A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Tema 1.240 dos recursos repetitivos, definiu que o Imposto sobre Serviços (ISS) deve compor a base de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) quando apurados pela sistemática do lucro presumido.

13/11/2024

Para consolidar esse entendimento, o colegiado estabeleceu comparações entre a questão debatida no recurso especial representativo da controvérsia (REsp 2.089.298) e a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 69 da repercussão geral, a qual excluiu o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).

No caso analisado pelo STJ, um laboratório questionou decisões das instâncias ordinárias que validaram a manutenção dos valores do ISS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Invocando a posição do STF, a empresa defendeu que o ISS deveria ser excluído da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, quando apurados na sistemática do lucro presumido.

Precedente do STF foi estabelecido em contexto específico

Relator do repetitivo, o ministro Gurgel de Faria destacou que não deve prevalecer nesse caso a tese firmada no julgamento do Tema 69 do STF, pois foi adotada em contexto específico, à luz da Constituição. “A legislação federal, de constitucionalidade presumida, expressamente determina que o valor relativo aos impostos, como o ISS, no caso, integra a receita para fins de tributação de IRPJ e CSLL pelo lucro presumido”, observou.

O magistrado verificou que o próprio STF deixou claro em seu precedente que a tese não se aplica “quando se tratar de benefício fiscal oferecido ao contribuinte, como na espécie, em que se pode optar por regime de tributação”.

Lucro real e lucro presumido: diferenças entre regimes de tributação

Segundo Gurgel de Faria, no regime de tributação pelo lucro real, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL é o lucro contábil, ajustado pelas adições e deduções permitidas em lei. Nessa sistemática, o ISS é um imposto dedutível como despesa necessária à atividade da empresa.

Já na tributação pelo lucro presumido, prosseguiu, multiplica-se um dado percentual – que varia conforme a atividade desenvolvida pelo contribuinte, nos termos dos artigos 15 e 20 da Lei 9.249/1995 – pela receita bruta, a qual representa o ponto de partida nesse regime de tributação. Sobre essa base de cálculo, incidem as alíquotas pertinentes.

“A adoção da receita bruta como eixo da tributação pelo lucro presumido demonstra a intenção do legislador de impedir quaisquer deduções, tais como impostos, custos das mercadorias ou serviços, despesas administrativas ou financeiras, tornando bem mais simplificado o cálculo do IRPJ e da CSLL”, detalhou o ministro.

Ainda de acordo com Gurgel de Faria, se o contribuinte quiser considerar certos custos ou despesas, deve escolher o regime de apuração pelo lucro real, que abarca essa possibilidade.

“O que não se pode permitir, à luz dos dispositivos de regência, é que promova uma combinação dos dois regimes, a fim de reduzir indevidamente a base de cálculo dos tributos”, concluiu o relator.

REsp 2.089.298.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2089298REsp 2089356

Fonte: STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento realizado nesta terça-feira (12), entendeu que as operadoras de planos de saúde devem cobrir o fornecimento de bomba de insulina para os beneficiários diagnosticados com diabetes tipo 1 quando devidamente comprovada a necessidade do equipamento. Para o colegiado, além de o sistema de infusão contínua de insulina ter comprovação de eficácia médica, não há autorização legal expressa para que as operadoras excluam essa cobertura de seus planos.

13/11/2024  

Com a decisão – que muda o entendimento do colegiado sobre o tema –, a turma manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que condenou uma operadora a cobrir o tratamento domiciliar com sistema de infusão contínua de insulina para um adolescente diagnosticado com diabetes tipo 1.

“O sistema de infusão contínua de insulina, quando corretamente prescrito, beneficia o paciente, ao lhe proporcionar o tratamento mais adequado e eficiente, e a própria operadora do plano de saúde, ao evitar o custo do tratamento das complicações agudas e crônicas da diabetes mellitus tipo 1″, afirmou a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi.

Para relatora, estudos científicos comprovam eficácia da bomba de insulina

No recurso ao STJ, a operadora alegou que o fato de o médico indicar o tratamento com a bomba como o mais adequado não atribui ao produto certeza científica suficiente para tornar a cobertura compulsória. Ainda segundo a recorrente, a Lei 14.454/2022 não afastou as previsões normativas que excluem da cobertura medicamentos de uso domiciliar e órteses que não sejam ligadas a ato cirúrgico.

A ministra Nancy Andrighi comentou que, especialmente depois de 2018, vários estudos científicos passaram a demonstrar os benefícios clínicos da utilização da bomba de insulina para pacientes com diabetes: melhora do controle da glicemia, diminuição da necessidade de injeções e redução de casos de internação em razão da doença, entre outros.

“Reforçam essa ideia as diversas notas técnicas emitidas, recentemente, pelo NatJus Nacional, divulgadas pelo Conselho Nacional de Justiça, confirmando a existência de evidências científicas e com manifestação favorável ao fornecimento específico do sistema de infusão contínua de insulina e seus insumos”, completou.  

Bomba de insulina não se classifica como medicamento nem órtese

Nancy Andrighi reconheceu que, como alegou o plano de saúde, a Lei 9.656/1998, em regra, não obriga as operadoras a custearem remédios para tratamento domiciliar e órteses não relacionadas a intervenções cirúrgicas.

Por outro lado, a ministra ressaltou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) registra as bombas de insulina como “produtos para a saúde”, classificação esta que não se confunde com a dos medicamentos, conforme a RDC 751/2022 da agência reguladora. Do mesmo modo, ela apontou que a Anvisa não classifica a bomba de insulina entre as órteses, definidas como um material permanente ou transitório que auxilia as funções de partes do corpo humano.

De acordo com Nancy Andrighi, a análise quanto à obrigatoriedade do fornecimento da bomba, por ser tratamento não elencado no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), deve observar os parâmetros estabelecidos pela Segunda Seção do STJ no julgamento dos EREsps 1.886.929 e 1.889.704, ou aqueles trazidos pela Lei 14.454/2022 – a qual incluiu o parágrafo 13 no artigo 10 da Lei 9.656/1998, seguindo a orientação da Segunda Seção no julgamento do REsp 2.038.333.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

Se o serviço é global, também poderá ser mundial o alcance da ordem judicial brasileira específica de indisponibilidade de conteúdo que seja considerado ilegal.

Internet é global.

13 de novembro de 2024

Vídeo difamatório contra empresa foi derrubado no Brasil, mas seguiu disponível em outros países

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento a um recurso especial do Google, que foi obrigado a derrubar um vídeo publicado no YouTube em todos os países em que o conteúdo está disponível.

Trata-se do primeiro precedente do STJ sobre o tema, o que gerou debates sobre os limites de jurisdição e o alcance da ordem quando se trata de serviço prestado globalmente pela internet.

A votação foi por 3 votos a 2. Prevaleceu a posição da ministra Nancy Andrighi, acompanhada pelos ministros Humberto Martins e Moura Ribeiro. Ficaram vencidos os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze.

YouTube é mundial

O caso trata de um vídeo que mostra empregados de uma empresa de alimentos diante de uma infestação de ratos em seus produtos. O conteúdo é falso e foi alvo de ordem de retirada junto ao Google, que é a empresa controladora do YouTube.

Ao analisar o caso, o Tribunal de Justiça de São Paulo ampliou a eficácia da decisão para toda a internet por entender que, em se tratando de realidade virtual, não podem ser invocados limites territoriais.

O Google levou o caso ao STJ para defender que o alcance da decisão extrapola a lei federal brasileira e tem potencial para violar a soberania de países estrangeiros.

Para Andrighi, se o serviço do YouTube é global, também pode ser mundial a ordem judicial de derrubada de conteúdo

Tendência mundial

Segundo a ministra Nancy Andrighi, o artigo 11 do Marco Civil da Internet desdobrou a jurisdição brasileira com caráter transfronteiriço ao apontar que a aplicação da lei brasileira depende apenas que os dados sejam coletados no território nacional.

No caso dos autos, há indicações de que o vídeo difamatório segue acessível a usuários do YouTube em outros países, o que atesta que a ordem de indisponibilidade apenas no Brasil foi insuficiente.

Assim, se a ordem de indisponibilidade de conteúdo é fundamentada em leis brasileiras, sua efetivação para além das fronteiras é um efeito natural, diante do caráter global que permeia o uso da internet, disse a ministra.

“Se o serviço é global, também poderá ser mundial o alcance da ordem judicial específica de indisponibilidade do conteúdo infrator. Inexiste ofensa, em tese, à soberania estrangeira na efetivação de forma global de uma ordem judicial civil especifica”, disse a ministra Nancy.

Extensão indevida

Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, para quem a extensão do alcance é indevida. Ele baseou sua argumentação no artigo 4º da Constituição Federal, que rege os princípios para as relações internacionais brasileiras.

Em sua análise, decisões locais que pretendam produzir efeitos globais, em regra, interferem indevidamente no exercício da jurisdição dos demais países.

Assim, esse alcance pretendido dependeria de coordenação do exercício da jurisdição entre os países, tarefa atribuída ao Direito Internacional Privado.

“Decisões que determinam o bloqueio de um conteúdo em âmbito global, ainda que pautadas em juízo de equidade e eficiência, propiciam cenário de instabilidade jurídica, criando relevante precedente para futuros casos e conferindo eficácia extraterritorial a decisões sem amparo legal”, avaliou.

Ao acompanhar a divergência, o ministro Marco Aurélio Bellizze opinou que a questão não estaria madura o suficiente para ser definida pelo Judiciário e levantou uma questão: qual seria medida cabível para coibir descumprimento dessa decisão?

“E se mandarmos tirar aqui e eles não cumprirem lá? Se a gente tem a força (para dar a ordem), mas não tem a arma (para fazê-la cumprir), eu tenho dificuldade (em admitir esse tipo de decisão).

REsp 2.147.711

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: STJ

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que a possibilidade de um terceiro cumprir obrigação que cabe ao executado, prevista no artigo 817 do Código de Processo Civil (CPC), exige a sua anuência, pois não pode ser determinada pela Justiça.

12/11/2024

Com esse entendimento, o colegiado afastou decisão que impôs ao município de Guarulhos (SP) o cumprimento de obrigação de responsabilidade da proprietária de uma área desmatada. Tanto o ente público quanto a particular foram alvos de uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público de São Paulo, na qual o primeiro foi condenado a controlar e fiscalizar o local degradado, enquanto a proprietária deveria realizar ações para restaurar a vegetação – entre elas, a demolição de uma obra.

O município cumpriu a sua parte, mas a particular não adotou as medidas necessárias. O Ministério Público, então, alegou que o artigo 817 do CPC possibilitaria exigir que um terceiro – no caso, o município – cumprisse a obrigação às custas da particular. O pedido foi atendido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), o que levou o ente público a recorrer ao STJ.

Município não pode ser forçado a cumprir obrigação que não é sua

Para o relator do caso, ministro Gurgel de Faria, o tribunal paulista violou a norma do CPC. “O comando normativo em discussão não permite obrigar o terceiro a cumprir obrigação pela qual não é responsável, mas sim faculta essa opção”, disse.

A regra do artigo 817, observou, estabelece que, “se a obrigação puder ser satisfeita por terceiro, é lícito ao juiz autorizar, a requerimento do exequente, que aquele a satisfaça à custa do executado”. Na avaliação do ministro, nesse caso, deve haver tanto a anuência do exequente como também a do terceiro, uma vez que o texto legal usa a expressão “puder” (em vez do verbo “dever”) e “autorizar” (em vez dos verbos “determinar” ou “requisitar”).

Gurgel de Faria também verificou que o dispositivo legal não prevê sanção para o caso de o terceiro deixar de cumprir tal obrigação de fazer, o que, na sua análise, evidencia que a aquiescência é indispensável, pois, do contrário, seria uma norma jurídica sem imperatividade.

AREsp 2.279.703.

Não tem jeito: toda história de amor traz consigo uma dose de burocracia antes do tão esperado “sim”. Para além da cerimônia, das alianças e da papelada exigida para formalizar a união, as providências para a realização de um matrimônio podem incluir também um pacto antenupcial. Mas o que é esse documento e por que ele é importante?

11/11/2024

O pacto antenupcial é um contrato feito pelos futuros cônjuges para definir as regras que vão incidir sobre o patrimônio do casal após o casamento. Se o acordo não for feito, o regime legal padrão do matrimônio será o da comunhão parcial de bens, conforme o artigo 1.640 do Código Civil. Nesse regime, os bens anteriores ao casamento continuam pertencendo a quem os adquiriu. Já os adquiridos ao longo da união devem ser compartilhados e, em caso de divórcio, divididos igualmente.

Por outro lado, se os noivos optarem por um regime de bens diferente do padrão, o pacto antenupcial será obrigatório. Isso significa dizer que ele deve ser firmado quando o casal decidir pelos regimes de separação convencional, comunhão universal ou participação final nos aquestos, ou ainda por um regime misto. A ausência desse contrato quando ele for obrigatório tornará nulo o regime de bens escolhido na época do casamento, aplicando-se automaticamente a comunhão parcial.

Os artigos 1.653 a 1.657 do Código Civil descrevem os requisitos para que o pacto seja válido: ele deve ser registrado por escritura pública e o casamento precisa ocorrer. Se não for registrado corretamente, o contrato será nulo. Se não houver o casamento, será considerado ineficaz. A jurisprudência, no entanto, já admite sua aplicação às uniões estáveis, como em alguns casos que serão detalhados adiante.

O pacto não se limita à regulação patrimonial e pode incluir cláusulas não patrimoniais ou indenizatórias, desde que não violem a dignidade e os direitos e garantias fundamentais dos cônjuges.

Muitas discussões sobre os termos do pacto antenupcial chegam ao Judiciário. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu casos envolvendo seus efeitos em segundos casamentos e os possíveis impactos do contrato após a morte de um dos cônjuges. A seguir, algumas decisões emblemáticas do tribunal.

Obrigatoriedade do pacto para regime de bens diferente da comunhão parcial

Com a entrada em vigor da Lei 6.515/1977 (Lei do Divórcio), o pacto antenupcial passou a ser obrigatório para o casal que escolhe um regime de bens diferente da comunhão parcial. Essa interpretação foi adotada pela Terceira Turma no julgamento do REsp 1.608.590, relatado pelo ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, em uma ação de divórcio cuja autora buscava manter o regime de comunhão universal registrado na certidão de casamento.

A mulher argumentou que o matrimônio ocorreu em 1978, durante a vigência do Código Civil de 1916, que adotava a comunhão universal de bens como regime legal. Ela alegou que, na época, não era comum os cartórios registrarem outros tipos de regimes de bens. Embora o matrimônio tenha sido celebrado sob o Código Civil de 1916, ele ocorreu após a publicação da Lei do Divórcio, que especificava que, na ausência de manifestação dos cônjuges, o regime seria a comunhão parcial.

No julgamento, o colegiado também discutiu a partilha de bens recebidos por herança durante o casamento. Os ministros decidiram que, após a confirmação do regime de comunhão parcial, os bens recebidos por herança, legado ou doação, antes ou durante a união, não seriam partilhados.

Ao negar provimento ao recurso da mulher, o relator concluiu que a partilha deveria se limitar aos bens resultantes do esforço comum dos cônjuges desde o início do casamento até a separação de fato, em 2004, quando o regime patrimonial foi extinto.

Pacto só pode ser modificado com manifestação expressa dos cônjuges

No REsp 1.706.812, também de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Terceira Turma decidiu que o regime jurídico da separação convencional de bens estabelecido voluntariamente no pacto antenupcial é imutável, a não ser que haja manifestação expressa de ambos os cônjuges.

Na origem do caso, uma mulher ajuizou ação pleiteando o reconhecimento da existência de sociedade de fato entre ela e o então marido. Ambos eram casados pelo regime da separação total. Ela alegou que seu trabalho teria contribuído para o sucesso das empresas pertencentes à família do ex-marido, devendo, por isso, ser considerada sócia de fato e ficar com 50% dos negócios.

O juízo de primeira instância negou o pedido da autora, decisão que foi reformada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). De acordo com a corte, a ausência de contrato social não impede o reconhecimento da existência de sociedade de fato com terceiros que atuam em comunhão de esforços, com o objetivo de concretizar um bem comum.

Ao restabelecer a sentença, o ministro Cueva explicou que não se poderia falar em sociedade de fato se o regime adotado era o da separação convencional de bens, principalmente não havendo registro escrito capaz de comprovar a existência da sociedade entre o ex-casal, já que este é um requisito indispensável para a configuração da sociedade de fato.

Pacto antenupcial pode se aplicar à união estável

A lei faz menção expressa ao casamento como requisito de eficácia do pacto antenupcial. Entretanto, a jurisprudência do STJ entende que o instrumento é aplicável às uniões estáveis.

No julgamento do AREsp 2.064.895, interposto em ação de dissolução de união estável, a Quarta Turma analisou um caso em que o recorrente buscava a declaração de ineficácia do pacto antenupcial que estabelecera o regime da separação total. Segundo alegou a parte, o pacto estaria vinculado ao casamento – o qual nunca ocorreu – e, por isso, deveria ser considerado ineficaz.

O tribunal do estado decidiu que, ainda que o matrimônio não tenha se concretizado, o pacto antenupcial celebrado pelas partes, de forma livre e consciente, deveria reger a união estável ocorrida após a sua celebração, pois traduziria a manifestação clara de como os conviventes pretendiam seguir a relação.

O relator do recurso no STJ, ministro Raul Araújo, manteve integralmente o acórdão estadual por avaliar que o pacto antenupcial detém validade no âmbito da união estável, para fins de definição do regime de bens no período da convivência.

De acordo com o ministro, um pacto realizado por escritura pública, ainda que não tenha sido seguido pelo casamento, deve ter sua eficácia aproveitada como um contrato de convivência, devendo reger a união para a qual foi celebrado.

Pacto escrito tem efeito imediato na união estável, mesmo antes do casamento

Com relação ao momento em que o pacto antenupcial começa a produzir efeitos, a Quarta Turma, no julgamento do REsp 1.483.863, fixou o entendimento de que o contrato que estabelece o regime de bens de um casamento passa a regular imediatamente os atos posteriores a ele ocorridos entre o casal, devendo reger, desde a sua celebração, a união estável pré-matrimonial.

O processo envolvia um casal que havia se relacionado em três momentos distintos, adotando regimes de bens diferentes em cada um deles. Primeiro, casaram-se sob comunhão universal; depois do divórcio, voltaram a viver em união estável por quatro anos; e, após esse período, decidiram se casar novamente, dessa vez no regime da separação total.

O pacto antenupcial relativo ao segundo casamento foi assinado na vigência da união estável, cerca de um ano e três meses antes do matrimônio. A recorrente alegou que o contrato escrito de convivência não se confundiria com pacto antenupcial, o qual somente passaria a ter eficácia a partir do casamento.

A controvérsia do recurso era definir o regime de bens que deveria ser aplicado durante o período final da união estável, após a celebração do pacto antenupcial que precedeu o segundo casamento pelo regime da separação total.

A primeira instância entendeu que a união estável não estava configurada, ao passo que o tribunal estadual reconheceu a união antes do segundo casamento, limitando a meação aos bens adquiridos pelo casal desde o início da união até a data da celebração do pacto antenupcial.

No STJ, a relatora, ministra Isabel Gallotti, esclareceu que, embora o pacto somente previsse vigência a partir do casamento, ele já atendia, desde a data em que foi firmado, ao único requisito exigido no artigo 1.725 do Código Civil de 2002 para disciplinar validamente a relação patrimonial de forma diversa da comunhão parcial entre os conviventes de uma união estável: ser um contrato escrito. Dessa forma, a ministra concluiu pela aplicabilidade imediata do regime de separação total de bens a partir de sua celebração.

Termos do pacto firmado na vigência da união estável devem ser respeitados

Entendimento semelhante foi adotado no julgamento do REsp 1.590.811, de relatoria do então desembargador convocado do Tribunal Regional Federal da 5ª Região Lázaro Guimarães. O magistrado explicou que, conforme disposição contida no artigo 5º da Lei 9.278/1996 e no artigo 1.725 do Código Civil, a comunhão parcial de bens é o regime que se aplica à união estável, salvo quando os conviventes decidem em sentido diverso, sendo a forma escrita o único requisito exigido.

Um casal que vivia em união estável firmou pacto antenupcial definindo que o regime patrimonial do futuro casamento seria o da separação total. O pacto, além de prever o futuro regime de bens, regulava, por escrito e com efeitos imediatos, a relação existente na época. Como o casamento não ocorreu, o homem pleiteou o reconhecimento da ineficácia do pacto e a incidência do regime de comunhão parcial durante o período da união.

O tribunal de origem concluiu, no entanto, que o pacto antenupcial firmado entre os conviventes, além de adotar o regime da separação total, tratou de regras patrimoniais relativas à própria união estável, registrando a ausência de interesse na constituição de esforço comum para formação de patrimônio em nome do casal e mantendo o regime de bens original.

No STJ, a Quarta Turma decidiu que, independentemente do nome atribuído ao negócio jurídico, as disposições estabelecidas no contrato com o objetivo de disciplinar o regime de bens da união estável, ainda que contidas em pacto antenupcial, deveriam ser respeitadas, especialmente porque atenderam à forma escrita, único requisito exigido para contemplar regime de bens diverso do legal.

Por fim, o colegiado constatou que a regra da comunicabilidade dos bens deveria, de fato, permanecer afastada, para ceder espaço ao regime da separação total escolhido pelos conviventes desde a celebração do pacto até a efetiva dissolução da união.

Regime de separação obrigatória permite pacto antenupcial mais restritivo

Com relação ao regime de separação obrigatória de bens, previsto no artigo 1.641 do Código Civil, a Quarta Turma decidiu, no julgamento do REsp 1.922.347, sob relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, que é possível os cônjuges firmarem um pacto antenupcial de separação total dos bens, afastando, assim, a aplicação da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal (STF).

Um casal, ao firmar o pacto antenupcial em 2014, declarou que vivia em união estável desde 2007. Na época do pacto, ele tinha 77 anos e ela, 37, o que os sujeitou ao regime da separação obrigatória. Além disso, o casal optou espontaneamente por termos ainda mais restritivos, por meio do pacto antenupcial de separação total de bens.

O processo teve origem em pedido de inventário ajuizado pela viúva. O juízo de primeiro grau atendeu à impugnação de uma herdeira do falecido marido para excluí-la da meação e da partilha dos bens e removê-la da inventariança. O tribunal do estado, no entanto, apesar de reconhecer o caráter restritivo do pacto antenupcial, manteve a viúva na função de inventariante.

Ao julgar o caso, o STJ atendeu ao pedido da herdeira para remover a viúva de seu pai do processo de inventário. A decisão também afastou a aplicação da Súmula 377 do STF, que permite a divisão dos bens adquiridos durante o casamento no regime da separação obrigatória. Para a Quarta Turma, o pacto com cláusulas mais restritivas é considerado válido, tanto para casamentos quanto para uniões estáveis.

Regime de separação total não interfere no direito sucessório

Nas sucessões em que não há descendentes ou ascendentes – na hipótese do artigo 1.829, III, do Código Civil –, a Terceira Turma entendeu que o regime de separação total de bens fixado no pacto antenupcial não impede o cônjuge sobrevivente de ser considerado herdeiro necessário.

Na origem do caso julgado no REsp 1.294.404, de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva,  um casal firmou pacto antenupcial com regime de separação total, exigência prevista no Código Civil de 1916, vigente na época do casamento. Quando a esposa faleceu, sem deixar filhos, ela beneficiou, em testamento público, a irmã e os sobrinhos com a parte disponível de seus bens.

Aberto o inventário, o viúvo teve seu pedido de habilitação negado pelo juiz de primeira instância. A decisão foi reformada pelo tribunal estadual, para o qual ele deveria ser considerado herdeiro necessário da falecida, independentemente do regime de bens estabelecido no casamento, conforme o artigo 1.829 do Código Civil.

Ao negar o recurso que pedia o afastamento do viúvo da condição de herdeiro necessário, o ministro Cueva esclareceu que o pacto antenupcial que estabelece o regime de separação total somente pode dispor sobre a incomunicabilidade de bens durante o casamento, não podendo invadir a seara do direito sucessório. Segundo explicou o ministro, essa incomunicabilidade não produz efeitos após a morte, uma vez que não existe no ordenamento jurídico brasileiro previsão de ultratividade do regime patrimonial, apta a lhe emprestar eficácia póstuma.

“A opção dos cônjuges pelo regime de separação de bens pode se dar pelos mais diversos motivos, entre os quais uma maior facilidade na administração do patrimônio de cada um ou prevenir a sua eventual redução em caso de divórcio, não cabendo projetar a ausência de meação na seara sucessória. Não se pode presumir que o pacto antenupcial nesse sentido seja fruto do desejo dos nubentes em perpetuar a intransmissibilidade entre seus patrimônios”, concluiu Villas Bôas Cueva.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1608590REsp 1706812AREsp 2064895REsp 1483863REsp 1590811REsp 1922347REsp 1294404

Fonte: STJ 

Salvo se houver previsão em cláusula contratual, o legislador expressamente excluiu da operadora a obrigação de garantir a cobertura de tratamentos ou procedimentos realizados no exterior.

11 de novembro de 2024

Após diagnóstico de câncer de mama, médicos recomendaram exame feito nos Estados Unidos, mas plano de saúde não custeou

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial de uma operadora de plano de saúde, desobrigando-a a arcar com R$ 14,2 mil de custeio de um exame feito nos Estados Unidos.

O procedimento foi recomendado pelos médicos e consiste em estudo genético com o objetivo de minimizar os riscos do tratamento do câncer de mama, fazendo com que o tratamento a ser seguido seja o mais seguro possível.

A operadora do plano de saúde recusou a cobertura. A beneficiaria então pagou os R$ 14,2 mil a ajuizou ação para cobrar o valor e conseguiu decisões favoráveis nas instâncias ordinárias.

O Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que a negativa foi abusiva porque privou a paciente de avanços tecnológicos e que podem preservar seu bem maior, a vida.

Ao STJ, a operadora do plano de saúde sustentou que não tem obrigação para arcar com procedimento feito fora do Brasil, já que a “a área geográfica de ação do plano é clara e objetiva, não havendo contratação para cobertura no exterior.

Limites brasileiros

Relatora do recurso especial, a ministra Nancy Andrighi deu razão à operadora. Apontou que o artigo 10 da Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/1998) obriga as operadoras a cobertura de partos e tratamentos realizados exclusivamente no Brasil.

E que, conforme o artigo 16, inciso X, a área geográfica de abrangência corresponde à área em que a operadora fica obrigada a garantir todas as coberturas de assistência à saúde contratadas, “podendo ser nacional, estadual, grupo de estados, municipal ou grupo de municípios”.

“Assim, salvo se houver previsão em cláusula contratual, o legislador expressamente excluiu da operadora a obrigação de garantir a cobertura de tratamentos ou procedimentos realizados no exterior”, concluiu a relatora. A votação foi unânime.


REsp 2.167.934

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur

Reunião discutirá aspectos ligados à saúde mental dos apostadores

11/11/2024

O Supremo Tribunal Federal (STF) realiza nesta segunda-feira (11) audiência pública para debater o mercado de apostas online (bets) no Brasil. A audiência foi convocada pelo ministro Luiz Fux, relator do processo sobre a questão. A partir das informações coletadas na audiência, Fux vai elaborar o voto e liberar o processo para julgamento. A data da votação não foi definida.

A abertura da audiência está prevista para as 10h20 e será iniciada com a exposição dos argumentos da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), autora da ação.

Em seguida, vão falar o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, a ministra dos Direitos Humanos e Cidadania, Macaé Evaristo, e representantes das pastas da Igualdade Racial, da Saúde e do Desenvolvimento Social, além do secretário de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, Régis Dudena.

A partir das 14h, a audiência terá enfoque nos aspectos econômicos das apostas eletrônicas. Terão a palavra os representantes do Banco Central, Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), das loterias estaduais do Paraná e do Rio de Janeiro e da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

Os aspectos ligados à saúde mental dos apostadores serão debatidos com representantes da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (Abead).

As entidades que representam o setor, como o Instituto Brasileiro do Jogo Responsável (IBJR) e a Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), também vão participar.

Na terça-feira (12), os debates vão continuar e contarão com os representantes do Fluminense, Botafogo e Cruzeiro. Praticamente, todos os times brasileiros são patrocinados por casas de apostas online.

A regulamentação do mercado de bets no Brasil é discutida no Supremo por meio de uma ação direta de inconstitucionalidade protocolada no dia 24 de setembro pela CNC. 

A entidade questiona a Lei 14.790/2023, norma que regulamentou as apostas online de quota fixa. Na ação, a CNC diz que a legislação, ao promover a prática de jogos de azar, causa impactos negativos nas classes sociais menos favorecidas. Além disso, a entidade cita o crescimento do endividamento das famílias.

De acordo com levantamento divulgado em agosto deste ano pelo Banco Central, os beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em bets.

*André Richter – Repórter da Agência Brasil

Fonte: Agência Brasil

Por Alberto Murray.

08/11/2024

Assunto escolhido pelo público no Instagram.

O novo vídeo do “Eproc – Sem Dúvida”, publicado hoje (8), responde à questão “Modelos gerados pelas varas no SAJ migrarão para o eproc?”, que recebeu 51% dos votos em enquete realizada no Instagram do Tribunal de Justiça de São Paulo (www.instagram.com/tjspoficial). O juiz assessor da Presidência na área de Tecnologia da Informação, Cristiano de Castro Jarreta Coelho, explica que, embora os documentos salvos dentro do SAJ sejam incompatíveis com a engenharia do eproc, os modelos de textos pessoais de juízes e servidores poderão ser exportados, conforme orientações futuras. Assista ao vídeo.

Lançada em setembro, a campanha “Eproc – Sem Dúvida” responde às principais questões sobre a mudança de sistema, com participação dos próprios usuários na escolha do assunto. Confira todos os vídeos no Youtube,  nos destaques do Instagram, no site do TJSP ou na intranet e continue participando da campanha!

Fonte: Comunicação Social TJSP – imprensatj@tjsp.jus.br

Justiça condena empresa por assédio moral e discriminação racial, reforçando o papel das organizações na criação de ambientes de trabalho respeitosos

08 de Novembro de 2024

Recentemente, um caso de assédio moral no Rio Grande do Sul trouxe à tona questões importantes sobre discriminação e respeito no ambiente de trabalho. Um trabalhador de uma empresa de engenharia foi indenizado após ser chamado de “negão gordo” pelo supervisor, sendo alvo de ofensas raciais e físicas que caracterizam assédio moral. A decisão judicial, que estipulou uma indenização de R$ 9,7 mil, destaca a necessidade de um ambiente de trabalho livre de discriminação e o papel das empresas na prevenção de práticas abusivas.

Justiça reconhece assédio moral e discriminação racial

O juiz do Trabalho Lucas Pasquali Vieira, da 1ª Vara do Trabalho de Canoas, reconheceu a gravidade das ofensas raciais e físicas dirigidas ao empregado e determinou a indenização por assédio moral. O caso se destaca pelo contexto de “racismo recreativo” — expressão utilizada para descrever situações em que comentários racistas são feitos de forma aparentemente descontraída, mas com impacto prejudicial.

Além das ofensas raciais, o trabalhador era constantemente chamado de “gordo” por seu superior, caracterizando uma forma de discriminação por condição física. O juiz ressaltou que o assédio moral se configura especialmente quando as práticas abusivas ocorrem de forma sistemática e partem de uma posição hierárquica superior.

Interseccionalidade e responsabilidade judicial

Em sua decisão, o magistrado mencionou a interseccionalidade de vulnerabilidades no caso. O trabalhador sofria preconceitos múltiplos, tanto por questões raciais quanto físicas, situação que agrava o impacto do assédio. Segundo o juiz, é dever do Poder Judiciário enfrentar opressões que envolvem raça, gênero, classe e outras características, buscando promover a equidade no ambiente de trabalho.

O magistrado destacou que a empresa falhou em assegurar um ambiente de trabalho respeitoso e livre de discriminação, o que configura uma violação dos direitos do empregado. A decisão baseou-se nos artigos 186 e 927 do Código Civil, que asseguram a responsabilização civil em casos de danos morais e violação de direitos fundamentais do trabalhador.

O papel das empresas na prevenção ao assédio moral e racial

A decisão judicial é um alerta para empresas de todos os setores sobre a importância de implementar políticas de prevenção ao assédio moral e de combate à discriminação racial. Embora a empresa do caso possuísse um canal de denúncias, o trabalhador sentiu receio de utilizá-lo por medo de retaliações. Esse fator, segundo o juiz, reflete a falta de um ambiente seguro para que os colaboradores possam relatar abusos sem temer represálias.

É essencial que as empresas capacitem suas lideranças para agir com respeito e igualdade, evitando a perpetuação de comportamentos discriminatórios. Além disso, a criação de canais confiáveis para denúncias de assédio é crucial para que os funcionários possam relatar episódios de abuso com segurança.

O impacto da decisão na proteção dos direitos trabalhistas

A decisão destaca o compromisso do Judiciário em defender os direitos dos trabalhadores, assegurando que o assédio moral e a discriminação não sejam tolerados. Esse tipo de condenação serve como um precedente importante, incentivando outros trabalhadores a denunciarem práticas abusivas e mostrando às empresas a necessidade de adotar políticas rigorosas contra o assédio.

Decisões como essa reforçam o entendimento de que o ambiente de trabalho deve ser um local seguro, livre de discriminação e de ameaças à dignidade dos colaboradores. A indenização por assédio moral nesse caso é um passo importante para garantir que práticas ofensivas, especialmente aquelas ligadas ao racismo e preconceito físico, sejam enfrentadas com seriedade pela Justiça.

Conclusão

A condenação de uma empresa por assédio moral e discriminação racial destaca a importância da criação de ambientes de trabalho éticos e respeitosos. A indenização por assédio moral não apenas compensa o trabalhador, mas também serve como um alerta para empregadores, reforçando a necessidade de políticas de prevenção ao assédio e à discriminação. O caso mostra que a Justiça está atenta às formas de opressão que ocorrem no cotidiano das empresas e que a luta por igualdade e respeito no ambiente de trabalho segue avançando.

Fonte: Jornal Jurid