventuais interessados), sua pretensão poderia ser deduzida por meio de contestação”, afirmou.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1818564REsp 1777404REsp 1909276REsp 1361226REsp 1228615REsp 1824133REsp 1517822REsp 1726292REsp 1874632REsp 1667843REsp 1667842

Fonte: STJ

Segundo o processo, a respiração da criança foi bloqueada após sua cabeça ficar presa no vão entre o colchão e o forro lateral do berço, o que provocou a morte por asfixia.

08 de Maio de 2023

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso especial de uma empresa importadora e vendedora de berços que foi condenada a pagar indenização pela morte de um bebê de seis meses. Segundo o processo, a respiração da criança foi bloqueada após sua cabeça ficar presa no vão entre o colchão e o forro lateral do berço, o que provocou a morte por asfixia.

O colegiado reconheceu a responsabilidade civil da empresa, nos termos do artigo 12 do Código de Defesa ao Consumidor (CDC), caracterizada pela falha no dever de informar o comprador quanto à utilização adequada do produto. De acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) – que manteve a indenização por danos morais de R$ 100 mil para cada um dos três membros da família que ajuizaram a ação –, o manual de instruções do berço não trazia qualquer informação, à época do acidente, sobre o risco de asfixia do bebê no caso de uso inadequado do colchão.

Ao STJ, a empresa alegou a inexistência de responsabilidade civil de sua parte, pois o produto estaria dentro das regras técnicas, tendo, inclusive, o selo de aprovação do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro). Ainda segundo a recorrente, os familiares não apresentaram o colchão utilizado no berço no momento do acidente, de forma que não foi possível verificar se o item estava em conformidade com as orientações técnicas.

Após o acidente, fabricante alterou significativamente a estrutura do berço

O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, destacou que, apesar de o produto ter obtido a certificação do Inmetro, verificou-se, logo após o acidente, que o modelo de berço comercializado representava risco aos usuários, especialmente em razão das informações insuficientes que acompanhavam o produto.

O ministro ressaltou que, conforme registrado pelo TJSP, a fatalidade ocorrida com o bebê levou o fabricante a fazer um recall dos berços e, posteriormente, a alterá-los de maneira significativa, aumentando a segurança para evitar novos acidentes.

Com base nas informações dos autos, Bellizze apontou que, embora o laudo pericial tenha considerado suficientes as informações sobre o colchão que eram apresentadas no manual, “na visão do homem médio” o documento continha especificações capazes de gerar confusão, por exigir “operações aritméticas para encontrar as medidas exatas do colchão adequado, agravando, assim, o risco na utilização do produto”.

“Tem-se, assim, através da análise do conjunto fático-probatório delineado pelas instâncias ordinárias, que a ora recorrente não atendeu a contento o dever de informar adequadamente os consumidores sobre as medidas exatas do colchão a ser utilizado no berço, nem mesmo alertando sobre o risco grave oriundo da inobservância de tais especificações”, afirmou.

Para Inmetro, acidente poderia ocorrer independentemente do colchão utilizado

Bellizze destacou ainda que, de acordo com a análise das instâncias ordinárias, a falta de exame do colchão utilizado no momento do acidente não teve influência na responsabilização da importadora, tendo em vista que o próprio Inmetro constatou a possibilidade de alojamento da cabeça do bebê por causa do afrouxamento dos tecidos do berço – ou seja, para a Justiça paulista, mesmo estando o colchão em conformidade com a especificação exigida no manual, existia a possibilidade de acidentes como o ocorrido.

“Portanto, estando comprovados os defeitos de informação e de concepção do produto colocado em circulação no mercado consumidor brasileiro pela recorrente, que acarretou a morte da filha e irmã dos recorridos, de rigor é o reconhecimento da responsabilidade da recorrente pelo fato do produto e, assim, da obrigação de reparação civil”, concluiu o ministro.

Fonte: STJ

A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.189 na base de dados do STJ, está assim ementada: “definir se a vedação constante do artigo 17 da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) obsta a imposição, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de pena de multa isoladamente, ainda que prevista de forma autônoma no preceito secundário do tipo penal imputado”.

08 de Maio de 2023

​A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu afetar um recurso especial de relatoria do ministro Sebastião Reis Júnior – que corre em segredo de justiça – para definir, no rito dos repetitivos, se a Lei Maria da Penha impede que a pena de multa seja aplicada de forma isolada.

A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.189 na base de dados do STJ, está assim ementada: “definir se a vedação constante do artigo 17 da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) obsta a imposição, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de pena de multa isoladamente, ainda que prevista de forma autônoma no preceito secundário do tipo penal imputado”.

O colegiado decidiu não suspender a tramitação dos processos que discutem a mesma questão, pois, além de já existir orientação jurisprudencial das turmas componentes da Terceira Seção, eventual atraso no julgamento pode causar prejuízos aos jurisdicionados.

Caráter repetitivo da matéria foi verificado

Segundo o relator, o caráter repetitivo da matéria foi verificado a partir de pesquisa à base de jurisprudência do STJ, que identificou 28 acórdãos e 650 decisões monocráticas tratando da mesma questão.

No recurso especial representativo da controvérsia, o Ministério Público questiona acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), segundo o qual “a regra restritiva contida no artigo 17 da Lei Maria da Penha deve sofrer interpretação limitada, porque inibe direitos. Assim, se a Lei Maria da Penha veda a substituição por multa, não impede a aplicação da multa prevista como pena autônoma no próprio preceito secundário do tipo penal imputado”.

Para o MP, houve violação do artigo 17 da Lei 11.340/2006, pois – conforme sustenta – a norma veda expressamente a possibilidade de aplicação de pena de prestação pecuniária, multa ou congênere no caso de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil de 2015 regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

Sob o rito dos recursos repetitivos, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai “definir o marco inicial do prazo recursal nos casos de intimação eletrônica e de publicação no Diário da Justiça eletrônico (DJe)”. A relatoria dos recursos especiais selecionados como representativos da controvérsia – REsp 1.995.908 e REsp 2.004.485 – é do ministro João Otávio de Noronha. A questão que será submetida a julgamento foi cadastrada como Tema 1.180 na base de dados do tribunal.

04/05/2023

No REsp 1.995.908, indicado como representativo pela Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas, a empresa recorrente argumentou que estava credenciada a receber intimação em portal eletrônico próprio, não sendo cabível a consideração da data de publicação no DJe como termo inicial do prazo recursal. Para a empresa, deve prevalecer a intimação realizada pelo portal eletrônico, mesmo que posterior à publicação do ato judicial no DJe.

Ao propor a afetação dos recursos ao rito dos repetitivos, o relator considerou desnecessária a suspensão dos processos que abordam a mesma temática, pois já existe orientação jurisprudencial do tribunal sobre a questão, inclusive da Corte Especial.

Entendimento da jurisprudência sobre o tema afetado mudou recentemente

Segundo João Otávio de Noronha, o tema afetado já foi objeto de diversos acórdãos proferidos no tribunal, havendo julgados, inclusive de sua relatoria, afirmando que, em casos de dupla intimação, deveria prevalecer aquela realizada pelo DJe. “No entanto, orientou-se a jurisprudência mais recente no sentido de que deve preponderar a intimação feita pelo portal eletrônico”, apontou o relator.

Ainda de acordo com o ministro, os pressupostos específicos do recurso especial se encontram atendidos, pois a questão suscitada foi objeto de prequestionamento, não havendo necessidade de reexame de provas para a apreciação da controvérsia, tampouco de matéria de direito local ou de natureza constitucional.

“No contexto apresentado, pode-se ter como madura a matéria submetida ao rito do recurso especial repetitivo, circunstância que possibilita a formação de um precedente judicial dotado de segurança jurídica”, concluiu.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil de 2015 regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

REsp 1.995.908.

REsp 1995908REsp 2004485

Fonte: STJ

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão unânime, isentou o laboratório fabricante do analgésico Novalgina do dever de indenizar uma consumidora que desenvolveu doença grave após usar o produto. Segundo o colegiado, sendo provado que não houve defeito do medicamento e estando prevista na bula a possibilidade da reação adversa, não é cabível a responsabilização do fabricante.

03/05/2023 07:00

Ao dar provimento ao recurso especial do laboratório, a turma julgadora considerou que a teoria do risco da atividade adotada no sistema do Código de Defesa do Consumidor (CDC) não tem caráter absoluto, integral ou irrestrito, podendo o fabricante se eximir do dever de indenizar caso comprove que o dano sofrido pelo consumidor não decorreu de defeito do produto (artigo 12, parágrafo 3º, inciso II, do CDC).

Após ingerir dois comprimidos de Novalgina, a consumidora apresentou sintomas como febre, dor de cabeça, irritação e bolhas na pele, na boca e nos olhos. Devido ao agravamento do quadro clínico, ela ficou internada por 20 dias. Diagnosticada com a Síndrome de Stevens-Johnson, a consumidora entrou na Justiça com pedido de reparação contra o fabricante do medicamento.

As instâncias ordinárias consideraram que a possibilidade de contrair uma doença grave após tomar o analgésico não poderia ser considerada normal e previsível pelo consumidor, ainda que essa reação alérgica esteja descrita na bula, por se tratar de medicamento de livre comercialização e grande aceitação no mercado, adquirido sem a necessidade de receita médica. Por isso, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) condenou o laboratório a pagar R$ 1 milhão por danos morais, além da reparação de todos os danos materiais.

Medicamentos são produtos que apresentam riscos intrínsecos

A relatora do recurso do laboratório no STJ, ministra Isabel Gallotti, observou que os medicamentos em geral são produtos que apresentam riscos intrínsecos, inerentes à sua própria utilização e decorrentes da finalidade a que se destinam (artigo 8º do CDC).

A magistrada destacou que a ingestão de medicamentos tem potencial para provocar reações adversas, as quais, todavia, não configuram, por si sós, defeito do produto, desde que a potencialidade e a frequência desses efeitos nocivos estejam descritas na bula, em respeito ao dever de informação por parte do fabricante – exigência que, segundo a relatora, foi atendida pelo laboratório.

“O registro na bula sobre a possibilidade de ocorrência dessas enfermidades, em casos isolados, como reação adversa da ingestão do medicamento, demonstra não apenas ter sido prestada de maneira adequada e suficiente a informação acerca da periculosidade do produto, mas, diante das peculiaridades do caso, que nada além disso poderia ser exigido do fabricante do remédio, porque estava fora do seu alcance a adoção de conduta diversa”, declarou.

Diversos outros remédios de uso corriqueiro podem causar a mesma reação

A ministra também apontou que a Síndrome de Stevens-Johnson, cujas causas ainda não foram identificadas de forma precisa pela medicina, pode ser desencadeada a partir da ingestão de pelo menos uma centena de remédios.

Gallotti ressaltou que a Novalgina pode ser adquirida sem prescrição médica porque, conforme previsto em regulamentação específica, seu princípio ativo – a dipirona – apresenta baixo grau de risco e nocividade reduzida, destina-se ao tratamento de enfermidades simples e passageiras, e não tem potencial de causar dependência física ou psíquica.

“Não teria relevância alguma a eventual assistência de profissional médico para alertar o consumidor sobre os possíveis efeitos adversos da ingestão da Novalgina, dado que as causas que desencadeiam a reação alérgica denominada Síndrome de Stevens-Johnson ainda não foram identificadas de forma precisa pela ciência médica, além do que diversos outros remédios de uso corriqueiro, inclusive o paracetamol, podem causar a mesma reação”, concluiu.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1402929

Fonte: STJ

No julgamento do Incidente de Assunção de Competência (IAC) 14, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu teses a respeito de qual ente federativo deve responder ação na qual se pede acesso a medicamento não incluído nas políticas públicas, mas devidamente registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

28/04/2023

Em razão da responsabilidade solidária dos entes federativos na prestação da saúde, o colegiado entendeu que:

a) nas hipóteses de ações relativas à saúde intentadas com o objetivo de compelir o poder público ao cumprimento de obrigação de fazer consistente na dispensação de medicamentos não inseridos na lista do Sistema Único de Saúde (SUS), mas registrados na Anvisa, deverá prevalecer a competência do juízo de acordo com os entes contra os quais a parte autora elegeu demandar;

b) as regras de repartição de competência administrativa do SUS não devem ser invocadas pelos magistrados para fins de alteração ou ampliação do polo passivo delineado pela parte no momento da propositura da ação, mas tão somente para fins de redirecionar o cumprimento da sentença ou determinar o ressarcimento da entidade federada que suportou o ônus financeiro no lugar do ente público competente, não sendo o conflito de competência a via adequada para discutir a legitimidade ad causam, à luz da Lei 8.080/1990, ou a nulidade das decisões proferidas pelo juízo estadual ou federal – questões que devem ser analisadas no bojo da ação principal; e

c) a competência da Justiça Federal, nos termos do artigo 109, I, da Constituição Federal, é determinada por critério objetivo, em regra, em razão das pessoas que figuram no polo passivo da demanda (competência ratione personae), competindo ao juízo federal decidir sobre o interesse da União no processo (Súmula 150 do STJ), não cabendo ao juízo estadual, ao receber os autos que lhe  foram  restituídos  em  vista  da  exclusão  do  ente  federal  do  feito,  suscitar  conflito  de competência  (Súmula 254 do STJ).

Responsabilidade solidária em matéria de saúde

Em seu voto, o relator, ministro Gurgel de Faria, apresentou a evolução da jurisprudência sobre o direito à saúde no Brasil, desde a consagração da saúde como direito fundamental na Constituição Federal até as últimas decisões do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a matéria.

Ele lembrou que o STF, no julgamento do Tema 793, consolidou o entendimento da responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de saúde, mas inovou no cenário jurídico ao exigir que o magistrado direcione o cumprimento da obrigação segundo as normas de repartição de competências do SUS, e que determine à pessoa política legalmente responsável pelo financiamento da prestação sanitária ressarcir quem suportou tal ônus.

Segundo o ministro, essa mudança acarretou uma divergência de interpretação entre os juízos estaduais e federais, e fez renascer a discussão relacionada à natureza do litisconsórcio formado em tais casos – o que resultou em uma imensa quantidade de conflitos de competência a respeito da questão no STJ.

Formação de litisconsórcio entre os entes federados nas demandas de saúde

Gurgel de Faria ressaltou que os precedentes de caráter vinculante, tanto do STJ quanto do STF, reconhecem a relação de solidariedade entre municípios, estados e União quando se trata de demanda jurídica de saúde. Assim, acrescentou, na solidariedade passiva, o credor tem o direito de exigir de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum.

Para o relator, uma vez que tem prevalecido, nos precedentes formados até então no âmbito do STJ e até mesmo do STF, a possibilidade de o usuário do SUS escolher quaisquer das esferas de poder para obter o tratamento médico desejado – medicação ou insumos –, de forma isolada e indistintamente, não haveria a figura do litisconsórcio compulsório ou necessário.

O ministro destacou, portanto, que “até que se desfaçam as premissas acima citadas, e outras sejam estabelecidas em seu lugar, nas hipóteses de ações relativas à saúde intentadas com o objetivo de compelir o poder público ao cumprimento de obrigação de fazer consistente na dispensação de medicamentos não inseridos na lista do SUS, mas registrado na Anvisa, deverá prevalecer a competência do juízo de acordo com os entes contra os quais a parte autora elegeu demandar”.

Além disso, salientou haver “flagrante necessidade de que o STJ se posicione imediatamente a respeito do tema objeto do presente IAC, buscando evitar a proliferação de incidentes relacionados à competência para o julgamento das demandas de saúde e oferecer segurança jurídica enquanto o STF não decidir a matéria que se encontra afetada à solução por repercussão geral”.

CC 187.276.

Para a 4ª turma, se a retroatividade é benéfica para a coletividade, não prejudica terceiros e nem produz desequilíbrio, deve ser admitida.

Efeito “ex tunc”


26 de abril de 2023


Casal casou com separação total de bens e pediu alteração para comunhão universal.(Imagem: Freepik)

A alteração do regime de bens do casamento produz efeitos retroativos – portanto, tem eficácia “ex tunc”. O entendimento é da 4ª turma do STJ em decisão proferida nesta terça-feira, 25.

No caso em tela, um casal procurou a Justiça pleiteando a modificação do regime de bens da sociedade conjugal de separação total para comunhão universal. Para tanto, eles alegam que o regime não mais atende aos seus interesses, já que a relação se consolidou e ambos construíram o patrimônio juntos.

Nas instâncias de origem, entendeu-se que a alteração do regime de bens deferida possui eficácia a partir do trânsito em julgado, com efeitos “ex nunc”.

Desta decisão o casal recorreu ao STJ apontando violação do art. 1.667 do Código Civil, bem como divergência jurisprudencial, argumentando que a modificação do regime de bens deve produzir efeitos “ex tunc”.

Assim, pedem o provimento do recurso especial, determinando-se que o regime da comunhão universal de bens adotado pelas partes retroaja à data do casamento, importando na “comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas”.
O pleito foi atendido pelo relator Raul Araújo ao considerar que as partes estavam voluntariamente casadas no regime de separação e, valendo-se da autonomia da vontade, pediram a alteração após anos de convivência “certamente harmônica e feliz” com o objetivo de ampliar a união.

Destacou, ainda, que a alteração para comunhão universal dificilmente terá prejuízo a terceiros, já que o casamento se fortalece com o novo regime adotado e todos os bens passam a ensejar penhora por eventuais credores.

“Não me parece que se queira adotar o regime universal sem a afetação de todos os bens do casal”, pontuou.

Segundo o relator, se a retroatividade é benéfica para a coletividade, não prejudica terceiros e nem produz desequilíbrio, deve ser admitida.

“Não há porque o Estado-juiz criar embaraços a decisão do casal se eles reconhecem que foi de esforço comum que construíram o patrimônio.”

Assim sendo, deu provimento ao recurso especial. A decisão foi unânime.

Processo: REsp 1.671.422

Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/385402/stj-mudanca-no-regime-de-bens-do-casamento-tem-efeito-retroativo