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A crescente popularidade dos chamados bebês reborn (bonecos hiper-realistas que imitam com impressionante perfeição recém-nascidos) tem despertado diversas manifestações sociais, emocionais e, mais recentemente, até pretensões jurídicas. Surgiu pessoas cogitando buscado o Judiciário para requerer guarda judicial e até pensão alimentícia em favor desses bonecos, movidas em contextos de dissolução de relacionamentos.

 

 

21/06/2025

Apesar da carga emocional envolvida, essas demandas esbarram em limites jurídicos objetivos, que impossibilitam seu deferimento. Este artigo analisa as razões legais pelas quais não é cabível o reconhecimento de guarda nem de pensão alimentícia para bebês reborn.

1. O conceito de pessoa natural no Direito brasileiro

Nos termos do artigo 1º do Código Civil, “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”, e conforme o artigo 2º, a “personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida”. Assim, para que um ente seja considerado sujeito de direitos, é necessário que tenha personalidade jurídica, adquirida com o nascimento com vida.

O bebê reborn, por mais realista que seja em sua aparência e por mais que desperte afeto em seu proprietário, é juridicamente um objeto, um bem material, sem vida, sem personalidade jurídica e, portanto, sem capacidade para ser sujeito de direitos.

2. A guarda como instituto de proteção à pessoa menor

A guarda, prevista principalmente no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990), visa proteger e assegurar os direitos de crianças e adolescentes reais, garantindo-lhes convivência familiar, afeto, educação, saúde e segurança. É um instituto voltado exclusivamente à proteção da pessoa em desenvolvimento, sendo inaplicável a objetos ou bens.

A tentativa de atribuir guarda judicial a um bebê reborn implica uma distorção do instituto, desvirtuando seu fim protetivo e sua natureza personalíssima.

3. A pensão alimentícia e o critério da necessidade

A pensão alimentícia possui fundamento na necessidade do alimentando e na possibilidade do alimentante, conforme o artigo do Código Civil. Para que alguém faça jus a alimentos, deve demonstrar necessidades reais, como subsistência, educação, saúde, moradia, etc.

Como o bebê reborn é um objeto inanimado, não possui necessidades próprias, tampouco pode sofrer prejuízos materiais ou existenciais. A tentativa de pleitear alimentos para esse tipo de bem revela-se juridicamente incabível e sem fundamento legal.

4. Riscos processuais: litigância de má-fé

Pedidos dessa natureza, embora eventualmente motivados por questões emocionais profundas, podem ser considerados abusivos ou manifestamente infundados, sendo possível o enquadramento na litigância de má-fé, nos termos do art. 80 do Código de Processo Civil. Além disso, a judicialização de questões sem relevância jurídica real pode gerar congestionamento do Judiciário e expor o requerente ao pagamento de multas e honorários sucumbenciais.

5. Considerações finais

A legislação brasileira é clara ao definir quem pode ser titular de direitos e quem pode figurar como sujeito de obrigações no âmbito do Direito de Família. Por mais que os vínculos afetivos com objetos como o bebê reborn possam ser legítimos do ponto de vista emocional, não produzem efeitos jurídicos equiparados aos laços familiares reais.

A guarda judicial e a pensão alimentícia são institutos criados para proteger pessoas reais, especialmente aquelas em condição de vulnerabilidade, como crianças e adolescentes, e não se aplicam a bens ou objetos, ainda que revestidos de valor sentimental.

Assim, deve-se evitar a judicialização de situações sem fundamento legal, a fim de preservar a racionalidade do sistema jurídico, a economia processual e o respeito aos institutos do Direito de Família.

*Por Thainá Silva

Fonte: https://thainasilvafp-adv404096.jusbrasil.com.br/