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Uma forte geada destruiu 60% de uma lavoura de cana-de-açúcar em Reginópolis (SP), em julho de 2021. Cinco meses depois, uma tromba d’água — chuva forte com ventania — arruinou uma plantação de milho já castigada por meses de seca em Nova Granada (SP). No ano seguinte, em setembro, uma estiagem prolongada arrasou um cafezal em Caconde (SP).

31 de outubro de 2025

 

 

Esses eventos, causados por fenômenos climáticos distintos, estão separados por cerca de um ano e algumas centenas de quilômetros no interior paulista. Além da proximidade temporal e geográfica, as três ocorrências tiveram um destino comum: foram parar no Tribunal de Justiça de São Paulo por divergências sobre a cobertura do seguro rural.

Fábio Pozzebom / Agência Brasil

Propriedade atingida por estiagem em Hulha Negra (RS), em 2023

A instabilidade climática, que se acentuou nos últimos anos, é ao mesmo tempo uma razão de ser do seguro rural e um de seus maiores desafios. O seguro agrícola, que é a principal modalidade de seguro rural, protege produtores de prejuízos decorrentes de chuvas, secas, geadas e outras intempéries, mas tem sofrido limitações que arrastam disputas para o Judiciário.

“O litígio no seguro rural ocorre por uma série de fatores. Um dos maiores, na minha opinião, é o desconhecimento desse modelo de negócio por parte dos agricultores e dos próprios magistrados”, avalia o advogado Robson Verfe Leal, especialista em resolução de disputas empresariais e sócio do escritório Costa Savian Advogados.

Problema de baliza

O fator climático é o principal sinistro (dano) que gera pedidos de indenização no seguro agrícola. A avaliação do impacto, que define o resultado da ação judicial, é feita por meio do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc), um guia público que estabelece a época ideal de plantio de cada produto conforme a região do país.

Em tese, a regra é clara: se o agricultor plantar fora da janela recomendada pelo Zarc e perder a produção, a seguradora pode alegar violação do contrato e negar a cobertura. A aplicação desse instrumento, porém, tem provocado divergências no TJ-SP.

Isso foi observado no julgamento do caso de Nova Granada (SP). A lavoura de milho do autor da ação foi prejudicada por uma seca prolongada, seguida de fortes chuvas. Com as perdas, ele procurou a seguradora para resgatar quase R$ 200 mil, mas a empresa negou o pedido.

O produtor rural argumentou nos autos que plantou dentro do período recomendado pelo Zarc, que ia de setembro a dezembro de 2021. A seguradora sustentou, contudo, que o plantio só ocorreu em janeiro de 2022, ou seja, fora da janela, e que a área tinha sido de pastagem até o mês anterior, o que excluiria a obrigação de cobrir as perdas porque esse tipo de solo exige mais tempo de recuperação.

Ao analisar o caso, o juízo de primeiro grau deu razão ao segurado. A sentença, publicada em novembro de 2024 (clique aqui para ler), considerou que o plantio em área recém-convertida de pastagem não violou os termos do contrato, uma vez que o procedimento é recomendado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

A decisão, todavia, foi modificada em segunda instância. Em acórdão publicado em agosto deste ano (clique aqui para ler), a 25ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP avaliou que o ponto de discordância “não foi suficientemente esclarecido”, mesmo com perícia. Com isso, os desembargadores anularam a sentença e mandaram produzir novos laudos para sanar a controvérsia.

Clima tenso

O fenômeno climático que provocou esse litígio foi registrado em setembro de 2022. Desde então, o Brasil sofreu catástrofes como as enchentes no Rio Grande do Sul, secas extremas na Amazônia e queimadas em várias regiões do país.

 

Fabio Pozzebom / Agência Brasil

Moradora ajuda a combater incêndio no Parque Nacional de Brasília, em 2024

A instabilidade para a agricultura brasileira decorre de intervalos cada vez mais curtos entre os fenômenos El Niño, que provoca cheias no Sul e secas no Sudeste e no Nordeste, e La Niña, que, grosso modo, tem o efeito inverso. O resultado é que as safras estão constantemente sob risco de excesso de chuvas ou de secas prolongadas.

“Era comum ouvir o produtor falando: ‘A cada quatro safras, eu perco uma’. Porém, isso não tem ocorrido mais. A gente vê que o período entre um fenômeno e outro se estreitou”, observou Guilherme Augusto Costa Rios, assessor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), em audiência no Senado em dezembro passado.

Para especialistas, o seguro rural ganha importância diante dessa realidade. “O seguro é um mecanismo de segurança para o agricultor, para o financiador que investiu na safra e para o fornecedor que espera receber. Em um cenário de agravamento da crise climática, a falta do seguro deixa toda essa cadeia mais vulnerável”, diz Robson Verfe.

Crescimento sufocado

Apesar disso, o mercado do seguro rural está em queda no Brasil. Segundo dados do Ministério da Agricultura, o número de apólices desse tipo caiu de 122,7 mil, em 2021, para 46,9 mil neste ano. Hoje, apenas 2,2 milhões de hectares — ou 22 mil km², equivalente ao estado do Sergipe — estão cobertos por seguro, o que representa menos de 5% da área cultivada no país.Por

Para os especialistas, essa queda se explica pela estagnação do Programa de Subvenção Rural (PSR), uma política criada em 2005 para subsidiar, com recursos públicos, parte dos prêmios (parcelas do seguro) pagos pelos agricultores. O orçamento anual do programa, de R$ 1 bilhão, é tido pelos técnicos como defasado, e mesmo esse valor tem sofrido contingenciamentos. Em 2025, o valor bloqueado foi de R$ 445,1 milhões — quase metade do total.

“Esse programa é vital para pequenos e médios agricultores que não têm capacidade de assumir sozinhos o custo integral da contratação do seguro. Sem esse recurso, o número de segurados pode cair ainda mais”, alerta Verfe.

A pesquisa contou com a participação de moradores e estudantes

Publicado em 01/03/2022

Pesquisadores de universidades e centros de estudos brasileiros desenvolveram uma metodologia de mapeamento de riscos de desastres naturais com a participação de moradores, principalmente estudantes, para prevenir os efeitos de inundações, alagamentos, deslizamentos e chuvas intensas.

O estudo, publicado na revista Disaster Prevention and Management, foi conduzido por pesquisadores do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), da Universidade Estadual Paulista (Unesp), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e da Universidade do Vale do Paraíba (Univap).

Para elaborar a metodologia de mapeamento, os pesquisadores contaram com a participação de 22 alunos matriculados entre 2019 e 2021 na escola estadual Monsenhor Ignácio Gioia, no município de São Luiz do Paraitinga (SP). A cidade foi parcialmente destruída por uma enchente em 2010, quando o nível do Rio Paraitinga subiu e deixou a maioria da população desalojada.

O estudo utilizou dados de risco, disponíveis na internet, do Serviço Geológico do Brasil – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), uma empresa pública, vinculada ao Ministério de Minas e Energia – e imagens obtidas com drones. Com essas informações, em conjunto com os alunos moradores da cidade, elaboraram um mapa de risco e rotas de fuga.

“Os alunos identificaram no mapa e foram também elaborando rotas de fuga para que as pessoas, dentro dessas áreas inundáveis, quais seriam os lugares seguros que elas poderiam se abrigar temporariamente diante de inundações de cinco metros, de dez metros, e assim por diante. É um exercício de planejamento, um plano de contingência feito em conjunto com as pessoas que moram na região”, destacou o sociólogo Victor Marchezini, pesquisador do Cemaden e orientador do trabalho.

“Se não há esse tipo de envolvimento com as pessoas do local, as respostas aos desastres acabam sendo improvisadas, as pessoas não estão preparadas. Usamos São Luiz do Paraitinga como um laboratório vivo, pensando em ações de prevenção”, disse o pesquisador.

Durante a pesquisa, os alunos sugeriram, como forma de melhorar a prevenção dos desastres, a realização de um planejamento territorial para evitar construções em áreas de risco, e a criação de um aplicativo para comunicar rapidamente ações de resposta direcionada aos moradores.

“É sempre importante que a gente tenha esses planos, faça os treinamentos em conjunto com os moradores. Mas além disso, a gente tem que se preparar para aquilo que é impensável, é justamente quando o evento extremo foge daquilo que a gente estava acostumado”, ressaltou Marchezini. 

A pesquisa, que tem como primeiro autor o pesquisador Miguel Angel Trejo-Rangel, do Inpe, foi apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Por Agência Brasil – São Paulo