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Decisão aponta risco de danos irreversíveis para a fauna e flora

27/05/2023

Rio de Janeiro (RJ) – Restinga de Maricá – STJ suspende obras e licenças ambientais de resort em restinga de Maricá. Decisão aponta risco de danos irreversíveis à fauna e à flora locais. Foto: Désirée Freire

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Herman Benjamin, emitiu liminar que suspende licenças ambientais e ordena a paralisação das obras de construção de um resort na Área de Proteção Ambiental (APA) de Maricá, região metropolitana do Rio de Janeiro.

A decisão atende ação civil movida pelo Ministério Público do estado contra o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), o Estado do Rio de Janeiro, o município de Maricá e a IDB Brasil (empresa responsável pelo projeto do resort). 

Na liminar, o magistrado justificou que as intervenções podem provocar danos ambientais irreversíveis na área de restinga. 

“Eventual lesão econômica pode ser reparada; a lesão ambiental, por sua vez, jamais poderá ser restaurada caso executados os trabalhos de construção civil, ante o impacto que provocam. Confrontados o interesse privado e o público, deve-se privilegiar este – que é irreparável – em detrimento daquele. Havendo o prosseguimento da construção, corre-se o risco de autorizar provimento apto a macular a fauna e a flora locais de maneira irreversível”, afirmou.

O projeto de empreendimento turístico-residencial Maraey engloba área de 840 hectares na Fazenda de São Bento da Lagoa, entre a Praia da Barra de Maricá e a Lagoa de Maricá. No local, está prevista instalação de hotéis, clubes, shoppings, campo de golfe, centro hípico, prédios e casas residenciais, restaurantes e escola. Os investimentos são estimados em R$ 11 bilhões.

A decisão do STJ foi comemorada por Désirée Guichard Freire, professora de Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que integra o Movimento Pró-Restinga de Maricá e o Fórum de Pesquisadores da Restinga de Maricá.

“Lamentavelmente, os empresários começaram as obras sabendo que estava próxima essa decisão judicial. Estamos felizes com essa medida de preservação do patrimônio. Ao mesmo tempo, vemos como algo provisório. A ação principal ainda não foi julgada, então ainda tem muita luta pela frente”, opinou.

Defesa

Em defesa da preservação da APA de Maricá, moções foram assinadas pelos conselhos universitários da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Federal Fluminense (UFF), além da Faculdade de Formação de Professores da UERJ. Eles se opõem ao empreendimento e destacam o valor ambiental e científico da APA.

“Inúmeros artigos científicos têm a restinga como tema no Brasil e no exterior há décadas. Foram investidos recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) desde os anos 1970. Aquela área é um verdadeiro campus das universidades do Rio de Janeiro e do Brasil. E a comunidade pesqueira foi registrada ali em 1797. Até hoje [os pescadores] estão vulneráveis do ponto de vista territorial. O estado não está exercendo as obrigações de proteger uma comunidade tradicional, um ambiente de alta biodiversidade e um patrimônio científico brasileiro”, disse a geógrafa Désirée Guichard Freire.

Histórico

O terreno conhecido como Fazenda de São Bento da Lagoa foi comprado em 2006 pelo grupo IDB Brasil. O primeiro projeto oficial do resort foi divulgado em 2007. Houve mobilização contrária de ambientalistas e da comunidade pesqueira de Zacarias. Eles defendiam que estavam em risco espécies endêmicas, aves migratórias, dunas, sítios históricos e arqueológicos, além da atividade pesqueira de duzentas famílias. Como resposta a esse movimento, foi realizada uma audiência pública. Na ocasião, a prefeitura de Maricá deixou claro o posicionamento favorável ao resort.

Ainda em 2007, um decreto estadual impôs um novo plano de manejo para a Área de Proteção Ambiental (APA) de Maricá, o que na prática ampliava a possibilidade de construir edificações no local e resolvia questões legais a favor do resort. Para tentar impedir o licenciamento e a construção do empreendimento, a Associação de Preservação Ambiental das Lagunas de Maricá (Apalma) entrou com uma ação civil pública em 2009, que teve posteriormente a adesão da Associação Comunitária de Cultura e Lazer dos Pescadores de Zacarias (Accaplez), representada pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro.

O IDB Brasil foi comprado em algumas etapas entre 2008 e 2010 pelo Grupo Cetya e pelo Grupo Abacus, que envolvem capitais espanhóis, brasileiros, estadunidenses e chineses. Sob essa configuração, um novo projeto de licenciamento ambiental para a construção do resort foi apresentado ao Instituto Estadual do Ambiente (Inea) em 2011.

Em 2013, a Apalma conseguiu na justiça uma liminar impedindo a construção de novos empreendimentos na APA. Mesmo com essa decisão desfavorável, o IDB Brasil conseguiu que o Inea, vinculado ao governo do estado do Rio, aprovasse o licenciamento prévio do empreendimento em 2015 e a licença de instalação em 2021. No mesmo ano, a pedra fundamental das obras foi lançada em evento com o apoio do governo do estado. O STJ decidiu, ainda em 2021, restabelecer a validade da liminar de 2013 que impedia as construções na restinga.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) também negou recursos da IDB Brasil e manteve o impedimento do projeto em abril de 2022. O Judiciário da Comarca de Maricá ordenou o cancelamento das licenças expedidas pelo Inea em agosto. Uma nova reviravolta aconteceu em setembro, quando o TJRJ derrubou a decisão da comarca e liberou o processo de licenciamento do empreendimento. Foi com base nisso que as obras foram iniciadas na APA de Maricá pela IDB Brasil em abril de 2023.

Outro lado

Em nota, a IDB Brasil disse que “recebeu com enorme tristeza a notícia sobre a paralisação cautelar do empreendimento, mas tem convicção de que o empreendimento é a solução para a conservação ambiental da Área de Proteção Ambiental de Maricá, para o desenvolvimento sustentável do município e do Estado do Rio e para aprimorar a capacidade turística do Brasil”. A empresa disse ainda que vai trabalhar para “reverter a decisão e concretizar a instalação de Maraey”.

*Texto alterado em 27 de maio, às 17h42, para inclusão de informações no 10º e no 12º parágrafos para melhor entendimento da matéria.

*Por Rafael de Carvalho Cardoso – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro

Fonte: Agência Brasil

Com base no artigo 475-B do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, em virtude da não apresentação reiterada, pela parte devedora, de documentos necessários ao cumprimento de sentença, devem ser considerados corretos os cálculos elaborados pelos credores nos autos. Essa presunção de veracidade, contudo, é relativa, admitindo prova em contrário na fase executiva.

26/05/2023

“Se é do devedor o ônus de provar, mediante impugnação, eventual erro ou excesso nos cálculos elaborados pelo credor, a fim de afastar a referida presunção, a sua inércia não pode impedir o cumprimento da sentença, devendo ser observado, ainda, o princípio geral do direito de que a ninguém é dado beneficiar-se da própria torpeza”, afirmou a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi.

De acordo com os autos, em primeiro grau, o juiz julgou extinto o cumprimento de sentença sem resolução do mérito, por entender que era ilíquida a sentença proferida na fase de conhecimento. Em segunda instância, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) anulou a decisão de primeiro grau e determinou a conversão dos autos em liquidação de sentença por arbitramento.

Para o TJMT, é inviável proceder diretamente ao cumprimento da sentença, quando a apuração do valor do crédito exige cálculo complexo, sendo necessária a sua prévia liquidação por arbitramento, a fim de obter o valor devido em razão do direito reconhecido na decisão. No entanto, é possível a conversão do feito em liquidação de sentença, em vez de extinguir o processo, prematuramente, sem resolução de mérito.

No recurso especial, os credores alegaram que, antes de instaurarem a fase de cumprimento de sentença, pediram ao juiz que o banco fosse intimado para exibir os documentos necessários, mas a instituição não os apresentou. Por essa razão é que, segundo eles, foi iniciada a fase do cumprimento de sentença e, mesmo assim, o banco poderia, na fase executória, contrapor os cálculos apresentados pelos credores no cumprimento – o que não aconteceu.

Artigo 475-B do CPC/1973 autoriza presunção de veracidade dos cálculos

Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi explicou que, nos termos do artigo 475-B, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil de 1973, no cumprimento de sentença, quando a elaboração do cálculo depender de dados em poder do devedor, o juiz, a requerimento do credor, pode requisitá-los, fixando prazo de até 30 dias para o cumprimento da diligência.

Se, de forma injustificada, os dados não forem apresentados pelo devedor, o parágrafo 2º do mesmo artigo prevê que devem ser reputados como corretos os cálculos apresentados pelo credor.

“A norma, assim, objetiva impedir que, quando o ônus de trazer os documentos necessários para o cálculo é do devedor, o silêncio deste impeça o cumprimento da decisão judicial, frustrando a satisfação do crédito perseguido e a efetiva entrega da prestação jurisdicional”, afirmou.

Banco se negou a apresentar os documentos por, pelo menos, 14 anos

No caso dos autos, Nancy Andrighi apontou que “a determinação do valor da condenação depende apenas de cálculo aritmético, uma vez que é necessário, tão somente (I) apurar o valor pago nos termos das cédulas de crédito; (II) calcular o valor que realmente seria devido, após os critérios fixados pela sentença; e (III) subtrair o primeiro pelo segundo, para apurar eventual saldo a ser restituído ao exequente”.

A ministra ressaltou que, diferentemente da conclusão do TJMT, o fato de ser necessária a apresentação de documentos pelo devedor não torna a sentença ilíquida.  

“Isso porque, conforme o art. 475-B do CPC/1973, ainda que dependa da apresentação de documentos para a elaboração do cálculo, é possível iniciar desde logo com o cumprimento de sentença, podendo o juízo, a requerimento, requisitar os dados em poder do devedor”, completou.

Além disso, Nancy Andrighi recordou que, no processo, o perito judicial só não conseguiu realizar os cálculos solicitados pelo juiz por culpa exclusiva do banco devedor, que não apresentou os documentos necessários para a execução, não podendo tal conduta impedir a satisfação do crédito dos recorrentes.

Para a ministra, é, ainda, nitidamente contraditório o comportamento do banco de sonegar, por pelo menos 14 anos, os documentos exigidos por ordem judicial e, depois, impugnar o cumprimento de sentença sob a alegação de ausência das provas necessárias para confirmar o cálculo elaborado pelo credor.

“Trata-se de comportamento que, de igual modo, é repudiado pelos princípios gerais do direito, na figura da vedação ao comportamento contraditório (nemo potest venire contra factum proprium)”, concluiu a relatora ao determinar o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau, reconhecendo a presunção de veracidade dos cálculos apresentados pelos credores.

REsp 1.993.202.

Fonte: STJ

Moura Ribeiro entendeu que o acórdão recorrido encontra-se em desacordo com a orientação recentemente firmada pela Corte Especial.

26 de maio de 2023


Ministro Moura Ribeiro, do STJ, decidiu que não é possível penhorar parte da aposentadoria de devedor para quitar débitos de honorários advocatícios sucumbenciais.

Trata-se de agravo em recurso especial interposto pela parte contra decisão que inadmitiu seu apelo. Ele sustenta que não é possível a penhora de parte da sua aposentadoria em razão de débitos de honorários advocatícios sucumbenciais com base na exceção do § 2º do art. 833 do CPC.

O relator acolheu o pedido:

“O acórdão recorrido encontra-se em desacordo com a orientação recentemente firmada pela Corte Especial desta egrégia Corte Superior, a qual já se manifestou pelo descabimento de mitigação da impenhorabilidade de remuneração do devedor quando se tratar de crédito lastreado em honorários advocatícios Nessas condições, CONHEÇO do agravo para DAR PROVIMENTO ao recurso especial.”


O advogado Richard Martins Silva atua no caso.

Processo: AREsp 2.242.472

Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/387185/stj-nao-permite-penhora-de-aposentadoria-para-quitar-honorarios

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), shopping center e empresa administradora de estacionamento são responsáveis por indenizar consumidor vítima de roubo à mão armada ocorrido na cancela para ingresso no estacionamento. Segundo o colegiado, ao disponibilizar obstáculo físico para controlar a entrada de terceiros no estacionamento, os estabelecimentos provocam uma sensação de segurança, ainda que a cancela não tenha sido ultrapassada no momento do ato criminoso.

25/05/2023

Após ter seu relógio roubado enquanto aguardava para ingressar em estacionamento de um shopping center, um consumidor ajuizou ação para que o shopping e a administradora do estacionamento fizessem a reparação de danos materiais e morais por ele sofridos em razão do assalto. As instâncias ordinárias condenaram os réus ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 33.750 e por danos morais arbitrados em R$ 10 mil.

No recurso ao STJ, o shopping center e a administradora do estacionamento alegaram que não tinham o dever de indenizar o consumidor, pois, no momento do roubo, o veículo ainda se encontrava na via pública, responsabilidade do Estado. Sustentaram, também, que o roubo à mão armada seria um evento fortuito que não possui relação com a conduta dos recorrentes, pois decorre de um fato estranho à vontade deles, fora de suas dependências e cujo efeito não era possível evitar.

CDC incide nos momentos que antecedem e sucedem a prestação de serviço

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, observou que a proteção do Código de Defesa do Consumidor incide não somente durante a prestação do serviço em si, mas também nos momentos que o antecedem e o sucedem, desde que estejam vinculados à sua execução.

Nesse sentido, a ministra destacou que, na hipótese de se exigir do consumidor determinada conduta para que usufrua do serviço prestado pela fornecedora, colocando-o em vulnerabilidade não só jurídica, mas sobretudo fática, ainda que momentaneamente, se houver falha na prestação do serviço, o fornecedor será obrigado a indenizá-lo, sob pena de violar o comando da boa-fé objetiva e o princípio da proteção contratual do consumidor.

“Quando o consumidor, com a finalidade de ingressar no estacionamento de shopping center, tem de reduzir a velocidade ou até mesmo parar seu veículo e se submeter à cancela – barreira física imposta pelo fornecedor e em seu benefício – incide a proteção consumerista, ainda que o consumidor não tenha ultrapassado referido obstáculo e mesmo que este esteja localizado na via pública”, declarou.

Estacionamento gera legítima expectativa de segurança ao cliente

Nancy Andrighi ressaltou que a jurisprudência do STJ entende que, para ser considerado fortuito externo, a causa do evento danoso não pode apresentar conexão com a atividade desempenhada pelos fornecedores, ou seja, tem de estar fora dos riscos assumidos pela atividade e, portanto, da esfera de proteção e atuação dos fornecedores.

A relatora apontou que a jurisprudência do STJ, conferindo interpretação extensiva à Súmula 130, entende que estabelecimentos comerciais, tais como shoppings centers e hipermercados, ao oferecerem estacionamento, ainda que gratuito, respondem pelos assaltos à mão armada praticados contra os clientes quando, apesar de o estacionamento não ser inerente à natureza do serviço prestado, gera legítima expectativa de segurança ao cliente em troca dos benefícios financeiros indiretos decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores.

“Não cabe dúvida de que a empresa que agrega ao seu negócio um serviço visando à comodidade e à segurança do cliente deve responder por eventuais defeitos ou deficiências na sua prestação. Afinal, serviços dessa natureza não têm outro objetivo senão atrair um número maior de consumidores ao estabelecimento, incrementando o movimento e, por via de consequência, o lucro, devendo o fornecedor, portanto, suportar os ônus respectivos”, concluiu a ministra ao negar provimento ao recurso especial.

REsp 2.031.816.

Fonte: STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) e afastou condenação imposta à Bovespa para indenizar uma investidora pela venda irregular de ações mediante procuração falsa.

24/05/2023

O documento teria sido apresentado à corretora, que, por sua vez, ordenou a venda das ações. Para o colegiado, não há relação de consumo entre a Bolsa de Valores e a investidora para justificar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao caso.

“A entidade de compensação e liquidação presta fundamental serviço no âmbito do mercado de capitais, mas não os fornece no mercado de consumo, tampouco ao público em geral, mantendo relação exclusivamente com as distribuidoras e corretoras de valores mobiliários – instituições previamente autorizadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para exercer tais atividades”, explicou a relatora, ministra Nancy Andrighi.

Ações vendidas após entrega de uma procuração falsa

Na origem, a investidora ajuizou uma ação de indenização após descobrir que suas 20 mil ações da Telemar foram vendidas em 1993 com o uso de uma procuração falsa apresentada à corretora. A sentença foi favorável à investidora, condenando a Bovespa (na época dos fatos Câmara de Liquidação e Custódia – CLC) ao pagamento das ações e de danos morais. Na decisão, o Juízo de primeiro grau aplicou o CDC.

O TJRJ manteve a condenação, reconhecendo a responsabilidade objetiva da Bovespa por entender que a relação jurídica entre a titular das ações e a ré teria sido regida pelo CDC.

No recurso especial, a Bovespa destacou, entre outros pontos, que não se enquadra no conceito de fornecedora de serviços no mercado de consumo, pois presta serviços às corretoras de valores que negociam títulos no mercado financeiro.

Não há relação de consumo entre investidores e bolsa de valores

Ao analisar o caso, a ministra Nancy Andrighi destacou que não há relação de consumo entre os investidores e a recorrente, mas apenas uma relação interempresarial entre a Bovespa e as corretoras. Segundo apontou, a relação jurídica entre a recorrente e o investidor não tem natureza consumerista e é regulamentada por normas especiais, razão pela qual não incide o CDC.

A relatora lembrou que uma das condições para o investidor negociar títulos e ações na bolsa de valores é a contratação de uma corretora, conforme disposto no artigo 15, inciso III e VI da Lei 6.385/1976 e artigo 2º do Regulamento Anexo à Resolução CMN 1.655/1989. Nessa linha de raciocínio, cabe às corretoras fazerem a negociação direta na Bovespa.

“Diante da não incidência do CDC, a responsabilidade civil da recorrente deve ser analisada à luz dos direitos e deveres fixados nas normas específicas”, destacou.

Corretoras possuem o dever de conferir documentação dos investidores

Nancy Andrighi afirmou que, nessa ordem de negócios, de acordo com as Resoluções CMN 1.655/1989 e 1.656/1989, o dever de verificar a legitimidade da procuração do titular das ações é da sociedade corretora e não da Bovespa, a quem cabe apenas assegurar o cumprimento da ordem dada por aquela.

“A entidade de compensação e liquidação não pode ser responsabilizada pelos prejuízos decorrentes da negociação de ações na bolsa de valores, mediante uso de procuração falsa em nome do titular apresentada à corretora de valores”, enfatizou a relatora.

A ministra ressalvou, contudo, ser possível “que, em determinada situação concreta, fique comprovada alguma atitude culposa efetivamente praticada pela CLC [Bovespa], no exercício de suas atividades, a ensejar a condenação pelos danos causados, o que deve ser analisado em cada hipótese, como matéria de mérito”.

REsp 1.646.261.

Fonte: STJ

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu afetar um recurso especial de relatoria do ministro Ribeiro Dantas, que corre em segredo de justiça, para definir, no rito dos repetitivos, se o gênero feminino é condição única e suficiente para atrair a aplicabilidade da Lei Maria da Penha e afastar a incidência do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nos casos de violência doméstica e familiar praticada contra criança ou adolescente.

23/05/2023

A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.186 na base de dados do STJ, está assim ementada: Se o gênero sexual feminino, independentemente de a vítima ser criança ou adolescente, é condição única para atrair a aplicabilidade da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) nos casos de violência doméstica e familiar praticada contra a mulher, afastando, automaticamente, a incidência da Lei 8.069/1990 (ECA).

O colegiado decidiu não suspender a tramitação dos processos que discutem a mesma questão, pois, além de já existir orientação jurisprudencial das turmas componentes da Terceira Seção, eventual demora no julgamento poderia causar prejuízos aos jurisdicionados.

Discussão sobre competência para julgar crimes sexuais contra menores de idade

Segundo o relator, o caráter repetitivo da matéria foi verificado a partir de pesquisa à base de jurisprudência STJ, que recuperou, pelo menos, sete acórdãos e mais de 400 decisões monocráticas tratando da mesma questão.

No recurso especial representativo da controvérsia, o Ministério Público do Pará aponta que o crime de estupro de vulnerável não configura hipótese de violência doméstica e familiar contra a mulher nos termos da Lei Maria da Penha, uma vez que a satisfação da lascívia, por um adulto, em detrimento de uma criança, não perpassa a submissão do gênero, tanto que o crime é praticado contra meninos e meninas, sendo o gênero da vítima irrelevante para a caracterização do delito.

Para o MP/PA, na fixação da competência para julgamento deve prevalecer a vulnerabilidade reconhecida na Constituição Federal e no ECA, independentemente do gênero da vítima menor de idade, a fim de conferir tratamento igualitário para crianças e adolescentes, independentemente do gênero, que venham a ser submetidos à prática delituosa que atente à sua dignidade sexual.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil de 2015 regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, o tribunal facilita a solução de demandas que se repetem na Justiça brasileira.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

O colegiado determinou a suspensão da tramitação de todos os processos que versem sobre a mesma matéria e tramitem no território nacional, nos termos do artigo 1.037, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC).

23 de Maio de 2023
Foto: Marcos Santos – USP Imagens

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou os Recursos Especiais 2.056.866 e 1.938.265, de relatoria do ministro Benedito Gonçalves, para julgamento sob o rito dos repetitivos.

A questão representativa da controvérsia, cadastrada como Tema 1.188 na base de dados do STJ, é “definir se a sentença trabalhista, assim como a anotação na CTPS e demais documentos dela decorrentes, constitui início de prova material para fins de reconhecimento de tempo de serviço”.

O colegiado determinou a suspensão da tramitação de todos os processos que versem sobre a mesma matéria e tramitem no território nacional, nos termos do artigo 1.037, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC).

Segundo o relator, o tema discutido é apresentado reiteradamente no STJ e representa questão de relevância do ponto de vista do direito processual administrativo. Benedito Gonçalves destacou pesquisa feita pela Comissão Gestora de Precedentes e Ações Coletivas do STJ, mapeando 126 acórdãos e 3.942 decisões monocráticas sobre o assunto.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

Código de Processo Civil de 2015 regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Fonte: STJ

Em um país cujos habitantes possuem mais de 139 milhões de animais de estimação (os dados da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação colocam o Brasil como a terceira nação do mundo nesse quesito), é difícil pensar que alguém brinque com o seu bem semovente ou o leve para passear. Foi essa caracterização de simples coisa, porém, que prevaleceu durante as últimas décadas no ordenamento jurídico brasileiro: os bichos seriam apenas um item do patrimônio de seu titular.

22/05/2023

Com a evolução do entendimento sobre a complexidade dos animais e uma nova visão das relações entre eles e as pessoas, também se desenvolveu o debate sobre qual o enquadramento jurídico adequado para os pets.

No mundo jurídico, surgem termos como “família multiespécie”, e são discutidos direitos intrínsecos aos animais não racionais; no mundo cotidiano, a histórica relação de dependência e sobrevivência que forjou os primeiros contatos entre humanos e bichos é alterada para algo muito mais íntimo e peculiar: por todos os lados, circulam os “pais de pet” levando seus “filhos” na coleira em roupas coloridas, pessoas se reúnem para comemorar o aniversário dos bichinhos, e se inauguram hotéis exclusivos para eles, com direito a banho de piscina e atividades lúdicas. 

Para além das discussões já existentes no Congresso Nacional – há projetos de lei, por exemplo, que pretendem admitir os animais como seres sencientes, passíveis de emoções e sentimentos e, como tal, sujeitos de direitos –, o Poder Judiciário tem dedicado maior atenção à caracterização dos animais de estimação. Esses debates chegaram ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que também evoluiu ao analisar controvérsias sobre bichos.

Definição como simples coisas não resolve mais as controvérsias sobre os pets

A doutrina aponta que a natureza jurídica dos animais está prevista no artigo 82 do Código Civil, segundo o qual são considerados bens móveis aqueles “suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social”. Nesse contexto, os bichos de estimação não teriam direitos, de forma que suas garantias estariam relacionadas aos direitos de seus donos, e as discussões sobre eles estariam mais próximas de institutos como a posse e a propriedade.  

Em dois precedentes recentes, os colegiados do STJ não alteraram essa caracterização legal, mas lançaram novas luzes sobre o tema ao apontar que a definição como simples coisa não é mais suficiente para tratar os litígios que envolvem animais de estimação.

Nem coisas, nem pessoas: animais de estimação seriam um “terceiro gênero”

No primeiro caso (processo sob segredo de justiça), em 2018, a Quarta Turma analisou a questão dos pets no bojo de uma controvérsia sobre a possibilidade de reconhecimento do direito de visitas após a dissolução de união estável. Em segunda instância, aplicando de forma analógica as regras legais para a guarda de filhos menores, o tribunal estadual entendeu ser possível a delimitação do direito de visitas ao animal de estimação que ficou com um dos ex-companheiros após a separação.  

O relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, lembrou que o Código Civil enquadrou os animais na categoria das coisas – portanto, objetos de relações jurídicas, conforme previsto não apenas no artigo 82, mas também nos artigos 4459361.4441.445 e 1.446.

Apesar dessa condição legal, o ministro considerou que “não se mostra suficiente o regramento jurídico dos bens para resolver, satisfatoriamente, tal disputa familiar nos tempos atuais, como se se tratasse de simples discussão atinente à posse e à propriedade”.

Para Salomão, não se trata de humanizar o animal, tampouco de equiparar a posse dos bichos com a guarda de filhos, mas de considerar que o direito de propriedade sobre eles não pode ser exercido de maneira idêntica àquele relativo às coisas inanimadas ou que não são dotadas de sensibilidade.

De acordo com o relator, é essa natureza especial que impõe uma série de limitações aos direitos de propriedade que recaem sobre os animais.

“Penso que a resolução deve, realmente, depender da análise do caso concreto, mas será resguardada a ideia de que não se está diante de uma ‘coisa inanimada’, sem lhe estender, contudo, a condição de sujeito de direito. Reconhece-se, assim, um terceiro gênero, em que sempre deverá ser analisada a situação contida nos autos” – afirmou o ministro ao manter o julgamento de segundo grau, enfatizando a necessidade de que tal análise seja voltada para a proteção do ser humano e de seu vínculo afetivo com o animal.

Animais são seres dotados de sensibilidade

Em julgamento realizado no ano passado (REsp 1.944.228), a Terceira Turma abordou o tema ao analisar controvérsia sobre a divisão de despesas com os animais de estimação após o fim do relacionamento de um casal. Os gastos diziam respeito a seis cachorros, todos adquiridos durante a união estável. De acordo com os autos, após a separação, o ex-companheiro teria deixado de contribuir para a manutenção dos bichos.

Em segundo grau, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), considerando não existir regramento jurídico específico para o caso, adotou os princípios gerais do direito para obrigar o ex-companheiro a custear, em conjunto com a ex-companheira, as despesas geradas pelos pets, como forma de evitar seu enriquecimento sem causa, nos termos do artigo 884 do Código Civil.

Ainda para o TJSP, uma vez estabelecida a relação de afeto entre as pessoas e os animais, não seria possível admitir, do ponto de vista ético, o abandono como causa lícita de extinção da propriedade e, por consequência, da responsabilidade pela manutenção.

No voto que foi acompanhado pela maioria do colegiado, o ministro Marco Aurélio Bellizze considerou ser necessário compatibilizar as regras sobre o regime de bens da união estável com a natureza particular dos animais de estimação, “concebidos que são como seres dotados de sensibilidade”.

Para o ministro, com base na atual legislação sobre o tema, não seria possível falar no custeio das despesas com os animais no contexto do instituto da pensão alimentícia – típico das relações de filiação e, portanto, regido pelo direito de família.

Segundo Bellizze, as despesas com o custeio da subsistência dos animais são obrigações inerentes à condição de dono, ainda mais relevantes no caso dos bichos de estimação, que dependem totalmente dos cuidados de seus donos. Essa característica, apontou, torna fundamental analisar como as partes definiram o destino dos animais ao término da relação.

“Se, em virtude do fim da união, as partes, ainda que verbalmente ou até implicitamente, convencionarem, de comum acordo, que o animal de estimação ficará com um deles, este passará a ser seu único dono, que terá o bônus – e a alegria, digo eu – de desfrutar de sua companhia, arcando, por outro lado, sozinho, com as correlatas despesas”, apontou.

Nesse cenário, para o ministro, não seria possível ao dono reivindicar do ex-companheiro, que não é mais responsável pelo pet, o custeio de suas despesas.

No caso dos autos, Bellizze entendeu que, como a ex-companheira atribuiu a si todos os direitos em relação aos animais, era ela quem deveria, desde o término da relação, custear as respectivas despesas – ao mesmo tempo em que, “merecidamente, usufrui da companhia dos seus cães de estimação e deles recebe afeto, em reciprocidade”.

Projetos no Congresso retiram animais da categoria de objetos e garantem direitos

Enquanto a Justiça segue analisando controvérsias sobre os pets, o Poder Legislativo pode alterar, nos próximos anos, a caracterização desses animais no ordenamento jurídico.

Em 2019, o Senado Federal aprovou o PLC 27/2018, segundo o qual os animais deixam de ser considerados objetos e passam a ter natureza jurídica sui generis, como sujeitos de direitos despersonificados. Em consulta pública feita pelo Senado, a proposição recebeu aprovação de mais de 24 mil pessoas, contra apenas 731 votos negativos.

O projeto reconhece nos animais a condição de seres sencientes – ou seja, que têm sentimentos – e altera o Código Civil para que não sejam mais considerados bens semoventes. Como a proposta teve início na Câmara dos Deputados e foi aprovada com alterações no Senado, o projeto retornou à primeira casa para nova análise (PL 6.054/2019).

Neste ano, a Câmara dos Deputados recebeu o PL 179/2023, que busca regulamentar a família multiespécie – definida como a comunidade formada por seres humanos e animais de estimação – e prevê uma série de direitos para os pets, inclusive pensão alimentícia e participação no testamento do tutor.

De acordo com o projeto, os animais devem ser considerados filhos por afetividade e ficam sujeitos ao poder familiar. Caso o texto seja aprovado, os pets também passarão a ter acesso à Justiça para a defesa de seus interesses ou a reparação de danos materiais e existenciais, hipóteses em que caberá ao tutor – ou, na falta dele, à Defensoria Pública e ao Ministério Público – representar o bicho em juízo. A proposta ainda aguarda distribuição na Câmara.

  • Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1944228
  • Fonte: STJ

15/05/2023

A Bíblia já questionava: pode uma árvore má produzir bons frutos? A resposta bíblica (Mateus 7:17-20) é negativa, assim como também é a do direito penal, que tomou a imagem emprestada ao definir que as provas derivadas de uma prova ilícita, obtida com violação das regras legais ou constitucionais, são igualmente ilícitas – e, portanto, imprestáveis para o processo.

Embora a teoria dos frutos da árvore envenenada seja amplamente aplicada pela Justiça brasileira – e também pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) –, ela encontra limites em outras duas teorias.

Uma é a da descoberta inevitável, segundo a qual é possível a utilização de uma prova ilícita por derivação, caso fique demonstrado que ela seria, de qualquer modo, descoberta por meios lícitos no curso normal da investigação. A outra é a da fonte independente, para a qual a prova derivada de uma ilícita não deve ser descartada se tiver também uma origem lícita, sem relação com a primeira.

Interferência policial na comunicação telefônica do suspeito

Em 2017, a Quinta Turma manteve acórdão do tribunal de origem que absolveu um réu acusado de tráfico de drogas, ao considerar nula a prova obtida a partir da escuta não autorizada de uma ligação atendida por ele no viva-voz do seu celular.

Conforme os autos, o telefone tocou durante a abordagem policial, e o suspeito foi obrigado a atender no viva-voz. Na conversa ouvida pelos agentes, a mãe lhe pediu que voltasse para casa, para retirar um certo “material” que ali estava guardado. Desconfiados da situação, os policiais foram à residência e arrecadaram as provas que serviram para fundamentar a condenação pelo juízo de primeiro grau.

O tribunal de segunda instância proveu o recurso da defesa por entender que houve quebra ilegal do sigilo de comunicação telefônica e que também não foi lícita a atitude dos agentes de levar o suspeito até a sua casa a fim de que ele lhes desse acesso ao interior do imóvel. 

No STJ, o relator do REsp 1.630.097, ministro Joel Ilan Paciornik, lembrou que as provas obtidas de forma ilícita são inadmissíveis e que “qualquer tipo de prova contra o réu que dependa dele mesmo só vale se o ato for feito de forma voluntária e consciente”.

Nessa mesma linha, em 2022, a Sexta Turma anulou condenação baseada em provas obtidas por policial que atendeu o celular do investigado e se passou por ele para induzir o corréu em erro e obter informação que levou à sua prisão em flagrante.

Desconfiados de que um motorista seria batedor do tráfico, os policiais rodoviários o mandaram parar, mas não acharam nada ilícito com ele ou em seu veículo. Mesmo assim, quando o telefone do motorista tocou, um dos policiais atendeu e, passando-se por ele, disse ao interlocutor que o caminho estava livre – o que resultou na apreensão de drogas e na prisão dos demais envolvidos.

O tribunal de origem entendeu que, além de o policial ter agido para atender o interesse público em detrimento dos direitos dos envolvidos, seria hipótese de aplicação da teoria da descoberta inevitável, pois o curso natural dos acontecimentos levaria fatalmente à apreensão das drogas.

Todavia, esse não foi o entendimento da Sexta Turma do STJ ao analisar o habeas corpus impetrado pela defesa do motorista abordado inicialmente. Para o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, não havia nada que justificasse a mitigação da inviolabilidade da comunicação telefônica, uma vez que o motorista nem sequer estava preso em flagrante no momento em que teve seu celular atendido pelo policial.

O ministro, ao observar a inaplicabilidade da teoria da descoberta inevitável, explicou que é necessária uma interpretação restritiva desse instituto, pois “não basta que se faça um raciocínio vago e abstrato de mera possibilidade de descoberta da prova por outro meio”.

Segundo Schietti, a teoria seria cabível se ficasse demonstrado que “os fatos naturalmente chegariam ao mesmo desfecho, a despeito da ilegalidade na ação policial”.

Exame de telefone sem autorização judicial foi irrelevante para a apuração do crime

Em 2019, a Quinta Turma não concedeu o habeas corpus requerido pela defesa de um homem acusado de tráfico de drogas, por considerar que, a despeito da alegação de ilegalidade da prova obtida diretamente de um celular apreendido pela polícia, havia outras provas para demonstrar a prática criminosa.

De acordo com o processo, no momento em que os policiais abordaram o carro em uma rodovia, um de seus ocupantes jogou duas sacolas pela janela, nas quais foi encontrada cocaína. Um deles admitiu ter comprado a droga e revelou o apelido do vendedor (o paciente no habeas corpus), o que permitiu que o policial o identificasse ao examinar o telefone. Posteriormente, a autoridade policial requereu o afastamento do sigilo de dados dos aparelhos apreendidos.

Após a condenação por tráfico de drogas e associação para o tráfico, a defesa sustentou que o acesso sem prévia autorização judicial ao conteúdo do celular do corréu invalidaria todas as provas decorrentes.

O relator do HC 521.228, ministro Jorge Mussi (aposentado), destacou a informação de que o dono do celular teria permitido à polícia acessá-lo no momento da abordagem. “Ainda que assim não fosse, os corréus confessaram informalmente a prática criminosa, afirmando que um deles adquiriu os entorpecentes do paciente, o que demonstra que as mensagens supostamente devassadas não foram determinantes para a apuração dos ilícitos”, afirmou o relator.

Para Jorge Mussi, “a apreensão dos celulares dos corréus levou a autoridade policial a requerer judicialmente o afastamento do sigilo dos dados neles contidos, o que foi deferido – pedido típico e comum em casos análogos, e que demonstra que se está diante de provas autônomas, nos termos dos parágrafos 1º e 2º do artigo 157 do Código de Processo Penal“.

Invasão ilegal de domicílio contaminou todas as outras provas

Ao reconhecer a nulidade das provas produzidas, a Quinta Turma confirmou decisão monocrática no HC 783.183 e absolveu um cidadão que havia sido condenado pelos crimes de posse irregular de arma de fogo e corrupção de menor.

Uma denúncia anônima – de que o indivíduo teria uma arma – fez com que policiais se dirigissem ao local indicado. Supostamente autorizados pelo morador, os agentes entraram na residência e encontraram dois carregadores de pistola e oito munições. Questionado, o morador teria confessado que a arma era sua, mas estava com um menor, em outro endereço.

O relator do habeas corpus, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, declarou nulas todas as provas decorrentes da ação policial, pois o alegado consentimento do morador para ingresso dos agentes não foi comprovado, e não havia mandado judicial nem indícios concretos de ocorrência de crime permanente no imóvel.

Ao recorrer à Quinta Turma, o Ministério Público (MP) sustentou que, como a localização da arma foi revelada pelo acusado, não se poderia dizer que a sua apreensão na casa do adolescente tenha sido decorrência direta da invasão ilícita do domicílio. Para o MP, deveria incidir no caso a teoria da descoberta inevitável, que rompe o nexo de causalidade e afasta a ilicitude, por derivação, da prova encontrada.

No entanto, Reynaldo Soares da Fonseca afirmou que a teoria da descoberta inevitável era inaplicável no caso, já que não havia como afirmar que a arma seria encontrada de outra forma que não mediante a informação do acusado, prestada em decorrência de uma abordagem ilegal.

Acesso ilegal a dados de celular não invalida condenação baseada em prova independente

Com base na teoria da descoberta inevitável, a Quinta Turma manteve a decisão do relator, desembargador convocado Jesuíno Rissato, que não conheceu do HC 722.827, no qual a defesa de três homens condenados por tráfico de drogas pretendia anular as provas do processo.

O tribunal de origem considerou lícitas as provas obtidas nos celulares dos acusados após terem sido presos. Segundo a corte, naquele momento “já existiam elementos suficientes para capitulação das condutas criminosas que lhes foram imputadas, de modo que não se pode confundir referida situação com os casos em que a flagrância somente é alcançada com a adoção da citada medida [exame do celular]”.

No pedido de habeas corpus, a defesa sustentou que, “ainda que a condenação dos pacientes não tenha se centrado no conteúdo das mensagens de WhatsApp, todos os elementos de convicção derivaram do acesso ilegal da polícia aos aparelhos celulares”, razão pela qual tais provas seriam nulas.

Ao analisar o caso, Jesuíno Rissato afirmou – com base nas conclusões da segunda instância – que, além de as informações no celular terem sido coletadas após a prisão dos envolvidos, existiam outros elementos de prova suficientes para demonstrar a autoria e a materialidade delitiva.

O relator reconheceu que a jurisprudência do STJ considera ilegal a prova obtida sem autorização judicial diretamente do celular – mensagens de texto, aplicativos de conversa, correio eletrônico, fotografias –, porque isso viola os direitos fundamentais à intimidade e à privacidade. No entanto, ele ressaltou que há firme jurisprudência da corte no sentido de excluir as provas derivadas das ilícitas que se enquadrem na teoria da descoberta inevitável.

“Mesmo que decotando as provas relativas aos dados armazenados no telefone, há elementos probatórios suficientes e independentes para manter a condenação”, disse o magistrado, apontando que, conforme consta do processo, “havia investigação em curso, com campana, tendo os aparelhos celulares sido apreendidos já quando da prisão em flagrante, em razão de todo um desfecho investigatório”.

Reconhecimento espontâneo anterior à prisão ilegal não invalida a condenação

A Sexta Turma manteve acórdão do tribunal de origem que afastou a aplicação da teoria dos frutos da árvore envenenada por entender que, apesar de ilegal a prisão dos envolvidos em um roubo de carga, existiam fontes independentes de prova capazes de subsidiar a sua condenação.

Na origem, um entregador dos Correios, ao se dirigir à delegacia para comunicar mais um roubo que havia sofrido, acompanhou os policiais na viatura, na tentativa de identificar os autores do crime. Antes mesmo da abordagem e da condução dos suspeitos para a delegacia, a vítima já os havia reconhecido nas redondezas da área em que os roubos costumavam acontecer.

Apesar de o juiz ter anulado todas as provas por entender que elas foram contaminadas pela prisão e pelo reconhecimento dos acusados – considerados ilegais –, o tribunal local afastou a incidência da teoria dos frutos da árvore envenenada, sob o fundamento de que havia outros elementos aptos a subsidiar a condenação dos acusados, de acordo com a teoria da fonte independente. 

No STJ, o relator do agravo regimental no REsp 1.573.910, ministro Nefi Cordeiro (aposentado), destacou que a ordem dos fatos é essencial na análise da viabilidade da ação penal, que se embasou em elemento idôneo e independente dos atos ilegais praticados posteriormente, qual seja, o reconhecimento espontâneo feito pela vítima antes da prisão dos envolvidos.

O ministro apontou que a conduta ilegal dos agentes não influenciou no reconhecimento dos réus pela vítima; ao contrário, foi o apontamento feito por ela que desencadeou a abordagem e a posterior condução dos envolvidos para a delegacia.

Prisão foi independente da obtenção ilegal de conteúdo do celular

No HC 423.794, a Quinta Turma entendeu que, mesmo após o acesso, sem autorização judicial, aos dados do celular de um preso em flagrante por tráfico de drogas, tal fato não anula as demais provas, por terem fontes independentes daquela considerada ilícita.

No caso dos autos, uma denúncia anônima subsidiou operação policial que resultou na abordagem e na prisão de dois homens que trafegavam por uma rodovia em Santa Catarina, portando, cada um, grande quantidade de entorpecentes.

A defesa alegou que a condenação foi embasada em prova ilícita, decorrente da violação do sigilo de comunicações e dados dos aparelhos celulares apreendidos com os acusados.

Todavia, tanto o juízo de primeiro grau quanto o tribunal local entenderam pela condenação dos réus, destacando que a operação montada pela Polícia Militar se baseou em denúncia anônima com informações suficientes para levar aos criminosos. Quanto às mensagens do celular que foram acessadas pelos policiais, o juízo apontou que não existe qualquer nexo causal entre elas e as demais provas.

O relator no STJ, ministro Jorge Mussi, destacou que, apesar de a Lei 9.296/1996 dispor apenas das comunicações telefônicas e de sistemas de informática e telemática – o que não inclui os dados e registros já contidos nos celulares –, tal fato “não permite que a polícia devasse a intimidade dos investigados a pretexto de obter provas do crime e de sua autoria, o que só é admitido mediante prévia autorização judicial”.

Em contrapartida, o ministro ressaltou que há no processo provas suficientes para demonstrar a prática do crime, sendo irrelevante o acesso às mensagens contidas nos aparelhos. Segundo concluiu, “tanto o flagrante quanto a posterior denúncia e a sentença condenatória não se embasaram no suposto acesso ilegal dos policiais aos dados contidos no celular”.

Prova nula não contamina outras produzidas de forma independente em PAD

A Terceira Seção, no agravo regimental na Rcl 42.292, confirmou decisão monocrática proferida pelo desembargador convocado Olindo Menezes, que suspendeu o uso em Processo Administrativo Disciplinar (PAD) de provas anuladas na ação penal pelo STJ.

Na origem, a polícia instaurou investigação por suposta organização criminosa responsável por fraudes em órgão federais. As provas produzidas foram compartilhadas e juntadas ao procedimento administrativo instaurado para apuração do envolvimento de um servidor. A Sexta Turma, porém, determinou a exclusão de elementos probatórios declarados ilegais, entre eles as mensagens de e-mail de um investigado.

A Advocacia-Geral da União (AGU) manteve, na apuração administrativa, as informações do e-mail funcional, sob o entendimento de que essa ferramenta é disponibilizada aos servidores para atender às suas atividades profissionais.

Olindo Menezes explicou que a Sexta Turma, ao decidir pela nulidade das provas, não especificou se a ilicitude alcançava apenas o e-mail pessoal ou também o funcional, e não caberia fazê-lo no julgamento da reclamação. Apesar disso, concluiu que “não há nenhuma objeção à utilização das demais provas colhidas de maneira independente no processo administrativo”.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1630097HC 695895HC 521228HC 783183HC 722827REsp 1573910HC 423794Rcl 42292

Fonte: STJ

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu pelo cancelamento do Tema 1.090, que seria julgado sob o rito dos recursos repetitivos. Com o cancelamento, poderão voltar a tramitar todos os recursos especiais e agravos em recurso especial que tratam das mesmas questões jurídicas e estavam sobrestados nos tribunais de origem ou no STJ.

RECURSO REPETITIVO

10/05/2023

O tema foi cancelado após o ministro Herman Benjamin, relator, não conhecer do recurso representativo da controvérsia, REsp 1.828.606, que pretendia discutir cinco matérias.

A primeira definiria se, para provar a eficácia ou a ineficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI) para a neutralização dos agentes nocivos à saúde e à integridade física do trabalhador, para fins de reconhecimento de tempo especial, basta o que consta no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), ou se a comprovação pode ser por outros meios probatórios e, nessa última circunstância, se a prova pericial é obrigatória.

A segunda questão decidiria se é possível impor rito judicial instrutório rígido e abstrato para apuração da ineficácia do EPI, como fixado pelo tribunal de origem, ou se o rito deve ser orientado conforme os elementos de cada contexto e os mecanismos processuais disponíveis na legislação.

Já o terceiro ponto discutia se a corte regional ampliou o tema delimitado na admissão do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) e, caso positivo, se é legalmente praticável a ampliação.

A quarta matéria estabeleceria se é cabível fixar de forma vinculativa, em julgamento de casos repetitivos, rol taxativo de situações de ineficácia do EPI, e, sendo factível, examinaria a viabilidade jurídica de cada hipótese considerada pelo tribunal de origem (enquadramento por categoria profissional, ruído, agentes biológicos, agentes cancerígenos e periculosidade).

Por último, a quinta questão iria determinar se é admissível inverter, inclusive genericamente, o ônus da prova para que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) demonstre ausência de dúvida sobre a eficácia do EPI atestada no PPP.

Fonte: STJ