Empresas pagarão mais de R$ 700 mil por consumarem operação antes do aval da autarquia

 

06/06/2024

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O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) homologou, durante a sessão de julgamento desta quarta-feira (05/06), um acordo com as empresas Vanz Holding, SZ Participações Societárias e Indústria e Comércio de Couros Britali por consumarem operação antes do aval da autoridade antitruste brasileira, prática conhecida como gun jumping.  

O Procedimento de Apuração de Ato de Concentração (Apac) foi instaurado em dezembro de 2023 para verificar se a criação de uma joint venture (Gelprime) entre o Grupo Vancouros, o Grupo Viposa e a Britali foi feita antes de ser aprovada pelo Cade. O novo negócio é dedicado à produção, comercialização e distribuição de gelatina de origem bovina, cujos principais insumos são os subprodutos do processo produtivo do couro, fornecidos integralmente pelas representadas.  

A operação foi submetida espontaneamente para avaliação da autarquia em dezembro de 2023. No formulário de notificação, as empresas informaram que o negócio foi formalizado em julho de 2019 e as atividades da Gelprime se iniciaram no final de 2022. No mesmo documento, reconhecem que a não submissão prévia à aprovação do Cade poderia implicar na abertura de um Apac.  

Conforme estabelecido pela da Lei nº 12.529/2011, é obrigatória a submissão ao Cade de atos de concentração nos quais um dos grupos envolvidos tenha registrado um faturamento bruto igual ou superior a R$ 750 milhões no Brasil no ano anterior à operação, e o outro grupo relacionado ao negócio também tenha registrado valores iguais ou superiores a R$ 75 milhões de faturamento bruto no Brasil no mesmo período. Operações que se enquadrem nesse critério de faturamento não podem ser consumadas antes de receberem o aval da autoridade antitruste, que avalia potenciais riscos à livre concorrência gerados por atos de concentração.  

O acordo entre as empresas e o Cade foi levado à apreciação do Tribunal Administrativo pelo conselheiro Diogo Thomson de Andrade, relator do caso. Para o cálculo da multa de gun jumping, o conselheiro considerou que a estipulação do valor de operação – em se tratando de joint ventures – deve considerar os ativos tangíveis e intangíveis necessários para a operacionalização do empreendimento, levando em conta as particularidades de cada caso. A partir desta análise baseada na Resolução n° 24 do Cade, o conselheiro avaliou a evolução dos instrumentos contratuais apresentados, entendendo que alterações no capital social da joint venture subsequentes à data de consumação da operação podem ser entendidas, no caso específico, como elementos para a quantificação do valor da operação. 

Pela infração, as empresas se comprometeram a recolher ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos contribuição de cerca de R$ 700 mil.   

Fonte: CADE

As empresas que pediram a recuperação judicial antes da entrada em vigor da Lei 14.112/2020, que alterou a Lei de Recuperação Judicial e Falência (Lei 11.101/2005), precisam fazer a regularização fiscal antes de obter a homologação do plano aprovado pelos credores. E cabe ao juiz determinar um prazo razoável para isso.

6 de junho de 2024

Antes de homologar o plano de recuperação judicial, tribunal deu 90 dias para empresa obter regularidade fiscal

Essa conclusão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento ao recurso especial de uma empresa que fez o pedido de soerguimento e esperava homologar o plano sem precisar regularizar suas dívidas tributárias.

Nesse julgamento, o colegiado, por unanimidade de votos, aderiu à conclusão já adotada pela 4ª Turma do STJ sobre o tema. O caso trata da aplicação do artigo 57 da Lei de Recuperação Judicial e Falência.

A norma exige a apresentação de certidões negativas de débitos tributários após a aprovação do plano de recuperação judicial pela assembleia de credores para que o processo de soerguimento seja homologado pelo juízo e, enfim, iniciado.

Agora pode exigir

Essa exigência vinha sendo afastada pelo Judiciário porque ela se mostrava simplesmente inviável. As empresas em crise financeira quase sempre têm grandes dívidas tributárias, que geralmente se tornam insanáveis, a ponto de inviabilizar a recuperação judicial.

O cumprimento dessa obrigação só se tornou possível a partir da entrada em vigor da Lei 14.112/2020, que autorizou as devedoras a fazer transação tributária com condições atrativas, como desconto sobre correção, juros, multa e encargos, e com prazos mais amplos para parcelamento, entre 120 e 145 meses.

Essa situação fez a 3ª Turma do STJ concluir que o artigo 57 da Lei de Recuperação Judicial e Falência se tornou aplicável. Agora a 4ª Turma concordou com essa tese e, posteriormente, avançou para fixar que a posição vale para todas as recuperações judiciais ainda não homologadas quando a lei de 2020 entrou em vigor.

Relator do caso julgado pela 4ª Turma, o ministro Marco Aurélio Bellizze observou que a regularidade fiscal é exigência para a homologação do plano pelo juiz, não para o ajuizamento do pedido ou para seu deferimento.

Prazo razoável

“Nesse contexto, conclui-se que a comprovação da regularidade fiscal da empresa em soerguimento é condição apenas à homologação judicial do plano e à concessão da recuperação judicial, sendo este o marco para fins de incidência da Lei 14.112/2020”, disse o magistrado.

Portanto, nos casos em que estava pendente a homologação do plano quando a nova lei entrou em vigor, cabe ao juiz conferir prazo razoável para a empresa devedora obter a regularidade fiscal.

No caso julgado pela 4ª Turma, as instâncias ordinárias inicialmente deram prazo de cinco dias para a regularização, posteriormente ampliado para 90 dias. Esse tempo foi considerado razoável pela 3ª Turma.

REsp 2.127.647

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur

Apesar de ter natureza alimentar, a verba dos honorários de sucumbência não se enquadra nas exceções previstas pela lei para autorizar a penhora do salário do devedor.

6 de junho de 2024

Relatório, laudo, perícia, escritório de advocacia

Advocacia ainda poderá penhorar parte do salário do devedor de honorários em situações excepcionais

A conclusão é da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que fixou tese sob o rito dos recursos repetitivos, em julgamento encerrado na tarde desta quarta-feira (5/6).

Os honorários de sucumbência são aqueles que são devidos aos advogados da parte vencedora de um processo e deve ser pagos pela parte perdedora.

O resultado confirma a posição do colegiado firmada em 2020 e inviabiliza a possibilidade automática de penhorar o salário de alguém para pagamento de honorários, mas não a impede totalmente.

Isso porque o próprio STJ e o restante do Judiciário têm admitido a penhora de salários para pagamento de dívidas não alimentares, desde que o percentual penhorado não comprometa a subsistência do devedor.

A tese aprovada foi a proposta pelo relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva

A verba honorária sucumbencial, a despeito de sua natureza alimentar, não se enquadra na exceção prevista no parágrafo 2º do artigo 833 do Código de Processo Civil (penhora para pagamento de prestação alimentícia)

Votaram com o relator e formaram a maioria os ministros João Otávio de Noronha, Nancy Andrighi, Herman Benjamin, Herman Benjamin, Og Fernandes, Benedito Gonçalves e Isabel Gallotti.

Não pode penhorar

A penhora de salários para pagamento de dívidas não é permitida, conforme o artigo 833, inciso IV do Código de Processo Civil. No entanto, há exceções.

O parágrafo 2º diz que a penhora pode ocorrer em duas situações: para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, ou se o devedor receber mensalmente mais de 50 salários mínimos.

Para ministro Noronha, permitir penhora do salário de um para pagar o salário de outro não atende ao propósito da lei (Lucas Pricken/STJ)

Conforme a jurisprudência do próprio STJ e do Supremo Tribunal Federal, os honorários advocatícios se enquadram como verba alimentar.

Segundo o relator, ministro Villas Bôas Cueva, isso não os equipara a prestação de alimentos.

Uma verba tem natureza alimentar quando se destina à subsistência de quem a recebe e de sua família. Mas só é prestação alimentícia quando é devida por quem tem a obrigação de prestar alimentos.

Despir um santo para vestir outro

Ao acompanhar o relator, o ministro João Otávio de Noronha destacou que a exceção prevista no parágrafo 2º do artigo 833 do CPC visa proteger aquele que está em situação vulnerável, cuja dependência do salário é maior do que aquele que recebe verba de natureza alimentar.

“Permitir, como regra, a penhora do salário de um trabalhador para pagar os honorários de outro equivaleria, como diz o ditado, a despir um santo para vestir outro. Creio não ser esse propósito do legislador”, afirmou.

Em aditamento ao voto, o ministro Villas Bôas Cueva, destacou que admitir a penhora para a classe dos advogados obrigaria o Judiciário a estender a exceção aos demais profissionais liberais.

“Deve ser também sopesado que essa prerrogativa, a depender da escassez financeira do devedor, dificultará o recebimento do crédito devido ao próprio cliente que foi representado em juízo”, acrescentou.

Ambos afirmaram que, no mais das vezes, os honorários sequer são devidos aos próprios profissionais, mas sim aos escritórios, havendo posteriormente um rateio. O ministro Herman Benjamin seguiu a mesma linha em tom de crítica.

“O Brasil é o único país em que os maiores escritórios de advocacia do planeta têm seus honorários qualificados como prestação alimentícia”, disse.

Divergência

Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Humberto Martins, acompanhado dos ministros Raul Araújo, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell e Antonio Carlos Ferreira.

Para eles, a penhora de salário para pagamento de honorários pode ser justificada com base no artigo 833, parágrafo 2º do CPC.

Isso porque o termo “prestação alimentícia” não se restringe aos alimentos decorrentes de vínculo familiar e pode, também, abarcar os honorários advocatícios.

REsp 1.954.380
REsp 1.954.382

  • Por Danilo Vital – correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
  • Fonte: Conjur
Emenda foi incluída em projeto que instituiu o Programa Mover

06/06/2024

O plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (4) o projeto de lei 914/24, que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover). O texto traz incentivos financeiros e redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para estimular a pesquisa, o desenvolvimento e a produção de veículos com menor emissão de gases do efeito estufa. 

O projeto foi aprovado com uma emenda que prevê taxação de produtos importados até US$ 50, que foi incluída na Câmara dos Deputados, para onde o texto voltará para ser analisado novamente, após mudanças no conteúdo.  A mudança abrange grandes empresas varejistas internacionais que vendem pela internet, como Shopee, AliExpress e Shein.

A emenda que prevê a taxa sobre as importações havia sido retirada do projeto pelo  relator da proposta no Senado, Rodrigo Cunha (Podemos-AL), argumentando tratar-se de tema “estranho” ao conteúdo principal do projeto de lei. No entanto, os senadores votaram pela manutenção da taxação no projeto de lei. 

Foram excluídos do texto outros conteúdos estranhos ao tema inicial que haviam sido incluídos pela Câmara. Um deles é o que incluía na lei a exigência de uso de conteúdo local na exploração e escoamento de petróleo e gás. Outro trecho excluído pelo relator tratava de incentivos para a produção nacional de bicicletas.

Taxação

Pela legislação atual, produtos importados abaixo de US$ 50 (cerca de R$ 255) são isentos de imposto de importação. O relator do projeto na Câmara, deputado Átila Lira (PP-PI), incluiu a taxação de 20% de imposto sobre essas compras internacionais.

Compras dentro desse limite são muito comuns em sites de varejistas estrangeiros, notadamente do sudeste Asiático, como Shopee, AliExpress e Shein. Os varejistas brasileiros pedem a taxação dessas compras, afirmando que, sem o tributo, a concorrência fica desleal.

Programa Mover

O programa incentiva a descarbonização da indústria de veículos, inclui limites mínimos de reciclagem na fabricação e cobra menos imposto de quem polui menos, criando o IPI Verde. 

Para que tenham acesso aos incentivos, as empresas devem ter projetos aprovados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) e aplicar percentuais mínimos da receita bruta com bens e serviços automotivos na pesquisa e no desenvolvimento de soluções alinhadas à descarbonização e à incorporação de tecnologias assistivas nos veículos (que tenham como objetivo facilitar o uso para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida).

A redução do IPI e habilitação dos projetos das indústrias e montadoras do setor para acessar os incentivos financeiros já foram regulamentados em um decreto presidencial e em uma portaria do MDIC. Os incentivos, segundo o governo, estão orçados em R$ 3,5 bilhões para 2024 e somam R$ 19,3 bilhões em cinco anos. A expectativa é de que o Brasil possa passar a produzir, por exemplo, os componentes de veículos elétricos, que atualmente são importados.

*Com informações da Agência Senado

Por Agência Brasil* – Brasília

A escalada do desmatamento durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL) e as desregulamentações sobre o uso da terra e a preservação da vegetação nativa fizeram com que os anos de 2020, 2021 e 2023 registrassem os maiores números de distribuição de ações da chamada litigância climática — processos que, direta ou indiretamente, envolvem as mudanças no clima e o aquecimento global.a

5 de junho de 2024

Desmatamento de vegetação nativa, mudança indevida de uso da terra e questões de energia estão estimulam litigância climática

Os dados compilados pelo projeto Juma, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), mostram que correm na Justiça brasileira 82 processos relacionados a essa matéria. Desses, mais da metade (47) é sobre o uso da terra e florestas, e 53 (64%) deles foram distribuídos durante a gestão do capitão reformado na Presidência da República.

O setor agropecuário, por causa da supressão de vegetação, responde por nove processos de litigância do clima; já a matéria de energia é apontada em 27 processos. A maior parte deles é relacionada à concessão de áreas para exploração de petróleo e tem como polo passivo autarquias como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Agência Nacional de Petróleo (ANP).

Por causa da tragédia climática do Rio Grande do Sul, aliada a perspectivas pouco otimistas em relação ao arcabouço legal ambiental do país, a tendência é que a litigância climática cresça e abarrote ainda mais o Judiciário brasileiro. Há, no entanto, meios para conter esse avanço, e eles incluem a regulação do mercado de carbono e o aumento da eficácia do Código Florestal, conforme afirmaram os especialistas entrevistados pela revista eletrônica Consultor Jurídico sobre o tema.

A relação dos estudiosos do assunto com o Código é complexa. À época da sua aprovação, em 2012, parte dos ambientalistas se colocou de forma contrária ao projeto por enxergar excesso de permissividade, ainda que considerasse seu texto avançado. Depois da promulgação, no entanto, esse mesmo grupo passou a defender sua aplicação de forma rigorosa para tentar amenizar as perdas, o que não foi feito por nenhum governo, fosse ele mais à esquerda ou mais à direita.

Anistias e prorrogações de prazos para regularização ambiental  um dos principais pontos do Código  distorceram a eficácia da norma, que nunca foi cumprida integralmente. E todos os governos, desde a aprovação da lei, sancionaram normas para postergar os prazos de adesão à regularização ambiental (PRA), que é o instrumento mais importante para verificar o tamanho das áreas desmatadas no país. A última delas foi aprovada em junho do ano passado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

“Os fatos podem ser distorcidos, mas eles estão aí. As catástrofes estão se multiplicando. Então a natureza está respondendo da forma mais trágica possível. Esse aumento de episódios, somado à maior comunicação, informação em relação a isso, tem propiciado um alavancamento da judicialização climática”, diz o advogado e desembargador aposentado Ingo Sarlet.

Os governos estaduais também têm sua dose de responsabilidade, porque cabe a eles fiscalizar, analisar e validar os cadastros ambientais das terras.

“Essas modificações foram claramente de flexibilização de padrões. No resto dos estados e municípios também está ocorrendo essa mudança. Existe uma brecha aberta no Código Florestal no sentido de permitir que se façam ajustes na redução dos níveis de cobertura das matas ciliares, por exemplo”, afirma Sarlet, citando um ponto que tem relação com a atual situação do Rio Grande do Sul, tendo em vista que esse tipo de vegetação poderia ter ajudado a absorver a água que inundou a maior parte do estado.

Além de turvar a visão dos gestores públicos, tendo em vista que mascara a real situação da vegetação nativa no país, o não cumprimento da norma ainda reforça a negligência em relação ao desmatamento ilegal, que é o fio condutor de tragédias climáticas como a que se observa no sul do país.

“Se pensarmos em recuperação de áreas de preservação permanente, aquelas que estão nas margens dos rios, manguezais etc., existe um imenso déficit de vegetação. O Código Florestal determina a recuperação desse ativo, e ele não se dá, ou se dá em passos muito lentos, levando em conta o tamanho do desafio. São milhões de hectares”, observa o advogado Oscar Graça Couto, que lidera a área de Direito Ambiental do escritório Graça Couto Advogados.

Regulação ou morte

A política pública mais citada pelos especialistas para amenizar a ineficácia do Código Florestal  e, de alguma forma, tentar combater as mudanças climáticas e a litigância  é a regulação do mercado de emissões de carbono, cujo projeto tramita no Congresso e é relatado pela senadora Leila Barros (PDT).

De acordo com o texto, todas as empresas que possuírem atividade que emita mais de 25 milhões de toneladas de CO² por ano terão de compensar a poluição que geram com créditos de carbono (para todos os fins, cada

crédito equivaleria a uma tonelada de CO²)

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Mercado regulado de carbono pode ser solução para reduzir emissões e desatolar Judiciário da pauta climática

A criação de um mercado regulado no Brasil (hoje já existe um mercado voluntário, em que as empresas atuam por iniciativa própria) poderia equilibrar a equação que envolve desenvolvimento e preservação. O comércio regulamentado vai ampliar necessariamente a demanda por esses títulos e pode preencher uma lacuna do Código Florestal para incentivar a regulação das terras, já que, grosso modo, quem preservar será remunerado e quem poluir (ou, no caso do Brasil, desmatar) terá de compensar financeiramente o Estado.

Diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos e na Europa, que têm emissões concentradas em queima de combustíveis fósseis e geração de energia, no Brasil a emissão de gases está diretamente relacionada ao uso da terra, seja no manejo ou na agropecuária.

“Na realidade, a legislação brasileira precisa evoluir, inclusive criando dois mecanismos que são os principais instrumentos jurídicos para combater o aquecimento global: a tributação sobre o carbono e um mercado de cap and trade (mercado de emissões) no Brasil. É importante colocar preço no carbono”, diz o juiz federal Gabriel Wedy, estudioso das mudanças climáticas. “A vantagem desse imposto do carbono é que pega todos os maiores emissores.”

A falta de regulação tem gerado prejuízos ao país, tanto pela perda da oportunidade de arrecadação quanto pelos gastos que o Judiciário tem de absorver por causa de um mercado ilegal que galopa. Somente em um caso do que está sendo chamado de “grilagem de carbono” (venda ilegal de crédito), há cinco ações civis públicas ajuizadas pela Defensoria Pública do Pará na cidade de Portel.

Nesse caso, a emissão dos créditos tem relação com a preservação da vegetação nativa do terreno, o manejo sustentável e o consequente aumento de estoques de carbono na floresta. A despeito de ter sido certificado pela Verra, empresa americana conhecida por dar lastro aos créditos, a Defensoria alega que o negócio foi feito em terras públicas sem autorização (por isso o termo grilagem) do governo paraense e das comunidades ribeirinhas que ali habitam.

Esses créditos têm valores milionários e, ao serem certificados por empresas estrangeiras, passam a ter lastro para comércio. As empresas que têm de compensar suas emissões os adquirem e, em tese, colaboram para um ciclo de preservação. Porém, com esse novo modelo criminoso, não só a emissão persiste, como o que deveria ser preservado é, na verdade, grilado para interesses particulares.

A situação é tida como gravíssima pela Defensoria paraense, já que o acordo firmado pelos supostos grileiros tem duração de 30 anos. A ação, que tem valor de causa de centenas de milhões de reais, tramita na Vara Agrária de Castanhal (PA). Ainda não houve sentença.

“A maior contribuição do Brasil para o problema se dá por conta do uso alternativo do solo. Essa, no sentindo inverso, também pode ser a nossa maior contribuição positiva para o clima. Se nós interrompermos esse processo clandestino, nós vamos recuperar nosso papel, o papel das florestas (na redução da emissão de carbono), incrementando a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos”, diz Graça Couto, para quem o mercado de carbono oferecerá um estímulo para boas práticas que hoje não são adotadas.

Suprindo as omissões

O Poder Judiciário brasileiro já tomou decisões no sentido de reconhecer o direito a um ambiente equilibrado como um direito humano  criando jurisprudências como o in dubio pro natura, que respalda a inversão do ônus da prova em casos de dano ambiental (cabe à empresa comprovar que seu empreendimento não vai gerar prejuízos ao meio ambiente), e o reconhecimento de um dano moral ambiental. O ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça, que em breve vai assumir a presidência da corte, teve papel fundamental para que as violações ambientais fossem reconhecidas como dano à coletividade.

Nos Recursos Especiais 1.356.207 e 1.198.727, por exemplo, o STJ consolidou essa perspectiva. Tribunais estaduais também têm proferido decisões no campo da litigância climática, fazendo menções ao Direito Climático implícito na Constituição. Os temas julgados vão desde a proteção de áreas de preservação até contestações de programas de incentivo à indústria automotiva, que ampliam as emissões e influenciam no aquecimento.

“STJ e STF têm feito sinalizações contundentes em relação a questões ambientais e, em especial, climáticas. É uma questão de solidariedade geracional, tendo por alcance não só as atuais gerações, mas também as futuras”, diz Graça Couto. “Há um entendimento no sentido de que essa é uma questão de tamanha grandeza que não deve ser atribuída somente aos tribunais, mas ao Legislativo e ao Executivo.”

O advogado afirma que a atuação do Judiciário tem relação com a ausência normativa e a inépcia dos outros poderes. E essa atuação se tornou ainda mais importante após as duas últimas eleições parlamentares, que resultaram em um Congresso cujas pautas não têm relação com as demandas sociais mais urgentes.

Ingo Sarlet credita o aumento da litigância climática “especialmente à omissão legislativa, como por exemplo quando o Senado retoma discussão sobre PEC que pode privatizar praias”.

“Há proibição do retrocesso pela Constituição brasileira, ou seja, toda medida que afeta um direito fundamental é, em princípio, inconstitucional.”

Outro ponto é que as empresas passaram a ser questionadas sob outra vertente, além da emissão de crédito de carbono. O Judiciário tem sido instado a decidir como será feita a reparação do ponto de vista do licenciamento, aspecto que tem sido atacado por legislações federais e estaduais, como no Rio Grande do Sul.

“No momento em que as políticas públicas falham, no momento em que o Estado falha nas suas três esferas, na esfera municipal, na esfera estadual e na esfera federal, e as próprias atividades das empresas emissoras não são reguladas adequadamente, e essas passam a emitir gases de efeito estufa e a poluir o meio ambiente, o Poder Judiciário pode, sim, vir a decidir causas que responsabilizem esses potenciais réus”, assinala Gabriel Wedy.

Processo estruturante

Um dos maiores nomes do Direito Ambiental brasileiro, o advogado Édis Milaré acredita que a litigância climática será uma consequência inevitável da tragédia que castiga o Rio Grande do Sul desde o fim de abril, mas ele faz um alerta: não será por meio de processos tradicionais — a velha “briga de X contra Y” — que o problema será resolvido. Segundo o sócio do escritório Milaré Advogados, uma catástrofe desse tamanho exige uma nova maneira de acionar o Judiciário, que ele chama de processo estruturante.

Nas palavras de Milaré, “a questão deve ser resolvida trazendo-se para a mesa de discussões, sob a fiscalização do Poder Judiciário, todos os atores passíveis de serem ouvidos, de serem envolvidos, para se buscar uma decisão de cunho estruturante, ou seja, para que se diga o que pode e o que não pode ser feito, de que forma vai ser feito e quais são os corresponsáveis por fazer isto ou aquilo”.

Como exemplo, o advogado cita o caso de empresas carboníferas da cidade de Criciúma (SC) que eram acusadas de poluir o lençol freático local. Segundo ele, todas as partes envolvidas com o problema (empresários, população e Ministério Público, entre outras) foram chamadas pelo Judiciário para buscar uma solução que atendesse a todos os interesses, e uma solução foi encontrada. “Foi o primeiro grande caso de processo estruturante, e acabou sendo muito bem resolvido.”

Na opinião de Milaré, a apresentação de um sem-número de ações contra municípios gaúchos, o governo estadual e a União — ou seja, o jeito tradicional de litigar — só vai servir para entupir o Judiciário e deixar as vítimas da tragédia sem soluções com a rapidez de que elas precisam.

“Aquele pinga-pinga de ações pulverizadas vai sobrecarregar o Judiciário e levar a decisões que demandarão um tempo que nós não temos, que o povo do Rio Grande do Sul não tem. Nós precisamos ter criatividade para propor medidas estruturantes para resolver um problema que é deveras complexo”, afirma Milaré. “Sem isso, não vejo como se tornar realidade a chamada litigância climática, que é o chamado a um processo diferenciado para a resolução de um problema também diferenciado e complexo.”

  • Por Alex Tajra – repórter da revista Consultor Jurídico.
  • Fonte: Conjur

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a operadora do plano de saúde é obrigada a cobrir medicamento de uso domiciliar incluído no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) durante a tramitação do processo judicial que solicita seu fornecimento.

05.06.2024

Na origem do caso, foi ajuizada ação contra o plano de saúde para que ele fornecesse um medicamento para o tratamento de psoríase. Tanto o juízo de primeiro grau quanto o tribunal local entenderam que o beneficiário teria o direito de receber o medicamento pelo tempo que fosse necessário.

No recurso especial dirigido ao STJ, a operadora do plano sustentou que, na época de sua negativa, o tratamento com a medicação pleiteada não era previsto no rol da ANS, o que só veio a ocorrer alguns meses depois. Alegou também que, por esse motivo, a questão deveria ser analisada conforme a resolução normativa vigente no momento da solicitação do medicamento.

Nova regra não pode ser aplicada retroativamente

A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que, após a inclusão do medicamento de uso domiciliar no rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS, a operadora não pode mais recusar o seu custeio.

Segundo ela, a Resolução Normativa 536/2022, publicada em 6 de maio de 2022, alterou o anexo II da Resolução Normativa 465/2022 para incluir a previsão de cobertura obrigatória do medicamento risanquizumabe para o tratamento de pacientes com psoríase. Até a data da publicação, portanto, os planos de saúde estavam autorizados a negar a cobertura do medicamento de uso domiciliar, de acordo com artigo 10, inciso VI, da Lei 9.656/1988, salvo se houvesse previsão contratual em sentido contrário.

De acordo com a relatora, não é possível aplicar retroativamente a nova resolução. Assim, a Terceira Turma reformou o acórdão de segunda instância para condenar o plano a custear o medicamento apenas a partir de 6 de maio de 2022.

Leia o acórdão no REsp 2.105.812.

Fonte: STJ

Texto sancionado proíbe definição aleatória de foro em contratos civis

05/06/2024

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou um projeto de lei (PL) que cria regras específicas para que as partes envolvidas em uma eventual ação judicial elejam um foro em um contrato privado de caráter civil. Pelo texto, aprovado no Congresso Nacional, a escolha de foro deve guardar pertinência com o domicílio ou residência das partes.

“Nós identificamos que boa parte dos processos que estão tramitando na Comarca do DF [Distrito Federal] são de outros estados sem guardar nenhum tipo de pertinência”, afirmou o autor do projeto, deputado federal Rafael Prudente (MDB-DF), durante cerimônia de sanção do PL nº 1.803/2023, na tarde desta terça-feira (4), no Palácio do Planalto.

Para a relatora do projeto, deputada federal Érica Kokay (PT-DF), o texto fecha uma brecha da lei que atolava o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) de ações judiciais entre partes de outros estados.

“Nós vimos que havia um acúmulo muito grande de processos de vários locais do Brasil aqui no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, em função de sua capacidade de ser célere e por suas custas [mais baratas]”, afirmou.

A nova lei alterou o Código de Processo Civil para estabelecer que a eleição de foro deve guardar relação com o domicílio das partes ou com o local da obrigação, e que o ajuizamento de ação em juízo aleatório constitui prática abusiva, passível de declinação de competência de ofício por parte do juiz. A mudança na lei era um pedido dos juízes do TJDFT.

Para o desembargador Roberval Casemiro Belinati, 1º vice-presidente do TJDFT, a lei corrige um problema histórico que penalizava o tribunal e os próprios moradores do DF.

“Hoje, muitos advogados ajuízam suas as ações em Brasília, porque aqui o tribunal é tido como o mais célere, as custas [judiciais] mais baratas. O advogado mora, por exemplo, no Amazonas, no Maranhão ou no Rio Grande do Sul, os negócios jurídicos estão sendo realizados naqueles locais e, para resolver qualquer litígio envolvendo as partes, eles elegem o foro de Brasília. O território tem que ser rigorosamente observado, sob pena do juiz não aceitar o processo”, afirmou.

Para o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, historicamente, o Código de Processo Civil remetia às partes a escolha livre do foro, pelo entendimento de que era uma questão particular, mas que acabou esbarrando no interesse público. “Se o particular puder escolher o foro, ele penaliza a parte contrária, que terá que se deslocar, ou penaliza os tribunais mais eficientes”, observou.

* Por Pedro Rafael Vilela – Repórter da Agência Brasil – Brasília

Fonte: Agência Brasil

Pena máxima vai de dez a 20 anos para quem fizer o procedimento

05/06/2024

Está na pauta do plenário da Câmara dos Deputados desta quarta-feira (5) o pedido de urgência para o Projeto de Lei nº 1.904/2024 que equipara o aborto realizado acima de 22 semanas de gestação ao homicídio simples, aumentando de dez para 20 anos a pena máxima para quem realizar o procedimento.

Além disso, o texto fixa em 22 semanas de gestação o prazo máximo para abortos legais. Hoje em dia a lei permite o aborto nos casos de estupro; de risco de vida à mulher e de anencefalia fetal (quando não há formação do cérebro do feto). Atualmente, não há no Código Penal um prazo máximo para o aborto legal.

De autoria do deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL/RJ), o texto conta com a assinatura de 32 parlamentares. Caso o pedido de urgência seja aprovado, o texto pode ser apreciado no Plenário à qualquer momento, sem necessidade de passar pelas comissões da casa, o que agiliza a tramitação da medida.

Atualmente, o aborto não previsto em lei é punido com penas que variam de um aos três anos, quando provocado pela gestante ou com seu consentimento, e de três a dez anos, quando feito sem o consentimento da gestante. Caso o projeto seja aprovado, a pena máxima para esses casos passa a ser de 20 anos nos casos de cometido acima das 22 semanas, igual do homicídio simples previsto no artigo 121 do Código Penal.

Ao justificar o projeto, o deputado Sóstenes sustentou que “como o Código Penal não estabelece limites máximos de idade gestacional para a realização da interrupção da gestação, o aborto poderia ser praticado em qualquer idade gestacional, mesmo quando o nascituro já seja viável”.

Ainda segundo o parlamentar, o aborto após 22 semanas deve ser encarado como homicídio. “Quando foi promulgado o Código Penal, um aborto de último trimestre era uma realidade impensável e, se fosse possível, ninguém o chamaria de aborto, mas de homicídio ou infanticídio”, destacou.

O projeto deve sofrer resistência no plenário. A liderança do bloco PSOL/PV, deputada federal Erika Hilton (PSOL/SP), sustentou a Agência Brasil que o texto busca criminalizar vítimas de estupro que têm direito ao aborto legal.

“Para a extrema-direita, crianças sendo mães ou na cadeia após sofrerem um estupro deve ser a normalidade no Brasil”, disse a parlamentar, acrescentando que os defensores do projeto querem “que estupradores tenham direito a serem pais, enquanto colocam na cadeia crianças, mulheres e pessoas que gestam que sofreram a pior violências de suas vidas”.

Ainda segundo a liderança, a medida penaliza servidores da saúde que atuam pra cuidar das mulheres e crianças vítimas de estupro que buscam acesso à cuidado e acolhimento no sistema de saúde.

*Matéria atualizada às 11h16min para acréscimo de informações.

Por Lucas Pordeus Léon – Repórter da Agência Brasil – Brasília

Fonte: Agência Brasil

A Corregedoria Nacional de Justiça atualizou e uniformizou, em todo o território nacional, as regras e os procedimentos de protestos, sejam comuns, falimentares e de sentenças condenatórias. De acordo com o corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, a norma disciplina procedimentos de protestos no Código de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça, como, por exemplo, a possibilidade de o credor escolher o local do pagamento do título em protesto.

  • 4 de junho de 2024

Você está visualizando atualmente Corregedoria Nacional de Justiça atualiza regras de protestos extrajudiciais no país

Cartório – Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ

O protesto judicial é um instrumento usado quando um determinado credor não recebe o valor de uma dívida cujo pagamento já foi determinado pela Justiça. Para o protesto de sentença condenatória, a nova normatização da Corregedoria Nacional exige, além da apresentação de cópia da decisão transitada em julgado, certidão do respectivo juízo apontando o trânsito em julgado, o valor atualizado da dívida, bem como ter transcorrido o prazo para pagamento.

Acesse a íntegra do Provimento nº 167/2024

O protestos dos títulos ou documentos de dívida devem ser recebidos na praça de pagamento indicada no título ou, no caso de falência, o local do protesto se faz no principal estabelecimento do empresário, mesmo que a praça de pagamento contida no título ou documento de dívida seja diversa. No caso dos demais títulos ou documentos que não apresentam a indicação da praça para cumprimento da obrigação, o protesto será registrado na circunscrição territorial do tabelionato do domicílio do devedor.

Para o corregedor nacional, a decisão reforça a importância da atualização constante do Código de Normas, uma vez que o art. 517 do novo Código de Processo Civil prevê a possibilidade de protesto de sentença condenatória, estabelecendo que a medida poderá ser levada a efeito depois de transcorrido o prazo para pagamento voluntário.

Texto: Romualdo Amorim
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias

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