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29/09/2022

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a aplicabilidade da figura do consumidor bystander (consumidor por equiparação) em um caso de danos morais decorrentes de dano ambiental e, com base no Código de Defesa do Consumidor (CDC), confirmou a inversão do ônus da prova determinado pelas instâncias ordinárias.

O colegiado negou provimento ao recurso especial no qual a JBS Aves Ltda. sustentou que o CDC não poderia ser aplicado ao caso, pois não haveria acidente de consumo e, assim, não estaria caracterizada a figura do consumidor por equiparação.

Autora apontou problemas de saúde decorrentes da poluição

Segundo o processo, a atividade industrial da JBS em sua unidade no município de Passo Fundo (RS) causava poluição sonora e atmosférica, com produção de ruído intenso, emissão de fuligem, gases e odores fétidos, tendo ocorrido, inclusive, vazamento de amônia.

Nesse contexto, uma mulher ajuizou ação requerendo indenização por danos morais e apontando problemas de saúde derivados do ambiente insalubre: hipoxemia decorrente de intoxicação causada pela falta de oxigênio, fortes dores de cabeça, fadiga, ardência nos olhos, náusea, diarreia, vômito e mal-estar.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) entendeu que a autora da ação poderia ser equiparada a consumidora e aplicou ao caso as normas do CDC, inclusive a possibilidade de inversão do ônus da prova prevista no artigo 6º, inciso VIII.

Acidente de consumo pode surgir do processo produtivo

A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, observou que, de acordo com a jurisprudência, equipara-se ao consumidor para efeitos legais aquele que, embora não tenha participado diretamente da relação de consumo, sofre as consequências do evento danoso decorrente do defeito exterior que ultrapassa o objeto e provoca lesões, gerando risco à sua segurança física e psíquica.

A magistrada destacou que o acidente de consumo não decorre somente do dano causado pelo produto em si, podendo surgir do próprio processo produtivo, nos termos do artigo 12 do CDC.

Segundo ela, “na hipótese de danos individuais decorrentes do exercício de atividade empresarial poluidora destinada à fabricação de produtos para comercialização, é possível, em virtude da caracterização do acidente de consumo, o reconhecimento da figura do consumidor por equiparação, o que atrai a incidência das disposições do CDC”.

Nancy Andrighi apontou que o STJ, em vários precedentes, já admitiu a figura do bystander em casos de dano ambiental.

Hipossuficiência da vítima validou a inversão do ônus da prova

Para a relatora, a inversão do ônus da prova, nos termos do CDC, não é automática, dependendo da constatação da verossimilhança das alegações e da hipossuficiência do consumidor.

Ao reconhecer a presença desses requisitos, as instâncias ordinárias decidiram que caberia à JBS apresentar prova técnica que demonstrasse que sua atividade não era prejudicial ao meio ambiente, ficando para a autora da ação a incumbência de provar os danos morais alegados.

De acordo com a ministra, a eventual reforma dessa conclusão exigiria o reexame das provas do processo, o que é impedido pela Súmula 7.

REsp 2.009.210.

Fonte: STJ

08/02/2022


O Supremo Tribunal Federal (STF) vai decidir se é passível de prescrição a execução de sentença, nos casos de condenação criminal por dano ambiental, quando convertida em prestação pecuniária. A questão é objeto do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1352872, que, por unanimidade, teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual (Tema 1.194).

Recuperação da área degradada

No caso em análise, uma pessoa foi condenada a seis meses de detenção por construir indevidamente em uma Área de Proteção Ambiental (APA). A pena foi convertida na obrigação de recuperar a área degradada, retirando o aterro, os muros e suas fundações, construídos nos fundos e na lateral de um terreno em Balneário Barra do Sul (SC). Como o condenado alegou dificuldades financeiras, o Ministério Público Federal (MPF) foi intimado a cumprir a obrigação às custas do devedor.

Antes de realizada a remoção e a recuperação integral da área degradada, a Justiça Federal reconheceu a prescrição da pretensão executória, com o argumento de que a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos em favor do exequente, resultando em dívida pecuniária, é prescritível, ainda que oriunda de obrigação reparatória ambiental. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao julgar apelação do MPF, manteve a sentença.

No recurso ao STF, o MPF sustenta que, por se tratar de proteção ao meio ambiente, bem de uso comum do povo, segundo o artigo 225 da Constituição Federal, não se pode falar em incidência da prescrição. Também argumenta que, embora não seja absoluto, o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado é indisponível, o que torna sua reparação imprescritível, inclusive em fase de cumprimento de sentença, pois a demanda não perde sua natureza coletiva.

Repercussão geral

Em manifestação ao Plenário Virtual, o ministro Luiz Fux, presidente do STF, explicou que a hipótese tratada nos autos não é abrangida pela tese firmada no RE 654833 (Tema 999), em que a Corte assentou a imprescritibilidade da pretensão de reparação civil de dano ambiental. O que se discute, no caso, é a incidência de prazo prescricional na execução do título executivo oriundo do reconhecimento da obrigação de reparar o dano.

A matéria, segundo o relator, transcende os interesses das partes envolvidas na causa e tem relevância do ponto de vista econômico, político, social e jurídico, pois envolve o direito ao meio ambiente equilibrado. Fux também assinalou o potencial impacto da temática em outros casos, tendo em vista tratar-se de direito fundamental de titularidade coletiva e de natureza transgeracional.

O mérito do recurso será submetido a julgamento pelo Plenário da Corte, ainda sem data prevista.

FONTE: STF

27 de janeiro de 2022

Seria um contrassenso o Estado, que age em nome da coletividade no papel de guardião do meio-ambiente ecologicamente equilibrado, brindar com contratos, incentivos fiscais, registro, licença e autorização a pessoa física ou jurídica que contamina ou degrada a natureza.

Pesca predatória com uso de redes de arrasto geral dano ambiental indenizável

Com esse entendimento, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado pelo Ibama para determinar sanções extras a uma empresa e seu sócio, ambos condenados a indenizar o Estado brasileiro por praticar a pesca de arrasto.

O caso ocorreu no litoral do Rio Grande do Sul, onde agentes do Ibama flagraram e reportaram o dano ambiental. Na pesca de arrasto, embarcações usam grandes e pesadas redes para, em movimento, exatamente arrastá-la pelo fundo do oceano, trazendo com si espécies não visadas e outras estruturas, como corais.

Em primeiro grau, o juízo identificou o dano ambiental e condenou a empresa a pagar R$ 200 mil por danos materiais e outros R$ 20 mil em danos morais coletivos, com a possibilidade de desconsideração da pessoa jurídica no momento da execução da pena, para alcançar os sócios.

O Ibama recorreu para que fosse cancelado o registro da empresa e cassadas a licença e incentivos fiscais. Elas estão previstas no artigo 14, incisos II a IV da Lei 6.938/1981 e no artigo 72, incisos IV a XI da Lei 9.605/1998.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região registrou que a sanção é possível, mas entendeu que, no caso concreto, não seriam aplicável. E acrescentou que as mesmas medidas poderiam ser buscadas na seara administrativa.

Para o ministro Herman Benjamin, seria contrassenso manter registro e benefícios à empresa que degrada o meio ambiente

“Não se está aqui a dizer que as esferas cível e administrativa dependam uma da outra, mas sim de concluir, conforme a situação trazida aos autos e de acordo com o entendimento dos julgadores, com base no livre convencimento”, disse o desembargador Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, relator do caso no TRF-4, ao julgar os embargos de declaração.

Relator no STJ, o ministro Herman Benjamin reformou essa parte do acórdão. Destacou que tais sanções se encaixam no vasto leque do poder geral do juiz em demandas de responsabilidade civil ambiental. São diligências acessórias, saneadoras e pedagógicas.

“Até porque representaria contrassenso o Estado — que age em nome da coletividade atual e vindoura, no seu papel de guardião do meio ambiente ecologicamente equilibrado — brindar com contratos, incentivos fiscais ou creditícios, e preservar registro, licença ou autorização, em benefício de pessoa física ou jurídica que contamina ou degrada a natureza”, pontuou.

Apontou que o artigo 12 da Lei 6.938/1981 fixa que entidades e órgãos de financiamento e incentivos governamentais devem condicionar a concessão desses benefícios ao licenciamento e ao cumprimento das normas fixadas por órgãos ambientais e pelo próprio legislador ordinário.

“No caso em tela, foi reconhecido, expressamente, pelo Tribunal a quo o dano ambiental. Portanto, é pertinente e adequada a pretensão recursal quanto ao cálculo corrigido do dano e à imposição de medidas complementares à empresa-ré”, concluiu o ministro Herman Benjamin.


REsp 1.745.033

Fonte: STJ