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19 de outubro de 2022

Em agosto de 2005, o promotor de Justiça André Luís Alves de Melo (Estrela do Sul, Cascalho Rio e Grupiara/MG) dirigiu ofício ao então secretário de Defesa Econômica, doutor Daniel Krepel Goldberg, tendo requerido a instauração de procedimento administrativo em desfavor do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, nos seguintes termos:

“Valho-me do presente para respeitosamente encaminhar a Vossa Excelência pedido de instauração de procedimento administrativo em desfavor da OAB/Federal, pois vem permitindo que as seccionais fixem honorários mínimos a serem cobrados do consumidor, o que é vedado pelo Código do Consumidor e havendo ainda indícios de cartelização, pois não usa a tabela de honorários apenas como referencial. Infringindo também as normas de direito econômico. Embora a OAB alegue que a tabela não é de honorários mínimos, pune os advogados que cobram valor a menor, violando o princípio constitucional da livre concorrência, o qual não pode ser descumprido pela Lei n° 8.906/94.” (Processo Cade 08012.006641/2005-63).

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, tendo formulado consulta, solicitou a juntada aos autos, em setembro de 2022, de parecer elaborado pelo doutor Eros Roberto Grau, que respondeu às perguntas abaixo:

1 – Sendo a Ordem dos Advogados do Brasil-OAB um serviço público independente (acepção extraída da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3026 julgada pelo Supremo Tribunal Federal -STF) e considerando-se que a advocacia não é atividade mercantil (art. 2º 1 § 1 º da Lei n. 8. 906 / 94, c/c art. 5º do Código de Ética e Disciplina da OAB) seria correto afirmar que a fixação por ela de valores mínimos de honorários mediante a edição de tabelas de honorários consubstancia abuso de poder econômico e configura poder de concertar honorários?
2 – O estabelecimento de valores mínimos nas Tabelas de Honorários das Seccionais da OAB configura atuação em cartel, na compreensão de combinação de agentes econômicos?

20. Aos quesitos propostos na consulta dou as seguintes respostas:
(i) não; sendo a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB um serviço público independente (acepção extraída da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.026 julgada pelo Supremo Tribunal Federal STF) e considerando-se que a advocacia não é atividade mercantil (art. 2º, § 1 º da lei n. 8.906/94, c/c art. 5° do Código de Ética e Disciplina da OAB não é correto afirmar- se que a fixação, por ela, de valores mínimos de honorários mediante a edição de tabelas de honorários consubstancia abuso de poder econômico e configura poder de concertar honorários;(ii) não; o estabelecimento de valores mínimos nas Tabelas de Honorários das Seccionais da OAB não configura atuação em cartel, na compreensão de combinação de agentes econômicos.

Colhe-se do processo o DESPACHO SG ENCERRAMENTO PROCESSO ADMINISTRATIVO (CONDENAÇÃO TOTAL OU PARCIAL) Nº 10/2022, vazado nos seguintes termos:

“Acolho a Nota Técnica nº NOTA TÉCNICA Nº 102/2022/CGAA6/SGA2/SG/CADE e, com fulcro no §1º do art. 50, da Lei nº 9.784/99, integro as suas razões à presente decisão, inclusive como sua motivação. Pelos fundamentos apontados na Nota Técnica, nos termos do art. 74 da Lei nº 12.529/2011 c/c art. 156, §1º, do Regimento Interno do Cade, decido pelo encaminhamento dos presentes autos ao Tribunal Administrativo de Defesa Econômica, opinando-se: (i) pela condenação do Representado Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por entender que suas condutas configuraram infração à ordem econômica, nos termos do art. 36, incisos I, III e IV e seu §3º, inciso II da Lei nº 12.529/2011 (correspondente aos art. 20, incisos I e IV, c/c art. 21, inciso II, ambos da Lei n° 8.884/1994), recomendando-se, ainda, a aplicação de multa por infração à ordem econômica, nos termos do art. 23 do mesmo dispositivo legal, além das demais penalidades entendidas cabíveis. Ao setor Processual. Publique-se.”

Assim, caberá ao Cade o julgamento!

O Capítulo VI do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº 8.906/1994), prescreve:

“Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.
§ 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado.

  • 2º Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, observado obrigatoriamente o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 do art. 85 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). (Redação dada pela Lei nº 14.365, de 2022)
    …”

É a Lei 8.906/1994 que determina ao juiz a fixação dos honorários, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado, na forma do artigo 22, § 1º.

Vale esclarecer que o citado § 2º, antes de ser modificado pela Lei 14.365/22, previa:

§ 2º Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, não podendo ser inferiores aos estabelecidos na tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB.

O artigo 58 (V – fixar a tabela de honorários, válida para todo o território estadual;) do mesmo Estatuto exclui qualquer dúvida quanto à possibilidade de fixação da referida tabela ao afirmar tratar-se de competência privativa do Conselho Seccional tal prerrogativa.

A legalidade do disposto encontra ainda morada no artigo 111 do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906: artigo 78.), que dispõe:

“Art. 111. O Conselho Seccional fixa tabela de honorários advocatícios, definindo as referências mínimas e as proporções, quando for o caso.
Parágrafo único. A tabela é amplamente divulgada entre os inscritos e encaminhada ao Poder Judiciário para os fins do art. 22 do Estatuto.”

O Código de Ética e Disciplina revogado, em seu artigo 41 simplesmente previa que o advogado deveria evitar o aviltamento de valores dos serviços profissionais:

Artigo 41. O advogado deve evitar o aviltamento de valores dos serviços profissionais, não os fixando de forma irrisória ou inferior ao mínimo fixado pela tabela de honorários, salvo motivo plenamente justificável.

Faz-se mister explicitar o real escopo oriundo da imposição da tabela de honorários, porque os Conselhos Seccionais da OAB buscam evitar o aviltamento de valores da profissão (CED/2015: Artigo 48. § 6º Deverá o advogado observar o valor mínimo da Tabela de Honorários instituída pelo respectivo Conselho Seccional onde for realizado o serviço, inclusive aquele referente às diligências, sob pena de caracterizar-se aviltamento de honorários.), assim como a inibição do advogado de se tornar “sócio” do próprio cliente, hipótese, rigidamente disciplinada no Código de Ética e Disciplina, em seu artigo 50.

Não há prescrição de que a ausência de observância à tabela de honorários constitua infração disciplinar, nos termos do artigo 34 e seus 29 incisos da Lei 8.906.

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O Cesa (Centro de Estudos das Sociedades de Advogados) e o Sinsa (Sindicato das Sociedades de Advogados dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro) promovem nos dias 9,10 e 11 de novembro, em São Paulo, o Congresso Nacional de Sociedades de Advogados.

*Por Stanley Martins Fras -sócio do Homero Costa Advogados e diretor do Cesa (Centro de Estudos das Sociedades de Advogados).

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 19 de outubro de 2022, 10h18