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14/07/2021

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o fornecimento de medicamento para uso domiciliar não está entre as obrigações legais mínimas das operadoras de plano de saúde, salvo os antineoplásicos orais e correlacionados, a medicação aplicada em home care e os produtos listados pela Agência Nacional de Saúde (ANS) como de fornecimento obrigatório.

“A saúde suplementar cumpre propósitos traçados em políticas públicas legais e infralegais, não estando o Judiciário legitimado e aparelhado para interferir, em violação à tripartição de poderes, nas políticas públicas traçadas pelos demais poderes”, afirmou o ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso analisado.

A decisão teve origem em ação ajuizada por um aposentado com o objetivo de obrigar o plano de saúde a custear tratamento domiciliar com o remédio Tafamidis – Vyndaqel, registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O autor da ação alegou que o fato de o fármaco não ser ministrado em ambiente ambulatorial, mas em casa, não bastaria para isentar o plano da obrigação de fornecê-lo, e que tal recusa afrontaria o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Negado em primeira instância, o pedido foi concedido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Setor privado tem caráter complementar

No recurso ao STJ, a operadora invocou o artigo 10 da Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/1998) para afastar sua obrigação de fornecer o medicamento.

De acordo com Luis Felipe Salomão, a judicialização da saúde exige redobrada cautela da magistratura, para não proferir decisões limitadas ao exame isolado de casos concretos – com o que acabaria por definir políticas públicas sem planejamento. Apesar da proteção conferida à saúde pela Constituição – acrescentou –, não se pode transferir irrestritamente o atendimento desse direito fundamental ao setor privado, que deve atuar apenas em caráter complementar.

O relator afirmou que o artigo 22, parágrafo 1º, da Lei 9.656/1998 mostra a inequívoca preocupação do legislador com o equilíbrio financeiro-atuarial dos planos e seguros de saúde. Ele mencionou precedente de abril deste ano (REsp 1.692.938) em que a Terceira Turma, por unanimidade, considerou lícita a exclusão, na saúde suplementar, do fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, salvo as exceções previstas na Lei dos Planos de Saúde.

Salomão observou que o medicamento de alto custo Tafamidis, embora esteja na lista do Sistema Único de Saúde (SUS), não figura entre os antineoplásicos orais e correlacionados, nem os de medicação assistida (home care), e tampouco integra o rol de medicamentos de fornecimento obrigatório da ANS (seja a relação da época do ajuizamento da ação, seja a atual).

Aplicação do CDC nos planos de saúde é subsidiária

Quanto à aplicação do CDC ao tema, o relator afirmou que sua interpretação deve levar em consideração o texto da lei como um todo, especialmente os objetivos da Política Nacional das Relações de Consumo e os princípios que devem ser respeitados, dentre os quais se destaca a harmonia das relações de consumo e o equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.

Segundo o ministro, já é pacífico na Segunda Seção do STJ o entendimento de que as normas do CDC se aplicam apenas subsidiariamente aos planos de saúde, conforme disposto no artigo 35-G da Lei dos Planos de Saúde. “Como o CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade há clara prevalência da lei especial nova pelos critérios de especialidade e cronologia”, declarou.

Na opinião do relator, a judicialização da saúde exige redobrada cautela de toda a magistratura, para não proferir decisões limitadas ao exame isolado de casos concretos – com o que acabaria por definir políticas públicas sem planejamento.

Se há motivos que autorizem a intervenção judicial – concluiu –, esta deve ocorrer para decretação da nulidade ou da resolução do contrato, “nunca para a modificação do seu conteúdo – o que se justifica, ademais, como decorrência do próprio princípio da autonomia da vontade”.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

REsp 1883654

Fonte: STJ

14/07/2021

P​ara a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), as revisões da Lei Complementar 123/2006 quanto à receita bruta máxima para enquadramento como Microempresa (ME) ou Empresa de Pequeno Porte (EPP) não descaracterizam o crime de inserção de informação falsa em documento público, para fins de participação em licitações, cometido anteriormente.

De acordo com a acusação, em 2011, duas empresas teriam apresentado declarações falsas para participar de licitação restrita às MEs e EPPs, mesmo sem se enquadrarem nessa condição, porque ultrapassavam os limites máximos de receita bruta anual então previstos na LC 123/2006.

Considerando a entrada em vigor da LC 139/2011 (que alterou a LC 123/2006 e elevou os limites de receita bruta), o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) decidiu pela ocorrência de abolitio criminis, sob o argumento de que as empresas se enquadravam nos novos patamares previstos na legislação.

O Ministério Público Federal recorreu ao STJ alegando que a intenção do legislador, ao alterar os valores para enquadramento como ME ou EPP, não foi abolir eventuais fraudes cometidas antes, mas apenas adequar tais montantes à inflação.

Ambiente jurídico mais favorável

Segundo o relator, ministro Ribeiro Dantas, o tratamento mais benéfico às microempresas e empresas de pequeno porte tem a finalidade constitucional de criar um ambiente jurídico favorável aos empreendimentos que, por seu tamanho reduzido, não detêm estrutura para competir em condições de igualdade com os “gigantes do mercado”.

Assim, para tornar objetiva essa condição – destacou o ministro –, a legislação fixou um limite de receita bruta, em dinheiro, suscetível às variações inflacionárias.

“A propósito, a atualização do teto de receita bruta das EPPs, dos R$ 2,4 milhões fixados em 2006 para os R$ 3,6 milhões da Lei Complementar 139/2011, corresponde a pouco mais do que a inflação acumulada no período (30,78%, conforme o IPCA)”, acrescentou.

Alteração legal do limite da receita bruta não retroage

Ribeiro Dantas afirmou que as sucessivas revisões dos quantitativos máximos da LC 123/2006, para fazer frente à inflação, não se aplicam a anos anteriores – ainda que para fins criminais –, sob pena de se instituir uma grave distorção concorrencial e atentar contra os próprios objetivos da lei.

Afinal, justificou o relator, uma receita bruta de R$ 3,6 milhões em 2012 representa, na prática, um poder aquisitivo menor do que o mesmo montante em 2011.

No caso julgado, frisou o ministro, a acusação não diz que as duas empresas não são, hoje, MEs ou EPPs, mas sim que, no específico ano-calendário de 2011, não tinham essa qualificação, a qual teria sido atestada falsamente por seus dirigentes.

No entender do ministro, as alterações legais posteriores são incapazes de modificar a dinâmica fática já ocorrida, porque a conduta delitiva imputada aos réus é a falsa declaração de uma situação fático-jurídica então inexistente.

“Uma modificação legislativa que dê novo enquadramento ao atual regime das empresas não muda o fato de que, em 2011, a informação prestada à administração pública foi, em tese, falsa”, concluiu.

Ao dar provimento ao recurso do Ministério Público, os ministros afastaram a absolvição sumária dos réus e determinaram que o processo retorne ao primeiro grau para regular seguimento.

Leia o acórdão no AREsp 1.526.095.​

Fonte: STJ

12 de julho de 2021

Ao analisar ação de anulação de rescisão de contrato de plano de saúde coletivo empresarial, a 3ª turma do STJ decidiu que a operadora que optar pela não renovação do contrato com a pessoa jurídica a que estão vinculados os beneficiários não tem a obrigação de mantê-los em plano individual ou familiar quando não existir essa opção em sua carteira de serviços.

No entanto, acrescentou o colegiado, deve ser oferecida ao beneficiário a possibilidade de contratar novo plano de saúde, observado o prazo de permanência no anterior, sem o cumprimento de novos períodos de carência ou de cobertura parcial temporária, e sem custo adicional pelo exercício do direito.

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, a resolução da controvérsia exige a análise conjunta das regras contidas no CDC e na lei 9.656/1998, com a regulamentação dada pela Resolução Consu 19/1999.

“De um lado, a Lei 9.656/1998 e seus regulamentos autorizam a operadora do seguro de saúde coletivo empresarial a não renovar o contrato; de outro lado, o CDC impõe que os respectivos beneficiários, que contribuíram para o plano, não fiquem absolutamente desamparados, sem que lhes seja dada qualquer outra alternativa para manter a assistência a sua saúde e de seu grupo familiar.”

(Imagem: Stocksnap)

3ª turma do STJ decidiu que operadora pode optar por não renovação, mas precisa oferecer alternativa para amparar beneficiário.

Plano coletivo

O caso teve origem em ação de anulação de rescisão de contrato ajuizada por usuários do plano de saúde em face da Unimed Seguros Saúde S/A, na qual se pretendeu a manutenção do contrato de saúde coletivo empresarial ou a migração para plano familiar ou individual, sem carências e nas mesmas condições do plano anterior.

A sentença julgou procedente o pedido, para determinar que a operadora assegurasse a continuidade da prestação dos serviços de assistência à saúde discutida nos autos, mediante migração do plano coletivo anterior/rescindido para a modalidade individual e/ou família.

O TJ/MG confirmou a sentença sob o argumento de que, embora a não renovação do contrato seja um direito da operadora de saúde, mediante notificação prévia (artigo 13, parágrafo único, inciso II da lei 9.656/98), ao beneficiário deve ser oportunizada a migração para um plano de natureza individual ou familiar oferecido pela estipulante, nos termos do artigo 1º da Resolução CONSU 19/1999.

No recurso especial apresentado ao STJ, a Unimed defendeu a legalidade da rescisão do contrato coletivo e a inexistência de obrigatoriedade de migração dos beneficiários para contrato individual ou familiar, em razão de não comercializar essa modalidade, devido à suspensão da ANS.

Vulnerabilidade do consumidor

Segundo a ministra Nancy Andrighi, no âmbito jurisdicional, a edição da Súmula 608 pelo STJ confirmou que a ANS, no exercício de seu poder normativo e regulamentar acerca dos planos de saúde coletivos (ressalvados os de autogestão, apenas), deve observar as regras do CDC.

A relatora acrescentou que a interpretação literal do artigo 3º da Resolução CONSU 19/1999 agrava ainda mais a situação de vulnerabilidade do consumidor, além de favorecer o “exercício arbitrário”, pelas operadoras de seguro de saúde coletivo, do direito de não renovar o contrato celebrado – o que não é tolerado pelo CDC, ao qual as empresas também estão subordinadas.

O diálogo das fontes entre o CDC e a Lei 9.656/1998, com a regulamentação dada pela Resolução CONSU 19/1999, exige uma interpretação que atenda a ambos os interesses: ao direito da operadora, que pretende se desvincular legitimamente das obrigações assumidas no contrato celebrado com a estipulante, corresponde o dever de proteção dos consumidores (beneficiários), que contribuíram para o seguro de saúde e cujo interesse é na continuidade do serviço”, destacou.

Portabilidade

Para Nancy Andrighi, na ausência de norma legal expressa que resguarde o consumidor na hipótese de resilição unilateral do contrato coletivo pela operadora, deve ser reconhecido o direito à portabilidade de carências – permitindo, assim, que os beneficiários possam contratar um novo plano de saúde, observado o prazo de permanência no anterior, sem o cumprimento de novos períodos de carência ou de cobertura parcial temporária, e sem custo adicional pelo exercício do direito.

Na hipótese julgada, a 3ª turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso especial para determinar que os beneficiários do plano de saúde coletivo sejam devidamente comunicados da data efetiva da extinção do vínculo contratual, a fim de que possam exercer o direito de requerer a portabilidade de carência – salvo se houver a contratação de novo plano de saúde pelo empregador.

  • Processo: REsp 1.895.321
  • Fonte: STJ

12 de julho de 2021

juros poupanca

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu julgar, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1.101), controvérsia sobre o termo final da incidência dos juros remuneratórios nos casos de ações coletivas e individuais que reivindicam a reposição de expurgos inflacionários em cadernetas de poupança.

Até a fixação do precedente qualificado, o colegiado determinou a suspensão do processamento dos recursos especiais e agravos em recurso especial que discutam questão idêntica e que estejam pendentes de apreciação nos tribunais de segundo grau em todo o país.

A relatoria dos recursos especiais é do ministro Raul Araújo, segundo o qual a tese adotada sob o rito dos repetitivos vai contribuir para oferecer mais segurança e transparência da questão pelas instâncias de origem e pelos órgãos fracionários do STJ, tendo em vista que o tema é recorrente e ainda não recebeu solução uniformizadora, concentrada e vinculante.

O relator também destacou que, de acordo com a Comissão Gestora de Precedentes, apenas em 2019, foram feitos mais de dois mil exames de admissibilidade dessa matéria. Além disso, a comissão também reforçou o impacto jurídico, econômico e social do debate sobre os expurgos inflacionários em cadernetas de poupança.

Ainda segundo o presidente da comissão, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a matéria repercute em boa parte dos 20 mil processos em razão da afetação dos temas 948 e 1.015 do STJ.

“Conclui-se, assim, que o recurso especial traz controvérsia repetitiva, de caráter multitudinário, com inúmeros recursos, em tramitação nesta Corte ou na origem, versando sobre o tema”, finalizou o ministro ao afetar os recursos.

O que são os recursos repetitivos?

O Código de Processo Civil regula no artigo 1.036 e seguintes o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1877300REsp 1877280

Por STJ

12/07/2021

A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) reformou decisão do Juízo da 2ª Vara Federal de Tocantins  que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa, rejeitou a alegação de impenhorabilidade de bem de família formulado pelo agravante. 

O agravante esclarece inicialmente que o imóvel penhorado é oriundo de herança de seu sogro e que o aludido bem é utilizado como residência de sua sogra. Informa que esta é proprietária de 50% deste (na qualidade de meeira) e que cada um dos herdeiros são proprietários de 10%, e que ele é casado em comunhão universal de bens com uma das herdeiras, é também proprietário na fração ideal de 5% (cinco por cento).  

Ao analisar o caso, a relatora, desembargadora federal Mônica Sifuentes, afirmou que de acordo com a orientação jurisprudencial mais recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece-se como bem de família de um imóvel indivisível , ainda que em relação a um só dos seus proprietários, estende a proteção legal da impenhorabilidade à sua integralidade.

No presente caso, sustentou a magistrada, o agravante, em princípio, logrou êxito em demonstrar pelos diversos documentos acostados aos autos de origem que o imóvel sobre o qual recaiu a penhora é utilizado como residência de sua sogra, proprietária de 50% do imóvel. 

Diante do exposto, a desembargadora federal ressaltou que há plausibilidade jurídica na pretensão do agravante, tendo em vista que não mostra possível, a priori, a penhora da fração ideal de 5% do imóvel em comento, por força da extensão da impenhorabilidade consagrada na Lei 8.009/1990 sobre todo o imóvel em destaque. 

A decisão foi unânime. 

Processo: 1004521-68.2021.4.01.0000 

Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça 

09/07/2021

Mesmo após a citação, é possível modificar polo ativo de ação ajuizada por empresa extinta

​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é possível a modificação do polo ativo da demanda, ainda que o pedido de alteração ocorra após a citação, como no caso da substituição de sociedade empresária extinta por um de seus sócios.

Com base em precedentes do STJ, o colegiado entendeu ser admissível emenda à petição inicial para a modificação das partes, desde não haja alteração do pedido ou da causa de pedir. Essa orientação, de acordo com a turma, é reflexo de uma evolução jurisprudencial em atenção aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, levando à flexibilização da regra do artigo 264 do Código de Processo Civil de 1973.

A controvérsia julgada teve origem em ação de indenização por danos materiais ajuizada por um dos sócios e por uma transportadora contra BRF SA (Sadia SA).

Segundo os autos, em outubro de 1993, a Sadia representou criminalmente um ex-funcionário e solicitou o sequestro de diversos bens. Após 17 anos, o processo penal foi extinto em razão do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva, momento em que os bens apreendidos foram devolvidos totalmente deteriorados e em estado de abandono. 

Assim, em 2011, os autores ingressaram com a ação de indenização por danos materiais, buscando a condenação da empresa em lucros cessantes e danos emergentes.

Estabilização da lide

Em decisão interlocutória, o juízo deferiu o pedido feito pela Sadia para a exclusão da transportadora do polo ativo da demanda, em razão do encerramento de seu registro na junta comercial.

Porém, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMS) deu provimento a agravo de instrumento para determinar a substituição de transportadora por seu ex-sócio.

No recurso especial apresentado ao STJ, a Sadia sustentou ser vedada a alteração do polo ativo da demanda após a estabilização da lide, ocorrida com a citação. Defendeu, ainda, que a substituição da empresa pelo ex-sócio lhe causou prejuízo, pois, se fosse ajuizada nova ação pelo responsável legal da sociedade empresária extinta, ela poderia invocar a prescrição.

A morte da empresa

Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, a extinção representa para a sociedade empresária o que a morte representa para a pessoa natural: o fim da sua existência no plano jurídico, sem a qual não há mais personalidade civil, nem capacidade de ir a juízo e reivindicar qualquer direito.

“Eventuais direitos patrimoniais que integraram a esfera jurídica da sociedade são transmitidos, com a sua extinção, aos ex-sócios, aos quais, assim, pertence a legitimidade para postular em juízo acerca de tais direitos”, afirmou.

Nancy Andrighi destacou que, na hipótese analisada, por já se encontrar extinta a transportadora desde abril de 2004, estava patente a ilegitimidade ativa da sociedade empresária desde o protocolo da petição inicial, realizado em 2011.

Segundo a ministra, nesse contexto, cabia ao juízo ter determinado a retificação do polo ativo, com vistas a possibilitar o regular processamento da demanda.

“Como não o fez, abriu-se para a parte ré a possibilidade de suscitar o vício em sua contestação, circunstância que, todavia, não é capaz de justificar a prematura extinção do processo quanto ao direito material vindicado”, observou.

Indenização proporcional

A magistrada acrescentou que, no caso analisado, não houve prejuízo à Sadia, por não se tratar de hipótese de alteração do pedido ou da causa de pedir. Dessa forma, apontou, as razões de defesa, tanto fáticas como jurídicas, permanecem hígidas e pertinentes – quer conste do polo ativo a transportadora já extinta, quer conste o seu ex-sócio.

Ao confirmar, em parte, o acórdão do TJMS – que autorizou a substituição da empresa por seu ex-sócio –, a ministra ressaltou que, como apenas um dos ex-sócios da transportadora compareceu aos autos, o pagamento da indenização deve ser feito na proporção da participação dele no capital social da empresa extinta.

Processo referente: REsp 1826537

Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça – 09/07/2021

08/07/2021

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a legitimidade da matriz para questionar, em nome de filial, dívida originada de cobrança para o Seguro Acidente de Trabalho (SAT). Na decisão, por unanimidade, o colegiado considerou pontos como a universalidade da sociedade empresarial, e a ausência de personalidade e autonomia jurídicas por parte da filial.

Por meio de mandado de segurança, a matriz buscava que o Fisco se abstivesse de cobrar a SAT com base em alíquota apurada de acordo com a atividade preponderante na empresa como um todo, de forma que a cobrança fosse realizada com base nas alíquotas aferidas segundo a atividade principal de cada estabelecimento da sociedade.

Ao negar o pedido, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) entendeu que a matriz carece de legitimidade para demandar em nome de suas filiais nos casos em que o fato gerador do tributo ocorrer de maneira individualizada em cada estabelecimento comercial ou industrial. Assim, para o TRF2, a matriz e a filial deveriam, individualmente, buscar o Judiciário para pleitear a alteração de suas alíquotas.

Sociedade empresarial como universalidade de fato

O ministro Gurgel de Faria, relator do recurso, destacou que o tema sobre a legitimidade da matriz para pedir compensação ou restituição tributária em nome das filiais foi decidido pela Primeira Turma, ao analisar o AREsp 731.625. No julgamento, o colegiado apontou que a filial é uma espécie de estabelecimento empresarial, fazendo parte do acervo patrimonial de uma única pessoa jurídica e partilhando dos mesmos sócios, contrato social e firma ou denominação da matriz.

Nessa condição, entendeu o colegiado, a filial consiste em uma universalidade de fato, não possuindo personalidade jurídica própria, tampouco pessoa distinta da sociedade, apesar de terem domicílios em lugares diferentes e inscrições distintas de CNPJ.

Segundo Gurgel de Faria, o fato de as filiais possuírem CNPJ próprio confere a elas apenas autonomia administrativa e operacional para fins fiscalizatórios, mas não abarca a autonomia jurídica, pois existe relação de dependência entre o CNPJ das filiais e o da matriz.

“Os valores a receber provenientes de pagamentos indevidos a título de tributos pertencem à sociedade como um todo, de modo que a matriz pode discutir relação jurídico-tributária, pleitear restituição ou compensação relativamente a indébitos de suas filiais”, concluiu o ministro ao reformar o acórdão do TRF2 e reconhecer a legitimidade da matriz para propor o mandado de segurança.

Fonte:  STJ

8/7/2021

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que é possível ao juízo, em sede de exceção de pré-executividade, determinar a complementação das provas, desde que elas sejam pré-existentes à objeção.

“A possibilidade de complementação da prova apresentada com o protocolo da exceção de pré-executividade propicia a prestação de tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva”, afirmou a relatora do processo, ministra Nancy Andrighi.

A decisão teve origem em ação de execução de título extrajudicial movida por uma indústria e distribuidora de petróleo contra um posto de combustíveis e um ex-cotista que atuava em negócios jurídicos relativos à venda de combustíveis. Por meio de exceção de pré-executividade, o ex-cotista alegou sua ilegitimidade passiva, sob o fundamento de ter alienado suas cotas sociais antes de ocorrida a transação que levou aos títulos em execução.

Juízo tem dever de precaução
Em decisão interlocutória, o juízo facultou ao ex-dono das cotas a apresentação de documentos aptos a comprovar a data do registro na junta comercial, da alteração contratual e da notificação da distribuidora a respeito desse fato.

Houve apelação e o tribunal de origem manteve a decisão por entender que o mero complemento de prova apresentada ou a correção de vício sanável pelo devedor não implica ofensa às características da exceção de pré-executividade ou à execução, pois retratam o mero dever de precaução do magistrado.

Apesar disso, a corte ressaltou que não seria possível a produção de prova baseada em fato não suscitado anteriormente, porque isso traria prejuízo ao credor e ao andamento regular da execução, de forma que seria viável apenas a complementação do que já fora apresentado na exceção.

Requisitos formais e materiais
Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi destacou que, conforme a jurisprudência do STJ, a exceção de pré-executividade tem caráter excepcional, sendo cabível somente quando atendido simultaneamente dois requisitos. O primeiro, de ordem material, preceitua que a matéria invocada deve ser suscetível de conhecimento de ofício pelo juiz; o segundo, de ordem formal, define ser indispensável que a decisão possa ser tomada sem necessidade de dilação probatória.

Nancy Andrighi pontuou que, entre as matérias passíveis de conhecimento pelo juiz, estão as condições da ação e os pressupostos processuais. “Não há dúvida de que a ilegitimidade passiva pode ser invocada por meio de exceção de pré-executividade, desde que amparada em prova pré-constituída”, apontou.

No caso do requisito formal, a magistrada ressaltou que a exigência de que a prova seja pré-constituída tem como objetivo evitar embaraços ao regular processamento da execução, de forma que não haja espaço para a realização de aprofundada atividade cognitiva por parte do juiz. “O executado apenas pode comprovar as alegações formuladas na exceção de pré-executividade com base em provas já existentes à época do protocolo da petição”, complementou a relatora.

Complementação de documento não é instrução probatória
A relatora lembrou que, conforme a doutrina, não se enquadra como instrução probatória a hipótese em que a matéria suscitada pelo devedor é acompanhada de prova robusta, apenas dependente de complementação superficial pelo juiz.

Como exemplo, Nancy Andrighi citou o caso do mandado de segurança, em que se consolidou orientação no sentido de que é possível emendar a inicial, para possibilitar ao impetrante a apresentação de documentos comprobatórios da certeza e da liquidez do direito invocado.

“Esse princípio é desdobramento do princípio da boa-fé processual. Cuida-se de substancial e destacada revolução no modelo processual até então vigente, em vista de uma maior proteção dos direitos fundamentais dos envolvidos no processo”, concluiu a ministra ao manter o acórdão de segundo grau.

REsp1912277

Fonte: STJ

5 de julho de 2021

A 2ª seção do STJ negou pedido de proteção especial da marca Visa, à empresa de cartões, autorizando que empresa de laticínios continue usando “Visa” no nome. O colegiado considerou ausência de declaração que a reconhecesse como de alto renome e por não verificar risco de confusão entre os consumidores.

(Imagem: STJ)

2ª seção negou pedido da Visa do Brasil Empreendimentos por não verificar risco de confusão entre os consumidores.

No julgamento do REsp 951.583, os ministros da 3ª turma, com base no princípio da especialidade, concluíram pela possibilidade de existência da marca Visa Laticínios – de uma empresa da indústria alimentícia de Minas Gerais -, por não verificarem risco de confusão entre os consumidores quanto à origem dos produtos ou serviços.

Na ação rescisória, as empresas do grupo Visa alegaram que o acórdão violou a legislação, por condicionar a proteção especial de sua marca à renovação do registro como marca notória, nos termos do artigo 67 da lei 5.772/71, ignorando que o artigo 233 da lei 9.279/96 proibiu expressamente a prorrogação de registros com esse status.

Marca notória

Para a relatora, ministra Isabel Gallotti, o fundamento jurídico do acórdão rescindendo foi o fato de não ter havido renovação do registro de marca notória e de não haver, na época, o reconhecimento de marca de alto renome em favor das empresas de cartão de crédito.

A ministra explicou que a determinação trazida pelo artigo 233 da lei 9.279/96 – de que os pedidos de declaração de notoriedade fossem arquivados e as declarações já concedidas pelo INPI permanecessem em vigor pelo prazo de vigência restante – fez com que as marcas notórias continuassem valendo até o término do prazo que a lei anterior conferia (dez anos), mas sem prorrogação, “porque a nova lei não permitiu”.

Assim, segundo a magistrada, após o vencimento da declaração de marca notória, a empresa interessada deveria dar início ao procedimento para obter o reconhecimento de sua marca como de alto renome, nos termos do artigo 125 da lei 9.279/96, da Resolução INPI/PR 107/13 e anteriores, bem como do Manual de Marcas do INPI. Porém, segundo Isabel Gallotti, não foi isso o que ocorreu na hipótese analisada.

De acordo com a ministra, as informações do processo dão conta de que, durante a vigência do registro da marca notória, não estavam comprovadamente preenchidos os requisitos legais para a proteção especial em todas as classes. Além disso, ao tempo da entrada em vigor da nova lei, não havia declaração pelo INPI de alto renome para a marca Visa.

Procedimento específico

Isabel Gallotti explicou que, apesar de alguns precedentes do STJ tratarem marca notória e alto renome como mera continuidade sob nova denominação, o artigo 233 da lei 9.279/96, ao estabelecer a proibição da prorrogação de declaração de notoriedade, aponta para a extinção do instituto antigo.

Para a ministra, do mesmo modo, a retirada da ressalva anteriormente constante do artigo 67 também corrobora a diferenciação dos institutos.

“Fosse uma mera continuidade do mesmo instituto sob novo nome, a lei nova certamente não impediria a prorrogação e faria a ressalva de que as marcas notórias passariam a viger na prorrogação com o estatuto de marcas de alto renome.”

A ministra disse ainda não haver impedimento para que, mesmo na vigência da marca notória, as empresas pedissem a declaração de alto renome.

“Ao contrário do que sustenta a requerente, o reconhecimento do alto renome exige procedimento específico, inicialmente incidental e posteriormente por meio de requerimento.”

Sem violação

Isabel Gallotti frisou que a interpretação do artigo 233 da lei 9.279/96 aponta para a convivência, durante o período de transição, dos dois institutos, cada qual com seu grau de proteção, conforme estabelecido na lei que regula a concessão desses status. “Concedido o registro de marca notória na vigência da lei 5.772/71, perdurará até o seu fim com os elementos de proteção estabelecidos naquele diploma“, afirmou.

A relatora ressalvou, no entanto, que o instituto de marca notória não pode ser prorrogado justamente porque deixou de existir com a mudança legislativa, devendo ser feita a solicitação para o reconhecimento de marca de alto renome, nos termos da nova lei.

A magistrada entendeu, assim, que não houve, no acórdão da 3ª turma, nenhuma violação à literalidade do artigo 233 da lei 9.279/96, o que inviabiliza a pretensão de sua rescisão.

  • Processo: AR 4.623
  • Fonte: STJ

​​​​​02/07/2021

​​​​​Diante das alterações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015), a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para declarar a incapacidade relativa de um idoso com doença de Alzheimer que, em laudo pericial, foi considerado impossibilitado de gerir os atos da vida civil.

O idoso foi declarado absolutamente incapaz nas instâncias de origem, mas, para o colegiado, a partir da Lei 13.146/2015, apenas os menores de 16 anos são considerados absolutamente incapazes para exercer pessoalmente os atos da vida civil. “O critério passou a ser apenas etário, tendo sido eliminadas as hipóteses de deficiência mental ou intelectual anteriormente previstas no Código Civil“, explicou o relator do recurso julgado, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Na ação que deu origem ao recurso, o juízo acolheu o pedido de interdição, indicou o curador especial e declarou o idoso absolutamente incapaz. A sentença foi confirmada pelo TJSP, para o qual a declaração de incapacidade relativa resultaria em falta de proteção jurídica para o interditado.

Mudanças no CC

O ministro Bellizze explicou que o objetivo da Lei 13.146/2015, ao instituir o Estatuto da Pessoa com Deficiência, é assegurar e promover a inclusão social das pessoas com deficiência física ou psíquica e garantir o exercício de sua capacidade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Segundo ele, a nova legislação trouxe alterações significativas para o Código Civil no tocante à capacidade das pessoas naturais – entre elas, a revogação dos incisos II e III do artigo 3°, os quais consideravam absolutamente incapazes aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tivessem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil e os que não pudessem exprimir sua vontade, mesmo em razão de causa transitória.

“A partir da entrada em vigor da Lei 13.146/2015, que ratifica a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, somente são consideradas absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 anos”, afirmou.

Novo sistema

O relator lembrou que o artigo 84, parágrafo 3º, do estatuto estabelece que o instituto da curatela da pessoa com deficiência constitui medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, e durará o menor tempo possível.

Nesse sentido, Bellizze ressaltou que a curatela deve afetar tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, não abrangendo todos os atos da vida civil, tais como “o direito ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto” (artigo 85).

No caso em julgamento, o ministro verificou que o laudo pericial psiquiátrico foi contundente ao diagnosticar a impossibilidade do idoso para gerir sua pessoa e administrar seus bens e interesses. Embora a sentença tenha sido fundamentada na nova legislação, o magistrado observou que o juízo de primeiro grau declarou o idoso absolutamente incapaz, nos termos do então revogado artigo 3°, II, do Código Civil.

Para o magistrado, diante do novo sistema de incapacidades promovido pela Lei 13.146/2015, é necessária a modificação do acórdão recorrido, a fim de declarar a incapacidade relativa do idoso, conforme as novas disposições do artigo 4º, III, do Código Civil.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ