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A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou nula a alteração de beneficiária de seguro de vida em grupo realizada por segurado que se obrigou, em acordo de divórcio homologado judicialmente, a manter a ex-esposa como única favorecida do contrato. Para o colegiado, ao se comprometer a manter a ex-mulher como beneficiária, o segurado renunciou à faculdade de livre modificação da lista de agraciados e garantiu a ela o direito condicional (em caso de morte) de receber o capital contratado.

19/04/2024

No mesmo julgamento, o colegiado entendeu que o pagamento feito a credores putativos – ou seja, credores aparentes – não poderia ser reconhecido no caso dos autos, pois a seguradora agiu de forma negligente ao não tomar o cuidado de verificar quem, de fato, tinha direito a receber o benefício.

Na origem, a mulher ajuizou ação contra a seguradora para anular a nomeação dos beneficiários de seguro de vida deixado por seu ex-marido falecido, que refez a apólice após o segundo casamento e a excluiu da relação de favorecidos. No processo, a ex-esposa provou que fez um acordo judicial de divórcio com o segurado, em que constava que a mulher seria a única beneficiária do seguro de vida em grupo ao qual ele havia aderido. 

O juízo de primeiro grau julgou improcedente a ação por considerar que a seguradora agiu de boa-fé ao pagar a indenização securitária aos beneficiários registrados na apólice, de modo que não poderia ser responsabilizada pela conduta do segurado. O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), entretanto, reformou a sentença e determinou que a ex-esposa recebesse a indenização sob o fundamento de que a estipulação feita no acordo de divórcio tornava ilícita a exclusão da mulher como beneficiária do seguro.

Ao STJ, a seguradora alegou que o pagamento feito por terceiro de boa-fé a credor putativo é válido. Dessa forma, argumentou, ela não poderia ser responsabilizada por seguir o disposto na apólice, em situação de aparente legalidade.

Segurado desrespeitou direito garantido à ex-esposa

Segundo o relator do caso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, o artigo 791 do Código Civil permite a substituição de beneficiários do contrato de seguro de vida pelo segurado, a menos que a indicação esteja vinculada à garantia de alguma obrigação ou o próprio segurado tenha renunciado a tal faculdade.

Nesse contexto, apontou, se o segurado abrir mão do direito de substituição do beneficiário, ou se a indicação não for feita a título gratuito, o favorecido deve permanecer o mesmo durante toda a vigência do seguro de vida. Segundo explicou o relator, nessa situação, o beneficiário “não é detentor de mera expectativa de direito, mas, sim, possuidor do direito condicional de receber o capital contratado, que se concretizará sobrevindo a morte do segurado”.

No caso dos autos, em razão do acordo homologado pela Justiça em que havia obrigação de manter a ex-esposa como beneficiária exclusiva do seguro de vida, o ministro Cueva entendeu que “o segurado, ao não ter observado a restrição que se impôs à liberdade de indicação e de alteração do beneficiário no contrato de seguro de vida, acabou por desrespeitar o direito condicional da ex-esposa, sendo nula a nomeação na apólice feita em inobservância à renúncia a tal faculdade”, observou.

Devedor deve demonstrar boa-fé e postura diligente

Em relação ao pagamento feito aos credores que aparentemente teriam direito ao crédito (credores putativos), Villas Bôas Cueva destacou que sua validade depende da demonstração da boa-fé objetiva do devedor. Dessa forma, segundo ele, seria necessária a existência de elementos suficientes para que o terceiro tenha sido induzido a acreditar que a pessoa que se apresenta para receber determinado valor é, de fato, o verdadeiro credor.

Por outro lado, o relator ressaltou que a negligência ou a má-fé do devedor tem como consequência o duplo pagamento: uma, ao credor putativo e outra, ao credor verdadeiro, sendo cabível a restituição de valores a fim de se evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes.

Para o ministro, a situação do processo indica que a seguradora não adotou a cautela necessária para pagar o seguro à verdadeira beneficiária.

“Ao ter assumido a apólice coletiva, deveria ter buscado receber todas as informações acerca do grupo segurado, inclusive as restrições de alteração no rol de beneficiários, de conhecimento da estipulante. Diante da negligência, pagou mal a indenização securitária, visto que tinha condições de saber quem era o verdadeiro credor, não podendo se socorrer da eficácia do pagamento a credor putativo”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso especial.

Leia o acórdão no REsp 2.009.507.

Fonte: STJ

Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é nula a decisão que, genericamente, indefere o pedido de apresentação do réu no plenário do júri com roupas civis. Segundo o colegiado, a utilização de roupas sociais pelo réu durante seu julgamento pelo tribunal do júri é um direito, e não traz insegurança ou perigo, tendo em vista a existência de policiamento ostensivo nos fóruns.

18/04/2024

Com esse entendimento, a turma concedeu habeas corpus para declarar a nulidade de uma sessão do tribunal do júri em que o réu, acusado de homicídio, foi obrigado a usar o traje do presídio.

O juiz que presidia o júri negou o pedido do acusado para usar suas próprias roupas, afirmando que a exigência de uniforme é válida tanto para condenados quanto para presos provisórios, e que isso não prejudicaria o exercício do direito de defesa. Mencionou, ainda, que havia pouca escolta policial disponível no fórum e que o uniforme facilitaria a identificação em caso de fuga. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) ratificou a posição do juiz, pois também considerou que o uso do uniforme, por si só, não causaria nenhum embaraço à defesa.

No pedido de habeas corpus dirigido ao STJ, a defesa alegou que a decisão da presidência do júri deveria ser considerada nula, uma vez que não se pode relativizar o direito do réu a um julgamento justo e imparcial sem a existência de uma causa preponderante.

Uso de roupas civis resguarda dignidade do acusado no julgamento popular

A relatora do habeas corpus, ministra Daniela Teixeira, observou que a decisão que indeferiu o pedido da defesa não apontou risco concreto de fuga do acusado, mas apenas mencionou, de modo geral e hipotético, que o policiamento no fórum era reduzido.

A ministra ressaltou que os jurados avaliam as provas conforme sua íntima convicção, sem a necessidade de fundamentar suas decisões, as quais podem ser influenciadas por uma série de simbolismos da sessão do tribunal do júri. Por conta disso, segundo a magistrada, o réu tem o direito de usar roupas sociais durante o julgamento, especialmente quando tal fato não apresenta riscos.

Para Daniela Teixeira, o uso de vestimentas civis pelo acusado visa resguardar a sua dignidade durante a sessão do júri. Ela ressaltou que, conforme consta do voto vencido no julgamento do TJMG, os jurados devem olhar o réu de forma imparcial, e isso exige a abolição de qualquer símbolo de culpa, como o uniforme de presidiário, que pode gerar um estigma capaz de influenciar na condenação.

Regras de Mandela preveem uso de roupas civis fora do presídio

De acordo com a relatora, é possível aplicar ao caso as Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Presos, conhecidas como Regras de Mandela, as quais dispõem que, “em circunstâncias excepcionais, sempre que um recluso obtenha licença para sair do estabelecimento, deve ser autorizado a vestir as suas próprias roupas ou roupas que não chamem a atenção”.

A ministra invocou ainda um precedente (RMS 60.575) no qual a Quinta Turma concluiu pela existência de constrangimento ilegal quando a defesa, dentro de sua estratégia, requer o uso de trajes comuns pelo réu, mas a presidência do júri nega o pedido de forma genérica, sem pormenores que o justifiquem.

Acompanhando o voto de Daniela Teixeira, o colegiado anulou a sessão do júri e determinou que o réu seja submetido a novo julgamento, dessa vez com suas próprias roupas.

HC 778.503.

Fonte: STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aumentou de R$ 5 mil para R$ 50 mil a indenização por danos morais coletivos decorrente da publicação, em 2008, de um artigo com ofensas aos povos indígenas de Mato Grosso do Sul.

17/04/2024

O colegiado considerou que o valor fixado pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) era irrisório, pois o texto – publicado em um jornal e depois divulgado também na internet – retratou opiniões preconceituosas e intolerantes, estimulando o ódio contra os indígenas e a exclusão social.

Como o autor do artigo morreu, a indenização terá de ser paga pelos seus herdeiros, até o limite da herança.

Para o MPF, conduta violou direitos humanos consagrados internacionalmente

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra o autor do artigo, intitulado “Índios e o retrocesso”, no qual os indígenas foram chamados de “bugrada”, “vândalos”, “assaltantes”, “ladrões”, “malandros e vadios”.

As instâncias ordinárias concluíram que a publicação foi prejudicial à honra da comunidade indígena do estado. A indenização, fixada em R$ 2 mil pelo juízo de primeiro grau, foi aumentada pelo TJMS para R$ 5 mil, no julgamento da apelação.

No recurso ao STJ, o MPF alegou que o valor, ainda assim, era insuficiente para compensar as vítimas e para desestimular a prática de ações discriminatórias por outros formadores de opinião, como jornalistas e blogueiros. Sustentou também que a conduta violou direitos humanos consagrados internacionalmente e adotados como cláusula pétrea na Constituição Federal de 1988.

Respeito à diversidade cultural e à autonomia dos povos indígenas

A relatora do recurso na Terceira Turma, ministra Nancy Andrighi, observou que o respeito à diversidade cultural e à autonomia dos povos indígenas, “outrora ignorado pela cultura integracionista, desponta como valor indissociável do Estado Democrático e Plural de Direito”.

Nesse contexto, de acordo com a ministra, a Lei da Ação Civil Pública assegurou a reparação por danos extrapatrimoniais causados à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos (artigo 1º, inciso VII, da Lei 7.347/1985).

A relatora apontou que, segundo a jurisprudência do STJ, o dano moral coletivo é uma lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade e ocorre quando a conduta agride, de modo totalmente injusto e intolerável, o ordenamento jurídico e os valores éticos fundamentais da sociedade, provocando repulsa e indignação na consciência coletiva.

“O reconhecimento do dano moral coletivo cumpre funções específicas, com a finalidade de punição do responsável pela lesão, de inibição da prática ofensiva e de compensação indireta da coletividade lesada”, afirmou.

Indenização fixada pelo TJMS é insuficiente para punir e reparar

Após considerar que o artigo estimula o discurso de ódio e implanta ideia segregacionista na estrutura social, Nancy Andrighi comentou que a sua divulgação por meio da internet ampliou o alcance das ofensas.

Diante disso, ela afirmou que a indenização arbitrada no tribunal de origem foi insuficiente para alcançar as finalidades de punição, dissuasão e reparação, e lembrou que a jurisprudência do STJ tem afastado a aplicação da Súmula 7 para permitir a revisão do valor dos danos morais quando ele se mostra irrisório ou abusivo

REsp 2.112.853.

Fonte: STJ

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia considerado abusivo o voto de um banco credor contra a aprovação de plano de recuperação judicial que previa deságio de 90% em seu crédito.

16/04/2024

Para o colegiado, não seria razoável exigir do banco, titular de cerca de 95% das obrigações da empresa devedora, que concordasse incondicionalmente com a redução quase total do seu crédito de cerca de 178 milhões de euros, em benefício da coletividade de credores e em detrimento de seus próprios interesses.

Por considerar abusivo o voto do banco contra o plano apresentado pela devedora, o juízo de primeiro grau flexibilizou as regras para concessão da recuperação judicial, aplicando o instituto conhecido como cram down, o qual permite ao magistrado impor o plano ao credor discordante mesmo que não tenha sido alcançado o quórum legal para sua aprovação.

Ao julgar recurso do banco contra a decisão de primeiro grau, o TJSP, por maioria, manteve o reconhecimento de abuso no exercício do direito de voto. De acordo com o tribunal, o banco não conseguiu demonstrar que a decretação da falência da empresa lhe seria mais benéfica do que a recuperação nos moldes propostos no plano.

No recurso ao STJ, o banco alegou que a recuperação foi concedida sem o preenchimento cumulativo de todos os requisitos do artigo 58, parágrafo 1º, da Lei de Falência e Recuperação Judicial (LFR).

Dois dos três requisitos legais para aplicação do cram down não foram cumpridos

O relator do recurso, ministro Antonio Carlos Ferreira, apontou um precedente do STJ (REsp 1.337.989) que admitiu, em circunstâncias extremamente excepcionais, a concessão da recuperação na ausência do quórum estabelecido pelo artigo 45 da LFR e sem o atendimento simultâneo dos requisitos do artigo 58, parágrafo 1º, a fim de evitar o abuso do direito de voto por alguns credores e visando a preservação da empresa.

Contudo, o ministro destacou que não se pode transformar essa exceção em regra. Segundo ele, o cram down é medida excepcional, cujo objetivo é superar impasses e permitir a continuidade da empresa. Justamente porque esse instituto exclui o voto divergente do credor, a LFR restringe o seu uso ao exigir o cumprimento cumulativo de três requisitos.

Desses três, Antonio Carlos Ferreira afirmou que dois não foram atendidos no caso em julgamento: o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembleia, independentemente de classes (artigo 58, parágrafo 1º, inciso I); e o voto favorável de mais de um terço dos credores na classe que tiver rejeitado o plano (artigo 58, parágrafo 1º, inciso II).

Banco não incorreu em abuso do direito de voto

O ministro também ressaltou que o deságio de 90% previsto no plano era mais significativo para o banco do que para os outros credores, considerando que seu crédito é de cerca de 178 milhões de euros, enquanto a soma total dos demais créditos não chega a 5% disso.

O relator ainda ponderou que o banco não pretendeu a decretação de falência, mas apenas a convocação da assembleia de credores para a aprovação de um novo plano. Assim, segundo o ministro Antonio Carlos, sob qualquer perspectiva que se examine a controvérsia, o banco não incorreu em abuso do direito de voto, pois estava buscando de forma legítima a satisfação de seu crédito.

Ao dar provimento ao recurso, a Quarta Turma determinou a intimação da devedora para a apresentação de um novo plano, a ser submetido aos credores.

REsp 1.880.358

Fonte: STJ

Por entender que a ação autônoma para fixar e cobrar honorários de sucumbência é cabível se houver omissão na decisão transitada em julgado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) e determinou o pagamento da verba sucumbencial pela parte vencida.

15/04/2024

Para a turma julgadora, a corte estadual não observou o disposto no artigo 85, parágrafo 18, do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, que admite expressamente a utilização da ação autônoma na hipótese de omissão quanto ao direito aos honorários e ao seu valor.

No processo original, um escritório de advocacia conseguiu excluir um dos litisconsortes que entraram na Justiça contra seu cliente. O juízo, porém, não fixou os honorários advocatícios decorrentes dessa decisão, e o processo seguiu até transitar em julgado.

Diante da falta de manifestação sobre a verba sucumbencial na sentença, os advogados ajuizaram ação autônoma de cobrança, a qual foi declarada improcedente. O juízo de primeiro grau rejeitou a possibilidade de fixação de honorários em decisão interlocutória que define a exclusão de litisconsorte – entendimento mantido pelo TJRO.

Instâncias ordinárias se basearam em súmula parcialmente superada

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso do escritório de advocacia na Terceira Turma, a Súmula 453 do STJ – editada ainda na vigência do CPC/1973 – estabeleceu que os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou ação própria.

No entanto, a ministra explicou que esse entendimento foi significativamente alterado pela redação do CPC/2015, o qual permite no artigo 85, parágrafo 18, o ajuizamento da ação autônoma diante da omissão judicial.

“Como consequência, o entendimento sumulado se encontra parcialmente superado, sendo cabível ação autônoma para cobrança e definição de honorários advocatícios quando a decisão transitada em julgado for omissa”, observou Nancy Andrighi.

É possível cobrança de honorários por decisão que exclui litisconsorte

Em relação à decisão interlocutória que exclui litisconsorte por ilegitimidade ativa, a relatora se amparou na jurisprudência da corte para afirmar que a parte excluída pode ser condenada ao pagamento de honorários proporcionais, admitindo-se valores inferiores ao mínimo previsto no artigo 85, parágrafo 2º, do CPC.

Por fim, Nancy Andrighi lembrou que o caso ocorreu já sob a vigência do CPC/2015 e, mesmo assim, “as instâncias ordinárias rejeitaram a pretensão de arbitramento de honorários advocatícios ao recorrente por meio de ação autônoma e aplicaram a Súmula 453”.

Ao dar provimento ao recurso especial, a relatora condenou o litisconsorte excluído da ação original a pagar honorários de 5% sobre a metade do valor atualizado da causa.

REsp 2.098.934.

Fonte: STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que a falta de pagamento da multa estipulada pelo artigo 1.021, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil (CPC), aplicada em agravo interno – decorrente de agravo de instrumento – considerado manifestadamente inadmissível, não impede o exame de apelação interposta em momento subsequente no mesmo processo.

12/04/2024

Para o colegiado, como o agravo interno teve origem em agravo de instrumento, não haveria razão para que a ausência de pagamento da multa impedisse a análise da apelação – interposta em outro momento processual e contra decisão diferente daquela atacada no agravo de instrumento. 

No caso dos autos, um plano de saúde interpôs agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, contra decisão de primeiro grau que concedeu tutela de urgência em favor da autora da ação. O efeito suspensivo foi negado monocraticamente pelo relator no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), motivo pelo qual o plano interpôs agravo interno.

O TJCE, considerando o agravo interno manifestadamente inadmissível, aplicou multa no percentual de cinco por cento sobre o valor atribuído à causa. Posteriormente, sobreveio sentença que julgou procedente os pedidos da autora, motivo pelo qual o plano de saúde interpôs apelação.

Porém, o TJCE não conheceu da apelação por entender que, nos termos do artigo 1.021, parágrafo 5º, do CPC, o pagamento da multa aplicada no agravo interno se tornou pressuposto de admissibilidade da apelação.

Multa só impede exame de recursos posteriores que visem discutir questões já decididas

A ministra Nancy Andrighi, relatora, observou que, de fato, o parágrafo 5º do artigo 1.021 do CPC prevê que a interposição de qualquer outro recurso está condicionada ao depósito prévio do valor da multa prevista no parágrafo 4º do mesmo artigo.

A relatora explicou que esta norma tem como objetivo coibir o uso abusivo do direito processual, aplicando uma sanção à prática de atos considerados como litigância de má-fé, como a interposição de recursos com intuito manifestamente protelatório, conforme estabelecido no artigo 80, inciso VII, do CPC. Apesar disso, segundo ela, a multa não pode frustrar injustificadamente o direito de acesso ao Poder Judiciário.

Nesse sentido, a ministra ressaltou que a interpretação que mais se alinha com o propósito da norma estabelecida no parágrafo 5º é aquela que estabelece que a multa imposta como requisito de admissibilidade para novos recursos apenas impede o exame de recursos posteriores que visem discutir questões já decididas e em relação às quais tenha sido reconhecido o abuso no direito de recorrer.

“Constata-se, assim, que, no caso dos autos, a multa foi aplicada em sede de agravo interno no agravo de instrumento interposto contra decisão liminar, e a exigência do depósito prévio deu-se no julgamento da apelação interposta contra a sentença, ou seja, em outro momento processual, portanto, não tem por objetivo discutir a matéria já decidida”, concluiu ao dar provimento ao recurso especial para determinar o retorno do processo ao TJCE a fim de que prossiga no julgamento da apelação.

REsp 2.109.209

Fonte: STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a operadora de plano de saúde, quando não houver possibilidade de atendimento do beneficiário no município onde surgiu a demanda, ou em outro que faça fronteira com ele, deve custear o transporte de ida e volta para uma cidade que ofereça o serviço médico necessário, na mesma região de saúde ou fora dela, e independentemente de ser o prestador do serviço credenciado ou não pelo plano.

10/04/2024

As regiões de saúde, nos termos do artigo 2º do Decreto 7.508/2011, são áreas geográficas formadas por agrupamentos de municípios limítrofes, organizados com a finalidade de integrar o planejamento e a execução de serviços de saúde – tanto os prestados pelas operadoras de saúde suplementar quanto os do Sistema Único de Saúde (SUS).

De acordo com a Terceira Turma, se não existir prestador de serviço credenciado na cidade em que houve a demanda de saúde do beneficiário, a operadora deverá garantir o atendimento em: a) prestador não integrante da rede de assistência no município da demanda; b) prestador integrante ou não da rede de assistência, em município limítrofe ao da demanda; c) prestador integrante ou não da rede de assistência, em município não limítrofe ao da demanda, mas que pertença à mesma região de saúde – garantindo, nesse caso, o transporte do beneficiário; d) prestador integrante ou não da rede de assistência, em município que não pertença à mesma região de saúde – também custeando o transporte de ida e volta. 

O entendimento foi estabelecido pela turma julgadora ao manter decisão da Justiça de São Paulo que condenou uma operadora a fornecer transporte a um beneficiário do plano, morador de Tatuí, para o tratamento em hospital de Sorocaba. A condenação foi fixada em primeira instância e mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Em recurso especial, a operadora sustentou que não estaria obrigada a custear ou reembolsar as despesas de transporte, porque já garantia ao beneficiário o atendimento em hospital que não ficava na cidade onde ele morava, embora pertencesse à mesma região de saúde.

Organização das regiões de saúde não pode prejudicar coberturas contratadas no plano

Relatora do recurso, a ministra Nancy Andrighi explicou que a Resolução Normativa 566/2022 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) prevê que a operadora deve garantir o atendimento integral das coberturas contratadas no plano de saúde, no município em que o beneficiário as demandar, desde que seja integrante da área geográfica de abrangência do plano.

Contudo, diante da impossibilidade de que as operadoras mantenham, em todos os municípios brasileiros, todas as coberturas de assistência à saúde contratadas pelos beneficiários, a ministra apontou que a saúde suplementar – assim como o SUS – trabalha com o conceito de regiões de saúde.

Nancy Andrighi afirmou que o conceito de região de saúde é dirigido às operadoras “com a única finalidade de permitir-lhes integrar a organização, o planejamento e a execução de ações e serviços de saúde que prestam”. Portanto, segundo ela, esse conceito “não pode ser utilizado como um mecanismo que dificulta o acesso do beneficiário às coberturas de assistência à saúde contratadas”.

A relatora também destacou que, nos termos do artigo 4º, parágrafo 2º, da Resolução Normativa 566/2022 da ANS, caso não exista prestador de saúde habilitado (integrante ou não da rede de assistência) no mesmo município ou nas cidades limítrofes, a operadora deve garantir o transporte do beneficiário até a localidade apta a realizar o atendimento, assim como o seu retorno ao local de origem.

Na avaliação de Nancy Andrighi, apesar de a norma da ANS prever distinções sobre a responsabilidade pelo transporte do beneficiário fora do município da demanda nas hipóteses de indisponibilidade e de inexistência de prestador no local, “não há como adotar soluções jurídicas distintas para a situação do beneficiário que, seja por indisponibilidade ou por inexistência de prestador da rede assistencial no município de demanda, é obrigado a se deslocar para outro município, ainda que da mesma região de saúde, para receber a cobertura de assistência à saúde contratada”.

Região de saúde de Sorocaba tem cidades separadas por mais de 300 km

A título ilustrativo, a relatora citou que a distância entre os municípios integrantes da região de saúde de Sorocaba pode passar de 300 km. Nancy Andrighi considerou desproporcional que o beneficiário seja obrigado a custear o deslocamento para receber tratamento em cidade que, embora faça parte da mesma região de saúde, seja distante do local em que a demanda deveria ter sido atendida.

“A operadora tem a obrigação de custear o transporte sempre que, por indisponibilidade ou inexistência de prestador no município de demanda, pertencente à área geográfica de abrangência do produto, o beneficiário for obrigado a se deslocar para município não limítrofe àquele para a realização do serviço ou procedimento de saúde contratado”, concluiu a ministra.

REsp 2.112.090

Fonte: STJ

Para a 2ª Turma, a extradição seria desproporcional, pois a pena no Brasil seria de máximo quatro anos, e o acusado é o único responsável pelos filhos.

08/04/2024

Por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou pedido de extradição de um sul-coreano acusado da suposta prática de crime contra direitos autorais. A decisão se deu na sessão virtual finalizada em 3/4, no julgamento da Extradição (EXT) 1784, apresentado pelo governo da Coreia do Sul.

Segundo a acusação, ele teria fornecido transmissão paga ilegal de filmes e séries para coreanos do exterior, cuja previsão no Brasil se equipara ao delito de violação de direitos autorais previsto no artigo 184, parágrafo 3º, do Código Penal.

Casos excepcionais

Em seu voto, o relator, ministro André Mendonça, apontou que o Tratado de Extradição entre Brasil e Coreia do Sul prevê que a entrega do estrangeiro poderá ser recusada quando, em casos excepcionais, o país que recebeu o pedido julgar, em função das condições pessoais da pessoa procurada, que a medida seria incompatível com considerações humanitárias.

No caso, a pena máxima no Brasil não ultrapassaria os quatro anos de reclusão, permitindo até mesmo um acordo de não persecução penal (ANPP). O relator ressaltou, ainda, que em uma eventual condenação, mesmo que pela pena máxima, o regime de cumprimento seria o aberto, com a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos.

Único responsável

O relator destacou que o acusado, brasileiro naturalizado, é divorciado e reside sozinho com os filhos menores de idade. Sua ex-esposa se mudou para os Estados Unidos, e ele não tem rede de apoio de familiares no Brasil. Frisou que, mesmo depois da prisão preventiva dele, a mãe das crianças não retornou ao País e não providenciou amparo direto aos filhos, os quais foram cuidados por amigos do pai durante sua reclusão.

Por isso, o ministro André Mendonça avaliou que a extradição fere o princípio da dignidade humana, pois alteraria profundamente a vida de dois menores de idade. Segundo ele, a decisão não viola a Súmula 421 do STF (não impede a extradição o fato de o extraditando ser casado com brasileira ou ter filho brasileiro), pois está de acordo com o que foi livre e expressamente estabelecido pelos dois países no tratado.

RP/AS//AD/CV

Fonte: STJ

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que é indispensável a autorização federal para utilização de água mineral obtida diretamente do solo como insumo em processo industrial, ainda que ela não seja destinada ao consumo humano.

04/04/2024

O entendimento foi fixado pelo colegiado ao reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que, confirmando sentença de improcedência de ação popular, considerou suficiente a autorização do poder público estadual para o uso de água termo-mineral por uma indústria de café. 

Segundo o TRF4, não haveria obrigatoriedade de prévia autorização do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) – substituído pela Agência Nacional de Mineração (ANM) – para uso da água retirada do solo em processos industriais, pois a permissão seria necessária apenas nas hipóteses de extração para consumo humano ou para fins balneários.

Relator do recurso do Ministério Público Federal, o ministro Paulo Sérgio Domingues lembrou que o artigo 20, inciso IX, da Constituição Federal prevê que são bens da União os recursos minerais, inclusive aqueles depositados no subsolo.

O ministro também explicou que, conforme definido no artigo 1º do Decreto-Lei 7.841/1945, águas minerais são aquelas oriundas de fontes naturais ou fontes artificialmente captadas que possuam composição química distinta das águas comuns, com características que lhes confiram ação medicamentosa.

Caracterização da água como mineral não advém de sua destinação

Para Paulo Sérgio Domingues, diferentemente do entendimento do TRF4, o que caracteriza a água como mineral – e, por consequência, define a necessidade de autorização e fiscalização federais para sua exploração – é a composição química, e não a finalidade para a qual será destinada (industrial ou consumo humano, por exemplo).

O relator reforçou que a legislação brasileira protege o possível interesse da União por um ativo econômico natural do poder público, de forma que o recurso não poderia ser explorado sem a autorização federal.

“A fiscalização e a análise da água pelo DNPM, hoje realizadas pela ANM, não têm como objetivo somente a verificação de suas propriedades para fins de saúde da população que pode vir a consumi-la. É uma atividade que visa o resguardo dos interesses da União no bem natural, respeitando imperativos de predominância do interesse público sobre o particular e de desenvolvimento no interesse nacional”, concluiu o ministro ao julgar procedente a ação popular.

REsp 1.490.603.

Fonte: STJ

O entendimento foi estabelecido pela Terceira Turma

01 de Abril de 2024

​Nos processos de conhecimento pelo rito da ação monitória, nos casos em que não houver a oposição de embargos monitórios, o juízo só pode alterar o valor da causa de ofício ou por arbitramento até a expedição do mandado de pagamento. Após a publicação da sentença, o juízo pode modificar o valor da causa apenas para corrigir – de ofício ou a requerimento da parte – imprecisões materiais ou erros de cálculo, ou, ainda, em decisão em embargos de declaração, nos termos do artigo 494 do Código de Processo Civil (CPC).

O entendimento foi estabelecido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) segundo o qual seria dever do juízo, caso constate que o conteúdo patrimonial em discussão não corresponde ao valor atribuído à ação monitória, corrigir de ofício o valor da causa, na forma do artigo 292 do CPC.

De acordo com os autos, a ré da ação monitória fez o depósito judicial do valor que constava tanto da petição inicial quanto do mandado de pagamento expedido pelo juízo. Após a quitação, contudo, a autora da ação impugnou a quantia e requereu o aditamento da petição inicial para retificação do valor da causa.

Em primeiro grau, o juízo entendeu que a autora comprovou a ocorrência de erro material e, assim, autorizou a correção do valor da causa e determinou que a ré complementasse o montante depositado judicialmente. A decisão foi mantida pelo TJDFT.

Sem os embargos, decisão que expede o mandado tem eficácia de sentença condenatória

A relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, explicou que, na ação de conhecimento pelo rito da monitória, quando não há oposição dos embargos monitórios, a decisão que determina a expedição do mandado de pagamento tem eficácia de sentença condenatória e faz coisa julgada, tendo como resultado ou a formação do título executivo judicial ou o cumprimento do mandado de pagamento pelo réu antes da constituição do título executivo.

Em relação ao valor da causa, a ministra comentou que a correção do montante indicado na petição inicial, quando ele não corresponder ao conteúdo patrimonial ou ao proveito econômico buscado, pode ser feita pelo juízo até a prolação da sentença – ou seja, até a decisão que determina a expedição do mandado de pagamento, caso não tenha havido oposição de embargos.

“Após a publicação da sentença, o juiz apenas poderá alterá-la para corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais ou erros de cálculo; ou por meio de embargos de declaração, nos termos do artigo 494 do CPC”, completou.

Na hipótese dos autos, Nancy Andrighi entendeu que, como a correção do valor da causa ocorreu após a expedição do mandado de pagamento, a determinação violou o princípio da inalterabilidade das decisões judiciais.   

“Por se tratar de ação com rito monitório em que não houve oposição de embargos, a decisão que expediu o mandado de pagamento teve eficácia de sentença condenatória. Com o cumprimento do mandado de pagamento pela recorrente, a sentença fez coisa julgada, de forma que o juiz não poderia ter alterado o valor da causa após o depósito judicial”, apontou.

Ao dar provimento ao recurso para manter o valor inicial da causa, a relatora disse que o caso dos autos não envolveu simples erro material, pois a suposta incorreção decorreu de falta de diligência da parte autora. Adicionalmente, a ministra considerou que, caso houvesse a correção do valor da causa após o pagamento do montante indicado no mandado, haveria efetivo prejuízo à parte ré.

Fonte: STJ